Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

«Nos programas de internacionalização da economia têm sido consumidos voltuosos fundos públicos»

Senhor Presidente, Senhores deputados, Senhores membros do Governo,

As orientações de internacionalização da economia e da captação de IDE constituem um eixo estratégico nos programas de sucessivos governos. E cada governo que chega relança, renova, «inventa» novos programas de internacionalização, onde têm sido consumidos vultuosos fundos públicos – nacionais e comunitários – e volumosas perdas de receitas em benefícios fiscais.

Alguns desses processos de internacionalização acabam por se revelar verdadeiros desastres económico-financeiros, perdas significativas das dotações públicas consumidas, perdidas em puro prejuízo. Recorde-se, entre outras, a ruinosa operação de internacionalização da Caixa Geral de Depósitos em Espanha, cujo resultado está hoje bem patente nas dificuldades e imparidades do banco público.

Por outro lado, muito do capital estrangeiro que chegou ao País nada teve a ver com projectos de investimento de utilidade nacional, mas pura e simples compra de activos económicos, e perigoso domínio de sectores e áreas estratégicas para a economia nacional. E um dos problemas dos sucessivos programas da internacionalização tem sido a recusa, «esquecimento», ou simples desvalorização de absoluta necessidade de uma avaliação global e sistemática desses programas passados, e a consequência dessa avaliação no desenho e elaboração de novos programas, como há muito o PCP reclama.
Por isso há um debate que tem de ser feito sobre esta matéria.

Que avaliação realizou o Governo sobre os anteriores programas de internacionalização? Quais os resultados dessa avaliação? Qual a avaliação quantitativa da despesa pública executada nos referidos programas de internacionalização? Quais os principais êxitos e insucessos destacados nessa avaliação?
Quais as mudanças de fundo que este “Programa Internacionalizar” veio trazer relativamente à sucessão de programas e iniciativas a que assistimos ao longo dos anos?

Em relação ao acesso das empresas portuguesas ao financiamento? Aos custos das operações de exportação e desde logo nos seguros à exportação? À famosa captação de “investimento directo estrangeiro”, que se traduzisse verdadeiramente na criação de riqueza e não em aplicações financeiras ou de imobiliário? Ou finalmente, à questão crítica do chamado Valor Acrescentado Nacional face à componente importada das nossas exportações?

Em todas estas matérias, convenhamos que o balanço que o País tem de fazer é de um autêntico desastre ao longo de anos a fio e sucessivos governos!
Mas a questão central é que a economia portuguesa já está totalmente "internacionalizada”! As maiores e estratégicas empresas do país – banca, seguros, energia, comunicações e telecomunicações, metalomecânica, etc., já estão todas na mão do capital estrangeiro, com os respectivos centros de competência e decisão fora do país; sujeitas aos jogos e aleatoriedades dos fundos de capital, na busca da maximização de dividendos para os accionistas/fundos de investimentos que as dominam; sujeitas à volubilidade das cadeias de valor das multinacionais, sempre em busca de mão de obra barata e máximos apoios públicos.

São opções, mas opções que não servem os interesses nacionais! O capital não tem pátria, mas não nos é, nunca foi indiferente, ser ou não ser do capital português, a propriedade das empresas, e em particular das que são estratégicas.

As consequências mais visíveis podem adivinhar-se do que sucedeu com a maior empresa industrial portuguesa a CIMPOR! Mas temos em conta o que sucedeu (ou está a suceder!) também com a PT, os CTT, ANA Aeroportos, o próprio sector financeiro, que são exemplos de privatizações, concessões, PPP, que se enquadram em processos de favorecimento dos grandes interesses económicos, de contornos nebulosos, com graves consequências para o País: perda de instrumentos estratégicos; perda de capacidade de decisão; rendas, subsídios, entrega de receitas aeroportuárias e de portagens, e outros benefícios.

A situação que se está a passar com a EDP, com uma anunciada OPA para a sua aquisição, coloca uma questão em evidência: uma empresa que é estratégica para os interesses nacionais, da qual depende grande parte da economia portuguesa, tal como o conjunto de equipamentos e funções públicas, não pode estar sujeita à disputa por parte de grupos económicos ou de Estados estrangeiros sobre o seu controlo accionista. Aquilo que pode e deve ser determinante para o futuro da EDP é a recuperação do controlo público da empresa eléctrica nacional.

A questão central que está em causa é a soberania e a independência nacional. Aquilo que o País precisa é que as suas empresas estratégicas, em vez de estarem nas mãos de grupos económicos americanos, alemães, franceses, espanhóis ou chineses, estejam nas mãos do Estado português, para servir o povo, para servir o desenvolvimento do País.

Reafirmamos e relembramos: o PCP nunca se deixou levar pelos cantos de sereia das privatizações. Antes pelo contrário, assumiu uma posição de forte e contínua denúncia ao longo dos anos, mas também o combate com propostas concretas, não apenas para reverter e recuperar para o sector público os sectores básicos e estratégicos da economia nacional, e para contrariar as práticas de submissão, corrupção e conluio com os grupos económicos.

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