Intervenção de Jos D'haese, Especialista em ambiente e activista. Líder Parlamentar do PTB-PVDA - Bélgica, Seminário «O Capitalismo não é verde. Uma visão alternativa sobre as alterações climáticas»

«Mobilizar-se para o clima significa procurar mudanças no sistema»

«Mobilizar-se para o clima significa procurar mudanças no sistema»

Mobilizar-se para o clima significa procurar mudanças no sistema.

Em 29 de Dezembro, duas meninas belgas lançaram um pedido de greve de estudantes em defesa do clima. Estavam zangadas com a falta de políticas climáticas do nosso Governo. Inspiradas pelo exemplo da sueca Greta Thunberg de dezasseis anos, que começara uma greve semelhante no seu país. Ninguém esperava uma grande participação. As próprias jovens esperavam a presença de algumas dezenas de pessoas. Queriam apenas assinalar que elas se preocupavam.

Mas duas semanas depois, o país ficou surpreendido ao ver pelo menos três mil crianças em idade escolar marcharem pelas ruas de Bruxelas numa manifestação não autorizada, mas entusiástica. Na semana seguinte, 12500 saíram às ruas. Em 24 de Janeiro, desfilaram trinta e cinco mil jovens em idade escolar, exigindo uma política climática ambiciosa. Prosseguiram durante 22 semanas, até às eleições de 26 de Maio. No dia 15 de Março, os jovens organizaram a primeira greve climática em colaboração com os sindicatos.

Apenas um mês antes do início do movimento, este cenário era totalmente impensável. Em Dezembro, as manchetes eram dominadas pela extrema- -direita, pois o Governo da Bélgica caíra em torno da assinatura de um pacto das Nações Unidas sobre migração. Quando foram convocadas as eleições para 26 de Maio, esperávamos uma campanha em torno da migração, da segurança nacional e do nacionalismo. Com estas massivas mobilizações, os estudantes e o movimento climático conseguiram transformar essa perspectiva. O clima tornou-se uma das principais questões nas eleições, juntamente com a política social.

Tem sido um movimento histórico. E, a propósito: são grandes as probabilidades de que continue nos próximos meses. Foi o maior movimento de estudantes das escolas secundárias dos últimos 25 anos, na Bélgica. Primeiro, os alunos do ensino secundário juntaram-se, depois os seus professores e finalmente os sindicatos. O exemplo belga juntou-se a Greta Thunberg e às iniciativas de outros para inspirar centenas de milhares de pessoas no resto da Europa e no mundo a saírem para a rua e fazerem-se ouvir. Tem sido incrível ver o quanto esses jovens aprenderam em poucos meses, organizando-se e lutando por aquilo em que acreditam. Eles são os líderes dos movimentos sociais do futuro.

Esse movimento desafia o modo como a nossa economia está sendo gerida, o modo como o nosso sistema político funciona.

Permitam-me que cite Greta Thunberg, que iniciou todo o movimento. Ela disse à Comissão Europeia: «Depois de fazerem os vossos trabalhos de casa, perceberão que precisamos de novas políticas. Precisamos de novas economias, onde tudo se baseie num orçamento global de carbono em declínio extremamente rápido e muito limitado. Mas isso não é suficiente. Precisamos duma nova maneira de pensar. O sistema político que vocês criaram gira à volta da concorrência. Vocês fazem trapaça sempre que podem, porque tudo o que vos importa é vencer, obter poder. Isso tem de acabar. Precisamos de parar de competir entre nós. Precisamos de cooperar e trabalhar em conjunto, partilhando os recursos do planeta de maneira justa».

Mas o movimento climático também tem um ponto fraco: é representado na política por partidos Verdes que promovem uma ecologia punitiva. Focam-se na responsabilidade individual e nos impostos verdes. Portanto os trabalhadores têm a impressão de que terão de pagar pela crise climática. Por isso a participação dos sindicatos é tão importante. Juntos, podem exigir uma transição ecológica ambiciosa e socialmente justa. A «justiça climática agora» é uma das palavras de ordem mais populares nas manifestações climáticas.

Mas é também por isso que é tão importante que a esquerda europeia abrace a questão climática.

