Intervenção de

Legislação laboral - Intervenção de Jorge Machado na AR

Declaração política, acusando o Governo de não fazer cumprir a legislação laboral

 

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

É certo e sabido que Portugal tem elevados níveis de trabalho precário.

É certo e sabido que, em Portugal, é sistematicamente violada a lei e são atropelados os direitos dos trabalhadores.

É certo e sabido que o Governo não está particularmente empenhado em fazer cumprir a legislação laboral.

Contudo, questão diferente é quando é o próprio Governo a violar a lei.

Não estamos só a falar de um Governo que tem liderado uma intensa ofensiva contra os trabalhadores, mas também que tem demonstrado que não olha a meios para atacar direitos, mesmo que isso implique violar a lei.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

São muitos os casos concretos em que o Governo, directa ou indirectamente, viola a lei para atacar direitos dos trabalhadores.

Vou dar apenas alguns exemplos.

No passado dia 31 de Agosto, os agentes de leitura da EDP, do distrito do Porto, foram informados, por parte da administração, que a empresa não pretendia mais trabalhar com contratos individuais de trabalho. A empresa, afirmando que os trabalhadores «estavam entre a espada e a parede», disse que, se eles queriam continuar a trabalhar, teriam de constituir uma empresa para, depois, prestar serviços à EDP.

É a total precarização dos trabalhadores, numa empresa que regista, anualmente, vários milhões de euros de lucro.

Também muito recentemente, vários funcionários da limpeza do Tribunal Judicial de Braga foram surpreendidos com a informação de que, a partir do mês de Setembro, haveria uma mudança do seu estatuto laboral.

Assim, e não obstante estes trabalhadores estarem a desempenhar funções permanentes, alguns deles há mais de 12 anos, por decisão do Ministério da Justiça, passam a ser trabalhadores independentes, vulgo «recibos verdes».

É, assim, um Ministério da Justiça pouco justo e que viola a lei.

São as violações à lei sindical. Veja-se o recente caso de um plenário de trabalhadores dos CTT de Guimarães, que foi interrompido pela PSP para, a pedido da administração, impedir a presença do coordenador do sindicato nesse mesmo plenário.

Este é mais um caso de utilização abusiva, por parte do Governo, das forças de segurança para impedir o exercício legítimo dos direitos dos trabalhadores. A PSP serve a legalidade e não é, nem pode ser, utilizada como força repressiva e de intervenção na luta de classes.

São múltiplas as violações da lei por parte dos CTT, mas queremos salientar que diversas informações dão conta que esta empresa está a utilizar trabalhadores estrangeiros, não legalizados, nos centros de distribuição dos correios, sem que lhes seja dado qualquer tipo de contrato de trabalho.

Questionado pelo PCP sobre esta situação, o Ministério do Trabalho responde, dizendo que a situação dos trabalhadores estrangeiros se encontra «devidamente regularizada, encontrando-se a respectiva prestação de trabalho de acordo com as normas legais em vigor».

Ora, a verdade é que chegou ao nosso conhecimento que a empresa PH&B - Serviços de Estafeta, Lda. contratou recentemente uma trabalhadora imigrante, não legalizada, para desempenhar a função de distribuição do correio nos CTT. O salário era pago por esta empresa em numerário, sem recibos e sem qualquer tipo de descontos.

Tendo como objectivo legalizar a sua situação no nosso país, esta trabalhadora pediu o contrato de trabalho, o que foi recusado pelas duas empresas. Não satisfeitos, despediram esta trabalhadora, estando agora desempregada, sem protecção no desemprego, sem possibilidade de se legalizar e em risco de ser expulsa.

É, assim, um gritante exemplo de uma empresa do Estado a utilizar e explorar trabalhadores ilegais.

No Ministério da Defesa, além de prenderem dirigentes por se manifestarem, foi impedida uma reunião entre um sindicato e o pessoal civil da Escola Prática de Engenharia em Tancos. Porquê? Segundo o oficial de dia, «por ordens superiores, não estavam autorizados a fazer reuniões», violando, assim, quer a lei sindical quer a Constituição.

