Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

PCP propõe reforço das obrigações de supervisão pelo Banco de Portugal

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

Ao contrário do CDS, o PCP não descobriu a pólvora sobre os problemas da supervisão agora. Curiosamente, o CDS, depois de ter estado quatro anos no Governo, não só não apresentou nada para a regulamentação da supervisão do setor financeiro como, em conjunto com o PSD, escondeu e contribuiu para esconder do conhecimento público profundos problemas no sistema financeiro, como é o caso do BANIF e da Caixa Geral de Depósitos.

Portanto, o PCP traz novamente a esta Assembleia uma proposta, que, curiosamente também, é agora, em grande medida, adotada pelo CDS, depois de ter sido rejeitada pelo CDS na passada Legislatura. O CDS vem agora dizer-nos que é necessário impedir a circulação de quadros entre as consultoras, as auditoras e a banca — coisa que o PCP propôs, contra a qual o CDS tinha votado e que o PCP volta a propor — e que é preciso impedir que auditoras prestem, simultaneamente, o serviço de auditoria externa e de consultoria — coisa com que o PCP está de acordo, que já tinha proposto, contra a qual o CDS tinha votado e que o PCP volta hoje a propor.

Contudo, o PCP vai mais longe. É verdade, e já foi aqui referido, que a questão da supervisão não aborda, de uma forma estratégica e sistémica, os problemas do setor financeiro e que esses problemas só podem ser resolvidos efetivamente assumindo o controlo público da banca e colocando os bancos ao serviço do povo e do País, retirando-os da esfera do serviço que prestam apenas aos seus grandes acionistas, de acordo com os seus caprichos e anseios a cada altura. Mas não é menos verdade que contribuir para uma supervisão mais eficiente também não agrava o problema e, de facto, pode evitar alguns dos problemas.

Mas, Srs. Deputados, desde o BPN até hoje, quantas vezes já ouvimos «não pode voltar a repetir-se»? Quantas vezes, nesta Casa, todos os Deputados, todas as bancadas já disseram, após cada uma das comissões de inquérito, «temos de tomar medidas para que não se volte a repetir, para que não torne a suceder o colapso de um banco, para que um banco não volte a ser assaltado pelos seus próprios administradores»?

E, no entanto, os grupos parlamentares que têm mais representação bloqueiam todas as propostas, nomeadamente as do PCP, que podem contribuir para, de facto, impedir que esses acontecimentos tornem a repetir-se.

Porém, isso não acontecerá enquanto, por exemplo, continuarmos a aceitar que o sistema financeiro pode ser gerido por entidades privadas e auditado por outras entidades privadas com quem partilha os funcionários e os quadros e ser aconselhadas por essas mesmas entidades privadas a conceber, da forma mais eficaz possível, as formas de escapar à lei e à malha fiscal.

Isso não acontecerá enquanto, por exemplo, os bancos continuarem a ser supervisionados por um Banco de Portugal que não tem inspetores mas contrata as mesmas empresas que fazem consultoria e auditoria aos bancos para fazer as suas auditorias. Ou seja, o Banco de Portugal não tem como confirmar a informação da banca, não tem como intervir na banca, e pede precisamente às mesmas empresas que fazem auditoria aos bancos que façam também uma auditoria para o Banco de Portugal.

Portanto, esta situação, que parece ridícula mas corresponde de facto à verdade, tem de terminar.

O PSD, o PS e o CDS rejeitaram sempre a proposta do PCP de atribuir ao Banco de Portugal capacidade para realizar as suas próprias auditorias sem ter de contratar as mesmas empresas que sistematicamente servem de biombo e que dão cobertura às ilegalidades da banca, que são, muitas vezes e em muitos casos, as auditoras externas.

Uma vez mais, e sem colocar de parte a questão de fundo que é o controlo público da banca, a propriedade e controlo público da banca, nesta questão da supervisão, o PCP propõe o reforço dos meios do Banco de Portugal, rompendo com a prática de externalização de serviços.
Para terminar, Srs. Deputados, fala-se muitas vezes das auditorias forenses. Até já na Assembleia da República se chegou a falar de auditorias forenses promovidas pelo Banco de Portugal. Essas auditorias forenses, que são pedidas pelo Banco de Portugal, são feitas por empresas privadas, as mesmas empresas privadas que ajudam os bancos a esconder as ilegalidades que praticam.

Ora, também essas, o PCP propõe que deixem de ser externalizadas e que passem a ser obrigatoriamente realizadas pelo próprio Banco de Portugal.

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