Projecto de Resolução N.º 35/XIII/1.ª

Pela abolição da cobrança de portagens na Via do Infante

Pela abolição da cobrança de portagens na Via do Infante

A Via do Infante, que atravessa longitudinalmente o Algarve desde a Ponte Internacional do Guadiana até Lagos/Bensafrim, foi construída em três fases. A primeira fase, incluindo os lanços desde a fronteira com Espanha até ao nó da Guia, foi concluída em 1992, com financiamento do Orçamento do Estado e comparticipação de fundos europeus do Quadro Comunitário de Apoio I (FEDER). Com o mesmo tipo de financiamento, foi, numa segunda fase, construído o lanço Guia-Alcantarilha, que entrou ao serviço em 2000. Nesse mesmo ano, a Via do Infante foi transformada numa concessão SCUT, atribuída à sociedade EUROSCUT - Sociedade Concessionária da SCUT do Algarve, tendo sido construídos no regime SCUT, numa terceira fase, os lanços desde Alcantarilha até Lagos/Bensafrim, que entraram ao serviço em abril de 2003. Estes últimos lanços, com 39 km, construídos, representam apenas 29% da extensão total da Via do Infante.

Em 2010, o Governo decidiu introduzir portagens em todas as concessões SCUT de norte a sul do País. Esta medida visou reduzir as despesas do Estado com as concessões rodoviárias sem, contudo, tocar nas fabulosas rendas auferidas pelos grupos económicos que as exploravam. Em vez de esmagar os cidadãos e as pequenas empresas com portagens, o que se impunha era a renegociação dos contratos de concessão, reduzindo drasticamente a taxa interna de rentabilidade dos concessionários, ou, em alternativa, a extinção dessas ruinosas parcerias público-privadas, recorrendo aos mecanismos legais e contratuais que garantissem da melhor forma a salvaguarda do interesse público.

Para a Via do Infante (A22) chegou a ser anunciada a data de 15 de abril de 2011 para o início da cobrança de portagens, medida que acabaria por não se concretizar devido à convocação de eleições legislativas antecipadas.

Em dezembro de 2011, o Governo PSD/CDS, saído das eleições legislativas de junho desse ano, introduziu a cobrança de taxas de portagem na Via do Infante, concluindo, desse modo, o processo iniciado pelo anterior Governo PS.

Apenas um ano antes, em reação do anúncio da introdução das portagens pelo anterior Governo, as estruturas regionais algarvias do PSD, em comunicado de imprensa, haviam-se insurgido contra a introdução de portagens na Via do Infante, considerando-as “uma ignomínia contra o Algarve!”, apelando “aos seus militantes e simpatizantes para aderirem à manifestação de revolta que certamente as forças vivas da sociedade algarvia não deixarão de convocar”, pois tal medida era inaceitável “sob todos os aspetos: político, económico e moral. Com isenções, descontos e exceções ou sem elas”. Após as eleições legislativas de 2011, o PSD (e o CDS, seu parceiro de coligação) esqueceram os seus compromissos com os algarvios e apressaram-se a introduzir portagens na Via do Infante.

A Via do Infante não tem alternativas válidas. O único eixo rodoviário longitudinal do Algarve, além da própria Via do Infante, é a EN 125. Esta estrada, que em partes significativas do seu traçado é uma autêntica artéria urbana, com cruzamentos, semáforos e passadeiras de peões, não tem características adequadas ao tráfego interurbano. Milhares de pessoas, que se viram forçadas a abandonar a Via do Infante, têm de enfrentar, diariamente, o calvário das longas filas de trânsito na EN 125.

A EN 125 foi, durante muito tempo, uma das estradas com maior sinistralidade do País, tendo sido apelidada de “estrada da morte”. Com a entrada em serviço da Via do Infante, a situação melhorou, verificando-se um decréscimo acentuado de acidentes e de vítimas mortais. Contudo, com a introdução de portagens, uma parte significativa do tráfego da Via do Infante voltou para a EN 125 e o número de acidentes, assim como de vítimas mortais, tornou a crescer. De acordo com a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, em 2015, até outubro, já se tinham registado 31 vítimas mortais em acidentes rodoviários no Algarve, mais de um terço das quais na EN 125. Assim, além dos custos económicos e sociais, a introdução de portagens na Via do Infante também representa um insuportável sacrifício em vidas humanas.

