Projecto de Lei

Projecto de Lei 284/IX - Redução dos gastos com medicamentos

Introduz medidas com vista à redução dos gastos com medicamentos comparticipados e altera a Lei 14/2000, de 8 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 271/2002, de 2 de Dezembro, bem como o Decreto-Lei 72/91, de 8 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 291/98, de 17 de Setembro e pelo Decreto-Lei nº 242/2000, de 26 de Setembro

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Preâmbulo

Portugal é um dos países da União Europeia onde o custo com despesas de saúde pago directamente pelos cidadãos (para além das contribuições fiscais) é maior. E se olharmos para os gastos com medicamentos a situação é particularmente grave. Os portugueses, especialmente os mais desfavorecidos, suportam uma elevada factura com medicamentos.

A situação agravou-se com os recentes aumentos decretados pelo Governo e acentuar-se-á com a entrada em vigor, em finais de Março, do sistema de preços de referência, que provocará um crescimento real dos custos para o utente nas situações em que seja receitado um medicamento de marca mais caro sem admissibilidade da sua substituição.

Em simultâneo os custos com medicamentos pesam cada vez mais no orçamento da saúde, sem que isso se reflicta em proporção semelhante na melhoria do acesso aos medicamentos pela população. Assume por isso especial relevância a possibilidade de poupar dinheiro aos utentes e ao Estado, através da dispensa gratuita nas unidades do SNS (com prioridade para os hospitais) dos medicamentos cujo custo de aquisição, mercê das vantagens da compra centralizada por concurso, seja mais baixo do que a comparticipação suportada pelo Estado nas farmácias privadas.

Não existe em Portugal uma preocupação sistemática com a racionalidade da prescrição, nem o seu incentivo pelas instituições do Serviço Nacional de Saúde. Conhecendo-se a tendência portuguesa para um consumo de medicamentos acima da média, a que acrescem os já referidos gastos elevados para o Estado e para os utentes, importa criar mecanismos para refrear essa tendência, quer por razões de boa gestão dos recursos financeiros, quer por não menos importantes razões de saúde pública. Para isso contribuirá a definição da prescrição pelo princípio activo como regra para todas as situações (mesmo admitindo ainda a referência à marca), retomando a formulação legal da Lei n.º 14/2000 de 8 de Agosto, bem como a garantia da existência de informação e formação independente de carácter público ou com certificação oficial, não deixando essa função apenas para a indústria farmacêutica.

Assim o PCP propõe neste projecto de lei, entre outras medidas:

- A eliminação da disposição legal que permite a aposição de marca num medicamento genérico, adulterando a sua característica fundamental que é a de ser um produto “branco” e que portanto dispensa a propaganda de quem o produz com vista à sua prescrição;
- A reposição da prescrição do princípio activo como regra geral para a prescrição no Serviço Nacional de Saúde;
- A existência de informação científica independente sobre medicamentos, sob a tutela do Infarmed;
- A implantação de programas e medidas de racionalização da prescrição terapêutica, designadamente prevendo a aplicação plena do Prontuário Nacional do Medicamento, do Formulário Nacional Hospitalar de Medicamentos e dos formulários de cada unidade, a partir de 1 de Agosto de 2003;
- A dispensa gratuita dos medicamentos cuja comparticipação seja mais onerosa para o Estado do que o custo da compra para o SNS.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do PCP abaixo-assinados apresentam o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1º
Âmbito

A presente Lei tem por objectivo desenvolver medidas conducentes à racionalização e rentabilização de encargos para o SNS decorrentes da prescrição de medicamentos e prevenir uma utilização mais racional e mais consentânea com a defesa da saúde dos cidadãos.

Artigo 2º
Forma de identificação de medicamentos genéricos

O artigo 21º do Decreto-Lei 72/91, de 8 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 291/98, de 17 de Setembro, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 21.º
(…)

1 - Os medicamentos genéricos são identificados pela denominação comum internacional (DCI) das substâncias activas, seguida da dosagem e da forma farmacêutica.

Alínea b) (revogada);

Alínea c) (revogada).

2 - O nome do titular da autorização de introdução no mercado (AIM) não poderá fazer parte integrante da identificação do medicamento nem figurar directa e imediatamente associado a essa identificação.

3 - Na falta de denominação comum internacional das substâncias activas, o medicamento é identificado pelo nome genérico nos termos em que essa designação é definida no Decreto-Lei 291/98, de 17 de Setembro.»

Artigo 3º
Prescrição racional de medicamentos genéricos

O artigo 2º da Lei 14/2000, de 8 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei 271/2002, de 2 de Dezembro, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 2.º
(…)

1 – A prescrição de medicamentos comparticipados pelo SNS é efectuada mediante a indicação da denominação comum internacional (DCI) ou do nome genérico, sendo admitido a seguir a essa indicação o nome do titular da autorização de introdução no mercado (AIM), seguida em todos os casos da dosagem da forma farmacêutica e da posologia.

2 – (…)

3 – (…)

4 – (…)

Artigo 4º
Informação científica independente

1- O Ministério da Saúde garante, de forma a habilitar o prescritor na decisão, a formação e informação científica indispensável sobre os medicamentos existentes no mercado.
2- A formação sobre medicamentos inclui a organização, sob a responsabilidade do Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (Infarmed), de iniciativas de divulgação e debate científico sobre medicamentos, especialmente dirigidas aos profissionais do Serviço Nacional de Saúde.
3- O Infarmed publica anualmente informação completa sobre os medicamentos existentes no mercado, com actualização trimestral, garantindo a acessibilidade na Internet.
4- O Infarmed disponibiliza igualmente on-line outras informações relevantes para prescritores ou utentes, designadamente os seus pareceres técnicos e as estatísticas de prescrição, consumo e gastos com medicamentos.

Artigo 5º
Melhoria da qualidade da prescrição

1- As instituições de saúde adoptam internamente programas de melhoria da qualidade da prescrição, apoiados pelo Infarmed, visando o aumento da racionalidade terapêutica, e promovendo a adopção de práticas de prescrição que permitam uma melhor utilização dos medicamentos.
2- O Prontuário Nacional do Medicamento, o Formulário Nacional Hospitalar de Medicamentos e os formulários de cada unidade, previstos nos números 3 e 4 do artigo 2º da Lei n.º 14/2000, de 8 de Agosto, deverão iniciar a sua aplicação plena a 1 de Agosto de 2003.

Artigo 6º
Prescrição com dispensa gratuita de medicamentos

1- São dispensados gratuitamente aos utentes, após prescrição num estabelecimento do Serviço Nacional de Saúde, os medicamentos cuja comparticipação pelo Estado seja mais dispendiosa do que a sua dispensa gratuita.
2- O disposto no número anterior aplicar-se-á prioritariamente nas consultas de urgência e de especialidade dos hospitais, sem prejuízo da sua generalização a todos os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde.

Artigo 7º
Função farmácia no SNS

Para os efeitos do artigo anterior, o Governo tomará medidas com vista ao desenvolvimento de estruturas de farmácias nos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente em hospitais, de forma a permitir a dispensa de medicamentos aos utentes das urgências e das consultas externas.

Artigo 8º
Avaliação e aplicação dos ganhos obtidos

No âmbito da avaliação sistemática dos medicamentos sujeitos a comparticipação prevista no artigo 4º da Lei 14/2002, de 8 de Agosto, o Ministério da Saúde, através do Infarmed, avalia e actualiza também a lista dos medicamentos cuja comparticipação pelo Estado seja mais dispendiosa do que a sua dispensa gratuita nos termos no artigo 4º da presente lei.

Assembleia da República, em 2 de Maio de 2003

 

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