Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

PCP contra a introdução de portagens nas SCUT's

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Em declaração hoje na Assembleia da República, o PCP afirmou que a introdução de portagens nestas vias, nos distritos do do Porto, Braga, Viana do Castelo e Aveiro, fundamentais para o desenvolvimento económico e social destes distritos, irá acarretar impactos significativos para o tecido produtivo e particularmente impactos sociais significativos nos já baixos rendimentos das famílias.

Declaração política insurgindo-se contra o anúncio, feito pelo Governo, de introdução de portagens em algumas SCUT

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Uma mentira, por muitas vezes que seja repetida, nunca se transforma em verdade.
O Governo, por diferentes responsáveis, tem vindo a repetir, de uma forma sistemática e até à exaustão, que as actuais auto-estradas sem custo para os utilizadores, onde o Governo quer implementar portagens, têm alternativas no sistema rodoviário nacional.
Por muitas vezes que o repitam, tal não é verdade. Um documento da Estradas de Portugal, até aqui mantido em segredo, mas que o PCP recentemente divulgou, demonstra que o Governo já sabia que estas vias não têm alternativas e todos sabemos que os distritos que usam estas SCUT sofrem uma grave crise económica e social.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O Programa do Governo diz, na página 26, que: «Quanto às SCUT, deverão permanecer como vias sem portagens, enquanto se mantiverem as duas condições que justificaram, em nome da coesão nacional e territorial, a sua implementação: i) localizarem-se em regiões cujos indicadores de desenvolvimento socioeconómico sejam inferiores à média nacional; e ii) não existirem alternativas de oferta no sistema rodoviário».
Tendo em conta estes dois requisitos, chegamos à conclusão de que o Governo não pode, se cumprir com a sua palavra e com o seu Programa, introduzir portagens nestas vias.
Não só os indicadores socioeconómicos do distrito do Porto, Braga, Viana do Castelo e Aveiro são piores do que a média nacional, como importa lembrar que nestes distritos a actual realidade, ainda não plenamente retratada nas estatísticas, dá conta de inúmeros encerramentos de empresas e agravamento do desemprego e da pobreza, numa dimensão preocupante e que importa ter em conta.
A título de exemplo, importa lembrar que o ganho médio dos trabalhadores de 19 concelhos dos 21 servidos pela SCUT Norte Litoral é abaixo da média nacional e que a taxa de desemprego é superior à média nacional; que 20 concelhos dos 24 que utilizam a SCUT Costa da Prata têm um ganho médio abaixo da média nacional e o desemprego, além de superior à média nacional, não pára de crescer. Importa lembrar também que o Vale do Sousa e Baixo Tâmega constitui uma das sub-regiões mais pobres de toda a União Europeia.
Quanto ao segundo critério, a inexistência de alternativas às SCUT Norte Litoral, Grande Porto e Costa da Prata é uma evidência para quem conhece minimamente estes distritos. Contudo, o Governo insiste na falsidade, dizendo que existem alternativas. Acontece que um estudo da Estradas de Portugal sobre estas SCUT, que o PCP divulgou, diz claramente o contrário. Neste documento é referido que: «A maior parte dos troços apresentados como alternativa já pertencem à jurisdição autárquica (…)»; «Todos os troços apresentados como alternativa não cumprem o estipulado no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 222/89…» — do Plano Rodoviário Nacional — «… relativamente aos níveis de serviços»; «Todos os lanços em IC, que se retiram agora do regime SCUT, resultaram da necessidade de construir variantes às antigas estradas nacionais, uma vez que estas já não possuíam características geométricas capazes de corresponder ao exigido»; «Daqui, facilmente se poderá retirar que as vias que agora se quer como alternativas (…) não possuem as características mínimas».
Particularmente contundente, este documento afirma, quanto aos tempos de percurso nas ditas «vias alternativas», que ele é «três vezes superior ao efectuado por auto-estrada» e ainda que a velocidade máxima imposta nestas vias é de 50 km/h e que estas vias são utilizadas por transportes públicos, o que, face à inexistência de faixas de ultrapassagens, provoca «filas intermináveis de veículos».
Mais refere que estas vias atravessam importantes aglomerados urbanos e termina dizendo, entre outras coisas, que, «Face ao exposto, principalmente no capítulo das generalidades, somos da opinião que presentemente não existem quaisquer vias que sirvam de alternativa aos itinerários em regime de SCUT em que se pretendem implementar portagens».
Se dúvidas ainda existem, as fotografias anexas a este documento da Estradas de Portugal demonstram bem a realidade.
Fica, assim, provado, por um documento do próprio Governo, algo que é óbvio para qualquer utilizador destas SCUT: não existem alternativas, pelo que não podem ser introduzidas portagens nestas vias!!
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
