O Comité Central do PCP, reunido no dia 27 de Outubro de 2008, analisou a crise do capitalismo, as suas causas e consequências, a sua expressão em Portugal. O CC do PCP identificou as manobras e medidas que no plano nacional e internacional estão a ser desenhadas para proteger os interesses do grande capital e apontou orientações essenciais que, em ruptura com a política de direita, dêem resposta imediata a esta situação. O Comité Central sublinhou a necessidade de ampliar o protesto e a luta dos trabalhadores e do Povo, de intensificar a intervenção política do Partido no quadro da preparação do XVIII Congresso do PCP.
I
A crise do sistema capitalista e a actualidade do
socialismo
1.
O mundo está confrontado com uma das mais graves crises do sistema capitalista,
porventura a maior desde a "Grande Depressão" desencadeada pelo crash bolsista de 1929, que, pela sua
profundidade, extensão e dimensão poderá trazer graves consequências para os
trabalhadores e para os povos de todo o mundo.
Anunciada
pela crise hipotecária nos EUA, exprimindo-se na bolha especulativa dos
mercados internacionais financeiros e de matérias-primas (bens alimentares,
energia, etc.), os seus impactos fizeram-se rapidamente sentir na esfera
produtiva e na situação económica de numerosos países, colocando o mundo às
portas de uma recessão económica mundial.
O Comité
Central considera que esta nova crise do sistema capitalista revela, como tem
sido assinalado, em particular em sucessivas Resoluções Políticas dos
Congressos do PCP, a sua natureza estrutural e sistémica, evidencia os limites
históricos do capitalismo e o seu carácter explorador, opressor e destruidor,
confirmando a validade das teses fundamentais do marxismo-leninismo sobre o
capitalismo, seu funcionamento e desenvolvimento.
Aos
trabalhadores e aos povos do mundo está colocada como grande exigência do nosso
tempo, a luta por profundas transformações sociais e económicas
antimonopolistas e libertadoras, pela superação revolucionária do capitalismo e
pela construção do socialismo como única, real e necessária resposta à profunda
crise do sistema.
2. As crises financeiras,
como a que presentemente abala o mundo, são uma expressão da crise estrutural
do sistema capitalista indissociável das contradições e limites do modo de
produção capitalista. Esta crise, cujo epicentro se manifestou na potência
hegemónica do capitalismo, resulta da contradição entre a sobreprodução e sobreacumulação
de meios de produção por um lado, e, por outro, a contracção dos mercados e
níveis de consumo decorrentes das desvalorizações salariais e abismais
assimetrias de rendimentos, agravadas pelas reduções das despesas públicas e
pouca solvabilidade de inúmeros países. A substituição dos salários dos
trabalhadores e dos rendimentos da população - incluindo pensões - pelo
estímulo ao crédito numa espiral de endividamento, servindo inteiramente o
propósito da extracção de benefícios pelos detentores do capital financeiro,
não só se revelou insuficiente e transitória, como se tornou num factor central
de aprofundamento da crise, agravado pelo endividamento dos Estados e das
pequenas empresas.
A
financeirização da economia - a autonomização dos fluxos financeiros, onde se
transforma dinheiro em mais dinheiro, com o desenvolvimento de processos
especulativos, sem passar pela actividade produtiva - tem sido a principal
resposta do capitalismo para a sua crise estrutural. A não obtenção das taxas
médias de lucro esperadas na esfera produtiva - a sua queda tendencial não foi
invertida pelo agravamento da exploração dos trabalhadores e alargamento do
mercado mundial com o fim do campo socialista - levou à transferência das
mais-valias geradas para a esfera da especulação financeira e à sua
centralização.
Nestes
processos, constituíram peças fundamentais as políticas de livre circulação de
capitais e liberalização dos mercados financeiros (nomeadamente com o
desenvolvimento das offshores); a
contracção da despesa e do investimento público a pretexto dos défices
orçamentais; a crescente exploração da força de trabalho, nomeadamente através
da desregulamentação das relações laborais e a privatização e liberalização dos
serviços públicos e de empresas essenciais ao desenvolvimento económico e
social (energia, telecomunicações, água, etc.).
