Declaração de Fernanda Mateus, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP, Conferência de Imprensa

Pacto de Agressão: em marcha os velhos itinerários de desigualdade e discriminação das mulheres

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A comemoração do 8 de Março tem lugar num quadro da mais violenta ofensiva contra os direitos das mulheres e a sua luta emancipadora. Cada medida imposta por via do Pacto de Agressão aprofunda o abismo entre a aspiração da larga maioria das mulheres em afirmar o seu papel, os seus saberes e capacidades – no plano profissional, social e cultural – e o agravamento de forma brutal das suas condições de vida e de trabalho, associado ao seu crescente empobrecimento, nomeadamente das mulheres oriundas das classes trabalhadoras e populares.

A troika nacional (PS, PSD e CDS-PP) e a troika internacional (BCE, UE, FMI), a pretexto da «crise» e dos «compromissos de Portugal com os credores», estão a penalizar o povo e o país por uma crise (do sistema capitalista) de que não são responsáveis. As mulheres portuguesas têm, por isso, razões comuns à generalidade dos portugueses para rejeitar o Pacto de Agressão, mas têm, igualmente, fortes razões ligadas à sua situação e aos seus direitos específicos: está em curso uma acelerada marcha de «institucionalização» dos velhos e recorrentes itinerários de desigualdade e discriminação das mulheres (por razões de classe e de sexo) no trabalho, na família, na vida social e política. Trata-se de um salto qualitativo na política de direita realizada nas últimas décadas por sucessivos governos, uma política que consubstancia um processo de liquidação de valores, direitos e conquistas das mulheres portuguesas alcançados após a Revolução de Abril e plasmados na Constituição da República.

Pela sua gravidade, o PCP destaca neste 8 de Março os seguintes aspectos que só pela luta, e em particular pela luta das mulheres, podem ser travados:

1.º – O afastamento de milhares de mulheres do mercado de trabalho que, aprisionadas ao desemprego forçado, vêem negados o direito ao trabalho – condição essencial à efectivação da igualdade de direitos –, à sua independência económica e à sua realização profissional. Um afastamento traduzido numa taxa de desemprego feminino, que em sentido lato atinge 21,8% de mulheres; cerca de 57,7% dos inactivos disponíveis para trabalhar são mulheres e em que 37,3% são jovens.

2.º – O agravamento da desigualdade e discriminação das mulheres no mercado de trabalho não obstante o aumento desta participação – 47,1% da população activa e 47% do emprego total em Portugal – e que pode ser identificado nos seguintes aspectos:

Na ampliação de uma «nova geração de trabalhadoras» sem direitos que fica aprisionada nas malhas da precariedade laboral, nas suas múltiplas formas: cerca de 24,5% das trabalhadoras têm vínculo precário (face a uma taxa média de 22,8%), uma situação que se agrava para as mais jovens quando 60,9% das jovens dos 15 aos 24 anos e 34% dos 25 aos 34 anos não têm emprego estável.

Na acentuação dos baixos salários das mulheres e das discriminações salariais. Entre Outubro de 2007 e Outubro de 2010 aumentou o número de trabalhadoras a receber o salário mínimo nacional (de 8,8% para 14,4%), o que significa um salário líquido de 432 euros, ou seja abaixo do limar da pobreza, e cerca de 40% das trabalhadoras auferem um salário mensal de apenas 500 euros. As diferenças salariais entre mulheres e homens chegam a superar os 30%, realidade que atravessa os diversos sectores de actividade. Entretanto, quanto mais elevada é a qualificação maior é a discriminação a nível de remunerações, chegando a diferir 26,1% no caso dos quadros superiores da admnistração pública, dirigentes e quadros superiores de empresas (Quadros de Pessoal 2009).

Destaca-se, entretanto, a persistência nas discriminações salariais indirectas entre mulheres e homens que, intervindo no mesmo processo produtivo e tendo categorias diferentes, executam um trabalho de igual valor. São disso exemplo, entre outros: uma operadora especializada na peixaria de uma grande superfície que ganha menos 84 euros do que o oficial de carnes especializado, ou a escolhedora de rolhas, no sector da cortiça, que ganha menos 46,83 euros do que o escolhedor de prancha.

3.º – A negação do direito das trabalhadoras a serem mães sem penalizações, o que, assumindo dimensões e expressões diferenciadas, tem como denominador comum a desresponsabilização do Estado e das entidades patronais para com a renovação das gerações e para com os direitos de maternidade e paternidade. Muitos exemplos poderiam ser dados mas recordamos apenas alguns: o adiamento da decisão de ter filhos face à instabilidade laboral; as crescentes pressões (directas e indirectas) para que as trabalhadoras abdiquem de exercer a licença de maternidade na totalidade; os cortes em importantes prestações sociais de apoio à família (abono de família, subsídio pré-natal, etc. ).

