Partido Comunista Portugu�s
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Voos ilegais da CIA - Intervenção de Jorge Machado na AR
Quarta, 10 Janeiro 2007

Inquérito Parlamentar n.º 2/X, sobre as responsabilidades do XV,XVI,XVII Governos Constitucionais e de organismos sob a sua tutela, na utilização do território nacional, pela CIA, ou outros serviços similares estrangeiros, para o transporte aéreo e detenção ilegal de prisioneiros

 

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Já vai longe o mês de Setembro de 2005, altura em que pela primeira vez o PCP denunciou o facto de os EUA terem recuperado um método de operações clandestinas denominado "rendições extraordinárias".

Este método, utilizado pela CIA, consiste na perseguição e sequestro de "suspeitos", em qualquer parte do mundo, para depois os enviar para prisões clandestinas onde são detidos, sem qualquer acusação ou garantia de respeito dos mais elementares direitos de defesa, e são barbaramente torturados.

Estamos assim face a um comportamento criminoso da Administração Norte Americana por violação do Direito Internacional e dos mais elementares Direitos Humanos.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Nessa mesma altura surgiram notícias que envolviam o nosso País neste método de "rendições extraordinárias".

Na verdade, Portugal surge, de acordo com diversas fontes, na rota dos voos ilegais da CIA, que utilizando aviões civis sobrevoaram o nosso espaço aéreo para levar a cabo os acima referidos sequestros.

O Governo começou por responder com silêncio aos requerimentos do PCP. Depois, e devido às proporções internacionais que o caso assumia, o Governo respondeu não admitindo sequer a existência desses voos em Portugal.

Não foi preciso muito tempo para surgirem novos dados, lista de voos e fotografias que desmentiram o Governo e os partidos da direita.

Nesta altura, e face à evidência, o Governo passa a admitir que a CIA poderá ter utilizado o nosso espaço aéreo, mas que não existem indícios de ilegalidades.

E quanto ao Governo estamos conversados.

Aos diversos requerimentos o Governo responde que nada sabe, que não há indícios.

Às várias intervenções em Plenário a pedir medidas de fiscalização e esclarecimentos, o Governo responde que nada sabe, que não há indícios.

Aos relatórios de organizações internacionais que implicam Portugal, o Governo responde que nada sabe, que não há indícios.

Às fotografias, relatos e dados oficiais de voos, mais que suspeitos, o Governo responde que nada sabe, que não existem indícios.

E por fim um testemunho. O Sr. Khadr, cidadão Canadiano sequestrado ilegalmente em Guantanamo, onde foi torturado, que descreve o seu voo e a escala que realizou em Santa Maria. O Governo continua a nada saber.

Aqui, na Assembleia da República, o PS e os partidos da direita nada sabem, não querer saber e tentam impedir que se saiba.

Se a este comportamento associarmos as respostas evasivas, incompletas e vagas que o Governo deu e os obstáculos que encontramos no esclarecimento das crescentes e avassaladoras dúvidas que com o tempo se avolumaram (importa lembrar que PS, PSD e CDS impediram a audição dos Directores dos Serviços de Informações), podemos afirmar que estamos face a um conjunto de comportamentos que apontam, quer para a conivência, quer para a total opacidade no tocante ao esclarecimento de fundados indícios e dúvidas.

Face a este comportamento, e uma vez que consideramos da maior importância o total esclarecimento da verdade e o apuramento de eventuais responsáveis, não nos resta outra alternativa senão propor uma comissão parlamentar de Inquérito.

Importa salientar que ao propor a comissão de inquérito, não estamos a impor conclusões. Estamos apenas a propor que o Parlamento exerça as suas funções de fiscalização.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

A Comissão de Inquérito deverá apurar informações e obter completas e cabais respostas, entre outras, às seguintes questões e dúvidas:

1. Apurar a lista exaustiva e detalhada de todos os voos susceptíveis de ter tido qualquer relação com as actividades descritas, no período que decorreu entre 2002 e o final de 2006.

2. Apurar a lista completa e identificação dos passageiros e tripulação que transitaram nessas aeronaves.

3. Apurar qual o país de origem e o destino dos passageiros.

4. Apurar que conhecimentos tinham os Governos, nomeadamente através dos serviços de informações, acerca destas actividades.

5. Apurar que medidas inspectivas foram levadas a cabo nesses aviões e quais os resultados.

6. Apurar que outras medidas foram tomadas para impedir a utilização do nosso espaço aéreo e territorial para estas actividades.

7. Apurar eventuais responsabilidades por omissão.

8. Apurar elementos que conduzam à caracterização da eficácia do nosso sistema de fiscalização de entradas, saídas e trânsito de pessoas e aeronaves em instalações aeroportuárias.

