Destinatário: Ministro das Infraestruturas e Habitação
O PCP tem vindo a suscitar ao Governo a necessidade de uma intervenção concreta sobre a situação dos estivadores do Porto de Lisboa.
Questionámos o Ministro na comissão parlamentar, não obtendo qualquer resposta apesar da nossa insistência. Requeremos a presença urgente do Governo e do SEAL para audições na AR sobre esta temática (que não tiveram lugar devido à suspensão dos trabalhos face à pandemia COVID-19). Apresentámos questionamentos por escrito face ao inaceitável encerramento da AETPL e impedimento aos estivadores do seu acesso ao local de trabalho.
Mas esta semana, após tudo o que sucedeu, o Governo assumiu uma posição particularmente grave com a requisição civil decretada e publicada no Diário da República n.º 54/2020, 1º Suplemento, Série I de 2020-03-17.
De uma forma conjugada, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 10-C/2020 e a Portaria n.º 73-A/2020 traduzem a visão do Governo sobre o conflito laboral no Porto de Lisboa: uma visão absolutamente parcial, que toma o partido do patronato e que ignora tudo o que se tem verificado com o escandaloso processo de insolvência fraudulenta e de tentativa de destruição da contratação coletiva na A-ETPL.
Quando se poderia até considerar que a requisição civil seria a resposta do Governo à insolvência fraudulenta da A-ETPL, ao impedimento de acesso dos seus trabalhadores ao Porto de Lisboa e às perturbações provocadas pelo patronato à indispensável cadeia de abastecimentos, ainda para mais no contexto da atual pandemia, o que se verificou foi afinal uma opção política de sentido inverso.
O Governo responsabiliza os trabalhadores pelos problemas que indesmentivelmente foram causados pelo patronato e decreta a requisição civil dos trabalhadores, que foram acusados de se “recusarem a trabalhar” e de “não cumprirem os serviços mínimos”. No entanto, desde o início da greve que o sindicato escala todos os trabalhadores para os serviços mínimos para os quais são requisitados – e desde terça-feira que as empresas de trabalho portuário não estão a permitir a entrada dos estivadores que se apresentaram ao trabalho, no contexto da requisição civil.
É assim que se verifica a inaudita situação de dezenas de estivadores continuarem a ser impedidos de entrar no Porto de Lisboa, apesar da requisição civil decretada pelo Governo. Trata-se de estivadores, muitos deles com dezenas de anos de serviço no Porto de Lisboa, que há 30 dias realizam serviços mínimos essenciais ao país com salários em atraso. Agora, perante a situação que foi provocada pelos patrões para justificar a requisição civil, é impedido a estes trabalhadores o acesso ao seu posto de trabalho.
Acresce que, ao contrário do que dizem os operadores portuários, não estão cumpridos os requisitos legais para que se considere o encerramento da A-ETPL e o despedimento dos trabalhadores.
O PCP conhece ainda casos em que trabalhadores que têm vínculo contratual com determinada empresa receberam instruções para hoje se apresentarem ao trabalho numa outra empresa com a qual não têm qualquer vinculo laboral, tipo de mobilidade que , neste quadro, à partida só poderia ser desencadeada pelo Sindicato que os representa ou pela Autoridade Portuária de Lisboa, no caso a Administração do Porto de Lisboa, portanto uma entidade pública.
Assim, ao abrigo da alínea d) do artigo 156.º da Constituição e nos termos e para os efeitos do artigo 229.º do Regimento da Assembleia da República, solicitamos ao Governo os seguintes esclarecimentos:
- Como explica o Governo a aprovação de legislação (Resolução do Conselho de Ministros e Portaria acima citadas) que ignora totalmente o escandaloso processo de insolvência fraudulenta e de tentativa de destruição da contratação coletiva na A-ETPL e que atribui a responsabilidade da presente situação, não aos seus autores morais (o patronato), mas sim àqueles que têm sofrido até agora – que são os estivadores?
- O Governo reconhece ou não que, desde o início da greve, o sindicato escala todos os trabalhadores para os serviços mínimos para os quais são requisitados – não sendo por isso imputável aos trabalhadores o incumprimento de serviços mínimos, mas sim ao patronato?
- Que medidas vão ser tomadas face a esta inaudita situação de dezenas de estivadores continuarem a ser impedidos de entrar no Porto de Lisboa, apesar da requisição civil decretada pelo Governo?
- Que medidas vão ser tomadas pelo Governo perante o facto dos operadores falarem de cessação do vínculo contratual com os trabalhadores da A-ETPL, quando não estão cumpridos os requisitos legais para tal?