Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Programação de Infra-Estruturas Militares

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados,

Há um único ponto em que creio todos estamos de acordo: há um problema relacionado com o património do Ministério da Defesa Nacional que carece de ser resolvido. Ou seja, para o bem ou para o mal, houve alterações significativas na estrutura, na dimensão, das Forças Armadas e há hoje, obviamente, uma inadequação entre as infra-estruturas do Ministério da Defesa e das Forças Armadas e aquilo que são as necessidades concretas dessas mesmas Forças Armadas. Portanto, há que equacionar esse problema e verificar muito bem como é que esse património deve ser adequado e como é que deve ser gerido. Até aqui estamos de acordo.

Mas vamos ver o que é que o Governo propõe à Assembleia da República em matéria de programação de infra-estruturas militares (proposta de lei n.º 196/X).

Prevê-se a existência de um período preciso de 12 anos, dividido em duas fases de seis anos cada uma, até estar completa a adaptação que o Governo considera necessária em matéria de infra-estruturas das Forças Armadas. Esse é um objectivo muito preciso. Mas, depois, vamos ver que imóveis é que o Governo pretende afectar a esse programa, e aí a proposta de lei, rigorosamente, não esclarece. Não sabemos que imóveis são esses.

Sabe-se que haverá um decreto-regulamentar que o Governo publicará e onde constará a lista dos imóveis, mas depois prevê também que pode haver imóveis que não constam do decreto-regulamentar mas que, por despacho conjunto do Ministério da Defesa e do Ministério das Finanças, podem ser acrescentados avulsamente a essa lista.

Sabe-se ainda que este universo - que pode abranger tudo e pode não abranger nada - abrange também a rentabilização do espaço aéreo e do respectivo subsolo, ou seja, há todo um universo patrimonial que é desconhecido para esta Assembleia.

Portanto, ficamos a saber que tudo aquilo que o Governo venha a considerar, por despacho ou por decretoregulamentar, que deve ser rentabilizado poderá sê-lo nos termos desta lei, que, nesse aspecto, é verdadeiramente um «cheque em branco» ao Governo, de acordo com aquilo que o Governo considere que dá jeito ou de acordo com aquilo que possa vir a dar jeito às parcerias que o Governo venha a estabelecer, nos termos desta lei.

Uma segunda questão são os critérios de gestão. De facto, os critérios de gestão deste património, segundo a proposta de lei, são as receitas, aquilo que for importante para gerir receitas: podem ser ou não alienadas, podem ser alienadas em lotes ou não, ou seja, vale tudo! Pode dizer-se que, em matéria de meios, o Governo não olha a meios! O Governo quer atingir um determinado objectivo e, depois, vale tudo, há todo um menu enorme de meios disponíveis - até parcerias com promotores imobiliários, até a constituição de fundos de investimento imobiliário, até outros instrumentos jurídicos, e a proposta de lei não diz quais.

Portanto, todo um vasto património do Estado pode vir a ser entregue à especulação imobiliária, aos interesses dos tais parceiros imobiliários ou até à especulação financeira, porque, inclusivamente, há uma alínea do artigo relativo à gestão e aos meios de gestão que permite, inclusivamente, isso, ou seja, permite tudo.

Relativamente à execução, o que diz o preâmbulo da proposta de lei é que este plano dos 12 anos será totalmente financiado com as receitas do património obtidas nos termos da presente lei. Porém, no artigo 14.º já se diz que cada afectação de receitas, em concreto, será feita por despacho conjunto e, depois, o artigo 16.º vem dizer que, afinal, pode haver outras fontes de financiamento. Ou seja, no preâmbulo, fala-se no financiamento total para, depois, no artigo 16.º se vir dizer que, afinal, o financiamento já não é total, porque há outras fontes de financiamento.

Resta ainda uma outra questão: o que é que vai ser financiado? Sobre isto, há um mapa anexo à proposta de lei, mas, Sr. Ministro da Defesa Nacional, olhando para este mapa, não conseguimos ir a lado algum, porque ele contém meia dúzia de generalidades. Ou seja, olhando para este mapa, não sabemos, rigorosamente, que investimentos vão ser feitos, mas alguém saberá e, portanto, como presumo que o Ministério da Defesa sabe - aliás, até o Sr. Deputado João Rebelo demonstrou, pela sua intervenção, que também sabia -, importa que os outros grupos parlamentares saibam também que investimentos vão ser feitos. Já que não sabe que infra-estruturas vão ser rentabilizadas, ao menos que se saiba em que é que o Governo tenciona gastar este dinheiro!

Porém, o que é facto é que, nos termos em que esta lei será aprovada, como o Governo propõe, a Assembleia da República fica sem saber o que é que está a aprovar.

Já agora, o Fundo de Pensões, cuja recapitalização se prevê, não consta do mapa e, portanto, gostaria de saber onde é que está neste mapa a recapitalização do Fundo de Pensões que é prometida quer no preâmbulo, quer no artigo 14.º da proposta de lei.

Em resumo e para terminar, Sr. Ministro, o património abrangido por esta proposta de lei é todo e nenhum, o que se pode fazer com a rentabilização desse património é tudo ou nada e o que se pode fazer com as receitas obtidas é financiar-se tudo ou não se financiar nada.

Portanto, Sr. Ministro, estamos entendidos quanto a esta proposta de lei e nós, obviamente, que vamos votar em conformidade com este entendimento.

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