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Resolução Política do XVIII Congresso do PCP |
Segunda, 01 Dezembro 2008 |
Aprovada com uma abstenção
I - Situação Internacional
0. Introdução
1. A economia mundial e a crise do capitalismo
2. A ofensiva do imperialismo
3. «Resistir é já vencer!» A luta dos comunistas, dos trabalhadores
e dos povos
4. O socialismo, alternativa necessária e possível
0. Introdução
O XVIII Congresso realiza-se numa
situação internacional de grande instabilidade e incerteza em que avulta, como
traço particularmente marcante, o desenvolvimento de uma crise económica e
financeira do sistema capitalista de grandes proporções que está a assolar o
mundo.
Apesar dos reveses sofridos, a violenta ofensiva do imperialismo não dá
sinais de recuo, antes se acentuam os seus traços fundamentais - exploração,
opressão, agressão, militarismo e guerra. O perigo de respostas violentas do
capitalismo à sua profunda crise estrutural e a pretensão do imperialismo de
impor ao mundo a sua hegemonia, fazem crescer perigos de dramáticas
consequências para o futuro dos povos.
Mas o imperialismo não tem as mãos totalmente livres, está condicionado
pelas suas próprias dificuldades e contradições, e por toda a parte prossegue a
resistência e a luta, que se diversifica nas suas formas e conteúdos, e se
traduz mesmo em situações de avanço progressista. Está em curso um processo de
rearrumação de forças a nível de Estados e estruturas de cooperação
internacionais.
O quadro é de uma multifacetada agudização da luta de classes, com a
possibilidade de rápidos e imprevistos desenvolvimentos, em que grandes perigos
para a paz, a liberdade e a soberania dos povos coexistem com reais
potencialidades de desenvolvimento progressista e mesmo revolucionário.
Perante a tragédia que o processo de reprodução do capital significa
para o mundo, perante a evidência da crise com que o sistema capitalista se
debate, reforça-se a necessidade dos Partidos Comunistas e da sua cooperação
internacionalista, e a actualidade do seu projecto de uma nova sociedade livre
da exploração do homem pelo homem, o socialismo, como a única e real
alternativa ao capitalismo e resposta aos problemas da Humanidade. A tenacidade
na construção de partidos revolucionários de vanguarda e a firmeza na luta
ideológica adquirem, nas actuais circunstâncias, uma acrescida e decisiva
importância.
1. A economia mundial e a crise do capitalismo
O XVIII Congresso do PCP
realiza-se no contexto de uma das mais graves crises do capitalismo, a maior
desde a «grande depressão» desencadeada pelo crash bolsista de 1929, e
cujo impacto mundial não se relevou ainda em toda a sua extensão. Esta crise
resulta da contradição entre a sobreprodução e sobre-acumulação de meios de
produção, por um lado, e a contracção de mercados e níveis de consumo
decorrentes das desvalorizações salariais e abismais assimetrias de
rendimentos, por outro. Esta crise, ao mesmo tempo que confirma a incapacidade
do capitalismo para se libertar das crises que periodicamente o abalam, é
reveladora de uma crise bem mais profunda, de natureza estrutural e sistémica
que, como o PCP tem assinalado, evidencia os limites
históricos do sistema capitalista e coloca a sua superação revolucionária como
uma exigência do nosso tempo.
No final de 2008 o sistema financeiro dos EUA abriu brechas profundas
com a falência ou colapso de algumas das maiores instituições de Wall Street.
Os efeitos da derrocada financeira propagaram-se rapidamente aos mercados
bolsistas e à esfera produtiva. Países apregoados como exemplos positivos da
globalização capitalista (como a Islândia) estão hoje em bancarrota. A economia
capitalista mundial entrou num grave período recessivo, cujas consequências
dolorosas para os trabalhadores e os povos do mundo irão marcar os próximos
anos. A classe dominante e os governos ao seu serviço procuram responder à
crise com gigantescas operações de transferência das dívidas para o erário
público e com a nacionalização (mais ou menos explícita) dos prejuízos das
instituições falidas, mas sem porem em causa os lucros passados e presentes do
grande capital. Sendo ainda incerta a eficácia destas medidas para evitar o
colapso do sistema financeiro e uma recessão de enormes proporções, certo é que
elas representam uma tentativa de fazer pagar aos trabalhadores e aos povos os
custos da crise gerada pelo grande capital, mantendo inalterado o poder e
domínio daqueles que são responsáveis pela crise. O aumento espectacular na
dívida pública dos principais Estados capitalistas, resultante dos
multimilionários subsídios e «planos de salvação» do sistema financeiro e dos
interesses do grande capital, representam um gigantesco fardo para os povos e,
em alguns casos, colocam em dúvida a própria solvência dos Estados. No caso dos
EUA representam um agravamento qualitativo de algumas das causas que geraram
esta explosão de crise.
