Declaração de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral

Sobre a Cimeira dos Açores

1. O PCP regista a atitude digna e responsável do Conselho de Segurança da ONU (já conhecida através de declarações do Embaixador inglês da ONU) de não ajoelhar face ao ultimatum e à chantagem dos EUA e dos seus acólitos europeus que, de forma clara e iniludível, ao longo dos últimos meses sempre apenas reservaram para a ONU o papel de submisso notário dos projectos de agressão e dos planos de guerra há muito concebidos e decididos pela Administração Bush.

2. O PCP reafirma a sua profunda convicção de que a grande maioria dos portugueses compartilha de uma viva indignação e revolta pela associação do nome de Portugal a uma Cimeira que representou o sinal de partida para uma guerra cruel e devastadora, que espezinha princípios elementares do direito internacional e que só poderá agravar em extremo os factores de tensão e insegurança internacionais.

O PCP reafirma como uma atitude chocante e clamorosamente ofensiva dos sentimentos da maioria do povo português os últimos passos dados pelo Governo PSD-CDS/PP, com o seu envolvimento na Cimeira dos Açores, e que, de forma irresponsável e desnecessária, associaram Portugal ao grupo de países que, sob as ordens de Bush, será historicamente culpado do desencadeamento de uma guerra de terríveis efeitos políticos, de dramáticas consequências humanas e de agravamento da situação económica internacional com graves reflexos na economia portuguesa. O PCP sublinha ainda que, sendo conhecidas as diferenciadas posições do Presidente da República, quer o acordo do Governo português para a realização da Cimeira em território nacional quer a presença, como parceiro menor, de Durão Barroso naquele conclave, quer ainda as suas declarações de que se Portugal estivesse no Conselho de Segurança votaria uma nova Resolução, representam uma atitude deliberada de um ainda mais ostensivo afrontamento ao Presidente da República que não deveria ser tolerado.

3. O PCP salienta que está hoje ainda mais à vista que, tanto no discurso da Administração Bush como também no discurso do Governo português, as referências a soluções políticas e diplomáticas, e designadamente no quadro da ONU, só se explicam como inseridas no propósito de fugir ao isolamento, como concessões que tiveram de fazer ao movimento de opinião mundial contra a guerra e como manobras para tentarem atrelar o Conselho de Segurança ao desencadeamento de uma guerra dita «preventiva» mas que seria totalmente ilegítima e ilegal face à própria Carta das Nações Unidas.

Está hoje ainda mais à vista que o desarmamento do Iraque nunca foi o real objectivo da Administração Bush e que o seu principal propósito sempre foi sim o derrubar o regime iraquiano, instalar um protectorado norte-americano no Iraque e controlar as suas riquezas petrolíferas.

4. O PCP reputa do maior cinismo que seja agora à beira do desencadeamento de uma nova guerra que os EUA venham fazer promessas de solução do conflito israelo-palestiniano quando está viva na memória do mundo árabe e da opinião pública mundial a prolongada cumplicidade da Administração Bush com a criminosa política de Ariel Sharon, com o desrespeito da parte de Israel de sucessivas Resoluções da ONU e com o sangrento espezinhamento dos direitos nacionais do povo palestiniano.

5. O PCP considera indispensável uma firme condenação do Governo pelas suas responsabilidades por uma política que envergonha Portugal e que constitui um dos momentos mais sombrios e desprestigiantes da intervenção do nosso pais na cena internacional depois do 25 de Abril de 1974, uma vez que o Governo português fica associado a uma guerra desencadeada unilateralmente que contraria as posições do Conselho de Segurança e as opiniões dos próprios Inspectores da ONU e que não tem qualquer cobertura na Resolução 1441.O PCP apela a todos os portugueses vinculados aos valores da liberdade, da dignidade nacional e da paz para que, além para além de outras formas imediatas de condenação da atitude do Governo, assegurem o êxito das manifestações que, como por todo o mundo, se deverão realizar em Portugal , em princípio no primeiro sábado a seguir ao desencadeamento da guerra.

Finalmente, e com vista a dar expressão institucional à indignação e ao protesto populares contra o envolvimento político do Governo na agressão ao Iraque, o PCP anuncia que apresentará na Assembleia da República uma moção de censura ao Governo, considerando ainda que a extraordinária gravidade do comportamento do Governo PSD/CDS-PP, nesta questão crucial plenamente justificaria que os partidos de oposição (PCP, PS, Verdes e BE) chegassem a acordo sobre um texto comum.

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