Projecto de Lei N.º 254/XIII/1.ª

Retira à Autoridade Tributária a competência para a cobrança coerciva de taxas moderadoras

Retira à Autoridade Tributária a competência para a cobrança coerciva de taxas moderadoras

Exposição de Motivos

O Serviço Nacional de Saúde está desde há muito confrontado com enormes dificuldades. Tal facto vem sendo denunciado pelo PCP e reconhecido quer pelos profissionais, quer pelos utentes cujos testemunhos adensam as nossas preocupações e voltam a legitimar a intervenção.
A situação, tal como temos vindo a alertar é o reflexo da política de direita levada a cabo por sucessivos governos, que protagonizaram as opções que têm conduzido à degradação do Serviço Nacional de Saúde.
Escolhas que se afastam dos princípios que instituíram o Serviço Nacional de Saúde, e que não asseguram em toda a plenitude o direito à saúde, tal como consagrado na Constituição da República Portuguesa.
Continuam a surgir inúmeros relatos que põem a descoberto os problemas no Serviço Nacional de Saúde e revelam uma realidade que atenta a sua especificidade e exigências de resposta se confronta com a escassez de meios, quer humanos quer materiais o que põe em causa a eficácia e a qualidade dos serviços prestados.
Na discussão do Orçamento do Estado para 2016, o PCP reafirmou a necessidade de inverter o rumo de ataque ao Serviço Nacional de Saúde, tendo apresentado propostas nesse pressuposto.
Reconhecendo alterações positivas nesta matéria, no que diz respeito ao alargamento dos casos de isenção e dispensa de pagamento de taxas moderadoras, não se deve perder de vista o objetivo central, ou seja, de eliminação total das taxas moderadoras, que constituem um verdadeiro co – pagamento. Ao pretexto da moderação do recurso aos serviços de saúde que foi utilizado para justificar a criação das taxas moderadoras, e a que o PCP sempre se opôs por considerar que constituem um obstáculo no acesso à saúde, junta-se o argumento da pretensa garantia de sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde.
Distanciamo-nos destes não só por defendermos o acesso universal do direito à saúde, e verdadeiramente gratuita mas por consideramos que a coberto de tais argumentos se concretiza uma inaceitável transferência dos custos da saúde para os utentes.
Segundo os dados do último Inquérito às Despesas Familiares realizado pelo INE em 2011, cada agregado familiar gastou em saúde 1.186 euros. Se atualizarmos os dados para 2014 de acordo com a taxa de inflação acumulada na saúde (3,86% nos últimos 3 anos), esse valor passa para 1.230 euros, qualquer coisa como 28% da despesa total em saúde o que é cerca dos 16.000 milhões de euros.
Considerada fonte de receita para o Estado as taxas moderadoras têm à sua disposição os meios coercivos para a sua efetivação, transformando o utente em infrator quando este falte ao seu pagamento.
O Decreto – Lei nº 128/2012, de 21 de junho integra no Decreto – Lei nº 113/2011, de 29 de novembro, o regime das contraordenações já previsto na Lei nº 64-B/2011, de 30 de dezembro.
Na redação mais recente é referido que, constitui contraordenação, punível com coima, o não pagamento pelos utentes, no prazo de 10 dias seguidos após notificação para o efeito, das taxas moderadoras devidas pela utilização dos serviços de saúde num período de 90 dias, em cada uma das entidades referidas no artigo 2º.
A Autoridade Tributária (AT) constitui a entidade competente para a instauração e instrução dos processos de contraordenação, bem como para a aplicação da coima.
Instaurado o respetivo processo de execução fiscal compete à Autoridade Tributária (AT) promover a cobrança coerciva dos créditos compostos pelas taxas moderadoras, coima e custos administrativos, sendo aplicável às referidas contraordenações o Regime Geral das Infrações Tributárias.
O PCP discorda desta alteração, que trata os utentes como infratores e que institui como contraordenação o não pagamento das taxas moderadoras.
Sendo por demais conhecida a posição de princípio do PCP relativamente às taxas moderadoras, o presente projeto de lei não colide com a intenção de extinguir as taxas moderadoras.
A circunstância de divergirmos quanto à sua criação e implementação não significa que não se alcançando a sua eliminação se não possa contribuir para aliviar os impactos das taxas moderadoras junto da população.
Nesse sentido, propomos a revogação do artigo 8º - A do Decreto – Lei nº 113/2011, de 29 de novembro através do qual se define como contraordenação o não pagamento de taxas moderadoras devidas pela utilização dos serviços de saúde. Instituímos ainda um regime especial para regularização de eventuais processos pendentes.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1º
Objeto
A presente lei retira à Autoridade Tributária (AT) a competência para instauração, instrução e cobrança de processos relativos ao não pagamento de taxas moderadoras.

Artigo 2º
Falta de pagamento de taxas moderadoras
A falta de cumprimento do disposto no nº 3 do artigo 7º do Decreto – Lei nº 113/2011, de 29 de novembro, pelo prazo aí estabelecido ou por outro mais alargado, não se integra no conceito de infração tributária, nem constitui contraordenação.

Artigo 3.º
Processos pendentes
1 - Nos processos pendentes para cobrança nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, caso o utente não proceda ao pagamento da taxa moderadora em dívida no prazo de 30 dias após a receção da notificação, o respetivo cumprimento deixa de ser judicialmente exigível.
2 – O prazo previsto no n.º anterior é contado a partir da entrada em vigor da presente lei para os casos em que a notificação seja anterior a essa data.
3 – O pagamento da taxa moderadora em dívida nos termos do presente artigo determina o arquivamento do processo de execução fiscal, bem como a extinção do procedimento por contraordenação, não sendo devidos quaisquer outros montantes a título de custas ou encargos respeitantes a tais processos.
4 – O disposto nos números anteriores não prejudica a possibilidade de impugnação da obrigação de pagamento da taxa moderadora por parte do utente, pelos meios legalmente admissíveis, caso em que o referido pagamento é efetuado a título de caução.

Artigo 4.º
Norma revogatória
É revogado o artigo 8º-A do Decreto–Lei nº 113/2011, de 29 de novembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto–Lei nº 117/2014.

Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, em 1 de junho de 2016

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