A
financeirização do sistema de produção capitalista cumpre ainda um fim
ideológico, tendendo a esconder e iludir a base material da produção económica,
alienando assim o homem enquanto agente transformador da sua condição.
As
recorrentes crises financeiras, com diversas intensidades mas com crescente
contágio internacional, são assim a consequência da progressiva financeirização
do sistema capitalista mundial e do domínio do capital financeiro.
3. Num quadro internacional
instável, a crise é susceptível de potenciar novos perigos para os
trabalhadores e os povos muito para lá da esfera económica como a História já
provou em anteriores períodos.
A não serem
invertidas as políticas que estiveram na origem da crise, os seus efeitos
acentuar-se-ão e prolongar-se-ão no tempo e a expressão e dimensão da crise na
esfera produtiva afectará sobretudo os trabalhadores e camadas mais
desfavorecidas, através de efeitos como desemprego, descida de salários e
pensões e terá como consequência o alastramento da pobreza, da fome, da
carência de habitação e de condições de saúde e salubridade.
Coerente com
a sua própria lógica, o capitalismo gera, em períodos de crescimento económico,
polarização da riqueza, para depois intensificar a exploração e o seu efeito
destruidor em "explosões" de crise. A recessão global em curso e a sua dimensão
na economia norte-americana tenderá a acelerar e criar novas tensões no plano
internacional. Sobretudo num quadro onde se acentua a tendência para o declínio
dos EUA, designadamente no plano económico, e para quem a presente crise pode
significar o enfraquecimento de instrumentos decisivos para o seu domínio
hegemónico nomeadamente a afectação do dólar como principal moeda de
referência. Quadro onde tendem a acentuar-se contradições inter-imperialistas e
a emergência, com aspectos contraditórios, de novas potências económicas, a
par, do aprofundamento da militarização das relações internacionais e o risco
de desenvolvimento de graves conflitos.
Contradições
e conflitos que serão agravados pela escassez de matérias primas - e
consequentemente pela crescente dependência das potências imperialistas
relativamente à periferia - e pela disputa em torno do controlo das principais
reservas de recursos naturais. A baixa tendencial da taxa de reposição dos
recursos naturais coloca em causa factores essenciais à sustentação da vida
humana e potencia as derivas destrutivas do sistema capitalista.
As medidas que os EUA, Japão, a União Europeia e outros países, definiram
para enfrentar a crise têm como principal objectivo salvaguardar o sistema
capitalista, sendo elas próprias sementes de novas crises. Medidas que, indo ao
encontro das necessidades do grande capital, se traduzem na deslocação
de vultuosos meios financeiros sugados da actividade produtiva, dos rendimentos
dos trabalhadores e de fundos públicos para o sistema financeiro, com
consequências nas contas públicas; nas limitações do crédito para as pequenas
empresas, autarquias e projectos públicos; no aprofundamento dos défices de
investimento público e novas reduções nas despesas e prestações sociais; no
aumento de impostos e pressões inflacionistas; no aumento do desemprego e na
desvalorização dos salários e pensões; na maior dependência e fragilidade das
economias periféricas e dos países mais pobres.
Embora a história não se repita, a
experiência histórica demonstra, e alguns sinais comprovam que, das crises
desta natureza e amplitude, podem resultar atitudes e concepções negativas
susceptíveis de animar perigosos fenómenos sociais e políticos como a
resignação, o racismo, a xenofobia, o anticomunismo e práticas autoritárias e
antidemocráticas por parte dos Estados, quando não fascizantes. A organização e
a luta dos trabalhadores e dos Povos, uma intervenção confiante e determinada
são essenciais para enfrentar tais fenómenos e os perigos que deles decorrem,
dar resposta à situação e abrir caminho à mudança que se impõe.