É o caso concreto da luta dos trabalhadores da Transtejo e do Metro, que importa recordar. As

administrações destas empresas, segundo indicações do Governo, aquando da greve geral, transformaram os serviços mínimos em serviços máximos, atacando, assim, o direito constitucional à greve. A resposta dos trabalhadores esteve à altura e a greve teve uma adesão de 100%. Não satisfeitos, e como represália, estas empresas instauraram processos disciplinares a um largo conjunto de trabalhadores. A resposta dos trabalhadores, face a esta tentativa de intimidação, esteve novamente à altura: percebendo que o que estava em causa era o direito à greve, lutaram novamente, fazendo greve às horas extraordinárias, demonstrando, assim, uma enorme solidariedade para com os seus camaradas e um elevado sentido de classe.

É o Ministério da Educação que todos os anos sujeita milhares de professores à condição de precários e à desumana incerteza quanto ao futuro; que viola, no concurso para professor titular, o estatuto da carreira docente, nomeadamente as disposições que o próprio Governo introduziu.

Por fim, é o Ministério dos Negócios Estrangeiros que mantém mais de 200 trabalhadores precários, sem qualquer tipo de descontos para um regime de protecção social. Esta miserável situação leva a que, hoje, nos postos consulares, estejam trabalhadores com mais de 70 e de 80 anos a trabalhar, porque não têm qualquer protecção na velhice nem qualquer outro meio de subsistência.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

Estes são alguns exemplos, dos muitos que podíamos dar, que ilustram a forma como o Governo encara os trabalhadores e a própria lei, ou seja, com total e desumano desrespeito.

Este Governo do Partido Socialista não se limita a atacar os direitos dos trabalhadores no plano legislativo.

Também no plano concreto das acções, o Governo ataca os direitos, mesmo que tal implique violar a lei.

É o Governo do PS no seu pior a imitar o pior dos patrões.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Maria José Gambôa,

Agradeço a sua questão e, em resposta, queria deixar-lhe um curto comentário. A Sr.ª Deputada fala nos acordos de concertação social, diz que importa que se veja quem é que assinou que acordos de concertação social, fala na formação profissional, de que nunca discordámos, mas importa referir que o que fiz não foi uma intervenção de princípios gerais, não foi uma intervenção em que acusámos o Governo de querer violar os direitos dos trabalhadores. Não! Enunciámos um conjunto concreto de situações em que o Governo violou a lei e a Sr.ª Deputada não fez sequer um pequeno comentário.

Então, não falou da violação da lei quanto ao que acontece com os trabalhadores dos CTT? Há contratação de trabalhadores ilegais, numa situação de total precariedade, e a Sr.ª Deputada não diz nada?!

Então, relativamente ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde há mais de 200 trabalhadores precários sem um cêntimo de descontos, que não têm direito a um cêntimo de reforma, a Sr.ª Deputada não diz nada?!

Relativamente à violação da lei sindical, falei nas instruções dadas à polícia, falei no Governo Civil de Braga, que manda instaurar processos-crime contra dirigentes sindicais por estes terem feito uso do seu direito à manifestação. Então, o Governo desresponsabiliza-se e a Sr.ª Deputada não diz nada?! É que estamos a falar de entidades que são nomeadas pelo Governo e, portanto, o Governo tem responsabilidades directas na violação da lei.

Quanto a isso, pode a Sr.ª Deputada ter o discurso mais redondo, mais retórico que tiver, mas a verdade é que, no plano concreto - e a Sr.ª Deputada sabe-o muito bem! -, o Governo viola a lei, aumenta a precariedade e dá um péssimo exemplo aos maus patrões que existem no nosso país, o que é verdadeiramente lamentável. Isto, perante um Partido Socialista que, aquando das eleições, disse que queria transformar e alterar, por exemplo, a legislação laboral.

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