Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República, Debate na Generalidade

"Sabemos a luta que foi preciso travar para interromper o rumo de destruição do país"

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Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo,
Sr. Ministro das Finanças,

A avaliação que o PCP faz da proposta de Orçamento do Estado para 2017 não deixa de ter em conta dois conjuntos de elementos diferentes. Por um lado, um conjunto de elementos que registamos como sendo de insuficiências, de limitações na resposta a problemas que os trabalhadores, o povo e o País hoje enfrentam, com a necessária perspetiva crítica relativamente àquilo que são as opções ou a aceitação de imposições que conduzem a essas limitações, a esses constrangimentos e a essas insuficiências nas respostas que são dadas; por outro lado, um conjunto de elementos que têm a ver com a avaliação que fazemos de que esta não é uma proposta de Orçamento que constitua um retrocesso nos objetivos de devolução de direitos e de rendimentos que já se conseguiram, que consolida e progride em muitas das matérias que já foram inscritas no Orçamento do Estado para 2016 e que constituem um elemento, que tem de ser devidamente avaliado, de reposição de direitos e de rendimentos, que apontam para uma inversão do caminho de agravamento da exploração e do empobrecimento que vinha sendo seguido pelo Governo do PSD e do CDS.

Sr. Ministro das Finanças,

Queria que ficasse bem claro que, da parte do PCP, não desvalorizamos esse sentido geral de reposição de direitos e de rendimentos porque ele não é, de facto, irrelevante. Fazemos essa valorização porque sabemos o que custou aqui chegar, porque sabemos a luta que foi preciso travar, sabemos os sacrifícios que foi preciso o nosso povo fazer para interromper esse ciclo de agravamento da exploração e do empobrecimento que estava a ser imposto pelo Governo do PSD e do CDS, sabemos aquilo que foi preciso fazer para alcançar estas medidas positivas.

Sr. Ministro das Finanças,

Obviamente que registamos o esforço que tem feito de procurar responder às questões que são colocadas pelo PSD e pelo CDS, mas também não ignoramos que, verdadeiramente, a ira do PSD e do CDS não é contra este Orçamento, é contra tudo aquilo que este Orçamento possa conter, ainda que reduzido, ainda que insuficiente, ainda que limitado, de resposta a essas exigências que os trabalhadores e o povo foram fazendo durante quatro anos de saque às suas condições de trabalho, de saque às suas condições de vida, de empobrecimento, de emigração, de miséria e de pobreza que o PSD e o CDS foram espalhando pelo País.

É esse o motivo da ira com que o PSD e o CDS travam este debate do Orçamento do Estado. É contra essas medidas, contra esses avanços que são registados na resposta às exigências que os trabalhadores e o povo foram colocando, de resto, regozijando-se com todo e qualquer entrave, com toda ou qualquer dificuldade ou obstáculo que possa surgir na concretização dessas medidas.

Relativamente ao primeiro conjunto de matérias que referi, Sr. Ministro das Finanças, queria dizer que, na nossa perspetiva, o enquadramento que envolve este debate orçamental e este Orçamento do Estado evidencia uma crescente necessidade de rutura com a política de direita e a adoção de uma outra política que enfrente os constrangimentos e os condicionamentos, externos e internos, que o País continua a registar.

No nosso entendimento, são necessárias opções que permitam enfrentar os constrangimentos, as pressões e as chantagens da União Europeia, que permitam enfrentar as regras e os critérios da União Económica e Monetária e do euro, que impõem metas orçamentais que são limitadoras da capacidade de resposta aos problemas económicos, de resposta aos problemas socias, de resposta à garantia de qualidade dos serviços públicos, de reposição dos direitos dos trabalhadores da Administração Pública e do setor público empresarial, naquilo que tem a ver com as suas carreiras, com a perspetiva de evolução profissional que continua a estar cerceada, de combate à precariedade, à falta de pessoal nos serviços públicos.