Pacto de Agressão e alterações à legislação laboral: Trabalhar mais por menos dinheiro, mais discriminações das trabalhadoras

O pacote de alterações à legislação laboral, apresentado pelo Governo PSD/CDS-PP na Assembleia da República no seguimento do acordo do Governo/associações patronais/UGT, representa uma inaceitável agressão aos direitos dos trabalhadores: promove o trabalho forçado e não pago, a tentativa de eliminação de feriados e dias de férias, o aumento do horário de trabalho até 12 horas por dia e 60 horas semanais (banco de horas), e a facilitação e o embaratecimento dos despedimentos. É um caminho que propicia, favorece e facilita a «institucionalização» das desigualdades e discriminações específicas das mulheres visando uma inaceitável regressão na sua condição de trabalhadora. Uma regressão que, a não ser travada, se refletirá muito negativamente em acrescidas dificuldades na organização da vida familiar e no apoio aos filhos, e em novos condicionamentos ao direito a terem tempo para si e para participar na vida social, política e cultural.

O que está em marcha com o Pacto de Agressão e com as alterações à legislação laboral está em «contra ciclo» com os interesses do país e com a reiterada vontade de sucessivas gerações de mulheres em terem o direito ao trabalho com direitos, a verem valorizados os seus salários e a sua progressão na profissão e em serem mães e trabalhadoras com direitos. Os subscritores e executores das medidas de austeridade – o PS, o PSD e o CDS-PP – ocultam e omitem as suas devastadoras consequências no desenvolvimento e expansão do empobrecimento e da pobreza enquanto fenómeno estrutural da sociedade portuguesa com gravíssimos reflexos na negação de direitos fundamentais às mulheres das classes trabalhadoras e populares.

O PCP saúda as organizações do movimento de mulheres que em Portugal, e face à brutal ofensiva contra os direitos das mulheres, empenham o melhor dos seus esforços para que as comemorações do 8 de Março de 2012 representem uma importante jornada de mobilização das mulheres portuguesas para que assumam nas suas mãos a luta em defesa dos seus direitos.

Neste 8 de Março, o PCP saúda as mulheres que se assumem como sujeitos activos na intensa luta que se trava no nosso país – nas empresas e locais de trabalho, nas cidades e nos campos – contra a exploração, o empobrecimento e o retrocesso social. Uma luta que mostra que as mulheres não calam, não consentem, nem se resignam perante o Pacto de Agressão e as alterações à legislação laboral, que representam um inaceitável «ajuste de contas» com os valores, direitos e conquistas das mulheres e com a sua luta emancipadora.

No dia 8 de Março, o PCP leva a cabo por todo o país um vasto conjunto de acções de distribuição do seu folheto às mulheres, e em especial às trabalhadoras, em que afirmará a confiança no papel da sua luta em defesa dos seus direitos. Uma acção que apelará a uma forte adesão das trabalhadoras, do sector público e privado, na Greve Geral de 22 de Março, convocada pela CGTP-IN. Porque é pela luta que as mulheres defendem os seus direitos.

Na Assembleia da República, o PCP destacará no dia 8 de Março as razões pelas quais apresenta um Projecto de Resolução de valorização do trabalho e dos salários das mulheres e de combate às discriminações salariais, directas e indirectas.

O PCP entregará na Assembleia da República um Projecto de Resolução relativo ao empobrecimento e pobreza entre as mulheres, visando proceder a uma rigorosa avaliação dos impactos do Pacto de Agressão no agravamento da pobreza em Portugal e nas suas incidências, em particular nas mulheres e nas crianças. O PCP reafirma, nas comemorações desta data, o seu empenho na luta pela efectivação do direito à igualdade das mulheres, na lei e na vida, e pela sua emancipação social.

É na luta pela exigência de ruptura com a política de direita e na construção de uma política alternativa que o PCP preconiza, que se poderá dar êxito a um Portugal com futuro que efective:

O direito ao trabalho com direitos, o direito a serem mães e trabalhadoras sem penalizações, o combate ao desemprego e às diversas formas de precariedade; a qualidade de vida e uma mais justa repartição do rendimento a favor das trabalhadoras, das reformadas, das deficientes e imigrantes, com a valorização dos salários, das reformas e o reforço da sua protecção social (saúde e segurança social); garantia do direito e articulação da sua vida profissional, pessoal e familiar; reforço da participação social e política, eliminando os factores económicos, sociais, políticos e culturais que condicionam essa participação a partir dos locais de trabalho e na vida sindical, bem como noutras importantes expressões da vida associativa; implementação de uma rede pública de equipamentos sociais e de apoio à família de qualidade e a preços acessíveis; adopção de medidas de prevenção e combate à violência sobre as mulheres, tanto no plano da violência doméstica como de combate ao tráfico, prostituição e pornografia, e apoio às suas vítimas.

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