As importantes e corajosas acções de luta do movimento de utentes obrigaram o Governo a sucessivos adiamentos na introdução de portagens. Na verdade, o Governo, que anuncia, desde 2006, como eminente a introdução de portagens, enfrentou importantes movimentos de contestação, como a gigantesca manifestação do passado dia 17 de Abril, que envolveu autarcas, empresários e muitos trabalhadores, que necessitam destas vias para se deslocarem para o seu emprego, que obrigaram o Governo a recuar e que provam que vale a pena lutar.
A introdução de portagens nestas vias, que são fundamentais para o desenvolvimento económico e social destes distritos, irá acarretar impactos significativos para o tecido produtivo, reduzindo a competitividade das empresas e acrescentando um novo custo, que muitas empresas poderão não conseguir suportar.
Além de impactos graves no tecido económico, as portagens irão ter impactos sociais significativos, uma vez que vai reduzir os já baixos rendimentos das famílias destes distritos.
Tendo em conta esta realidade e que estas portagens são uma injustiça, o PCP irá continuar lutar, dentro e fora da Assembleia da República, para que esta errada medida não se concretize.
O anúncio do Governo, afirmando que pretende introduzir as portagens em Julho deste ano, além de tornar claro que o PS governa contra os interesses da grande maioria da população, leva-nos a afirmar que o caminho para a derrota destas políticas é só um: o caminho da luta contra as injustiças.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado,
A questão que se coloca aqui é a de saber se o Governo pretende ou não cumprir com aquilo que está no seu próprio Programa de Governo, aquilo que é a palavra dada pelo Governo, aquando das eleições. Pode dar-lhe as voltas que quiser, Sr. Deputado, mas a verdade é que estes distritos — Porto, Braga, Viana do Castelo e Aveiro — enfrentam uma gravíssima crise económica e social.
As perguntas que lhe deixo são as seguintes: em que medida vai ajudar a introdução de portagens? Vamos ou não agravar as condições socioeconómicas? Vamos ou não perder competitividade? Vamos!! Ouça os Deputados da sua própria bancada, ouça os autarcas do Partido Socialista, no terreno, ouça dirigentes nacionais do Partido Socialista relativamente a essa matéria e veja as consequências que são evidentes, para qualquer um de nós, que a introdução de portagens irá ter sobre as empresas e sobre as famílias!
Esta é a questão fundamental! Portanto, o Sr. Deputado, ao introduzir portagens, vai agravar as consequências socioeconómicas, vai agravar a crise, vai agravar os problemas e não vai melhorar a situação em nada!
Se dúvidas existissem, relativamente a esta matéria, o Sr. Deputado viu as fotografias. Elas são elucidativas! É porque não há dúvida alguma de que as vias que o Governo diz serem uma alternativa, na realidade, não são alternativa absolutamente nenhuma!!
E as populações vão pagar um custo exagerado, que não podem suportar neste momento, para circular em vias que são estruturais e fundamentais.
Portanto, o que o Partido Socialista está aqui a dizer é que, à custa da «boleia» da crise e das culpas da crise, não vai cumprir aquilo que está no seu próprio Programa de Governo. E isto é que é absolutamente inaceitável!
Por isso, o caminho, como dissemos na nossa declaração política, é o da luta.
Já sei que o Governo do Partido Socialista não vai demover-se relativamente a esta matéria, mas já sabemos que o Governo recuou sucessivamente nas tentativas de introdução de portagens. Desde 2006 que anda a anunciar as portagens. Tem vindo a recuar, por pressão das populações e pela luta dos movimentos de utentes; por isso, a luta vai também derrotar este Partido Socialista na introdução destas portagens, que são injustas e que não respondem às necessidades do País e destas regiões!
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Luís Menezes, quero agradecer-lhe a pergunta que me fez e dizer-lhe que estranhamos esta posição do Partido Social-Democrata e que recordar aqui o princípio do utilizador-pagador entra em profunda contradição com aquilo que os dirigentes de PSD dizem, no terreno, nestas mesmas regiões.
Dizer, aqui, na Assembleia da República, que o PSD é a favor do princípio do utilizador-pagador quando, no terreno, temos autarcas do PSD, dirigentes do PSD, militantes do PSD na luta contra as portagens é uma profunda contradição!
O PCP não tem duas caras: uma na Assembleia da República e outra no terreno, junto das populações! O PSD terá de justificar estas duas posições.
Agora, o que importa aqui lembrar é que foi o próprio Governo que estipulou duas condições para introduzir portagens! Não foi o PCP, não foi o PSD, foi o Governo que estipulou duas condições: uma, a dos indicadores socioeconómicos acima da média nacional; a outra, a existência de vias alternativas.
Ora, nenhum dos dois requisitos se cumpre! Não só qualquer um de nós percebe facilmente que os distritos do Porto, de Braga, de Aveiro, de Viana do Castelo têm problemas socioeconómicos muito graves e indicadores socioeconómicos abaixo da média nacional e, portanto, não se verifica um dos requisitos, como também não se verifica o segundo requisito.
Este documento é particularmente esclarecedor: não existem alternativas às actuais SCUT. Não existindo vias alternativas, o que o Programa de Governo diz, taxativamente, é que não se pode aplicar portagens. Por conseguinte, o que nós estamos a exigir é que o Governo cumpra com a sua palavra, cumpra o que está escrito no Programa de Governo!
