Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

Pelo cumprimento efectivo dos horários de trabalho e a conciliação do trabalho com a vida familiar

Sr. Presidente,
Sr. Deputados,

No nosso país, o principal problema relativo aos horários de trabalho é o seu incumprimento e desregulação.

Mais do que qualquer problema de “vazio” ou necessidade de clarificação legislativa na fixação de limites dos tempos de trabalho, o principal problema é o incumprimento desses limites por parte das entidades patronais.

O horário de trabalho, a sua fixação e cumprimento, o respeito pelos tempos de descanso, as respetivas condições de pagamento e de compensação, e a articulação com a vida familiar, pessoal e profissional continuam a ser dos ataques mais graves aos direitos dos trabalhadores, que todos os dias marcam o dia a dia nas empresas e locais de trabalho.

Os tempos de trabalho, os períodos de descanso, o trabalho suplementar e a isenção do horário de trabalho, quanto à sua previsão e definição, estão tipificados e fixados na legislação laboral.

À luz dessa fixação, é objetivo que, durante os períodos de descanso os trabalhadores não estão obrigados a receber ordens da sua entidade patronal e a prestação de trabalho.

E sendo verdade que existem atividades que obrigam a permanência de contacto em caso de urgência (cuidados de saúde, serviços informáticos, piquetes de serviços universais, bombeiros, socorristas, entre outras) dada a natureza contingente dessas profissões, a verdade é que, na generalidade dos casos, esta questão não se coloca. Aliás, a legislação em vigor estabelece com grande precisão os limites dentro dos quais o trabalhador está obrigado a permanecer contactável pela entidade patronal e ao seu serviço.

Na verdade, fora dos limites legais e convencionais estabelecidos para a vigência do contrato individual de trabalho, a entidade patronal não possui qualquer poder sobre o trabalhador.

Este princípio existe de forma inequívoca na legislação nacional, não necessitando de qualquer esclarecimento, uma vez que, fora do contrato de trabalho, o trabalhador está totalmente livre de qualquer ónus ou obrigação laboral.

No entanto, a confirmar-se de facto, a necessidade do contacto superveniente e intervenção urgente e de permanência em estado de prevenção nalgumas atividades, deve ser em sede de contratação coletiva que se responde a essa necessidade, como aliás já acontece.

Sr. Presidente, Sr. Deputados,

Registamos as notas do parecer da CGTP quando alerta para que estas propostas do PS, BE e PAN podem “abrir a porta à legalização das práticas ilícitas assumidas pelas entidades empregadoras quando interferem com os períodos de descanso dos trabalhadores, arrogando-se no direito de invadir o seu tempo de autodisponibilidade e a esfera da sua vida privada”.

Os avanços científicos e tecnológicos que a humanidade tem conhecido não têm tido tradução directa na melhoria das condições de vida de milhões de seres humanos por todo o mundo.

A evolução significativa da ciência e a tecnologia, as surpreendentes descobertas científicas e tecnológicas das últimas décadas não têm estado ao serviço de uma mais justa distribuição da riqueza, da redução dos horários de trabalho e da melhoria das condições de vida. Na verdade, os avanços científicos e tecnológicos têm servido a acumulação de riqueza por uma minoria extraída directamente das condições de agravamento da exploração, através de formas mais ou menos novas de criar mecanismos de pressão e controlo sobre os tempos de trabalho.

O PCP considera que, a utilização cada vez mais intensiva das tecnologias de informação e comunicação não devem fazer esquecer a necessidade de cumprir e fazer cumprir a lei e a contratação coletiva.

Os projetos do BE, PAN e PS são perigosos, perversos e podem traduzir-se na degradação dos direitos dos trabalhadores, ao pretender legalizar o que hoje já é ilegal. O PCP não acompanhará estas propostas.

O PCP propõe:
1. Reposição da obrigatoriedade de entrega por parte das entidades patronais à ACT, em cada ano civil, dos mapas de horários de trabalho que estejam em vigor nos locais de trabalho que estão sob a sua direção;

2. Reforço efetivo dos meios de fiscalização da ACT, nomeadamente, dos meios e mecanismos de fiscalização da aplicação dos direitos ligados à organização do tempo de trabalho;

4. Garantia de que a regulação de situações especiais que obriguem à manutenção, por parte dos trabalhadores, de estados de prevenção ou de estados em que estão contactáveis, seja feita no respeito pelos limites aplicáveis à duração do período normal de trabalho, à retribuição do trabalho suplementar, à retribuição do trabalho noturno e por turnos e da isenção de horário;

5. Garantia de que a organização do tempo de trabalho em resposta às situações referidas no ponto anterior, seja regulada no respeito pelos tempos de descanso, pelos intervalos de descanso e pelo direito a férias, bem como, garantindo os respetivos descansos compensatórios aplicáveis;

6. Garantia de que a organização do tempo de trabalho prevista nos números anteriores seja realizada no respeito pelo direito à conciliação do trabalho com a vida privada, no direito à realização pessoal e social, reforçando os meios oficiais disponíveis para a fiscalização destas situações.

Disse.

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