As análises à economia mundial e aos traços fundamentais e tendências de
evolução do sistema capitalista feitas nos XV, XVI e XVII Congressos, foram
confirmadas pela vida e mantêm uma flagrante actualidade. A actual crise, de
dimensão internacional, tem como epicentro os EUA. É uma crise profunda, que se
inscreve num processo que tem como momentos mais próximos a crise do peso
mexicano de 1994/95, a crise «asiática» de 1996/97, a crise na Rússia e nos
países do Leste europeu de 1998, a crise no Brasil e Argentina em 1999 e 2001,
a crise da «nova economia» de 2001/2003, e a crise do sector imobiliário
norte-americano desencadeada em Agosto de 2007. A sua expressão financeira e
rápida expansão resultam do grau de financeirização atingido pelo sistema em
resposta ao longo ciclo de estagnação económica iniciado nos anos 70, e que tem
vindo a manifestar-se por uma desaceleração das taxas de crescimento do
produto, de década para década, no centro capitalista desenvolvido.
A centralização e
concentração do capital e da riqueza realizam-se a um ritmo sem
precedentes, impulsionadas pelos Estados ao seu serviço, pela guerra, pelas
instâncias formais e informais de articulação internacional do capitalismo,
pelas políticas de «competitividade» e «livre mercado» que aceleram a ruína das
empresas não monopolistas e a destruição das economias menos desenvolvidas e
dependentes, pelo acelerado processo de fusões e aquisições, que quintuplicaram
desde final da década de 80, e também como resultado da nova fase da crise que
se abriu em Setembro de 2008. Reforça-se o peso das grandes empresas
multinacionais que controlam 2/3 do comércio mundial, algumas das quais com um
peso económico superior ao de alguns Estados.
A financeirização
da economia continua a acentuar-se com a explosão do crédito e do capital
fictício. A própria dinâmica da exploração gera uma massa de capitais sob a
forma de dinheiro, excedentária e em crescimento que, face às dificuldades de
obtenção das taxas de lucro esperadas na esfera produtiva, se desloca para a
esfera financeira e especulativa em detrimento do investimento produtivo,
contribuindo para a transferência e concentração das mais-valias geradas. Uma
tal situação é acompanhada da criação e crescimento de mercados cada vez mais
distantes da economia produtiva (como os de «futuros» e outros instrumentos
financeiros) que, no quadro da livre circulação de capitais, da
desregulamentação e integração dos mercados financeiros, das deslocalizações e
criação artificial da procura pelo crédito fácil, acentuam a irracionalidade e
a anarquia do sistema capitalista, tornando-se factor maior da instabilidade
monetária, bolhas especulativas e colapsos bolsistas, e tendem a tornar as crises
cíclicas, inerentes ao sistema capitalista, mais globais e mais destruidoras. A
presente crise é uma concludente expressão desta realidade.
Intensifica-se a exploração dos trabalhadores com a extensão do uso da força de trabalho
e a redução, por todos os meios possíveis, da sua remuneração, visando
arrecadar a maior fatia possível de mais-valia, tirando partido do
enfraquecimento temporário do movimento comunista e operário. São eixos
centrais desta ofensiva a redução dos salários reais, a intensificação dos
ritmos de trabalho, a apropriação dos ganhos de produtividade do trabalho pelo
capital, a desregulamentação e o aumento do horário de trabalho, o aumento da
idade de reforma e diminuição dos valores de reformas e pensões, a
desregulamentação das relações laborais. A linha de ataque ao sindicalismo de
classe e à contratação colectiva constitui uma das mais graves expressões da
política exploradora e reaccionária do grande capital e da ofensiva
imperialista. Altíssimas taxas de desemprego, generalização do trabalho
precário, particularmente entre as novas gerações de trabalhadores, regressão
de direitos sociais e laborais, sobre-exploração dos trabalhadores migrantes,
são realidades que estão a ser falsamente apresentadas como inelutáveis,
realidades que contribuem, nomeadamente, para o aumento do exército de reserva
e para a redução do peso dos salários no rendimento criado.
