Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«Cá estamos para fazer avançar as condições de vida e o desenvolvimento do País. É esta a garantia que os trabalhadores e o povo podem dar como certa»

Ver vídeo

''

Senhor Presidente, Senhor Primeiro-ministro, Senhoras e senhores membros do governo, Senhoras e senhores deputados,

O País vive hoje uma conjuntura diferente daquela que se apresentava há quatro anos atrás.

Mas uma conjuntura diferente que não significa um País substancialmente diverso, já que ele continua marcado por graves problemas estruturais e por significativos atrasos no seu desenvolvimento.

As consequências negativas de prolongados anos de políticas de direita de sucessivos governos permanecem na vida nacional e o País está longe de ter a política de que precisa para as superar.

Com o nosso importante e decisivo contributo foi possível, nos últimos quatro anos, travar o rumo de desastre nacional que vinha sendo seguido defendendo, repondo e conquistando direitos que foram a verdadeira base do crescimento económico, da criação de emprego e até do equilíbrio orçamental.

Medidas que comprovam o acerto do posicionamento do PCP e que mostram que o desenvolvimento do País é inseparável da elevação das condições de vida dos trabalhadores e do povo.

Mas o que se conseguiu, como sempre afirmámos, é de alcance limitado para a dimensão dos problemas que o País enfrenta. A resposta às desigualdades sociais e regionais, ao défice demográfico, aos patentes atrasos no desenvolvimento das forças produtivas e da produção nacional, às manifestas carências de um Estado que deveria garantir serviços públicos capaz de efectivar os direitos sociais num quadro de um País coeso, garantindo a protecção da natureza, do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, reclama uma outra política.

Uma política que passa, no imediato, por uma política de valorização salarial assumida como emergência nacional, para uma mais justa distribuição da riqueza, o combate à pobreza, para a dinamização da economia nacional, para fortalecer a Segurança Social e assegurar melhores pensões no futuro e para travar o esvaziamento do país de jovens qualificados. Que exige, no concreto, o aumento geral dos salários e do salário mínimo nacional para os 850 Euros; o combate à precariedade, a revogação das normas gravosas da legislação laboral, mas igualmente o aumento geral e real das pensões de reforma. Compromissos que o Governo não assume decididamente.

Passa por criar condições para assegurar creche gratuita para todas as crianças até aos três anos, por um programa ambicioso de financiamento dos serviços públicos essenciais, que precisam de investimento e da contratação de milhares de profissionais. Passa, nomeadamente, por um Serviço Nacional de Saúde reforçado e capacitado, pelo investimento nos transportes públicos, visando a recuperação e aquisição urgente de comboios, navios e autocarros e o reforço das medidas de redução do tarifário e alargamento da oferta, pela valorização da criação artística e fruição cultural assumindo o objectivo de alcançar 1% do Orçamento do Estado para a cultura, pela resposta ao grave problema do acesso à habitação.

Passa por garantir que todos os jovens possam aceder aos mais altos graus de ensino, apostando na Escola Pública, reforçando a Acção Social Escolar e pondo fim às propinas no ensino superior.

Passa pela ampliação da protecção social com o reforço do Sistema de Segurança Social Público, capaz de assegurar a universalização e majoração do abono de família e do reforço das prestações sociais.

Passa por uma Administração Pública dignificada, incluindo a valorização das carreiras e o reconhecimento integral do tempo de serviço prestado para efeitos de progressão.

No Programa que o Governo PS apresentou não se vê a cabal resposta aos problemas de fundo do País. Trata-se de um Programa marcado estruturalmente pelas opções de política macroeconómica que estiveram presentes na acção do anterior governo do PS e condicionaram a resposta aos problemas de fundo do País.
Opções que dão prioridade ao défice em detrimento do investimento, que mantêm privilégios e condições de domínio dos grandes grupos económicos e do grande capital sobre a vida nacional, em detrimento da resposta aos problemas dos trabalhadores, da garantia dos direitos sociais e do desenvolvimento do conjunto da economia. Opções que recusam uma resposta estrutural ao problema da dívida e sacrificam a resposta aos problemas do País e a necessária capacitação da Administração Pública. Opções cada vez mais assistencialistas no domínio social, em detrimento de opções de justiça na distribuição da riqueza, incluindo na política fiscal.