4. O Comité Central do PCP chama a atenção
que a presente crise do capitalismo é mais uma manifestação de características
intrínsecas à sua natureza como o seu desenvolvimento desigual e a anarquia e
insustentabilidade do processo de produção, em que, a fases de expansão e
crescimento, de cada vez menor intensidade e com longos períodos de estagnação,
se sucedem fases de desaceleração e crises cada vez mais frequentes,
prolongadas e destruidoras.
A intensa
acção de propaganda, desenvolvida pelas forças sociais e políticas da direita e
da social-democracia e pelas organizações do grande capital, destinada a
justificar a crise por pretensos "excessos", "ganância" e corrupção de alguns,
visa iludir a responsabilidade estrutural do sistema capitalista.
Perante a
derrota das teses neoliberais no contexto do sismo financeiro internacional - a
falência da regulação pelo mercado; o recurso ao Estado para garantir o
funcionamento do sector financeiro; o abrandamento e reversão do "crescimento
económico" supostamente imparável - as forças políticas dominantes e o grande
capital procuram não só "justificar" a crise, como salvaguardar o essencial:
elevadas taxas de exploração, a liberalização do comércio mundial, a livre
circulação dos capitais, o prosseguimento da especulação, a concentração e
acumulação capitalista.
Como em
outras crises, fingindo ignorar as causas que lhe estiveram na origem, afirmam
a necessidade de alteração das regras de regulação e supervisão do sector
financeiro, o reforço da autoridade e independência das entidades reguladoras,
a sua articulação ou mesmo institucionalização multinacional e novos códigos e
normas de conduta ética em torno do mercado de capitais, isto é, a mesma
receita que foi adiantada aquando da recente crise de 2002, marcada pelos
escândalos da Enron, da Worldcom e outros grandes grupos e
empresas. Ensaiam ainda manobras de demarcação do neoliberalismo, como se esta
doutrina não fosse a expressão lógica e consistente do capitalismo na sua
actual fase imperialista, e alimentam a ideia de falsas "viragens" de natureza
reformista de tipo keynesiano. Na
realidade, confirmando a natureza de classe do sistema de poder, os mesmos que
usam o Estado para aumentar a exploração sobre o trabalho, privatizar serviços
públicos e entregar ao capital tudo quanto possa dar lucro, usam-no agora para
salvar a alta finança e socializar os prejuízos e assim continuar a favorecer o
capital financeiro.
É assim que as medidas tomadas são conducentes sobretudo a uma ainda
maior acumulação de capital, a movimentos de fusões e aquisições e ao retomar
da "dinâmica" especulativa, no sobe e desce das bolsas de valores, necessária à
captação de mais-valias.
Os grandes planos de financiamento e garantias ao
sector financeiro, quer nos EUA, quer na União Europeia, têm tido reduzido
impacto na estabilização dos mercados financeiros. As "nacionalizações" em
curso não significam qualquer opção política pelo controlo estatal da banca mas
apenas uma solução para estabilizar importantes instituições financeiras,
assumindo o Estado os monstruosos riscos e prejuízos, para posteriormente as
devolver ao capital financeiro, depois de saneados.
O Comité Central alerta para a
natureza das medidas que, no quadro da preparação da cimeira internacional
agendada para 15 de Novembro em Washington, apontam para novos passos na instituição
de renovados mecanismos de regulação internacionais que, com uma nova face, têm
em vista assegurar a continuidade do domínio económico e financeiro do
capitalismo. Num processo que tudo aponta para que siga o caminho da propaganda
em torno da "refundação do capitalismo" com a utilização dos Estados e das
instituições internacionais do capitalismo como "avalizadores" dos grandes
grupos económicos e financeiros numa perspectiva de consolidação do capitalismo
monopolista adaptado às actuais condições de globalização capitalista.
