Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

"Não há trabalhadores a mais nos serviços públicos. Há trabalhadores a menos!"

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
A receita não é nova, é, na verdade, bem antiga — retirar funções aos trabalhadores, impor perda de direitos e salários, pressionar psicologicamente para forçar as rescisões ditas amigáveis a que hipocritamente chamam de rescisões por mútuo acordo. Foi exatamente isto que o Governo PSD/CDS impôs e que em pouco mais de um mês, entre junho e julho de 2013, queria literalmente despachar. O Governo PSD/CDS, em vésperas do mês de agosto, queria despachar um regime de despedimento de trabalhadores da Administração Pública tal era a pressa de despedir funcionários públicos, degradar e privatizar serviços e funções sociais do Estado. O exemplo mais acabado pode bem o Deputado Pedro Mota Soares, do CDS, então Ministro, aqui hoje apresentar. Enquanto Ministro do CDS enviou para a antecâmara do despedimento cerca de 700 trabalhadores, que não eram excedentários, eram essenciais para o funcionamento dos serviços da segurança social. Chegou mesmo ao ponto de enviar para a requalificação presidentes de comissões de proteção de crianças e jovens, membros de equipas multidisciplinares de apoio aos tribunais, pessoas com deficiência e doentes oncológicos. Sr. Presidente e Srs. Deputados, entre 2011 e 2015, saíram da Administração Pública 78 000 trabalhadores e, se recuarmos a 2005, saíram 100 000 trabalhadores. Mas o anterior Governo, PSD/CDS, achou pouco e assumiu o objetivo de despedir 30 000 trabalhadores. Não temos dúvidas em afirmar que não há trabalhadores a mais nos serviços públicos, há trabalhadores a menos, e é preciso garantir que a um posto de trabalho permanente corresponde um vínculo efetivo. O PCP sempre rejeitou os ditos regimes de mobilidade especial da autoria do anterior Governo do PS e, depois, o regime dito de requalificação do PSD e do CDS. Defendemos um regime de valorização do emprego público, de vínculos, de carreiras e de remunerações que assegurem serviços públicos que respondam às necessidades das populações e cumpram as funções sociais do Estado. Não é possível recordar este processo sem falar do guião para a reforma do Estado do Dr. Paulo Portas e do que isso pervertia as funções sociais do Estado consagradas na Constituição. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este debate é a prova provada de que valeu e vale a pena lutar. Os trabalhadores lutaram muito contra esta medida durante os últimos três anos. Em janeiro de 2014 e em fevereiro de 2015, trouxemos esta mesma proposta à discussão na Assembleia da República, a revogação do regime de requalificação, e à data, por duas vezes, a maioria absoluta do PSD e do CDS rejeitaram-na. Hoje, corrigimos uma injustiça e damos um passo na reposição de direitos. Pela nossa parte, cá estaremos para ir mais longe na valorização do emprego público, lutando pelo fim do descongelamento das carreiras, pelo aumento dos salários, pelo combate à precariedade e pela defesa do emprego com direitos. É para isso que cá estamos!
(...)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Com muita sinceridade, eu não tinha a ilusão de achar que o CDS e o PSD viessem pedir desculpa aos funcionários públicos, porque aquilo que fizeram, fizeram-no com deliberada intensão, que foi despedir funcionários públicos. Não vínhamos com a ilusão de ouvir isso do CDS.

Mas, Sr. Deputado, também lhe digo, com muita franqueza, que não estava à espera de o ouvir chamar Diabo ao seu colega de bancada, que fez os trabalhadores da segurança social comerem «o pão que o diabo amassou», porque, efetivamente, isso é que é inaceitável.

Convido-o a virar-se só um bocadinho para o lado e perguntar ao seu colega de bancada, então ministro do CDS, se os doentes oncológicos, as pessoas com deficiência, os presidentes de comissões de proteção de crianças e jovens em risco, os membros da segurança social que integravam equipas multidisciplinares de apoio aos tribunais eram excedentários e não faziam falta. Sr. Deputado, da nossa parte, sabemos que não há funcionários públicos a mais, há funcionários públicos a menos, porque o que está previsto na Constituição, quanto às funções sociais do Estado, à existência de uma escola pública de qualidade, de uma segurança social universal e solidária, de um Serviço Nacional de Saúde, exige funcionários públicos e, por isso, cá estaremos.
Vou concluir, Sr. Presidente. Hoje, cumpre-se uma decisão fundamental de respeito pela luta dos trabalhadores. Não foi um milagre, foi a luta dos trabalhadores que nos obriga, hoje, com outra correlação de forças na Assembleia da República, a revogar o regime inaceitável e, da parte do PCP, a iniciar um caminho de valorização do trabalho e dos trabalhadores.

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