Intervenção de Carla Cruz na Assembleia de República

PCP propõe a actualização dos estudos científicos dos efeitos do consumo de cannabis

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Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

O debate de hoje deveria ser sobre o uso terapêutico da cannabis. Porém, este debate está inquinado à partida, porque, sejamos muito claros, as iniciativas do BE e do PAN não têm verdadeiramente esse objectivo; pretendem sim, de forma encapotada, abrir caminho à utilização da cannabis para fins recreativos.
E esse é um outro debate sobre o qual haveria também muito a dizer.

Se o BE e o PAN defendem o consumo recreativo de cannabis deviam tê-lo proposto com clareza para que o debate pudesse ser feito sem equívocos. Tendo o BE e o PAN optado ocultar essa proposta sob o pretexto dos fins terapêuticos é preciso começar por esclarecer os equívocos que temos pela frente.

Senhoras e senhores Deputados,

Face à lei actual já é possível a utilização da cannabis para fins terapêuticos e o Infarmed até já autorizou a comercialização de um medicamento à base da cannabis destinado aos doentes com esclerose múltipla.

Isso acontece com a cannabis como acontece com qualquer outra substância que possa ter utilização terapêutica e que não necessita de autorização da Assembleia da República para ser utilizada em medicamentos.

São também disso exemplo os medicamento à base de ópio, autorizados pelo Infarmed e introduzidos no mercado sem que o Parlamento tivesse dado uma autorização prévia.

O uso da cannabis ou de qualquer outra substância para fins terapêuticos é uma questão essencialmente técnica e científica e não uma questão política.

Havendo evidência científica e vantagens do ponto de vista clínico na utilização de cannabis para fins terapêuticos, então o que se espera é que as autoridades competentes actuem neste caso nos mesmos moldes e com o mesmo rigor com que o fazem para qualquer outro medicamento disponível no mercado. Este procedimento não deve nem está, obviamente, dependente de uma lei que legalize a utilização das substâncias para fins terapêuticos.

Por isso o PCP propõe no projecto que traz à discussão aquilo que é adequado propor sobre a utilização da cannabis para fins terapêuticos: a integral avaliação clínica das vantagens da utilização da cannabis sativa para fins terapêuticos e, perante a comprovação científica dessas vantagens, que se pondere a sua utilização no Serviço Nacional de Saúde quando tal demonstre corresponder ao tratamento necessário para determinada patologia.

O que propomos vai, de resto, ao encontro dos vários pareceres emitidos por entidades com intervenção nestas matérias, designadamente a Ordem dos Médicos.

O projecto de resolução do PCP não omite, nem poderia omitir, a existência de efeitos adversos decorrentes do uso da cannabis. Há fortes indícios de que o consumo desta substância pode induzir sintomas psicóticos em pessoas com predisposição para desenvolver esquizofrenia ou outras perturbações comportamentais. Assim como não silencia os resultados de vários estudos, designadamente um realizado no último ano, que mostra que “entre 2012 e 2016/2017 a percentagem da população residente em Portugal entre os 15 e os 74 anos com padrão de consumo de cannabis mais frequente quadruplicou”.

Perante isto, o PCP defende a actualização dos estudos científicos dos efeitos do consumo de cannabis e que deles seja dado conhecimento à Assembleia da República. Propomos ainda que sejam reforçados o investimento público no plano da prevenção e os meios financeiros, técnicos e humanos dos serviços públicos na área da toxicodependência.

Considerando o PCP que a regulação do uso terapêutico de cannabis não pode ser utilizado como pretexto para legitimar ou favorecer o seu uso recreativo, o que de resto fica bem visível com as propostas que BE e PAN fazem acerca do auto-cultivo sem fixarem quaisquer critérios que assegurem os objectivos terapêuticos que dizem prosseguir, o PCP não acompanhará estas iniciativas.

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