Intervenção de Manuel Nobre, Encontro Nacional do PCP sobre a educação em Portugal

A rede escolar

A rede escolar

A Educação é um factor de igualdade, onde a Escola Pública assume um importante papel de vitalidade da democracia e da promoção de um ensino de qualidade, universal, gratuito e para todos.

Consagra a Constituição da República Portuguesa, que é responsabilidade do Estado criar uma “rede de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população”. Contudo, ao longo dos últimos anos, as políticas adoptadas pelos sucessivos governos, têm vindo a agravar os ataques à Escola Pública, com objectivos claros e bem definidos.

O caminho tem sido o da destruição e da desvalorização da oferta pública, através de vários ataques onde, entre outros, se incluem a privatização e a municipalização da educação.

No Sul do País, o resultado do encerramento de escolas, da fusão e agregação de escolas, da criação de centros escolares à custa do abate das escolas de proximidade, do aumento do nº de alunos por turma, da reorganização curricular, das alterações dos horários de trabalho, e a redução do número de profissionais da educação, têm levado a resultados desastrosos para o Alentejo, para o Algarve e para o País. 

Nesta política de submissão e de diretriz economicista, o que tem contado para os Governos são os números, não tendo presente o desenvolvimento do interior do País, a coesão territorial, nem as preocupações com o consequente despovoamento das comunidades.

Na sua vontade cega de reduzir a despesa pública a todo o custo, os governos não têm olhado a meios, mesmo que isso prejudique gravemente as populações. Assim foi com as Extensões de Saúde, postos de GNR, Transportes Públicos, Juntas de Freguesia, Estações de Correios, Tribunais, etc. 

Este autêntico ataque aos Serviços Públicos e às conquistas de Abril, em 12 anos, entre 2004 e 2016, já levou ao encerramento, no Alentejo, de: 236 estabelecimentos públicos de educação e ensino, o que representa um encerramento de 41% das escolas em todo o Alentejo; essa percentagem aumenta para 50% no caso da realidade do Distrito de Beja, 35% no Distrito de Évora e 39% no Distrito de Portalegre. No mesmo período de tempo o número de escolas privadas manteve-se inalterado, logo poder-se-á dizer que comparativamente com o número de escolas públicas, aquelas aumentaram brutalmente em termos percentuais. 

No caso do Algarve a realidade também é preocupante, a redução de estabelecimentos públicos foi, no mesmo período de tempo, de quase 28%. O número de estabelecimentos públicos passou de 357 em 2004/15, para 235 em 2015/16, ao mesmo tempo que o número de estabelecimentos privados aumentou 42%, tendo passado de 76 para 108.

Estes encerramentos têm também contribuído para a desertificação humana do interior do País. Obrigando comunidades inteiras a deslocações “desnecessárias”, numa região como o Alentejo, em que as distâncias são enormes e as temperaturas elevadas, os transportes públicos morosos ou escassos, poderemos dizer que para muitos alunos se trata de uma “jornada escolar de sol-a-sol”.

De salientar que não é a diminuição da população escolar que tem levado à redução do número de professores e ao encerramento de estabelecimentos escolares, mas sim as opções políticas dos vários Governos. 

A comprovar isso ressalta a redução do número de docentes, que numa década diminuiu 16% no Alentejo, o dobro dos 8% no Algarve, médias que só por si são preocupantes, mas também porque não têm qualquer correspondência com a realidade demográfica de cada uma das regiões. 

O decréscimo de alunos, no mesmo período de tempo, no Alentejo foi na ordem dos 6,3%, ligeiramente mais que a média nacional, enquanto que no Algarve houve mesmo um aumento de cerca de 2%.

O que quer dizer que no Alentejo a redução de professores foi 3 vezes superior à redução de alunos, e o encerramento dos estabelecimentos é 6,5 vezes superior à redução de alunos. Já no caso do Algarve, a visão economicista e a carga ideológica das políticas de direita é bem visível, num quadro de aumento do número de alunos, os governos reduzem brutalmente o número de professores e dos estabelecimentos públicos de educação, ao mesmo tempo que aumentam as ofertas privadas.

Entre o ano lectivo 2006/2007 e 2015/2016 o Alentejo perdeu 1.217 docentes. Beja reduziu 19%, Évora 17% e Portalegre 12%.

Também a redução dos profissionais não docentes nas escolas contribui para o decréscimo da qualidade e das respostas da Escola Pública. Em 2008, com o início da descentralização de competências da educação para os municípios, levou a que grande parte das Autarquias tenham assumido competências em matéria de gestão de pessoal não docente, o que tem resultado em grandes dificuldades para as escolas, devido à insuficiência de meios humanos qualificados. Opções que contribuem para a degradação da qualidade do ensino e da escola pública, e aumentam exponencialmente os custos da interioridade.

Esta visão da rede escolar e do que deve ser o serviço público de educação, tem uma grande carga ideológica. 

Para os executores das políticas de direita, a mesma assenta em objectivos de redução de despesa, através, nomeadamente, da extinção de postos de trabalho de professores e auxiliares de educação, reduzindo os currículos, diminuindo a qualidade e a diversidade das ofertas educativas, procurando criar uma escola a vários tempos - uma escola pública, gratuita, elementar e com metas mínimas, a escola do “ler, escrever e contar”, destinada aos filhos dos trabalhadores, e um ensino mais elitista e mais diversificado, pago e destinado aos alunos com outras condições familiares e sociais.

O desinvestimento na Região e no interior do País, as dificuldades que os trabalhadores, as populações e os jovens se deparam, fruto das políticas de empobrecimento e dos ataques aos direitos e às conquistas de Abril, continuam a acentuar o atraso do País. 

Ao abrigo da pomposa proposta do governo de “transferência de competências na área da educação”, este Governo segue os passos dos seus antecessores, pretende impor e transferir competências das escolas para as Câmaras Municipais, descurando os interesses, as opiniões e a vontade das comunidades educativas. 

Este processo de municipalização em curso vem com uma roupagem renovada, mas tem como objectivo de fundo o desmantelamento das funções sociais do Estado, onde se incluem os processos de concessão e privatização da educação, através dos municípios, das CIM´s e dos financiamentos e orientações comunitárias, que levarão à criação de sistemas educativos a funcionar a velocidades diferenciadas e a respostas educativas ao sabor do maior ou menor perfil, sensibilidade ou capacidade de cada município.

Recentemente fizemos uma análise a vários municípios da Zona Sul, com o propósito de tentar perceber como estão as Câmaras a utilizar os financiamentos do programa de “combate ao abandono e insucesso escolar”, e desde logo se percebe a disparidade de soluções e a forma como esses fundos estão a ser utilizados. 

Ficando bem claro que, em matéria de Educação cabe ao Estado assumir todas as suas responsabilidades, condição indispensável para concretizar uma Escola Publica, gratuita, de qualidade, democrática e inclusiva.

Também na educação é urgente uma nova política. 

É urgente a ruptura com a política de direita e a construção de uma política alternativa, patriótica e de esquerda, que defenda a Constituição e o Portugal de Abril, que coloque os interesses dos trabalhadores e do País na linha da frente. 

E só com o PCP isso será possível.
Viva a Escola Pública!

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