9. Apurar se houve, em algum momento, qualquer tratamento privilegiado na autorização dada a estes voos para utilização do nosso território.

Para apurar estes factos propomos que sejam ouvidos, entre outros,

  • Os Directores do SIS, no período em inquérito
  • O Secretário-geral do SIRP
  • Os oficiais portugueses de ligação em serviço na Base das Lajes, no período em inquérito
  • A Sr.ª Deputada do PS no Parlamento Europeu Ana Gomes
  • O Sr. Khadr, testemunha e passageiro de um dos voos referenciados.
  • Os Ministros da Defesa Nacional e os Ministros dos Negócios Estrangeiros dos XV, XVI e do XVII Governos.

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Esta comissão Parlamentar de inquérito visa apurar a verdade. Proceder a uma investigação cabal sobre eventuais responsabilidades, por acção ou omissão, dos Governos liderados por Durão Barroso, Santana Lopes e José Sócrates, mas visa também apurar que medidas importa tomar para que o nosso espaço aéreo não seja utilizado para actividades criminosas por parte da CIA ou qualquer outra organização.

É portanto também uma questão de soberania.

Hoje, com as votações, torna-se claro quem quer descobrir a verdade e quem tenta manter a opinião pública e a verdade na penumbra.

Hoje descobrimos quem, por subserviência aos Estados Unidas da América, impede a descoberta da verdade e se presta a um papel vergonhoso de encobrimento das actividades criminosas da CIA em Portugal.

Da nossa parte, os Portugueses podem contar com a luta e o combate contra a tortura e a violação dos Direitos Humanos sejam eles praticados por quem for  seja em que país for.

Disse.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado José Vera Jardim,

Registamos a sua intervenção que será analisada e considerada no futuro, quando os novos factos surgirem a «lume» nesta discussão.

Mas deixe-me também dizer-lhe que não é uma questão de retórica, não foram os Deputados do PCP, nem a Eurodeputada Ana Gomes que descobriram os factos ou as informações! Não fomos nós que os inventámos! Os factos existem e, dos factos e indícios que o senhor diz que não existem, eu posso fazerlhe um resumo, Sr. Deputado!!

De facto, são centenas de voos entre Portugal e Guantánamo e investigação sobre estes voos, zero! Só neste Governo foram realizados 24 voos de ou a partir de Guantánamo e o Governo investigou zero!!

Isto não são indícios, Sr. Deputado?... Há fotografias dos aviões, que já mostrámos e juntámos, em território português! Isto não é um indício?

Há relatórios internacionais, da União Europeia, Amnistia Internacional, da Human Rights Watch que lhes fazem referência e que envolvem Portugal nesta rede internacional de sequestro e isto não é um indício, Sr. Deputado?

A desculpa é a de que não há cidadãos portugueses sequestrados e à custa desse argumento fecha-se os olhos a qualquer actividade ilegal e criminosa da CIA?

É este o argumento? Por não haver um português envolvido directamente no sequestro?

Isso não é desculpa e o Sr. Deputado sabe-o muito bem!

Quanto aos relatos e às testemunhas, infelizmente, temos uma testemunha e não venha dizer que foi em serviço da CIA que o Sr. Khadr cumpriu aquela missão. O Sr. Khadr, muçulmano canadiano, foi sequestrado, esteve em Guantánamo anos a fio, preso e torturado e trocou a sua liberdade por uma missão na Bósnia.

Isto é deplorável e vergonhoso por parte da CIA, e os senhores deveriam estar aqui a condenar essa situação e não deviam utilizar esse argumento para justificar isto.

Este senhor foi usado pela CIA anos e anos após tortura, por parte dos serviços de informações.

E é isto que custa aos Srs. Deputados ouvir! Depois, o Sr. Deputado disse, ainda, que não há mais factos.

Pois não há mais factos, porque o Sr. Deputado também não quer investigar, nem o seu Governo se propõe a investigar o que quer que seja! E isto é que é problemático: diz que não há factos para justificar um inquérito mas só há investigação com a comissão parlamentar de inquérito e essa é que irá apurar os factos!!

Ora, os senhores alimentam esta contradição mas não a justificam minimamente.

Só para terminar, deixe-me dizer-lhe que «quem não deve não teme»!

E o que se pergunta é o que é que o PS teme nesta discussão e o que é que teme relativamente a estes indícios. É porque os indícios são fortes, mas estou convencido de que o PS, o PSD e o CDS-PP sofrem de uma espécie de esquizofrenia, isto é, os indícios podem ser do tamanho de um elefante, Srs. Deputados, caírem-lhes à frente dos olhos que os senhores vão aqui afirmar, neste Plenário, que não há indícios, nem factos, porque a única posição que querem defender é a dos Estados Unidos da América, num claro sinal de subserviência que é absolutamente vergonhoso para esta Câmara.