Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

«É preciso rejeitar esta tendência para a privatização da política»

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,

Sem prejuízo de uma outra apreciação crítica em momento próprio neste debate, há questões concretas sobre as opções políticas da aplicação dos fundos comunitários, que importa colocar desde já.

No enunciado dos principais objectivos, na teoria, mais uma vez todos estaremos de acordo. A questão é da estratégia e da planificação da sua aplicação. E a alteração da estratégia errada que foi prosseguida nos cinco últimos quadros comunitários de apoio, exige duas rupturas fundamentais:

Passar de uma distribuição “segundo o mercado”, a uma distribuição com o objectivo de correcção das desigualdades no território e na sociedade, o que implica a definição do volume de fundos distribuídos de uma forma que descrimine fortemente e garantidamente as zonas do interior e as áreas públicas dos serviços de saúde e de educação – o que implica também a segunda ruptura.

Rejeitar esta tendência para a “privatização da política” que se tem vindo a verificar na aplicação e mesmo na gestão dos fundos comunitários. Deve ser a gestão pública, a administração central e local, a conduzir de forma transparente as opções e prioridades neste domínio e a aplicar a parte substancial dessas verbas. Tem que ser o Estado a definir quais os territórios e áreas onde os fundos se vão aplicar – e não as solicitações do poder económico!

O que coloca por sua vez duas outras questões centrais:

O Estado deve dispor de dotações orçamentais necessárias e suficientes – que não devem contar para o défice – quer para explorar ao máximo as potencialidades dos fundos, com efeito multiplicador, o que significa não poupar nas contrapartidas nacionais obrigatórias – quer para que o investimento público não se reduza ao proporcionado pelos fundos (e ainda ontem sublinhávamos isto mesmo no debate em comissão!);

Os incentivos ao capital privado, devem ficar direccionados para as micro, pequenas e médias empresas, afastando o grande capital nacional e estrangeiro do acesso aos fundos! Nada justifica que os orçamentos públicos continuem a suportar os grandes grupos económicos! Aliás, já para o actual quadro o PCP propôs medidas específicas para as MPME, aprovadas aqui no Plenário há cerca de um mês.

Nesta altura, Senhor Ministro, importa então que haja, como ponto de partida para este debate, uma abordagem que responda claramente a estas questões centrais, para que não tenhamos outra vez a repetição dos problemas do passado.

Disse.
(…)

[segunda intervenção no debate]

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,

Há uma questão incontornável neste debate, que é a do posicionamento do Estado Português face às supostas “inevitabilidades” da União Europeia e das suas opções políticas. Porque o que se tem verificado é o aprofundamento do federalismo, a escalada militarista, com as restrições ao orçamento comunitário que nos querem impor;

A centralização crescente dos poderes e processos de decisão em Bruxelas (veja-se o CEF, o Plano Juncker, etc.) – mas também a privatização desses processos, muitas vezes entregues eles próprios a consultoras multinacionais (com tudo o que isso pode implicar de conflitos de interesses);

A complexidade de uma inenarrável burocracia, que pode não sujar as mãos de tinta mas amarra as entidades agora por via electrónica.

Sem esquecer que o próprio enquadramento político dos acordos de parceria (que depois determina os contornos do Quadro Plurianual) é de uma subjugação de tipo colonial verdadeiramente inaceitável – como se verificou já no actual quadro, com a infame “condicionalidade macroeconómica” a levar mais longe a ingerência e a imposição de constrangimentos.

E entretanto, a tal “Europa da Coesão”, tão propagandeada para este processo de integração capitalista, já é deitada borda fora do discurso das grandes potências.

E a verdade, que o Governo não ignora, é que a tal convergência de Portugal com a União Europeia parou em 2000 com a introdução do Euro!
Quando cai a máscara, ganha-se em clareza e percebe-se quem é quem. Mas não pode haver tabus e inevitabilidades na defesa do interesse nacional, do nosso desenvolvimento, da nossa soberania, perante estas estratégias de dominação que se vão evidenciando cada vez mais na União Europeia.

Disse.

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