Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

«Os direitos dos trabalhadores não são defendidos ameaçando de caducidade os seus contratos»

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,

Os direitos dos trabalhadores não são defendidos ameaçando de caducidade os contratos que os preveem. Negociar novos contratos não pode ser uma operação feita com a espada da caducidade sobre a cabeça dos contratos que estão em vigor.

A introdução da caducidade na legislação laboral pelo, então, Governo PSD/CDS, através do Código «Bagão Félix», serviu apenas um objetivo: dar ao patronato uma arma para fazer desaparecer uma geração de direitos laborais que estavam previstos nos contratos coletivos, que na altura abrangiam 1 500 000 trabalhadores.

Sr.as e Srs. Deputados, aquilo que ouvimos hoje novamente do PSD e do CDS são exatamente os mesmos argumentos de 2003. Em nome da modernidade, em nome do desenvolvimento e da alteração tecnológica das relações laborais, era preciso alterar a legislação laboral para dinamizar a contratação coletiva.

Sr.as e Srs. Deputados do PSD e do CDS, em 10 anos, de 2003 a 2013, houve 241 000 trabalhadores abrangidos por novas convenções coletivas de trabalho. É este o resultado da farsa que os senhores venderam em 2003.

Não houve dinamização da contratação coletiva, houve, sim, liquidação de contratos coletivos com um conjunto de direitos que lhes estão associados.

Ouvimos, neste debate, novamente, os mesmos argumentos, de que o PSD e o CDS não prescindem, tal como em 2003 os afirmaram: é preciso fazer caducar os direitos para obrigar os trabalhadores a negociar em piores condições, sendo obrigados a prescindir dos seus direitos, sendo ameaçados pela caducidade para aceitarem a degradação das condições de trabalho, para aceitarem regras que impõem uma mais injusta distribuição da riqueza.

Dizem os Srs. Deputados do PSD e do CDS e também a Sr.ª Deputada Wanda Guimarães, do Partido Socialista, que, antes de 2003, antes da introdução da caducidade, havia contratos coletivos que apenas eram renovados em relação aos salários. Pois era! E já não era pouco! Renegociar um contrato coletivo para garantir aumentos de salários não é coisa pouca!

Mas a verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que, depois de se introduzir a caducidade na legislação laboral, hoje, nem para aumentar salários se renovam os contratos. Hoje, nem os aspetos que já antes não eram discutidos se discutem, nem os salários são objeto de renegociação com vista ao seu aumento.

Diz o PSD: «A caducidade não é uma malfeitoria». Gostava de ouvir a Sr.ª Deputada Clara Marques Mendes a dizer isso aos trabalhadores da Petrogal, do setor dos têxteis, da hotelaria, dos SAMS, alguns dos quais estão hoje a assistir a este debate. Diga-lhes que a caducidade não é uma malfeitoria e que os direitos que estão em risco, que estão em xeque, não resultam dessa operação da caducidade que os senhores apoiaram.

Diz o Sr. Deputado Adão Silva que a caducidade tem tido resultados. Só por desprezo pelos trabalhadores, só por desprezo pelos direitos dos trabalhadores é que se pode dizer que a caducidade tem tido resultados. É verdade que tem tido resultados, Sr. Deputado Adão Silva, mas é a favor do patronato! É a favor de quem paga menos salários, de quem rouba feriados, de quem rouba dias de descanso, de quem rouba compensações e subsídios que estão previstos nos contratos para serem pagos aos trabalhadores.

Diz o CDS que não é necessário revogar mais nada, apenas a contratação coletiva; não é preciso revogar mais nada na legislação laboral.

Sr. Deputado Anacoreta Correia, certamente não se deu conta de que o PCP tem apresentado projetos de lei sobre o banco de horas e a adaptabilidade, sobre o combate à precariedade, sobre o trabalho temporário, sobre o outsourcing, sobre todos esses aspetos em que se concentra um aspeto essencial de um problema dramático da vida nacional, que é o problema da exploração dos trabalhadores e da injusta distribuição da riqueza.

Sr. Deputado Anacoreta Correia, tal como hoje trouxemos à discussão a matéria da contratação coletiva, também haveremos de trazer as outras questões para que o CDS, uma vez mais, tome a posição a favor do patronato, a favor dos interesses que sempre assumiu protagonizar, contra os interesses dos trabalhadores.

Srs. Deputados do Partido Socialista, ouvimos novamente o argumento de que isto é matéria de concertação social.

Não é! Esta matéria da contratação coletiva é uma matéria de legislação laboral. Não é a concertação social que altera o Código do Trabalho, não é a concertação social que altera as regras que determinam uma espada sobre a cabeça dos contratos coletivos que estão hoje em vigor.

Sem haver uma alteração à legislação laboral, a discussão na concertação social continuará a ser feita em condições que permitem ao patronato ter na mão a faca e o queijo para decidir a vida dos trabalhadores e para decidir as condições de vida e de trabalho de milhões de trabalhadores no nosso País.

Para concluir, Sr. Presidente, quero, apenas, dizer que revogar a caducidade da contratação coletiva e repor o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador é repor travões ao retrocesso, é repor na legislação laboral elementos essenciais de proteção dos trabalhadores numa relação que é desequilibrada.

A relação laboral entre trabalhadores e patrões não é uma relação entre partes iguais e a nossa Constituição de 1976 fez uma opção a favor dos trabalhadores, prevendo a consagração constitucional da contratação coletiva.

Aquilo que o PCP está hoje a fazer é dar não só cumprimento a esse desígnio dos Deputados constituintes, que aprovaram a Constituição de 1976, mas uma resposta de modernidade e de futuro aos trabalhadores portugueses, que não têm de ficar condenados à exploração e às injustiças e que, por via da contratação coletiva, por via dos seus sindicatos, podem defender os seus direitos e a melhoria das suas condições de vida.

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