Projecto de Resolução N.º 561/XIII-2ª

Pela valorização da Língua Gestual Portuguesa

Pela valorização da Língua Gestual Portuguesa

I

A língua gestual constitui mais um instrumento para a integração das pessoas surdas, sendo um veículo de expressão e comunicação para aqueles que a utilizam.

Assim como qualquer língua, a Língua Gestual “é constituída por palavras, numa forma gestual, que não imitam a realidade designados gestos arbitrários, que seguem regras gramaticais específicas e que se combinam para formar frases. Contudo, sendo uma língua visuo-espacial e utilizando-se o aparelho motor superior para a comunicação, alguns gestos poderão ter uma inspiração no real”, sendo que “estes gestos variam consoante o país e a língua gestual da comunidade surda que a utiliza.”

Está determinado no artigo 74.° da Constituição da República Portuguesa que incumbe ao Estado, na realização da política de ensino, entre outras responsabilidades, a de “proteger e valorizar a Língua Gestual Portuguesa, enquanto expressão cultural e instrumento de acesso à educação e da igualdade de oportunidades.”

Para o devido cumprimento deste direito constitucional, há medidas que precisam de ser planificadas e concretizadas para, por exemplo, ultrapassar as dificuldades sentidas pelas crianças e os jovens no acesso ao ensino – cuja garantia de ensino e acesso à Língua Gestual Portuguesa é ainda bastante deficitária, como é possível verificar na carência de intérpretes de Língua Gestual Portuguesa na rede pública de ensino, especialmente no ensino superior.

Importa também concretizar medidas que garantam o acesso a um conjunto de direitos (como, por exemplo, a saúde), já que a inexistência de intérpretes nos vários serviços públicos conduz a discriminações dos cidadãos surdos.

Sem prejuízo de outras soluções que são igualmente importantes para responder aos problemas das pessoas surdas e que o PCP tem defendido - como é o caso dos implantes cocleares e a promoção de rastreios auditivos precoces, a Língua Gestual Portuguesa é mais um instrumento de superação das barreiras de comunicação que persistem e que, não raras vezes, impedem que as pessoas surdas usufruam de direitos fundamentais.

Foram dados importantes avanços, no desenvolvimento do texto constitucional, com a aprovação da iniciativa legislativa do PCP em 1999, que permitiu a definição das condições de acesso e exercício da atividade de Intérprete de Língua Gestual; atividade que não estava legalmente prevista nem regulamentada. Há, no entanto, ainda muito caminho para percorrer que não pode ser adiado.

II

A justa consagração da Língua Gestual Portuguesa como instrumento de acesso à Educação e de igualdade de oportunidades deve traduzir-se na existência dos necessários meios humanos nas escolas que garantam o devido apoio às crianças e jovens surdos.

Simultaneamente, importa que a Língua Gestual Portuguesa seja ensinada nas escolas para que as crianças e jovens ouvintes possam comunicar com os seus colegas e amigos surdos – a criação de condições para que todos os alunos possam, em todos os graus de ensino, aprender Língua Gestual Portuguesa assume significativa importância para ultrapassar esta barreira comunicacional e para combater a exclusão e segregação dos estudantes surdos. Importa, por isso, garantir os necessários meios humanos nas escolas para acompanhar devidamente os estudantes surdos, bem como garantir que todos os estudantes ouvintes que assim pretenderem, podem aprender Língua Gestual Portuguesa.

A valorização dos profissionais nesta área não pode ser esquecida. Os intérpretes de Língua Gestual têm um papel fundamental no acompanhamento dos alunos surdos, designadamente nas escolas de referência, tal como a sua intervenção é de extrema importância para a compreensão da comunidade escolar para as necessidades específicas destes estudantes, nomeadamente na garantia da igualdade de acesso às aprendizagens. Mas, além do necessário reforço destes profissionais para estas escolas e para as restantes escolas da rede pública, de forma a responder às necessidades existentes, é necessário garantir o efetivo recrutamento destes profissionais para estas funções específicas, devendo ser criado um grupo de recrutamento de docentes de Língua Gestual Portuguesa.

Importa ainda dar passos significativos na acessibilidade das pessoas surdas a um conjunto de serviços públicos, como no acesso a centros de saúde ou hospitais, no acesso a tribunais, balcões de Finanças ou da Segurança Social, entre outros serviços públicos. A inexistência de intérpretes de Língua Gestual nestes serviços que possam prestar o devido apoio e acompanhamento às pessoas surdas que se desloquem a estes locais faz com que se torne mais difícil ou mesmo impossível aceder aos serviços públicos. Importa, por isso, planear e concretizar medidas que garantam esta resposta inclusiva.

Diversos passos são necessários para que a atual situação, em que são insuficientes as condições de acesso à utilização da Língua Gestual Portuguesa, seja ultrapassada.

O projeto que o PCP hoje aqui apresenta é um contributo para passos a dar nesta matéria, entendendo e defendendo que as medidas a tomar devem fazer parte de uma resposta ampla e integrada que signifique uma maior inclusão e integração das pessoas com deficiência, designadamente das pessoas que apresentam défices auditivos médios, moderados ou profundos (congénitos ou adquiridos) e que usam aparelhos auditivos.

Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõe que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:

1. Crie um Grupo de Recrutamento para docentes de Língua Gestual Portuguesa.

2. Realize um levantamento do número de docentes e técnicos de língua gestual existentes nas escolas, tal como um levantamento das necessidades sentidas nas escolas, no sentido da contração destes profissionais.

3. Tome medidas no sentido de contratar os meios humanos necessários para o ensino da Língua Gestual Portuguesa e para o acompanhamento das crianças e jovens surdos.

4. Tome as medidas necessárias, ouvindo as associações representativas das pessoas com deficiência, especialmente da comunidade surda, e as organizações representativas dos profissionais da área, para que, nas escolas da rede pública, em todos os graus de ensino, a Língua Gestual Portuguesa seja ensinada a todas as crianças e jovens, que manifestem vontade na sua aprendizagem, devendo este processo, que deverá ser progressivo, iniciar-se progressivamente nas escolas de referência existentes, alargando-se a todo o ensino público.

5. Elabore um plano que avalie as necessidades e assegure a acessibilidade da comunidade surda aos serviços públicos, designadamente através da existência de uma bolsa de intérpretes de Língua Gestual Portuguesa, que prestem o devido apoio às pessoas surdas quando estas recorram aos serviços públicos, auscultando, para tal, as associações representativas das pessoas com deficiência, especialmente da comunidade surda.

Assembleia da República, 7 de dezembro de 2016

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