Entendemos que é preciso uma política que enfrente, de facto, o constrangimento da dívida com a sua renegociação, porque necessitamos, como de pão para a boca, dos recursos que hoje são despendidos com os juros da dívida e que ficam a fazer falta no apoio aos setores produtivos, à nossa agricultura, às pescas, à indústria, que ficam a fazer falta para uma política de investimento público que contrarie a degradação, a obsolescência de equipamentos e infraestruturas que, particularmente nos últimos quatro anos, com o Governo do PSD e do CDS, foi imposta de uma forma dramática e que, hoje, condiciona o funcionamento de serviços públicos, que condiciona as capacidades de desenvolvimento das nossas atividades económicas. É óbvio que esses recursos que são gastos com os juros da dívida ficam a fazer falta para esses objetivos.

Continuamos a afirmar a necessidade de uma política que enfrente também o grande capital e o domínio do capital monopolista, particularmente nos setores estratégicos onde esse domínio do capital monopolista, sobretudo do capital estrangeiro, continua a condicionar e a determinar aspetos essenciais da nossa vida nacional e da situação económica.
Portanto, Sr. Ministro, obviamente que estes são elementos que registamos como justificações, são elementos que fundamentam limitações e insuficiências que noutro plano acabam por se registar naquilo que o Orçamento prevê, ou seja, na resposta a problemas económicos e sociais, a problemas estruturais do País.

Relativamente ao segundo conjunto de questões que suscitei, é óbvio que, para o PCP, pesa na avaliação do Orçamento do Estado o processo de recuperação de direitos e de rendimentos, que prossegue, e para a qual a luta dos trabalhadores e do povo foi, e continua a ser, decisiva.

A proposta de Orçamento do Estado, além de não retomar opções de agravamento da exploração e do empobrecimento, que estariam em curso se o Governo do PSD e do CDS tivesse tido condições para se manter em funções e se continuasse a desenvolver a sua política, confirma também e consolida avanços alcançados em 2016.

Pela primeira vez desde 2010, estamos a falar de um Orçamento do Estado que aponta, para um ano inteiro, a recuperação de salários e pensões sem um único corte. Parece que, afinal de contas, o CDS, hoje, já «mordeu a língua» relativamente ao fim dos cortes nas pensões e que a Sr.ª Deputada Assunção Cristas, com a intervenção que acabou de fazer, já critica a própria proposta que o CDS apresentou aqui, no final de 2015, para acabar com a CES (contribuição extraordinária de solidariedade). É mais uma incoerência do CDS mas que não deixa de relevar para aquilo que é decisivo.

É que, afinal de contas, como se costuma dizer, com a verdade nos enganam. Afinal de contas, o CDS confirma, com esta apreciação que hoje aqui faz, que preferia que se mantivessem os cortes impostos com a CES e que a perspetiva que o CDS tem relativamente às pensões não é de assegurar aumentos, não é de assegurar a recuperação do poder de compra, é a de continuar a impor cortes, particularmente aqueles cortes que correspondem a pensões do regime contributivo, a pensões que correspondem a descontos que, durante anos, os pensionistas fizeram para um regime contributivo que o CDS pretende liquidar para favorecer o negócio privado com as pensões.

Registamos que este é um Orçamento que consolida a reposição do horário de trabalho de 35 horas e dos feriados, que consolida o compromisso de atualização do IAS com o aumento generalizado das prestações sociais, que consolida a redução do IVA da restauração contra aquela que foi uma medida verdadeiramente liquidadora de um setor de atividade do nosso País, que consolida medidas de apoio aos desempregados de longa duração, que, de resto, foram incluídas no Orçamento do Estado para 2016 por proposta do PCP.
Sabemos que se o PSD e o CDS tivessem tido oportunidade nenhuma destas medidas veria a luz do dia e estaríamos hoje a discutir um Orçamento de continuação do agravamento da situação que foi criada durante os quatro anos de Governo do PSD e do CDS.

Sr. Ministro das Finanças,

Consideramos que esta proposta de Orçamento do Estado, não sendo aquela de que o País precisa, abre, no entanto, a possibilidade, que não deve ser subestimada ou desperdiçada, de repor e conquistar direitos.

Já fizemos referência àquilo que são medidas que, em nosso entender, apesar de insuficientes, vão no sentido da reversão das restrições impostas a direitos e remunerações dos trabalhadores da Administração Pública, que, estamos convictos, na especialidade, terão de ter uma resposta mais alargada no sentido dessa reversão.

