Partido Comunista Portugu�s
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Intervenção de Bernardino Soares na AR
Politica de Saúde
Sábado, 27 Junho 2009
saude.jpgNa intervenção de abertura da interpelação ao Governo sobre Política de Saúde agendada pelo PCP, Bernardino Soares referiu que "estes quatro anos de política de saúde do Governo PS não inverteram nem alteraram no fundamental a política de direita que vinha a ser seguida pelos governos anteriores. O Serviço Nacional de Saúde continua a degradar-se nos seus aspectos essenciais e as populações a ver o seu direito à saúde, constitucionalmente garantido, cada vez mais ameaçado.

 

 

 

Interpelação ao Governo n.º 29/X sobre Politica de Saúde

Sr. Presidente
Srs. Deputados


Estes quatro anos de política de saúde do Governo PS não inverteram nem alteraram no fundamental a política de direita que vinha a ser seguida pelos governos anteriores. O Serviço Nacional de Saúde continua a degradar-se nos seus aspectos essenciais e as populações a ver o seu direito à saúde, constitucionalmente garantido, cada vez mais ameaçado.
Uma coisa é certa. No Ministério da Saúde houve uma mudança de estilo. O que não houve foi uma mudança de política. Melhor dito: a mudança de estilo serviu para disfarçar a manutenção da política.
A população sentiu bem o agravamento da situação na saúde. Entre 2003 e 2007 os gastos privados em saúde aumentaram 33%, de cerca de 3500 para 4600 milhões de euros. Ela corresponde já em 2007 a 2,8% do PIB e significa uma despesa média por família de cerca de 1200 euros por ano.
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Uma parte significativa do aumento da despesa dos últimos anos deveu-se às medidas do Governo na área do medicamento. Ao contrário do que o Ministro Correia de Campos disse até sair do Governo, a despesa dos utentes com medicamentos aumentou de 671 para 766 milhões de euros entre 2005 e 2007.

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O Governo decidiu poupar dinheiro à custa dos utentes em vez de o ir buscar aos lucros do sector do medicamento.
Em apenas três anos a despesa dos utentes aumentou 95 milhões de euros, o que significa um aumento de 14%.
Mas os portugueses sentiram também que a saúde ficou mais distante. Em primeiro lugar devido à gritante falta de profissionais de saúde, ou em consequência dos erros na formação, ou por não serem contratados para o SNS.

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Um dos casos mais graves é o da falta de médicos de família. Como se pode verificar, uma parte fundamental dos médicos de família aproxima-se rapidamente da idade de aposentação o que terá consequências devastadoras nos cuidados de saúde primários e por arrastamento em todos os serviços de saúde.

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Veja-se que em 2001 havia ainda 81% de médicos de família com menos de 50 anos.
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Apenas seis anos depois, em 2007, essa percentagem era já de apenas 23%, sendo 77% os médicos de família com mais de 50 anos. A evolução é a previsível. E é previsível há muitos anos, perante a passividade e a irresponsabilidade de sucessivos governos, a que se junta o actual, cujas tímidas e tardias medidas não serão suficientes para inverter a situação. É por isso que há centenas de milhares de pessoas sem médico de família.

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Nos enfermeiros a carência deriva apenas da política de restrição de trabalhadores na administração pública, que para além de ajudar ao desemprego, deixa os serviços de saúde em difíceis condições para dar resposta à população.
Considerando dados de produção da Administração Central dos Serviços de Saúde, podemos concluir que faltam nos hospitais portugueses, pelo menos 15 mil enfermeiros. Já nos centros de saúde e aplicando as regras da OMS, para que todos os portugueses tenham enfermeiro de família, serão precisos mais 5 mil enfermeiros. Faltam por isso no total 20 mil enfermeiros.

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Os enfermeiros em falta em relação aos necessários são 35% em todo o SNS, 42% nos centros de saúde e 33% nos hospitais. E isto enquanto milhares de enfermeiros estão no desemprego e o Governo aposta na sua precariedade e na negação dos direitos mais elementares na sua carreira.

Outra das razões para a degradação do serviço às populações foi a política de concentração de serviços, com encerramentos baseados em razões economicistas e em falsos critérios técnicos, para favorecer a política da obsessão do défice. Assim aconteceu com inúmeras extensões de saúde, com serviços de atendimento permanente, com urgências hospitalares, com maternidades e blocos de partos.
Em muitos sítios o serviço público foi substituído pelo privado, que passou a ser a única solução para as populações.

