Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

Pela defesa dos princípios cooperativos da Aliança Cooperativa Internacional

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

A abordagem do PCP é muito clara e objectiva: uma empresa privada é uma empresa privada, uma cooperativa é uma cooperativa. São sectores diferentes, com objectivos e princípios diferentes.

Há uma base essencial de princípios e valores do Cooperativismo que não podemos deixar de afirmar e defender – e que, do nosso ponto de vista, devem estar no centro das opções políticas nesta discussão. O princípio de «um cooperador, um voto», nas cooperativas de primeiro grau; a adesão dos cooperadores pela sua participação; a actividade da cooperativa para a satisfação das suas necessidades (e não pela expectativa de remuneração do seu investimento) – garantindo a sua independência política em relação a financiadores externos.

Estes princípios estavam consagrados no espírito e na letra do Código Cooperativo que foi aprovado por unanimidade em 1996 na Assembleia da República. Já havia divergências, perspectivas diferentes no seio do Movimento Cooperativo, mas o debate desenvolvido nesse processo permitiu construir consensos e chegar a um texto final que mereceu o apoio de todos.

Isto foi em 1996 – porque em 2015, infelizmente, a situação foi outra. Em 2015, a aprovação do novo Código Cooperativo pelo PSD e CDS-PP, com o apoio do PS, introduziu uma contradição entre a legislação nacional e o respeito pelos princípios cooperativos, reconhecidamente definidos pela Aliança Cooperativa Internacional, bem como pelo direito constitucional da liberdade de constituição de cooperativas, desde que no respeito desses princípios. Por outro lado, introduziu-se ainda uma limitação da iniciativa cooperativa, do direito de eleger e ser eleito, de acordo com a vontade dos cooperantes.

O que na prática se apontou, com o voto desses partidos, foi que uma qualquer entidade, individual ou colectiva, sem qualquer motivação na iniciativa cooperativa, possa condicionar a actividade da mesma, determinando e assegurando a remuneração do seu capital. Isto, além de colocar em causa o princípio da gestão democrática e o da participação económica, coloca em causa o princípio da autonomia e da independência.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,

O que deverá contribuir efectivamente para o desenvolvimento do movimento e iniciativa cooperativa será a promoção de políticas que, nos termos da Constituição, discriminem positivamente as cooperativas: facilitem o seu acesso ao financiamento; e possibilitem o seu auto-financiamento; isentando fiscalmente os seus resultados exclusivamente aplicados e investidos na cooperativa; apoiem tecnicamente a criação e o desenvolvimento de cooperativas e promovam os princípios e a iniciativa cooperativa.

O acesso das cooperativas a investidores, onde se demonstre adequado, deve ser acompanhado pela melhoria da informação económica, pelo acompanhamento, participação e até intervenção sem direito de voto nas assembleias, o que aliás já está previsto para os subscritores de títulos de investimento ou de obrigações das cooperativas.

Estas são questões centrais, que não podem estar ausentes do debate sobre as cooperativas. Não podemos concordar que um processo legislativo de alteração ao Código Cooperativo seja uma oportunidade perdida e que se transforme numa pura e simples operação de rectificação de erros formais, mantendo no essencial tudo na mesma. Pelo contrário, temos de ir ao concreto, discutir as questões fundamentais, ouvir o Sector, e trabalhar em conjunto para uma legislação, não que desvirtue, mas que consagre de facto os princípios cooperativos da Aliança Cooperativa Internacional. É no sentido de contribuir para esse processo que o PCP apresenta este projecto de lei.

Disse.