Na União Europeia, a crise é usada para a
consolidação do directório das grandes potências visando impor aos outros
países as suas soluções, dirimir as suas próprias contradições e
posicionarem-se perante um possível processo de rearrumação do sistema
financeiro internacional. As propostas da criação de um "governo económico na
zona Euro" ou de "fundos soberanos" para o apoio ao grande capital europeu
tentam tirar partido da crise e, instrumentalizando a ideia de "mais Europa para
proteger as economias europeias", apontam para o aprofundamento do carácter
neoliberal e federalista da União Europeia e para a tentativa de ultrapassar o
impasse político decorrente da rejeição do Tratado de Lisboa no referendo da
Irlanda, avançando inclusive com a ilusória ideia que, num quadro da
globalização capitalista, a União Europeia poderia, no contexto da crise, ter
um papel económico e político autónomo dos EUA.
5. O capitalismo não é, na
sua essência, reformável, humanizável ou regulável. O Comité Central do PCP
considera que qualquer solução séria para a presente crise que não signifique
um adiamento dos seus efeitos imediatos ou a adopção de expedientes que serão o
nascimento de novos factores para futuras crises passa, obrigatoriamente, por ir
ao fundo das suas causas. No imediato, colocam-se como factores de
estabilização essenciais: garantias sociais básicas aos trabalhadores e povos
mais afectados pela crise; aumento rápido e significativo do poder de compra
das massas trabalhadoras e populares (salários e pensões) como factor essencial
de dinamização do consumo e estímulo à produção; a propriedade social dos
principais meios de produção e o controlo estatal do sistema financeiro, num
quadro de democratização e fortalecimento do papel do Estado nas economias, a
par do desenvolvimento de políticas que promovam o investimento público e
recuperem funções sociais do Estado.
São medidas centrais cuja concretização tem de
ser sustentada através de pujantes movimentos de massas, da ampliação da luta
organizada que rejeite a ideia de terem de ser aqueles que mais sofrem com a
exploração a pagar os efeitos da crise. Serão os trabalhadores e os povos a
determinar o curso dos acontecimentos e das decisões políticas, sociais e
económicas.
O
Comité Central do PCP sublinha que cabe à classe operária, aos trabalhadores e
aos povos, aos partidos comunistas e revolucionários e a outras forças
progressistas e anti-imperialistas no mundo, lutar para prevenir e travar todo
e qualquer desenvolvimento negativo, exigindo melhores condições de vida,
democracia, cooperação e paz entre os povos.
A situação que o mundo vive, dá corpo à tese
central expressa nas Teses (proposta de resolução política) do XVIII Congresso
do PCP de que grandes perigos coexistem com grandes potencialidades de
desenvolvimento da luta progressista e revolucionária. A importância do
esclarecimento e da intervenção política dos comunistas em torno das causas,
dos efeitos e dos responsáveis pela crise e do caminho alternativo ao actual
sistema económico e social afigura-se como uma tarefa necessária e urgente.
A situação torna evidente a necessidade do
fortalecimento dos partidos comunistas e revolucionários, intimamente ligados
aos trabalhadores e às massas, identificados com os seus problemas concretos,
com as suas aspirações e reivindicações. Nesta situação, assume importância
decisiva a acção comum e convergente dos partidos comunistas e revolucionários
e das forças progressistas de todo o mundo.
O PCP, cumprindo as suas
responsabilidades para com os trabalhadores e o povo português e assumindo
simultaneamente o seu carácter de partido internacionalista, tudo fará para
fortalecer e estimular a luta, a intervenção política e ideológica do movimento
comunista e revolucionário internacional que se reunirá brevemente no Encontro
Internacional de Partidos Comunistas e Operários em São Paulo, Brasil, nos dias
21 a 23 de Novembro.
II
A situação do País, o
Governo PS/Sócrates e a crise
1. O agravamento da situação no País é anterior ao desenvolvimento da crise
e o resultado directo das políticas de direita, que fragilizaram os sectores
económicos nacionais tornando o País mais vulnerável a uma crise com esta
dimensão.
