Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

Procedimento por Défice Excessivo - «Estamos a sair de onde nunca deveríamos ter entrado»

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Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Quem, como nós, se bateu, tantas vezes quase sozinho, contra uma posição intolerável e arbitrária como a do procedimento por défice excessivo que foi imposto ao País pela União Europeia e se bate, e continua a bater-se, para que o País se liberte dos constrangimentos a que o submetem não pode deixar de assinalar qualquer passo dado nessa direção como uma necessidade.

Temos agora uma disputa sobre quem deve colher os louros, tal como assistimos, nestes últimos dias, em relação ao facto de o País ter crescido 2,8% no primeiro trimestre do ano.

Mas é preciso dizer, para quem tanto procura colher vantagens e não se poupa em congratulações, três coisas: em primeiro lugar, em relação ao procedimento por défice excessivo, estamos a sair de um procedimento no qual nunca deveríamos ter entrado.

O facto de o défice ter assumido uma dimensão elevada tem na sua origem uma política que conduziu à degradação do aparelho produtivo nacional, à regressão económica e da balança comercial, com consequências no aumento da dívida pública e na sujeição a juros especulativos, mas também na transformação de avultados défices de milhões de euros canalizados do Estado para a banca, cobrindo negócios ruinosos dessa mesma banca privada. E essa política tem responsáveis. A culpa não deve morrer solteira.

Mas, a esse propósito, Sr. Deputado Luís Montenegro, não se gabe pelo facto de a economia ter crescido em 2015. Não aconteceu por vosso mérito.

Aconteceu porque o Tribunal Constitucional considerou inconstitucionais os cortes nos subsídios de férias e de Natal, no subsídio de desemprego, no subsídio por doença, e a questão das pensões de sobrevivência, obrigando-os a devolver aos trabalhadores e às pessoas aquilo que lhes tinha sido saqueado durante esse tempo.

Em segundo lugar, afinal, o País não estava condenado à política de cortes e mais cortes e de exploração e empobrecimento sistemático e que a reposição de rendimentos e direitos não era o caminho para o desastre que os partidos derrotados em outubro de 2015 profetizavam.

Dissemos que era preciso repor rendimentos e direitos para iniciar a recuperação da economia e fazer crescer o País, e a realidade aí está a comprová-lo.

Dissemos que não era a cortar salários, reformas e direitos que o País avançava e hoje vemos quão verdadeira era esta nossa afirmação.

Em terceiro lugar, os problemas que o País enfrenta estão longe de estar resolvidos e é necessário prosseguir o caminho da reposição de rendimentos e direitos e da elevação das condições de vida do povo.

Temos de reconhecer que os passos dados são ainda curtos; que o grave problema do desemprego se mantém a níveis inaceitáveis; que permanece uma injusta distribuição da riqueza e 2,6 milhões portugueses continuam no limiar da pobreza; que se mantém um fraco investimento nas infraestruturas e no apoio ao desenvolvimento dos setores produtivos; que permanecem carências gritantes em serviços públicos e nas funções sociais do Estado; que são precisos avanços no combate a esse flagelo que é a precariedade, desde já, acelerando a execução de medidas que estão previstas no Orçamento do Estado para o corrente ano, de medidas de reforço do SNS (Serviço Nacional de Saúde) a nível de meios humanos e técnicos, resolvendo as justas aspirações dos médicos, enfermeiros e outros profissionais da saúde e as condições que as populações reclamam, de medidas que superem as carências de assistentes operacionais nas escolas e que respondam, por exemplo, à resolução do problema da redução do preço do gás de botija, que continua adiado.

Sr. Primeiro-Ministro, coloco-lhe uma questão: como diz o nosso povo, «cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém», e, sendo certo que já cerca de 1000 trabalhadores saíram da PT, diga-nos se o Governo se compromete a não autorizar esse crime social que os novos donos da PT querem perpetrar. Chamem-lhes «despedimentos», disfarcem chamando-lhes «rescisões forçadas», nós conhecemos esta manha semântica que visou, durante décadas, por parte das empresas, liquidar postos de trabalho. Sejam despedimentos ou chamem-lhes «rescisões», Sr. Primeiro-Ministro, com certeza que o Governo não vai avalizar esta situação.

2ª Intervenção

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Em relação àquelas recomendações que são públicas, cuidado! Há razões de fundo para nos preocuparmos — independentemente de terem aligeirado o tom — se forem concretizadas, porque são recomendações que, na prática, se transformam em ameaças, particularmente para os direitos dos trabalhadores. Fica só a nota.

Mas estamos preocupados, e por isso insistimos na pergunta em relação à PT, porque, para além da destruição de postos de trabalho, do aumento do desemprego, da destruição da vida de famílias, esta situação tem implicações profundamente negativas, designadamente na segurança social.

Sr. Primeiro-Ministro, em relação à segurança social, além das preocupações sobre a falta de funcionários nos serviços, era importante dar uma resposta melhor e mais eficaz no que se refere à prestação de apoio aos desempregados. Desde logo, não se justifica o corte de 10% do montante do subsídio de desemprego, que urge revogar, assim como precisamos de considerar o alargamento e reforço do financiamento da segurança social, para garantir uma outra resposta e cobertura a problemas sociais, com várias medidas, designadamente completando o atual sistema de cálculo das contribuições das empresas, com base nas remunerações, com outro sistema baseado na riqueza líquida criada por essas empresas.

Estas questões sociais, que são de grande importância e têm uma grande atualidade, farão, com certeza, parte da preocupação do Governo.

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