A crise económica e social que assola o País é agravada, no Algarve, por um errado modelo de desenvolvimento que assenta quase exclusivamente no turismo e negligencia as atividades produtivas na indústria, nas pescas e na agricultura. Tal afunilamento num único setor de atividade colocou a economia regional numa situação de grande fragilidade, traduzindo-se, em particular, numa elevadíssima taxa de desemprego, no encerramento e na falência de inúmeras micro e pequenas empresas e no aumento de manchas de pobreza e exclusão social. Neste quadro, a introdução de portagens na Via do Infante, além de agravar as dificuldades económicas dos utentes, já duramente afetados pelo aumento do custo de vida e por baixos níveis de rendimentos, teve ainda repercussões muito negativas na atividade económica da região. Ou seja, a introdução de portagens na Via do Infante somou mais crise à crise, quando o que o Algarve precisava era exatamente o oposto: uma vigorosa intervenção de relançamento da economia regional que garantisse a criação de emprego e o progresso social.

Dando voz a todos aqueles que rejeitam a introdução de portagens na Via do Infante, o PCP apresentou, ao longo da anterior legislatura, oito projetos de resolução visando a abolição dessas portagens. Todos eles foram rejeitados pelo PS, PSD e CDS.

Recentemente, o Governo PSD/CDS concluiu um processo de renegociação do contrato de concessão da Via do Infante, procedendo, por via do Decreto-Lei n.º 214-C/2015, de 30 de setembro, à alteração das bases desta concessão. Contudo, como o próprio Governo PSD/CDS reconheceu, a taxa interna de rentabilidade do concessionário foi apenas reduzida ligeiramente, de 8% para 7,5%. Assim, apesar de toda a propaganda governamental em torno do alegado sucesso da referida renegociação, na realidade, o concessionário privado continua a usufruir de uma escandalosa taxa de rentabilidade, muito superior às taxas de juro da dívida pública portuguesa.

Durante a campanha eleitoral das legislativas de 4 de outubro, a coligação PSD/CDS assumiu o compromisso de “avançar com uma revisão do preço das portagens de forma a garantir uma discriminação positiva para as vias estruturantes da região do Algarve, beneficiando a mobilidade dos cidadãos e das mercadorias”. Não deixa de ser curioso que aqueles partidos que em dezembro de 2011 introduziram portagens na Via do Infante e que, ao longo dos últimos 4 anos, rejeitaram todas as propostas do PCP para a sua abolição tenham aparecido em plena campanha eleitoral, perante os eleitores algarvios, a defender a redução do valor dessas portagens. Por que motivo a coligação PSD/CDS, que dispunha de maioria absoluta na anterior legislatura, não reduziu o preço das portagens? Tais promessas em plena campanha eleitoral só podem ser vistas como uma tentativa de enganar os algarvios, fazendo-os crer que um voto na coligação PSD/CDS seria um voto contra as portagens na Via do Infante.

Para o PCP, a redução do valor das portagens na Via do Infante não responde ao verdadeiro problema, apenas adia a sua resolução.

Decorridos quatro anos após a introdução de portagens na Via do Infante (cumprem-se no próximo dia 8 de dezembro) confirma-se a justeza dos alertas do PCP. Esta foi uma medida contrária aos interesses regionais e nacionais, teve repercussões muito negativas para a atividade económica da região e contribuiu para o encerramento de inúmeras empresas, o aumento do desemprego e o agravamento das injustiças e das desigualdades sociais no Algarve, além de ter contribuído para o dramático aumento da sinistralidade na EN 125. Impõe-se, pois, a imediata abolição das portagens na Via do Infante.

Pelo exposto, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:

Resolução

A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, resolve pronunciar-se pela imediata abolição da cobrança de taxas de portagem em toda a extensão da A22 (Via do Infante).

Assembleia da República, em 3 de dezembro de 2015

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