Nos últimos anos, apesar da economia nacional ter quase estagnado,
assistiu-se à acumulação de lucros colossais por parte dos grandes grupos
económicos e financeiros, à formação de grandes monopólios, a escandalosos
favorecimentos ao grande capital, à rapina dos recursos nacionais, ao
agravamento da exploração e à degradação das condições de vida dos
trabalhadores e da população. Anos em que os sectores que produzem bens e
serviços, ditos não transaccionáveis, nomeadamente, construção e imobiliário,
banca e seguros, grande distribuição, telecomunicações e energia apresentaram
um aumento dos lucros sempre acima de 20%, representando mais de 50% dos lucros
de toda a economia, realizando uma forte capitalização. Uma "prosperidade" do
grande capital assente na subordinação do poder político ao poder económico
As profundas vulnerabilidades e fragilidades que o país apresenta: a
política de desvalorização salarial e uma injusta distribuição do rendimento; a
crescente financeirização da economia nacional em detrimento da actividade
produtiva; a política penalizadora de crédito para as empresas - conduziram a
uma situação do elevado endividamento das famílias (129% do Rendimento
Disponível) e das empresas não financeiras (107% do PIB); a acentuação da
dependência de importantes centros de decisão do capital estrangeiro (cujo peso
cresce no tecido económico agravando o risco das deslocalizações) e perda de
decisivas alavancas económicas pelas privatizações; a persistência dos
principais défices (agro-alimentar, energético, cientifico e tecnológico, de
transportes e comunicações); o enfraquecimento de sectores produtivos e
permanência de inúmeras empresas industriais em regimes de subcontratação a
grupos multinacionais; a destruição da pequena agricultura e das pescas; os
elevados e crescentes défices e endividamentos externos onde a dívida externa
líquida (que quase duplicou em 10 anos) atingiu já cerca de 91% do PIB em 2007
- são consequência, não do agravamento da actual crise do capitalismo, mas sim,
de mais de 32 anos de políticas de direita.
As políticas desenvolvidas em Portugal são as mesmas que levaram à crise
nos EUA. Não há uma política de "capitalismo selvagem" nos EUA e um
"capitalismo com preocupações sociais" em Portugal e na União Europeia.
O Comité Central do PCP denuncia a forma profundamente desonesta,
hipócrita e mistificadora como o Governo PS aborda esta crise. Depois de meses
a fio em que, apesar dos alertas do PCP, negou e ignorou a crise, e mesmo
depois da sua deflagração continuou a desvalorizar a sua profundidade e a
ocultar as suas mais que previsíveis consequências, ensaia agora uma
inaceitável tentativa de desresponsabilização perante as dificuldades por que
passam os trabalhadores e o povo português
2. O Comité Central do PCP chama a atenção para a demagogia do discurso do
Governo PS, que, perante o agravamento da crise do capitalismo, ensaia um falso
distanciamento do neoliberalismo. O Primeiro-Ministro que antes replicava
"deixem o mercado funcionar", é o mesmo que agora perante a crise e
as eleições de 2009, critica no discurso o "Estado mínimo" e a "especulação
bolsista ", mantendo no entanto nas suas orientações políticas as mesmas
opções de classe.
O Comité Central do PCP considera particularmente grave, o favorecimento
do capital financeiro com a disponibilização de garantias no valor de 20 mil
milhões de euros do Estado, enquanto recusa tomar as medidas necessárias para
responder aos problemas das famílias e das pequenas empresas. Farsa posta a nu,
quando o Governo insiste na alteração para pior do Código do Trabalho, nas
privatizações, na concretização da Estratégia de Lisboa (nomeadamente na
liberalização e privatização dos mercados financeiros, de transportes e de
serviços postais) e numa política orçamental subordinada ao Pacto de
Estabilidade. A proposta de Orçamento de Estado para 2009 é uma síntese dessas
políticas com o défice de 2,2% do Produto Interno Brutocomo primeiro objectivo orçamental, o projecto de novas
privatizações, desmantelamento de serviços públicos e redução do número de
trabalhadores da Administração Pública.