Lamentamos que o PSD, a nível nacional, tenha uma determinada posição, mas contamos com o PSD, a nível local, para as acções de lutas, porque essas são fundamentais para derrotar esta política do PSD.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Heitor Sousa,
Muito obrigado pela sua questão.
Relativamente a esta matéria somos muito claros: é evidente que este estudo apresentado se refere a um levantamento feito em Outubro de 2006, mas, no que diz respeito às vias que aqui foram sinalizadas, não houve nenhum investimento significativo que tenha melhorado as vias de circulação.
Portanto, no que diz respeito às vias de circulação, de 2006 para agora, o que nós podemos dizer é que a situação está pior, como estão piores, claramente, os indicadores socioeconómicos. Ninguém pode esquecer a actual crise económica e social que se vive nestes distritos, realidade essa que ainda não está reflectida nas estatísticas, como aqui foi referido, uma vez que são utilizados indicadores de 2007, e isso tem de ser tido em conta na avaliação política.
Mas, além da falta de rigor técnico, o que importa salientar aqui é este aspecto: é que o Governo deixou cair os critérios! O Governo já não fala dos dois critérios que utilizou para justificar a introdução de portagens, isto é, os indicadores socioeconómicos e a não existência de vias alternativas. Deixou cair! Não convém ao Governo utilizar esses critérios e, portanto, quer introduzir esta medida contra a sua própria palavra.
Ora, é contra estas medidas, é contra este comportamento — importa dizê-lo aqui — que a população se insurge, em manifestações realizadas por movimentos de utentes com o envolvimento de empresários, de pequenos e médios produtores, de profissionais liberais, de trabalhadores. Esse movimento de utentes que se juntaram em volta de um protesto é significativamente importante para a vida das populações e é determinante para obrigar o Governo do Partido Socialista a recuar e a não introduzir estas portagens.
A concluir, quero dizer que, se o Partido Socialista insiste neste caminho, além da luta das populações, que, com certeza, irá enfrentar no terreno, irá provocar um agravamento da situação socioeconómica destes distritos, o que, em nossa opinião, é inaceitável.
Estes distritos não precisam de mais desemprego, não precisam de mais dificuldades, não precisam de mais encerramentos de empresas! Não foi para isso que os portugueses votaram no governo. Do que estes distritos precisam é de ajudas ao seu desenvolvimento!
Neste momento concreto, importa que o Governo cumpra a sua palavra e não introduza portagens nestes distritos!
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Abel Baptista,
Agradecemos a sua pergunta, porque temos de deixar aqui um esclarecimento à Câmara e a quem segue o debate em casa: o CDS-PP tem uma posição com a qual o PCP não concorda, isto é, o CDS prepara-se para estar ao lado do Partido Socialista nesta medida — e, inclusivamente, quando estivermos a discutir o projecto de lei que impede a utilização dos chip nas matrículas —, porque o CDS-PP tem uma posição contra os interesses das populações. Digo isto, Sr. Deputado Abel Baptista, porque quem ouviu a sua intervenção fica na dúvida. Por isso, aqui fica o esclarecimento: o CDS não «mexe uma palha» para impedir a introdução de portagens nas SCUT e, portanto, concorda com o princípio. Coloca uma questão de divergência regional, mas esse não é o nosso caminho; fala nas questões da alternativa ferroviária e, ao mesmo tempo, é contra o investimento público, que permite, precisamente, melhorar a alternativa ferroviária. Portanto, a posição do CDS relativamente a esta matéria é bastante ambígua.
Mas há aqui um aspecto que considero interessante e que importa salientar. É que o PS assumiu, aqui, na Câmara, com a intervenção do Sr. Deputado — ainda vamos ouvir mais uma intervenção da bancada do Partido Socialista —, que está em causa um critério claramente economicista, uma questão orçamental.
A pergunta que se deixa aqui a todos os Srs. Deputados é a seguinte: os impactos sociais e económicos que a introdução de portagens irá ter nestes distritos serão ou não superiores àquilo que o Estado irá arrecadar?!
Vamos ou não destruir mais empresas?! Vamos ou não destruir postos de trabalho?! Vamos ou não aumentar os problemas sociais nestes distritos?! Vamos!
As consequências para o País são bem mais gravosas do que qualquer arrecadação de receitas.
Portanto, para discutir medidas no sentido de arrecadar receita, cá estaremos para as discutir, mas é preciso ir buscar o dinheiro onde ele existe em abundância, mesmo em anos de crise, e não contribui para a sociedade. Aí é que vamos buscar o dinheiro!
A introdução de portagens nestas SCUT é injusta, vai aumentar os problemas do País, vai aumentar os problemas do tecido produtivo nas principais regiões, a nível nacional, no que diz respeito à máquina da industrialização, que estão no norte do País, nomeadamente nos distritos do Porto, de Aveiro e de Viana do Castelo, e, nessa medida, os impactos para a sociedade e para o País serão bem superiores. Pena é que o CDS se permita colaborar com o Partido Socialista neste desiderato e ser, também assim, conivente e responsável por esta medida.

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