Refiro ainda as medidas que têm a ver com a introdução de uma opção de tributação do património imobiliário de valor mais elevado,que, obviamente, também na especialidade, poderão ser desenvolvidas, melhoradas e corrigidas em alguns dos seus aspetos.
Um outro elemento que, obviamente, Sr. Ministro, registamos como muito importante tem a ver com o avanço na gratuitidade dos manuais escolares, com tudo o que isso significa e com tudo o que isso tem de simbólico no avanço para uma escola pública gratuita.

Outra questão, ainda, tem a ver com as pensões, Sr. Ministro. Na matéria relacionada com pensões, apesar de a proposta que foi incluída no Orçamento do Estado não corresponder àquela pela qual o PCP se bateu e apesar de continuarmos convencidos de que a proposta de aumento de 10 € para todas as pensões era aquela que, de forma mais justa, correspondia às aspirações e aos anseios dos pensionistas, que permitia uma valorização, do ponto de vista percentual, mais significativa das pensões mais baixas, sem deixar de valorizar também pensões que correspondem a carreiras contributivas para as quais os pensionistas fizeram os seus descontos e que, ao contrário do CDS, o PCP entende que são pensões que devem ser também valorizadas, apesar de continuarmos convencidos de que essa era a proposta que, de forma mais evidente e adequada, correspondia aos anseios e aspirações dos reformados e pensionistas, não desvalorizamos uma proposta que significa que cerca de 98% das pensões do regime geral da segurança social e da Caixa Geral de Aposentações terão um aumento em 2017, sendo que 85% das pensões do regime geral da segurança social podem estar em condições de registar esse aumento de 10 €. É uma proposta que temos de valorizar, porque aponta, de facto, uma perspetiva de reversão da política de empobrecimento dos reformados e dos pensionistas, que PSD e CDS impuseram.

Para terminar, Sr. Ministro, queria colocar-lhe três questões concretas, a primeira das quais tem a ver com contratos de energia. Ficámos, ontem, a saber, por via de uma estimativa feita pela ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos), que a Galp, apenas em contratos celebrados com a Nigéria, acumulou, entre 2010 e 2016, 476 milhões de euros de rendas que, na nossa perspetiva, devem ser eliminadas, revertendo a favor dos consumidores, revertendo a favor das famílias e das empresas, traduzindo-se na redução das tarifas. A proposta de Orçamento do Estado aponta já uma perspetiva relativamente à garantia de potência, mas queríamos também colocar, sobre esta questão que tem a ver com os contratos de energia, a perspetiva de se poder avançar no sentido daqueles objetivos.

A minha segunda questão tem a ver com a contratação de assistentes operacionais nos serviços públicos. São inúmeras as carências e insuficiências que se vão verificando em serviços públicos em virtude da falta de assistentes operacionais. Registamos que, com a insistência que tem sido feita, com a denúncia e a proposta de soluções para estas questões, o Governo tenha já assumido o compromisso de assegurar a contratação de assistentes operacionais nas escolas, para responder a problemas urgentes que ali estão colocados. Gostávamos também de ter uma perspetiva, da parte do Governo, num quadro mais alargado e até no quadro do combate à precariedade em relação à contratação de assistentes operacionais.

Por fim, Sr. Ministro, refiro uma matéria relativamente à qual o PCP suscitou a discussão no Orçamento do Estado para 2016 e que não queríamos deixar de assinalar também no início do debate deste Orçamento. Refiro-me à redução do pagamento especial por conta (PEC).
Consideramos que a perspetiva de redução do pagamento especial por conta, com o objetivo da sua eliminação e da sua substituição por um mecanismo de tributação mais justo para as pequenas e médias empresas, é uma medida fundamental de estímulo e apoio às pequenas e médias empresas. No Orçamento do Estado para 2016 propusemos uma redução para 850 € e estamos convencidos de que esta era uma matéria em que, havendo também algum avanço na especialidade, se poderia corresponder com uma importante medida que vai ao encontro dos anseios e das aspirações das pequenas e médias empresas e, naturalmente, com um impacto económico muito significativo.

Disse.

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