Antes de tudo, porque o clima é importante. Se os nossos governos não agirem agora, tudo permanecerá inalterado. Podemos ver em toda a parte as consequências do aquecimento global em um grau. Imaginem como será uma subida de temperatura em 3,4,5 graus. Temos que parar as alterações climáticas e, portanto, precisamos de apoiar o movimento climático de todas as maneiras possíveis.

E depois porque é nosso dever orientar o movimento na direcção da justiça social e vinculá-lo aos trabalhadores. Cabe-nos esclarecer que, para salvar o clima, precisamos de mudar o sistema.

Como Naomi Klein diz: «A nossa economia está em guerra com muitas formas de vida na Terra, incluindo a vida humana. O que o clima precisa para evitar o colapso é uma contracção no uso humano dos recursos. O que o nosso modelo económico exige para evitar o colapso é uma expansão irrestrita. Apenas um desses conjuntos de regras pode ser alterado e não são as leis da natureza». O nosso sistema económico está em guerra com a vida na Terra.

Há pessoas responsáveis pela crise climática: as que possuem os meios de produção, as que determinam a direcção da nossa economia. E há pessoas que sofrem as consequências: as pessoas que trabalham e não têm meios para se adaptar. Como dizem nos sindicatos: não há empregos num planeta morto. Os ricos e abastados não terão qualquer problema em adaptar-se às mudanças climáticas. Será a classe trabalhadora que sofrerá as consequências duma atmosfera em aquecimento.

Há já alguns anos que integramos a luta contra as mudanças climáticas no trabalho do nosso partido. Isso significa que, nos primeiros anos,trabalhámos duro para produzir um programa climático muito ambicioso, mas também detalhado, baseado em três eixos:

- Antes de tudo, exigimos uma planificação ecológica. É o mercado livre que nos trouxe até aqui, logo como poderia ser ele a resolver esse problema? Em vez do comércio de emissões, pedimos regulamentação, iniciativas públicas e planeamento com base na quantidade de CO2 que ainda podemos emitir.

Em segundo lugar:todas as medidas têm de ser ecologicamente justas. Não é a classe trabalhadora que tem que pagar para salvar o planeta, mas as multinacionais responsáveis pelo aquecimento global. Por isso opomo-nos firmemente a impostos verdes e sobre kilometragens, defendendo antes sistemas de transporte público melhores e gratuitos e sistemas de pagamento por terceiros para isolamento de residências e painéis solares.

Terceiro e muito importante: enfatizamos a importância de proteger os empregos.

Não queremos afastar a nossa indústria. Queremos torná-la um trunfo para a luta contra as mudanças climáticas. Uma economia baseada no hidrogénio será um factor crucial para isso.

Mas não parámos depois de terminar a análise e redigir um programa. O nosso partido, e especialmente o nosso movimento juvenil, está apoiando o movimento climático de maneira muito concreta e de diferentes maneiras.

- através da consciencialização. Com publicações e folhetos, mas também nas redes sociais com vídeos que foram vistos dezenas de milhares de vezes. Explicando a mudança climática, defendendo o movimento contra os ataques da direita, pedindo mudanças no sistema. Raoul Hedebouw, o chefe do nosso Grupo no Parlamento Federal, foi o primeiro a trazer as exigências do movimento pelo clima para o Parlamento, fazendo ouvir a sua voz.

- ajudando a organizar o movimento. Muitos membros de nossos movimentos de jovens e estudantes criaram comités nas suas escolas e ajudaram a organizar as marchas.

Mobilizando-nos pelo clima. Em primeiro lugar, naturalmente, mobilizando as nossas próprias forças. Estivemos presentes, em grande número, em quase todas as marchas climáticas dos últimos anos. Mas também apoiando o movimento climático onde quer que possamos ajudar a trazer um grande número de pessoas para as ruas.

Fazendo-o, o nosso movimento juvenil cresceu significativamente. O número de membros aumentou seis vezes. Ainda é um desafio organizar todas essas pessoas, mas o potencial é enorme. Como eu já disse: os estudantes que estão organizando as marchas hoje são os líderes dos movimentos sociais de amanhã.

Com o Partido dos Trabalhadores da Bélgica, acreditamos que a luta contra as mudanças climáticas deve estar no centro de nossa estratégia política. Temos de preservar este planeta para as gerações vindouras e deixar claro que salvar o clima significa mudar o sistema.