3.O Comité
Central do PCP entende que o momento é oportuno para uma abordagem séria e
desmistificadora da regulação e das entidades reguladoras em Portugal. Os
exemplos dos aumentos dos preços dos combustíveis, com a entidade reguladora, a
Autoridade da Concorrência, a fazer relatórios enquanto os portugueses pagam
milhões de euros a mais na gasolina e no gasóleo; do escândalo do BCP, sob a
cúmplice tutela dos órgãos de supervisão, o Banco de Portugal e a CMVM, a que
se acrescentou o Relatório de Inquérito na Assembleia da República aprovado pelo
PS, PSD e CDS, ou os inaceitáveis aumentos dos preços da electricidade
propostos para 2009 (consumidores domésticos, 4,3%, empresas 4,4/5,9%) pela
entidade de regulação (ERSE - Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos),
num quadro em que a EDP só no primeiro semestre alcançou mais de 700 milhões de
euros de lucros, constituem uma flagrante denúncia do papel que as entidades de
regulação têm na acumulação capitalista. O que se pretende com estas teses em
torno da regulação e da transparência é na verdade reabilitar os infractores e
o perverso sistema que os suporta e sustenta, apagando as suas
responsabilidades para retomar as mesmas práticas especulativas.
A falência das entidades de regulação e supervisão no controlo dos
fluxos e produtos financeiros, legais ou ilegais, é demonstrada pela a livre
circulação de capitais, ou pelos offshores,
onde predominam escandalosamente as actividades de fuga ao fisco e lavagem de
dinheiro e para as quais o PCP há anos vem chamando a atenção. Em 2006 as
seguradoras e os bancos portuguesas tinham aplicados em offshores respectivamente 9,5 e 4,1 mil milhões de euros, a que
devem acrescentar-se cerca de 10 mil milhões de euros de aplicações isoladas o
que perfaz um montante superior ao valor que agora PS, PSD e CDS-PP aprovaram
de garantias do Estado à banca.
4. O Comité Central do PCP considera que a actual crise do capitalismo
comporta evidentes riscos de agravamento de problemas económicos e sociais
nacionais, que não podem nem devem ser subestimados: desenvolvimento de um
período económico onde a recessão e estagnação económica se associa à inflação
("estagflação"); aumento de deslocalizações e falências; enfraquecimento (e
mesmo potencial desaparecimento) de sectores económicos; agravamento de défices
externos; mais desemprego e pobreza; maior degradação das condições de vida dos
portugueses. Estes perigos assumirão tanta mais amplitude e gravidade quanto o
Governo insista no aprofundamento da política que a provocou.
O Governo PS esconde as suas responsabilidades na situação do país,
acentua linhas de propaganda e demagogia, e procura tirar proveito da crise do
capitalismo para continuar a aprofundar a política de direita. Demarca-se em
palavras da política que ele próprio promoveu e avança com medidas que, no essencial,
procuram garantir que aqueles que mais beneficiaram com esta política, dela
continuem a beneficiar, enquanto abre, depois dos sacrifícios exigidos em nome
do combate ao défice das contas públicas, um novo ciclo de novos sacrifícios
para os trabalhadores e para o Povo português, desta vez, em nome da crise.
O Comité Central do PCP considera inaceitável que, a pretexto da crise,
sejam os mesmos de sempre, os trabalhadores, os pequenos empresários, os
agricultores, os reformados, os jovens, o povo português a suportar, mais uma
vez, pesados sacrifícios.
O Comité Central do PCP declara a firme oposição dos comunistas a um
governo que continua a comportar-se como um conselho de administração dos
interesses do grande capital, a um Governo que aproveita a crise para manter a
especulação financeira, a "economia de casino", o agravamento da exploração dos
trabalhadores e outras camadas, que mantém a política de subalternização dos
interesses nacionais e de alienação de importantes parcelas da nossa soberania,
que permanece subserviente perante o directório das grandes potências e
indiferente à dependência do país face ao estrangeiro
III
Ruptura com a política
de direita para responder à crise
O
Comité Central do PCP coloca como questão central da resposta à crise a ruptura
com a política de direita e a exigência de uma política alternativa de
esquerda. Uma política que, no quadro da Constituição da República Portuguesa e
do reforço do regime democrático, tenha como objectivos a melhoria das
condições de vida dos trabalhadores e da população, a dinamização da actividade
económica, a criação de emprego, o reforço do papel do Estado na economia, a
dinamização do mercado interno e o estímulo à actividade das MPME´s, o aumento
do investimento, o combate aos défices estruturais do país, a defesa da
soberania nacional.