Um programa onde não se veem medidas ajustadas ao combate às desigualdades, mas sim a manutenção de um quadro degradado de direitos laborais e de insuficiente valorização dos salários e reformas. Não se vê a resposta que se impunha no plano do investimento para acudir aos atrasos no desenvolvimento de infraestruturas públicas e de dinamização dos sectores produtivos nacionais. Não se vê uma medida que recupere para o domínio público empresas privatizadas que há muito mostraram ser incapazes de servir os interesses nacionais e de garantir a prestação de um serviço público eficaz ao serviço das populações, como é o caso dos CTT.

Um Programa suficientemente vago e de formulação redonda e abrangente para não se comprometer em concreto em muitas das suas áreas. Um programa com formulações que indiciam soluções de sentido negativo ou até retrocessos, nos domínios da Administração Pública, dos transportes, ambiente, creches, deficientes, poder local, forças armadas, entre outras.

O Programa do Governo que hoje discutimos enfrenta a grande contradição entre o que proclama e o que verdadeiramente poderá ser concretizado face à opção que faz ao manter intocáveis os constrangimentos externos e os dogmas impostos pelo Tratado Orçamental. A fixação de um saldo primário orçamental permanente de 3% do PIB, superior 6 mil milhões de euros, revela que o devia ser canalizado para o desenvolvimento do País e assim será desviado na sua quase totalidade para pagamento dos juros da dívida

É uma evidência que solução dos problemas nacionais não encontra resposta numa política submetida aos constrangimentos impostos pela União Europeia.

É inquestionável que Portugal precisa de outras soluções. Precisa de um novo rumo com outra política, em ruptura com as questões nucleares da política de direita que o PS não abandonou.

Permanece a necessidade da concretização de uma política patriótica e de esquerda que tenha como eixos essenciais a libertação do País da submissão ao Euro e às imposições da União Europeia e a renegociação da dívida pública; a valorização do trabalho e dos trabalhadores; a defesa e promoção da produção nacional e dos sectores produtivos; a garantia do controlo público da banca e do conjunto dos sectores básicos e estratégicos da economia e o apoio às micro, pequenas e médias empresas e ao sector cooperativo; a garantia de uma administração e serviços públicos ao serviço do povo e do País; uma política de justiça fiscal; a defesa do regime democrático e do cumprimento da Constituição da República Portuguesa, com uma justiça acessível a todos e o combate à corrupção.

Eixos essenciais que são linhas de resposta aos problemas do País e ao mesmo tempo compromissos que o PCP assumiu com os trabalhadores e o povo.

Senhor Presidente, Senhor Primeiro-ministro, Senhores membros do governo, Senhoras e senhores deputados,

É a partir do seu Programa e projecto que o PCP desenvolverá a sua acção, iniciativa e proposta. Todo o caminho de avanço e de adopção de medidas que correspondam a direitos e aspirações dos trabalhadores e do povo contará sempre com a intervenção decisiva do PCP.

Assim como todas e quaisquer medidas contrárias aos seus interesses terão a nossa firme oposição.

O PCP desenvolverá a sua acção, disposto a contribuir para a solução dos problemas nacionais e a avançar com a força que os portugueses lhe deram.

Cá estamos para fazer avançar as condições de vida e o desenvolvimento do País. É esta a garantia que os trabalhadores e o povo podem dar como certa.

  • Administração Pública
  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Cultura
  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Educação e Ciência
  • Justiça
  • Poder Local e Regiões Autónomas
  • Saúde
  • Soberania, Política Externa e Defesa
  • Trabalhadores
  • Assembleia da República
  • Intervenções