Intervenção de Charalampos Angourakis, deputado do PC Grego ao Parlamento Europeu, Debate «Estratégia da União Europeia 2020»

"A luta popular, o enraizamento nos locais de trabalho e a solidariedade proletária internacionalista podem fazer fracassar a estratégia UE 2020"

Em nome do CC do Partido Comunista da Grécia quero agradecer-vos pelo convite para participar nesta reunião de tão grande actualidade.

Transmito-vos uma saudação calorosa dos comunistas gregos, da classe operária do meu país em luta. Um grande obrigado pelo vosso imenso interesse, pela simpatia e solidariedade dos comunistas portugueses, dos trabalhadores de Portugal, dos comunistas e de outros amigos na Europa.

Nestes dias milhões de trabalhadores gregos, de pequenos empresários, de camponeses pobres, e muitos jovens, desempregados, trabalhadores sem papéis, estão em greve e têm-se manifestado com a PAME em todas as cidades do país.

Exprimiram a sua cólera contra as medidas verdadeiramente bárbaras impostas pelo grande capital, pelo governo grego, pela UE e pelo Fundo Monetário Internacional sob o pretexto de «salvar» a Grécia. Procuram, com o terror mediático, ideológico e nos locais de trabalho, com a chantagem e o anticomunismo, impor a aplicação a partir da Grécia da famosa Estratégia 2020 da União Europeia, que é de facto o nosso assunto hoje.

Para ter uma ideia do que se trata, recordo-vos que a famosa ajuda é de 110 mil milhões de euros em três anos, ao passo que com as novas medidas os trabalhadores terão de pagar mais 45 mil milhões de euros daqui até 2014. A Grécia está endividada apesar de, desde 1990, o PNB ter aumentado 5,5 vezes e os lucros das grandes empresas terem aumentado 28 vezes; os bancos e os grandes empresários já receberam 28 mil milhões de euros em nome da crise, e os lucros das maiores empresas gregas são colossais. Desde 1990 os salários só aumentaram uma vez.

Cada vez mais pessoas participam nas mobilizações actuais, porque têm cada vez mais a certeza de que o desenvolvimento capitalista só pode gerar crises, desemprego e pobreza para a grande maioria. Apercebem-se, graças à militância mas também graças a um trabalho político de massas do partido, que a crise não é somente grega ou dos países chamados PIIGS, mas sim do capitalismo na Europa e no mundo.

Pensamos que a participação maciça é a demonstração de que estas medidas, mesmo que sejam adoptadas, nunca serão aceites pela grande maioria dos trabalhadores.

E tudo isto apesar do terror nos locais de trabalho e dos enormes esforços dos patrões, porta-vozes do capital e apoiantes da UE a todo o custo.

A situação actual tem confirmado em massas muito amplas a posição expressa desde há anos pelo nosso partido de que a União Europeia e a Eurozona, a concorrência desenfreada, são verdadeiros tiranos para os povos ao serviço do patronato.

A diminuição brutal dos salários e a redução dos direitos à segurança social impostos pela UE, o FMI e o BCE, pelo PASOK, que os fez votar ontem com o apoio de facto da ND e o muito grande apoio do LAOS, da extrema-direita, é um assunto que infelizmente não diz respeito apenas à Grécia, mas antes a todos os trabalhadores da UE, que são chamados a pagar a crise capitalista.

As medidas decididas não são nem novas nem provisórias. O memorando do governo grego é muito claro, falando de medidas suplementares, «se necessárias». São medidas impostas pelas leis do desenvolvimento capitalista, que conduz de crise em crise.

O pacote de ajudas é destinado àqueles que causaram o défice exorbitante, ou seja, o patronato grego e europeu, porque os grandes buracos orçamentais são o resultado da abertura dos mercados após Maastricht, da destruição do tecido industrial e agrícola tradicional, dos enormes créditos aos patrões para promover o «desenvolvimento», o resultado do desperdício dos chamados programas de coesão ou dos fundos estruturais da UE. E também das despesas militares exorbitantes para a NATO. Todas as suas medidas foram tomadas com base nas disposições do tratado de Maastricht e da Estratégia 2020.

Face a esta situação, o KKE procura convencer a grande maioria no nosso país, sobretudo agora, num momento em que a crise capitalista se exprime com tal violência, de que existe outra alternativa. É o caminho da reorganização do movimento operário assente numa orientação de classe, é a necessidade de nos desembaraçarmos dos líderes sindicais comprometidos, de nos desembaraçarmos dos partidos políticos ao serviço do capital e da UE.

