Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Audição Pública «Plano de Emergência. Reforçar o SNS, garantir o acesso aos cuidados de saúde»

A defesa do Serviço Nacional de Saúde é um imperativo nacional

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O PCP apresentou, no passado dia 15 de Maio, um Plano de Emergência para reforçar o Serviço Nacional de Saúde que, partindo de uma análise rigorosa do trabalho que foi realizado durante os últimos três meses, das experiências recolhidas na intervenção das unidades do SNS no combate ao surto epidémico, das necessidades identificadas e dos meios necessários, aponta 15 medidas fundamentais para que o SNS possa continuar a responder no combate ao vírus, mas recuperar atrasos no tratamento de outras patologias e regularizar a actividade normal.

Um plano que surge num momento em que está em curso uma gigantesca operação a partir dos grupos monopolistas do negócio da doença, sustentada politicamente nos partidos que tudo têm feito ao longo dos mais de 40 anos de existência do SNS para o destruir e ampliada pelos comentaristas e propagandistas.

O pretexto para esta operação é o de agigantando problemas reais que o SNS já tinha em resultado de um continuado sub-financiamento, sustentar que, face ao conjunto de medidas de resposta ao surto epidémico, o Serviço Nacional de Saúde não estaria em condições de responder, por si só, às exigências que estão colocadas de prestação de cuidados de saúde aos portugueses.

Nada mais falso!

Uma tese que surge precisamente numa altura em que caiu por terra o mito de que “os privados fazem melhor e mais barato”, tese que valeu aos grupos privados, ao longo dos anos, a transferência de milhares de milhões de euros do erário público, ao mesmo tempo que se manteve o subfinanciamento crónico do serviço público, se desvalorizou profissional e salarialmente os seus profissionais. Com este dinheiro os hospitais privados reproduziram-se por todo o País, retiraram do SNS milhares de profissionais e mantiveram um negócio florescente.

Se é possível retirar já algumas conclusões do período que estamos a viver no plano sanitário, é que sem o SNS no tratamento dos doentes afectados e na contenção e mitigação do surto, seria certamente para muitos deles e para todos nós, uma ruína e um desastre.

Reafirmamos que sem o SNS não haveria, nesta situação, seguradoras e prestadores privados que valessem aos portugueses. Prestadores privados que, durante o período mais agressivo da COVID-19, se esconderam do vírus debaixo da cama.

Quando pensamos no combate à epidemia do coronavírus, pensamos no SNS. A grande privada como a CUF, Luz, Lusíadas, Trofa, Sanfil, ficou atrás das trincheiras, com instalações vazias, baixando 80% do negócio.

Dos 75.000 vales cirurgia passados pelo SNS neste período, menos de 10 000 foram utilizados, muitos porque os utentes não quiseram fazer a opção pelos privados, mas igualmente muitos porque os grupos privados suspenderam a sua utilização nos seus hospitais.

Os mesmos grupos que vêm agora pressionar para que o governo transfira milhares de cirurgias para os hospitais privados através dos cheques cirurgia e a respectiva transferência de dezenas de milhões de euros. Grupos económicos esses que se revelam insaciados apesar dos 40% do orçamento do SNS ou dos mais de 700 milhões de euros dos subsistemas de saúde públicos que anualmente recebem.

Tal como está suficientemente claro na Base 6 da nova Lei de Bases da Saúde aprovada em 2019, o recurso ao sector privado e social tem carácter supletivo, temporário, em casos de necessidade fundamentada e não como uma regra.

O SNS já mostrou que é capaz de garantir o combate ao vírus e recuperar atrasos, porque tem os melhores profissionais, porque tem conhecimento acumulado, porque tem uma lógica de funcionamento baseada na saúde e não na doença.

Mas para isso é decisivo reforçar a sua capacidade em meios financeiros, em profissionais e meios técnicos.

O Plano de Emergência apresentado pelo PCP aponta para, entre outras medidas:

- o reforço imediato no plano financeiro em 25% do orçamento do SNS para 2020;

- a mobilização e modernização da capacidade de diagnóstico e terapêutica instalada no SNS e o seu alargamento através da internalização nos hospitais dos Meios de Diagnóstico e Terapêutica;

- a recuperação até final de 2020, de todos os actos que ficaram em suspenso ou foram adiados em resultado da resposta ao surto epidémico;

- o reforço dos recursos humanos através da abertura de um processo de contratação, da conversão de contratos dos trabalhadores contratados no âmbito do combate ao surto para contratos com vínculo efectivo; do aumento extraordinário dos salários, da generalização do vínculo público, entre outras medidas;

- iniciar até ao início de Setembro de 2020, a formação da especialização de todos os médicos em condições de iniciarem essa especialização;

- aumentar a capacidade instalada em 800 camas de agudos e reforçar o número de camas de cuidados intensivos;

- garantir uma reserva nacional de equipamentos de protecção individual para os profissionais e uma reserva estratégica de medicamentos e dispositivos no quadro de uma interacção com as unidades do SNS, revista anualmente;

- dar passos significativos na criação do Laboratório Nacional do Medicamento, medida já aprovada na Assembleia da República quando da discussão do Orçamento do Estado;

- reforçar a estrutura de saúde pública que, como ficou comprovado nesta fase, é fundamental para organizar e dirigir o combate a qualquer surto, mas em particular na prevenção da doença e na promoção da saúde.

Medidas que contrastam com a política de direita desenvolvida na saúde ao longo de 40 anos.

O surto epidémico veio demonstrar quão negativa foi a política de direita prosseguida por PS, PSD e CDS ao longo de dezenas de anos na área da saúde e quão tardias, insuficientes e inconsequentes foram as medidas tomadas pelo Governo do PS nos últimos anos.

Ao longo dos últimos 20 anos, com maior agressividade entre 2011 e 2015, o SNS foi sujeito a uma estratégia de subfinanciamento que atingiu em média/ano 20% entre 2010 e 2017, considerando o orçamentado e a despesa real.

Nos 4 anos de governo PSD/CDS o número de profissionais atingiu um número muito aquém das necessidades do funcionamento das unidades do SNS, 123.205 o número mais baixo na última década, menos 10.000 dos que trabalham actualmente, ainda assim insuficientes para as necessidades do SNS.

Alguns hoje aclamam-os, produzem discursos de circunstância para os homenagear, mas durante muitos anos não fizeram outra coisa que não fosse desvalorizá-los profissional e salarialmente.

Nesta estratégia de favorecimento dos grupos económicos, milhares de camas foram desactivadas nas unidades hospitalares do SNS. Entre 2009 e 2019 foram encerradas mais de 4 000 camas nos hospitais públicos, ao mesmo tempo que nos privados o número de camas cresceu mais de 2 500.

Dois caminhos estão em decisão nos próximos meses: a defesa e reforço do SNS para garantir o direito à saúde, com a aplicação do plano de emergência para o seu fortalecimento; ou o definhamento do SNS e das suas estruturas, canalizando os fundos públicos do seu financiamento para engrossar os lucros e o poder dos grupos monopolistas da saúde.

Apesar de todas as dificuldades que lhe foram criadas, o SNS é a única resposta possível e, por isso, a opção certa é o seu reforço e a sua capacitação.

O apelo do PCP é que os trabalhadores, os democratas, todos aqueles que ao longo dos anos mantiveram de pé esta importante conquista de Abril, que é o Serviço Nacional de Saúde, considerem a sua defesa como um imperativo nacional.

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