Aprofunda-se a polarização social, tanto dentro de cada país, a começar pelos EUA e outras grandes
potências capitalistas, como, à escala mundial, ainda que com contradições,
entre o centro capitalista desenvolvido e a periferia subdesenvolvida. A
flagrante contradição entre os gigantescos avanços da ciência e da técnica e as
terríveis regressões sociais que percorrem o mundo contemporâneo constitui uma
condenação política e moral do sistema capitalista. Segundo as próprias
estatísticas da ONU, cerca de mil milhões de pessoas sofrem de fome crónica e
cem mil morrem todos os dias em consequência directa ou indirecta de
subnutrição.
Intensifica-se o ataque sistemático a funções sociais do Estado conquistadas pela luta, ao mesmo tempo que
se reforça a sua componente coerciva (forças armadas, polícias, serviços de
informação, tribunais) e os mecanismos de domínio do capital e de sujeição aos
centros do imperialismo.
Mercantilizam-se todas as esferas da vida social,
numa lógica de privatizar tudo quanto possa gerar maiores remunerações ao
capital (saúde, educação, segurança social, cultura, tempos livres) e de
transformar em negócio a própria satisfação das necessidades mais elementares
da existência humana (alimentação, água, natureza). Face à deterioração das
condições ambientais resultante do modo de produção capitalista, desenvolve-se
uma sofisticada ofensiva ideológica de cobertura à pilhagem de recursos
naturais, e de criação de novos mercados, como o da reconversão ambiental e das
energias alternativas.
A evolução do capitalismo suporta-se na exploração do trabalho humano e, paralelamente, na
exploração irrestrita de recursos naturais à escala planetária para além do seu
ritmo de renovação e da possibilidade da sua disponibilidade futura, gerando
fluxos de resíduos e impactos ambientais que são ameaças destrutivas para a
biosfera e a sobrevivência da sociedade humana.
Acentua-se o carácter parasitário e decadente do capitalismo, com a instalação no poder do crime
organizado e o florescimento de todo o género de tráficos criminosos (armas,
droga, prostituição, trabalho escravo, órgãos humanos, mulheres e crianças) com
a cobertura e cumplicidade da banca internacional e seus sofisticados
instrumentos de circulação e branqueamento de capitais, em que avultam os offshores.
A expansão lucrativa assenta na multiplicação de situações de miséria e brutal
destruição de relações sociais estáveis, provocadas pelas políticas de saque
associadas à globalização imperialista e às ingerências e agressões militares
do imperialismo.
A evolução do capitalismo no terreno económico e social é acompanhada de
desenvolvimentos no plano político,
cultural, ideológico e militar, de
sentido profundamente reaccionário, e mesmo fascizante, envolvendo o ataque
às liberdades e direitos democráticos; o reforço do controlo dos aparelhos
ideológicos; a subordinação dos aparelhos legais e judiciários aos interesses do
capital; a ofensiva contra a soberania dos Estados e de recolonização do
planeta; o desenvolvimento do militarismo e uma nova corrida aos armamentos.
Neste pano de fundo, que caracteriza a evolução do sistema capitalista,
verificaram-se, após o XVII Congresso, alguns desenvolvimentos que, para além
da sua importância conjuntural, expressam novas arrumações de forças e
tendências que importa sublinhar:
- - A crise desencadeada nos EUA pôs em evidência os gravíssimos
problemas de uma economia altamente deficitária, endividada e crescentemente
dominada pelo complexo militar-industrial, com disparidades e problemas sociais
gravíssimos, em que cerca de 35 milhões de pessoas vivem em
situação de pobreza. A dívida externa atinge quase 90%
do PIB. Mais do que «locomotiva» da economia mundial, os
EUA têm sido um ilimitado sorvedouro da mais-valia criada pelos trabalhadores
de todo o mundo, assim como dos recursos naturais. Representando somente 4,6%
da população mundial, consomem mais de 20% dos recursos energéticos,
sendo responsáveis por cerca de 21% das emissões de CO2..
A superioridade militar, o potencial científico e tecnológico
e a hegemonia dos EUA nos mecanismos de criação e difusão
da ideologia dominante, são inegáveis. Mas o seu poderio económico
e a sua posição privilegiada como principal centro financeiro
mundial estão enfraquecidos, com expressão na desvalorização
e descredibilização do dólar e do seu papel de moeda
de reserva internacional, papel este que já está a ser abertamente
contestado. A economia norte-americana confirmou-se como o principal factor
de instabilidade e crise da economia mundial.