Pensamos que existe riqueza para um trabalho e uma vida que correspondam ao nível das necessidades populares. Militamos por soluções radicais, contra as supranacionais e os organismos ao serviço do imperialismo, por uma sociedade ao serviço dos produtores de toda a riqueza, por um poder popular desembaraçado dos monopólios e dos capitalistas.

Estamos optimistas porque este enorme movimento operário e popular foi realizado apesar da polémica e do anticomunismo dos sindicatos oficiais, apesar dos muito grandes esforços da social-democracia e do PEE para esconder o carácter da crise e as suas raízes, apesar dos actos de provocação aberta contra o nosso partido e a PAME. Apesar do atentado criminoso que custou a vida a três trabalhadores aterrorizados pelo patronato.

A Estratégia UE 2020 constitui o prolongamento da Estratégia de Lisboa, com as adaptações necessárias que respondem às necessidades do capital europeu, que se formaram no quadro da crise capitalista, com o olhar virado sobretudo para o período de regeneração que se seguirá à recessão.

A Comissão Europeia não o esconde, afirmando: «Ela apoia-se nas realizações da Estratégia de Lisboa, nas vantagens tiradas da resposta coordenada dada à crise pelo plano europeu de relançamento económico.»

Ela implica o plano dos monopólios para reforçarem as suas posições no antagonismo mundial intra-imperialista, que agravará ainda mais a fase de saída da crise capitalista. As reformas antioperárias efectuadas pelos Estados-Membros e pelo conjunto da UE para fazer face crise à capitalista visarão atirar todo o peso das consequências sobre a classe operária e as camadas populares. Elas são consideradas pelos estados-maiores da plutocracia como um «acervo» (acquis) para o capital, sobre o qual se construirão medidas antipopulares ainda mais duras.

A Comissão Europeia adoptou a Estratégia 2020 após ter recolhido o parecer das organizações colectivas dos capitalistas, dos diversos sectores do capital e das organizações sindicais europeias vendidas.

Em nossa opinião, as prioridades essenciais da Estratégia Europa 2020 no fundo não se diferenciam das da Estratégia de Lisboa. Para impedir qualquer falsa interpretação, a Comissão é muito clara: «A conservação da economia social de mercado», a qual orienta estímulos a investimentos para valorizar a inovação e modos alternativos de empresariado (ONG, empresas municipais, estruturas informais de assistência social, etc.) com o objectivo de dar uma nova dinâmica ao desenvolvimento capitalista.

Trata-se de uma estratégia única do capital, que deve ser promovida com base num plano único em todos os Estados-Membros, naturalmente adaptado ao diferente nível de desenvolvimento capitalista.

O factor essencial da Estratégia Europa 2020 é a valorização «de novas fontes de desenvolvimento», tendo como prioridade principal os sectores da alta tecnologia, onde é mais forte a intensidade da exploração da mão-de-obra, da produção e da mais-valia. Assim, põe-se o acento na educação, na investigação, na inovação e na criatividade.

Quando a UE fala em reforçar a educação, quer dizer mais jovens, não de elevada educação mas sim com conhecimentos básicos, para que o operário de amanhã seja barato e responda às necessidades do capital.

Tem uma importância muito particular o Espaço Europeu de Investigação, o qual, de maneira única e eficaz e com financiamentos públicos, se ligará ainda mais directamente às empresas monopolistas e lhes dará directamente vantagens práticas. É retomado o objectivo da criação de um mercado interno da investigação que será estabelecido com o desenvolvimento de estruturas ao nível da UE e a aplicação inteira da chamada 5.ª liberdade. O peso fundamental assenta no financiamento da «inovação e criatividade» e no «acesso a fontes colectivas públicas e privadas de expansão dos capitais».

Neste quadro, é dada uma importância muito especial à protecção dos direitos intelectuais, a fim de proteger os lucros capitalistas e todo o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, encontrando-se a sua utilização e exploração entre as mãos do capital.

Os estados-maiores da UE prevêem que o desemprego estará acima dos 10% em 2010. Prevêem que «na economia pós-crise, empregos que foram suprimidos não serão substituídos».

Assim, por um lado aponta-se para «uma economia mais inteligente, mais verde e mais competitiva» em domínios e tecnologias de elevado lucro para o capital. Ao mesmo tempo, quer-se demolir o que resta dos sistemas da segurança social, da previdência e protecção, não conservando mais do que uma rede logo antes da miséria, para conter uma explosão social.

É nesta direcção que se deseja dar um carácter permanente e generalizar as medidas antioperárias impostas, aproveitando a crise capitalista. Como indica a Comissão Europeia, a passagem à economia verde «exige um quadro organizacional e de apoio a estas mutações, eventualmente com base em algumas das medidas adoptadas aquando da crise (por exemplo, diminuição das horas de trabalho em relação com a formação)».