O Comité Central do PCP propõe um conjunto de orientações
essenciais, necessárias para, no imediato, combater a crise:
-Oaumento
dos salários, incluindo o salário mínimo nacional, das reformas e pensões,
promovendo a sua efectiva valorização e a reposição do poder de compra perdido
ao longo dos últimos anos, constituindo um factor de melhoria das condições de
vida, de estímulo ao mercado interno, de combate ao endividamento das famílias
e de desenvolvimento. Uma justa distribuição dos rendimentos nacionais que
exige a revogação dos aspectos negativos do código do trabalho e o abandono das
actuais propostas de alteração para pior, bem como, do quadro de benefícios
ficais, regalias e apoios do Estado aos grandes grupos económicos;
-O reforço do papel e
intervenção do Estado em sectores e áreas estratégicas, nomeadamente: o fim de qualquer nova privatização; a assunção pelo
Estado de uma posição dominante e determinante no sector financeiro; o assumir
do Estado, a partir das actuais posições, com nacionalização ou negociação
adequada, do controlo de grandes empresas dos sectores estratégicos no plano
nacional, particularmente na energia, nas comunicações e nos transportes;
-A defesa dos sectores produtivos e da produção
nacional, avançando no imediato para uma avaliação
prospectiva dos sectores mais vulneráveis à crise e daqueles que se inserem no
aproveitamento das potencialidades de desenvolvimento nacional, concentrando
nesta direcção, os fundos estruturais do QREN, numa lógica que relativamente a
novos investimentos deve corrigir assimetrias regionais; o Estado deve promover
políticas de apoio a factores e meios de produção na energia, comunicações,
água e crédito que assegurem níveis adequados de competitividade às empresas
portuguesas;
-A adopção de uma política de promoção de
empregocom direitos assente no alargamento da actividade económica,
na dinamização do emprego público, num plano nacional de combate à precariedade
e na redução do horário de trabalho;
-O desenvolvimento e promoção do mercado interno,
nomeadamente pela redistribuição do rendimento nacional, reforço da
transferência de verbas para as autarquias locais e políticas (inclusive
fiscal) que permitam o aumento das margens líquidas e alívio das tesourarias
das pequenas empresas; medidas de defesa face a exportações agressivas ou de dumping
pelo recurso sistemático do controlo e fiscalização das mercadorias importadas,
com a reclamação de cláusulas de salvaguarda sempre que necessário;
-A adopção de uma nova política de crédito que
responda com a baixa da taxa de juro, e de outros custos do serviço de dívida e
acessibilidade, à situação das famílias endividadas com a compra de casa e das
pequenas empresas sufocadas pelo estrangulamento do mercado interno e pelos
elevados preços dos factores de produção, e que promova uma audaciosa política
de investimento público e privado; com esse objectivo o Governo deve tomar as
medidas necessárias inclusive com a fixação administrativa dos limites máximos
das margens (spread), das comissões,
das taxas de juro, e das condições de acesso ao crédito;
-O reforço das funções sociais do Estado e da
protecção social, nomeadamente com a revisão do valor e da
acessibilidade ao subsídio de desemprego e dos critérios de atribuição de
reformas e pensões; o reforço do investimento público em equipamentos sociais,
nomeadamente em creches e lares da terceira idade assumindo o Estado
directamente a sua realização; o desenvolvimento de uma política de habitação
que garanta o direito a todos a uma habitação condigna; a defesa e
desenvolvimento do Serviço Nacional de Saúde e a valorização da Escola Pública.