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Um caso particular foi o das maternidades. As públicas foram encerrando tendo como um dos critérios fundamentais a não realização de 1500 partos, poucas restando hoje abaixo desse valor. A justificação era a segurança das parturientes. Só que o governo não explicou porque estava a segurança em causa nas maternidades públicas e não nas privadas.
Em 2007, segundo a ERS, dos 25 centros de nascimento privados, apenas dois faziam mais de 1500 partos por ano e apenas seis faziam mais de um parto por dia. A taxa de cesarianas oscilava entre 43% e 100% consoante as unidades. Para além disso foram detectadas outras graves carências patentes no relatório da ERS. Nenhuma maternidade privada foi encerrada pelo Governo. E agora a ERS já moderou as exigências num segundo relatório, definindo apenas como essencial a realização de pelo menos três partos por semana, isto é 157 por ano, isto é, 10 vezes menos do que o Governo considerou necessário no sector público.

Este Governo aliás continuou a beneficiar o sector privado em vários aspectos.
Manteve o programa de parcerias público privadas, que impõe obrigações para o Estado durante mais de 30 anos. Aliás o PSD, autor originário desta política não está preocupado com estas concessões. Estas parcerias para hospitais são afinal rosa, mas também laranja.
O Governo desenvolve uma política do medicamento completamente refém dos interesses privados do sector. Já assinou um acordo com a APIFARMA e outro com a ANF, sempre introduzindo graves medidas que prejudicam o interesse público. Criou algumas farmácias hospitalares, mas para as privatizar, abdicando de um instrumento fundamental de que o Estado carece para desenvolver uma eficaz política do medicamento.
O Governo até define como prioritários investimentos privados que concorrem directamente com investimentos públicos projectados, como adiante demonstraremos.

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Mas enquanto abundam as benesses para o privado, escasseiam os recursos para o serviço público. De 2005 até 2009 as transferências do Orçamento do Estado para o SNS, em percentagem do PIB, diminuíram de 5,1% para 4,8%, num claro desinvestimento nos serviços públicos de saúde. É por isso que se restringe a capacidade dos serviços, o atendimento aos utentes, o acesso a consultas, a cirurgias e a tratamentos.

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Este enorme desinvestimento reflecte-se também no investimento público em saúde. Desde o início da legislatura o investimento público em saúde diminuiu cerca de 40%, de 100 milhões de euros para menos de 40 milhões. Se o PS não quiser comparar os seus orçamentos com o último orçamento do Governo PSD/CDS-PP, podemos então compará-lo com o último orçamento dos governos de António Guterres, o de 2002, em que este investimento era de quase 200 milhões de euros, cinco vezes mais do que é agora.


Mas se o orçamento do investimento público em saúde é de menos de 40 milhões de euros, o que o Estado paga, já em 2009, às parcerias público privadas é cerca de 140 milhões de euros, 3,5 vezes o que é atribuído ao investimento no SNS.
Este mandato fica também marcado pelo gravíssimo ataque aos profissionais da saúde, no quadro do ataque à administração pública, precarizando os seus vínculos, atacando as suas carreiras e degradando as suas condições de trabalho. Com este Governo generalizou-se o recurso ao trabalho temporário para fornecimento de mão-de-obra, pondo em causa a estabilidade dos serviços e até a segurança dos cuidados prestados.


A situação criada pelo Governo levou à saída de muitos médicos altamente diferenciados e preciosos para os serviços públicos. Esse era o objectivo do Governo. É que só assim os vários hospitais privados que entretanto floresceram puderam ter a possibilidade de contratar os profissionais de que necessitavam.
O Governo continua a não respeitar os enfermeiros, a quem quer impor uma carreira em que para se atingir o topo é preciso ter 45 anos de exercício profissional e a quem quer nivelar por baixo o salário em relação a outros técnicos superiores de saúde.

Finalmente o Governo falhou na tão propagandeada reforma dos cuidados primários de saúde. Apesar de princípios positivos, a criação de USF fez-se em muitos casos à custa de outras unidades de saúde a quem foram retirados profissionais, continua a não ter o objectivo da generalização a todos os utentes e continua a ter na lei a possibilidade da sua privatização.
A juntar a isto o processo dos agrupamentos de centros de saúde está marcado por uma concentração de decisão, ainda por cima sujeita a uma clara partidarização, e por uma tendencial ingeribilidade, como demonstra a generalizada confusão entre USF, Unidades Locais de Saúde, Agrupamentos, etc. etc..
Uma coisa é certa. Já não é possível esconder que esta reforma dos cuidados primários de saúde falhou e deixou por resolver os principais problemas.


A política deste Governo beneficia o sector privado e degrada o Serviço Nacional de Saúde. E sem Serviço Nacional de Saúde, sem a estabilidade dos seus profissionais, sem o seu financiamento adequado e o aumento do investimento, não se garante o direito à saúde das populações. Essa é a mudança que os portugueses exigem e que este Governo já provou não querer fazer.
Mas outra política é possível e é por essa que o PCP continuará a lutar!