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A Agricultura Portuguesa - João Frazão, da Comissão Política do CC do PCP
Sábado, 24 Novembro 2007
João Frazão

A Agricultura Portuguesa sofre de grave e acentuada crise, perdendo peso na economia, no emprego e no mundo rural.
Fruto das política protagonizadas, à vez, por PS, PSD e CDS, entre 89 e 2006 desapareceram mais de 250 mil explorações – mais de 40 explorações por dia.
A superfície cultivada diminuiu em mais de 30%, aumentando a área de pastagens, devido fundamentalmente ao aumento das áreas não cultivadas. Acentua-se o envelhecimento dos agricultores, a par do aumento do nº dos que, para além da agricultura, se dedicam a outras actividades.
Concentra-se dia-a-dia a propriedade, crescendo as com mais de 50 e 100ha em 12% e 25%, respectivamente, e diminuindo as propriedades com menos de 50ha em 34%.


O défice alimentar atinge os 60%. Portugal, terra de grande e boa produção agro-alimentar, vê-se dependente da importação de batata, de leite, de cereais, frutas, hortícolas, de carne, etc., etc.
O efectivo leiteiro nas regiões de Entre Douro e Minho, Açores e Beira Litoral que é no seu conjunto ¾ do efectivo leiteiro nacional, viu desaparecer, no período 1999-2005 mais de metade das explorações e 19% das vacas que existiam.


Ao Encontro sobre a Agricultura e o Mundo Rural realizado na Mealhada, em Junho e que juntou cerca de 300 agricultores de todo o país, chegaram depoimentos impressivos, de quem não desiste da agricultura apesar de sentir que as políticas de direita já desistiram deles, de um sector que resiste às sucessivas barreiras e obstáculos, sejam elas as da exigência de avultados investimentos em infra-estruturas ou dos apoios aprovados a projectos de jovens agricultores que esperam anos pelos reembolsos, dos milhões que o Ministério deve aos agricultores e às suas Associações, designadamente à CNA.
No Plano de Desenvolvimento Rural (PDR), o Governo insistiu em manter essa injusta política de apoios que concentra cerca de 95% das verbas em cerca de 5% das grandes explorações e na grande agro-indústria, fingindo desconhecer que cerca de ¾ do Produto Agrícola das fileiras apresentadas como estratégicas, são o resultado da actividade das explorações com menos de 5 hectares.
A concentração das verbas no "eixo da competitividade", que ascende quase a 50% do total, bem como os avultados fundos previstos para projectos do Alqueva, que devem ser apoiados sim, mas pelo QREN, vão resultar em brutais cortes nas agro-ambientais e no afastamento, no acesso aos fundos, dos pequenos agricultores.


Por outro lado as negociações para a alteração das OCM do Leite, do Vinho e das Hortofrutícolas e, as propostas da União Europeia, que o Governo Português, nesta fase, representa e em todos os momentos defende, representariam novas ameaças, com o fim das quotas leiteiras, favorecendo as grandes produções do norte da Europa, com novos arranques de vinha, e a liberalização do plantio e do comércio das mixórdias a que chamam vinho, e com o desligamento das ajudas, liquidando importantes culturas, em particular do tomate.


Nós afirmamos que a agricultura portuguesa não está condenada ao declínio irreversível e que tem um importantíssimo papel a desempenhar nas suas dimensões agro-produtiva, agro-ambiental e agro-rural.
Mas isso exige uma ruptura política que acredite nas potencialidades da agricultura portuguesa, e que tenha como eixo central o aumento da produção e o aumento do rendimento dos pequenos e médios agricultores e a melhoria das suas condições de vida.
Uma política que tenha como objectivos a defesa da soberania e da segurança alimentares. Que contribua para a atenuação das assimetrias regionais, concorrendo para o estabelecimento de equilíbrios territoriais, demográficos e etários do espaço rural.


Um política que desenvolva a floresta, assegurando um ordenamento florestal com base na diversificação das espécies, e que respeite e fomente o sector comunitário dos baldios.
Uma política que promova a necessária reforma agrária, com uma profunda alteração fundiária nas actuais condições, nos campos do Alentejo e do Ribatejo, de forma a facilitar o acesso à terra aos jovens agricultores e aos pequenos agricultores nas zonas de propriedade latifundiária no Sul do país.
Uma política que defenda a manutenção dos serviços públicos no espaço rural, evitando a fuga acelerada dos campos.


Uma política que defenda uma reforma da Política Agrícola Comum, para proteger a produção dos países da pequena e média agricultura, garantindo os apoios ligados à produção e defenda reformas da OCM dos vinhos, dos hortofrutícolas e do leite que tenham em conta os interesses nacionais, o que significa rejeitar as propostas da União Europeia.
Sim, nós reafirmamos a nossa convicção de que é possível, com outra política e um novo rumo, defender a agricultura portuguesa e particularmente a agricultura familiar.
Não o afirmamos por qualquer sentimento de nostalgia serôdia. Não temos saudades do tempo em que os pequenos lavradores e os assalariados agrícolas labutavam a terra de sol a sol por uma côdea de pão.
Mas sabemos que fazem falta campos de trigo no Alentejo, sem descurar o bom aproveitamento do regadio instalado e a instalar para outras culturas.
Fazem falta as vinhas no Douro, os castanheiros em Trás-os-Montes, o arroz do Baixo Mondego, os pastores da Serra da Estrela, os Olivais da Beira Baixa, a fruta do Oeste ou da Cova da Beira, a produção de leite no Minho ou na Beira Litoral, os baldios do interior Norte, as raças autóctones de gado bovino ou caprino.


Fazem falta à paisagem e fazem falta ao povo português.
Sim, a agricultura portuguesa tem futuro.
Com preços justos à produção e aos consumidores, com uma maior, e mais justa distribuição dos apoios, entre os diversos países, agricultores, culturas e regiões, é possível um mundo rural vivo e produtivo.
É possível uma floresta multifuncional, sem o flagelo dos fogos florestais, com as dimensões catastróficas dos últimos anos.
Sim é possível, com os agricultores, pois sem agricultores não há agricultura, sem agricultura não há mundo rural e sem mundo rural não há desenvolvimento.