-A exigência do fim dos offshores/paraísos
fiscais e da livre circulação dos capitais, através da
intervenção do Estado português, no plano das suas relações internacionais e da
sua participação em instituições internacionais, bem como, na União
Europeia para que esta avance unilateralmente, e desde já, com a taxação da
circulação dos capitais especulativos e/ou correspondendo a processos de
deslocalizações;
-A defesa dos interesses e da soberania nacional e
a intervenção na União Europeia que compreenda a luta por: assegurar a
direcção política do BCE pelos Estados membros e o controlo por cada Estado do
seu banco central, revendo desde já a política monetária do euro forte a favor
do crescimento económico e o emprego; a imediata suspensão do Pacto de
Estabilidade; a revisão urgente da Estratégia de Lisboa em todos os seus
objectivos e dimensões privatizadoras, desregulamentadoras e liberalizantes; a
rejeição da proposta de directiva do tempo de trabalho; a promoção de reformas
urgentes das políticas comuns agrícola e das pescas que assegurem a segurança e
soberania alimentares de cada país; o desenvolvimento pelo Banco Europeu de Investimento
- BEI de soluções que mobilizem os seus fundos para as pequenas empresas,
sectores produtivos, autarquias locais e projectos públicos; o abandono do
projecto do Tratado de Lisboa
-A defesa de uma nova ordem internacional, através da intervenção do Estado
português no processo que está actualmente em curso no sentido de defender:
relações económicas mais justas e equitativas, o acesso a bens alimentares, à
água e energia e a preservação desses recursos, a melhoria das condições de
vida, o combate à fome, à pobreza e à doença; o desenvolvimento de estruturas
internacionais no quadro da ONU que substituam as orientações hoje dominantes
na Organização Mundial do Comércio, no Banco Mundial e no Fundo Monetário
Internacional, nomeadamente as relativas ao sistema monetário e relações
comerciais no plano mundial; o respeito pela soberania, a defesa da paz e
cooperação entre os povos, a democratização da ONU e o respeito pela sua carta.
IV
Desenvolver a luta, reforçar o Partido,
afirmar a alternativa
A situação decorrente do agravamento da crise do capitalismo, as suas
consequências para os interesses nacionais, o aproveitamento que os grupos
económicos e financeiros e o Governo querem fazer para justificar uma nova vaga
de ataque aos direitos e às condições de vida dos trabalhadores e do povo,
colocam a necessidade do desenvolvimento e da intensificação da luta de massas
defendendo esses interesses e direitos e assumindo como objectivo a ruptura com
a política de direita e uma nova política, uma política de esquerda para
Portugal e tornam mais actual, a palavra de ordem "É tempo de lutar. É tempo de
mudar - Mais força ao PCP".
Os desenvolvimentos recentes, a derrota dos principais eixos políticos e
ideológicos em que assentou a ofensiva mundial do grande capital nas últimas
duas décadas, dão nova actualidade à necessidade do combate ao capitalismo,
comprovam o acerto das análises e alertas do PCP, exigem uma redobrada
determinação na resistência e uma afirmação confiante das propostas e do
projecto do PCP numa indispensável articulação entre a luta diária por
objectivos concretos e imediatos, a ruptura com a política de direita, a
exigência de uma alternativa de esquerda e a concretização do objectivo de uma
nova sociedade.
Existe uma alternativa real ao sistema capitalista. Uma alternativa que
é cada vez mais necessária, como o demonstra os tempos que vivemos. Substituir
o capitalismo por outro sistema social e económico, ao serviço dos
trabalhadores e dos povos - o socialismo - está colocado pela História e é uma
tarefa do nosso tempo. O Partido Comunista Português éportador dessa alternativa de fundo às crises
e à crise do capitalismo.
Apoiar o PCP, dar mais força a PCP é, a par do amplo desenvolvimento e
reforço da luta de massas, a garantia mais sólida para afirmar um novo rumo de
desenvolvimento, justiça e progresso social.
Por Abril, pelo Socialismo, um Partido mais forte, a preparação e
realização do XVIII Congresso constitui, ainda mais na actual situação, uma
grande resposta às questões da época em que vivemos e uma poderosa afirmação de
confiança na luta dos trabalhadores e do povo português, que abra o caminho de
justiça, progresso social e soberania nacional de que Portugal precisa.