Intervenção de Diana Ferreira na Assembleia de República

«O combate ao trabalho infantil é inseparável do combate à pobreza e à exclusão social»

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

A 12 de Junho, data em que se celebra o Dia Mundial contra o Trabalho Infantil foi sinalizado por organizações como a OIT e a Unicef, o risco existente, actualmente, para milhões de crianças em todo o mundo, de serem empurradas para situações de trabalho infantil, devido à situação sanitária actual.

A propósito desta discussão, importa lembrar que, desde o ano 2000, cerca de 94 milhões de crianças deixaram de estar em situação de trabalho infantil – uma evolução que pode estar ameaçada devido ao agravamento da situação económica e social no actual contexto.

A Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens, no Relatório Anual de avaliação da Actividade das CPCJ’s referente ao ano de 2019, sinaliza 40 situações identificadas como sendo de “Exploração Infantil” das quais 20 (50%) são “Exploração de Trabalho Infantil” – mais 4 do que em 2018.

A CNASTI - Confederação Nacional de Acção sobre o Trabalho Infantil tem assinalado preocupações sobre situações de trabalho infantil no nosso país, mesmo que de forma “encapotada”, tendo recentemente referido o risco de aumento dessas situações face ao contexto actual.
Portugal fez um caminho que é de assinalar e de valorizar no combate ao trabalho infantil. Um caminho que não pode ser posto em causa e que não pode ter retrocessos.

O aprofundamento das desigualdades sociais, as situações de pobreza que persistem e se intensificam, os alertas de risco de retrocesso no combate ao trabalho infantil em todo o mundo, a realidade espelhada nos números e a realidade escondida que não está traduzida em nenhum documento, exigem intervenção constante para eliminar todas as situações de trabalho infantil, mas também para combater e erradicar todas as formas de exploração e violência sobre as crianças.

O combate ao trabalho infantil é inseparável do combate à pobreza e à exclusão social, que são inseparáveis de opções políticas que garantam condições de trabalho e de vida dignas às famílias, desde logo o cumprimento efectivo dos direitos civis, sociais, económicos e culturais por parte do Estado.

Porque a pobreza infantil, intimamente ligada à pobreza das famílias, tem especificidades próprias quanto à sua caracterização e aos seus contornos materiais, expressando-se em dimensões e indicadores que não se reportam a outras camadas etárias, como por exemplo, as situações de abandono, insucesso escolar ou a prevalência de determinado tipo de vulnerabilidades. Porque é essa pobreza que empurra as crianças para estas situações.

A pobreza das crianças tem efeitos e implicações individuais e geracionais que são mais duramente repercussivos e continuados que noutras idades. Um dos traços que melhor caracteriza a pobreza infantil é, sobretudo, a associação entre a escassez de recursos que define a pobreza e a dependência que caracteriza a infância.
O combate ao trabalho infantil é inseparável do combate ao desemprego, à precariedade, aos baixos salários e por isso inseparável da garantia de emprego com direitos, da valorização dos salários e de uma justa distribuição da riqueza.

Como é inseparável da escola pública, gratuita, de qualidade, inclusiva, que responda às necessidades e características destas crianças – tendo a Escola que ter mais meios humanos, materiais, financeiros para responder a estas realidades.

Como é inseparável do acesso universal, gratuito e de qualidade a serviços públicos, nomeadamente de saúde e segurança social, acesso à protecção social.

A nossa Constituição salvaguarda o direito das crianças “à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão”, proibindo também o trabalho de menores.

Todas as crianças têm direito a especial protecção e cuidas, à saúde, à educação, a protecção social, à habitação, a alimentação adequada, ao vestuário, à sua integridade física, ao respeito pela sua identidade própria. Têm direito a crescer em harmonia, direito ao seu desenvolvimento integral, a crescerem e serem felizes.

O PCP tem proposto a criação de uma Comissão Nacional dos Direitos das Crianças e Jovens com o objectivo de estudar, acompanhar, analisar as realidades das crianças no nosso país, entendendo que essas competências não devem estar na Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens.

Acompanharemos as iniciativas em questão, entendendo que importa que seja feito um estudo rigoroso e aprofundando sobre a realidade do trabalho infantil no nosso país.

Disse.

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