No centro deste ataque contra a classe operária está a famosa «flexigurança», ligada a diversas formas de «formação permanente», à «formação e reformação» e à aquisição de «capacidades», mas também à mobilidade da classe operária nos diversos ramos e sectores de produção e ainda entre os diferentes Estados-Membros da UE.

A Comissão sublinha «que serão necessários sistemas modernos de protecção social e de reformas, adaptados à crise e ao envelhecimento da população europeia», dando o pontapé de saída para a sua demolição integral.

A «economia verde» e as «tecnologias verdes», sobretudo no sector energético, parecem hoje ter um lugar preponderante na estratégia do capital europeu e da UE, tendo em conta que dariam uma saída para investimentos de capitais acumulados em novos sectores de lucro «verdes», que a UE considera terem vantagens comparativas no antagonismo monopolista mundial.

Como sublinha a Comissão europeia, «é igualmente importante acelerar a modernização dos ramos industriais existentes na Europa; muitos deles sofrerão uma reestruturação como consequência da crise. Alcançar estes objectivos será decisivo para que a UE seja concorrencial num mundo em que todos os países procurarão soluções para estes desafios».

Evidentemente, o apoio dado ao capital pela UE e pelos Estados-Membros, por meio de financiamentos públicos, será decisivo para realizar esta viragem.
«Num período de reestruturação industrial, a política de ajudas públicas desempenhará um papel determinante para contribuir para a passagem a uma economia mais inteligente, mais verde.»

Para melhor realizar os objectivos estratégicos do capital está prevista uma maior coordenação das políticas económicas dos Estados-Membros que será realizada pelo centro dirigente da UE com base no plano estratégico único do capital.

Neste contexto, preconiza-se a finalização completa e o levantamento de qualquer obstáculo na valorização do mercado único da UE, que funciona como um multiplicador da força do capital europeu no antagonismo imperialista mundial.

Um dos meios fundamentais para atingir este objectivo é a «libertação» ainda mais acentuada do comércio internacional, tanto no quadro da OMC como através do desenvolvimento das relações bilaterais da UE, a fim de, por todos os meios, chantagens económicas e pressões políticas ou até a guerra imperialista a nu, «assegurar os limites dos obstáculos aos fluxos comerciais e aos investimentos internacionais».

Além disso, a estratégia UE 2020 vai continuar a apoiar-se ainda mais fortemente no Pacto de Estabilidade e Crescimento. Este será utilizado para reduzir drasticamente as despesas públicas. Ao mesmo tempo, o objectivo é dirigir ainda mais eficazmente os meios públicos, provenientes da classe operária e das camadas populares por meio da intensificação das rapinas fiscais directas e indirectas, para «investimentos e reformas estruturais».

Por último, sublinha-se a importância decisiva da aplicação única do plano estratégico do capital sem ser posta em perigo por eventuais desacordos secundários dos Estados-Membros. Confia-se à Cimeira europeia o papel de garantir a aplicação única desta política reaccionária na base das novas possibilidades oferecidas na estrutura da UE tal como ela se apresenta com a entrada em vigor do Tratado de Lisboa. Os Estados-Membros deverão apresentar e materializar «objectivos nacionais a 5 anos», e a Comissão e o Conselho Europeu seguirão anualmente os seus «progressos» na realização desses objectivos. Atribui-se um papel específico para apresentar e atenuar as reacções dos trabalhadores à aristocracia operária vendida e às diversas formas da «parceria social» e dos «diálogos sociais».

Para terminar, duas palavras sobre a Grécia.

Basta um simples olhar ao plano da UE Estratégia 2020 e ao programa governamental do PASOK para constatar que o PASOK copia quase palavra a palavra todo o plano estratégico da UE e do capital. Com a diferença de que, enquanto os estados-maiores do capital da UE nem sequer moderam as palavras, do mesmo modo que não moderam as suas ambições, o PASOK, a aristocracia operária e a classe burguesa do nosso país, com o apoio substancial dos partidos da via única europeia, organizaram uma enorme operação de propaganda para apresentar o ataque mais selvagem do capital nestes últimos 30 anos contra a classe operária e as camadas populares como política popular!

Apesar de tudo isso, a revolta popular amplifica-se dia a dia.
Estamos confiantes. Também porque nos lembramos e prestamos homenagem às lutas de todos os povos, aos sacrifícios dos comunistas e da União Soviética há 65 anos contra a barbárie fascista.

Estamos seguros de que a luta popular, o enraizamento nos locais de trabalho e a solidariedade proletária internacionalista podem fazer fracassar a estratégia UE 2020. 

Exprimimos toda a nossa solidariedade com a luta do PCP para defender os direitos e as conquistas da classe operária, para alcançar novos êxitos.

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