Intervenção de

Petições nº 301/VI e nº 20/IX sobre o processo de indemnização aos espoliados do Ultramar<br />Intervenção de Luísa Mesquita

Senhor Presidente Senhoras Deputadas e Senhores Deputados O objecto das petições que hoje apreciamos é similar. Pretendem os peticionantes que seja revogado o artigo 40º da Lei nº 80/77 de 26 de Outubro, substituindo o seu conteúdo por outro que reconheça o direito dos ex-residentes nas ex-colónias portuguesas a indemnizações pela perda de bens. Afinal, matéria substantiva idêntica à presente nos dois projectos de lei apresentados pelo CDS-PP em Janeiro de 2000 e em Outubro de 2001, quando eram oposição e agora esquecida porque são Governo. Afirmá-mo-lo em ambos os debates, em intervenções do meu camarada João Amaral que, “uma das piores coisas que se pode fazer em política e às pessoas que se sintam injustiçadas é prometer-lhes o que, à partida, quem prometesabe perfeitamente que não pode cumprir! Isto é manipulação de sentimentos para efeitos meramente partidários! Esta é uma atitude intolerável na vida democrática!” Não foi preciso muito tempo para confirmar esta tese. Hoje, o outrora Sr. Deputado Paulo Portas, é Ministro do Governo da coligação, e, em dois anos não quis, porque sabe que não pode, resolver as indemnizações relativas aos bens expropriados e ou nacionalizados por Estados soberanos. Afinal não quis porque sabe que não pode rectificar o que em 2000 considerava ser, e passo a citar, “o cinismo político e jurídico do Estado português face a centenas de milhar de cidadãos”. E acrescentava ainda que o projecto do CDS/PP era “uma convocação à decência”. O silogismo é simples. Se o Governo que conta com o CDS/PP não foi capaz de concretizar essa convocatória, naturalmente que lhe falta a tal decência ou então limitou-se em 2000 e em 2001 a exercitar o populismo e a prometer o que sabia, a priori, não poder cumprir. Todos sabemos que o drama colonial teve causas e consequências. Não é sério, consideramos, hiperbolizar ou mesmo diabolizar as consequências e branquear as causas. Foi dramático o regresso de cerca de meio milhão de portugueses mas o país soube ser solidário e inserir, com dificuldades é certo, todos aqueles que voltaram. Um país que se construía e reconhecia nesse processo histórico, acolhia com sucesso, no seu quotidiano, todos esses milhares de portugueses. Senhor Presidente Senhoras Deputadas e Senhores Deputados Os direitos de indemnização que se enunciam nas petições relativos a bens que os portugueses possuíam nas diferentes ex-colónias portuguesas e que foram posteriormente expropriados ou nacionalizados teriam que ser formulados contra os novos Estados africanos e não contra o Estado português. De facto o artigo 40º é claro e, na nossa opinião, não pode deixar de ser assim. A haver direitos de indemnização a reclamar, relativamente aos bens sitos em território de ex-colónias terão que ser “segundo a lei do Estado da localização dos bens (e a pagar) pelo Estado que procedeu à respectiva nacionalização, expropriação ou privação da posse ou fruição”. Afirmá-mo-lo em 2000 e 2001 e repetimo-lo hoje, que se há outras questões, como a contagem do tempo de serviço ou a devolução de bens ainda em instituições portuguesas, estas sim da responsabilidade do Estado Português, podem e devem ser resolvidas. Agora criar expectativas, ilusões e instrumentalizar sentimentos é perigoso e intolerável em democracia. A carta endereçada ao Sr. Presidente da Assembleia da República pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares relativa à discussão de hoje evidencia que se pretende continuar o faz-de-conta de 2000 e 2001. Uma das duas petições entrou nesta casa em 1994, em plena governação da AD, sem obter nenhuma solução; o partido autor dos dois projectos de lei está no Governo há dois anos e nada fez para responder, como havia prometido, em programa eleitoral e em programa do governo, a estas questões. Ontem, na véspera desta discussão, o governo corre a informar a Assembleia da República que e passo a citar “tomou recentemente a decisão (…) de criar um Grupo de Trabalho Interministerial incumbido de estudar (…) as questões (…) incluindo o prévio levantamento e triagem das situações potencialmente susceptíveis de resolução”. Justifica-se perguntar se as iniciativas apresentadas, duas vezes, pelo CDS-PP são tão pouco válidas, tão inconsistentes, tão demagógicas que só podem ser ignoradas. Senhor Presidente Senhoras Deputadas e Senhores Deputados Continuaremos disponíveis para resolver os problemas e as preocupações que nesta área competem ao Estado Português. Continuaremos disponíveis para reforçar as relações entre Portugal e os Estados soberanos que resultaram da Revolução de Abril. Mas estaremos firmemente indisponíveis para avaliar as relações entre Portugal e os Países de Língua Oficial Portuguesa como colonizadores ofendidos.  

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