- - O reforço da União Europeia como bloco imperialista,
sem subestimar as fragilidades e contradições que o processo
de integração capitalista na Europa envolve, torna ainda mais
clara a natureza de classe da UE como instrumento do grande capital e das
grandes potências capitalistas da Europa Ocidental, caindo por terra
duas teses centrais com que se pretende enganar as massas: a de que a integração
capitalista europeia visaria contrariar os «excessos da globalização»,
e a que pretende que uma «Política Externa e de Segurança
Comum» e respectivos instrumentos militares, tornaria a UE mais segura
e um obstáculo ao «unilateralismo» dos EUA. De facto, o
que está a verificar-se, e com uma inquietante rapidez, é a
intensificação e refinamento das políticas neoliberais
orientadas para o aumento da exploração e do poder do grande
capital e, no imediato, quer directamente quer via NATO, o reforço
da aliança estratégica com os EUA e um intervencionismo cada
vez mais agressivo e ambicioso.
- - O desenvolvimento económico da China e o seu crescente peso internacional
(com a perspectiva de se tornar nas próximas décadas a primeira
potência económica mundial), a par da emergência
de outros grandes países com altas taxas de crescimento como a Índia,
o Brasil, a Rússia e outros. Ao mesmo tempo, desenvolvem-se alianças
e processos de cooperação e integração regional
que, situando-se em geral numa lógica de expansão das relações
capitalistas de produção, tendem ainda assim (como nos casos
do MERCOSUL, da UNASUR - a União das Nações Sul Americanas,
ou da Organização da Alternativa Bolivariana para as Américas
- ALBA, impulsionado pela Venezuela, ou da Organização de Cooperação
de Xangai) a contrariar as pretensões hegemónicas dos EUA e
das duas outras grandes potências da «Tríade», a
UE e o Japão. Estes processos, que expressam o desenvolvimento desigual
do capitalismo e geram contradições inter-imperialistas, têm
pesado positivamente na arrumação de forças no plano
internacional e na resistência dos povos ao imperialismo.
- - A acentuação do carácter predador do capitalismo e
as consequências da recolonização planetária em
curso revelam-se particularmente no agravamento dos problemas agro-alimentar,
energético e ambiental. A rapina das multinacionais, assente nas
políticas de ajustamento estrutural do Fundo Monetário Internacional
(FMI) e do Banco Mundial (BM), na liberalização do comércio
mundial impulsionada pela Organização Mundial do Comércio
(OMC), numa desenfreada especulação bolsista, está a
provocar insuportáveis aumentos de preços e a empurrar o mundo
para situações de grave crise sem solução no quadro
do capitalismo. Os «motins da fome», que têm tido lugar
em numerosos países, contra os aumentos dos preços dos bens
alimentares (mais de 37% em 2007 e 14% em 2006), constituem uma inequívoca
condenação das imposições neocoloniais e da política
das multinacionais do sector agro-alimentar (incluindo a afectação
de vastas áreas parar a produção de biocombustíveis),
que assentam os seus fabulosos lucros nos mais cínicos mecanismos de
reprodução capitalista da fome e da miséria.
O capitalismo é o modo de produção e a formação socioeconómica dominante
e a dinâmica das suas contradições marca decisivamente toda a evolução mundial.
Mas esta influência não é absoluta. Há forças sociais e políticas, incluindo
Estados, que intervêm na configuração do mundo em que vivemos e na correlação
de forças de classe em que lutamos, que pesarão tanto mais quanto maior partido
tirarem das dificuldades e contradições do capitalismo.
No momento actual impõe-se passar à ofensiva no plano da luta das
ideias, tirando as necessárias ilações políticas e ideológicas da crise
económica e financeira do capitalismo: ela está a abrir uma brecha profunda no
fundamentalismo e na tecnocracia neoliberal; representa um rude golpe no
triunfalismo capitalista dos anos 90, resultante das derrotas do socialismo;
deita por terra toda uma propaganda visando fazer crer que o capitalismo se
tornou capaz de dominar as suas contradições e furtar-se às sempre destruidoras
crises cíclicas inerentes ao próprio modo de produção capitalista e ao sentido
destrutivo da sua evolução.
No ano em que se assinalam os 160 anos do Manifesto do Partido Comunista
e o 190º aniversário do nascimento de Marx uma conclusão se impõe da observação
do mundo actual: não obstante as grandes transformações por que passou o
sistema capitalista, a análise marxista do capitalismo mantém uma
extraordinária vitalidade e as leis fundamentais da reprodução do capital
formuladas por Marx e Engels revelam-se de uma flagrante actualidade. Tal é o
caso da lei do valor e da teoria da mais-valia que desvenda os
mecanismos da exploração capitalista e da lei da baixa tendencial da taxa de
lucro, que o capital tudo faz para contrariar, intensificando quanto
possa e a correlação de forças lho permita, a exploração do proletariado, e que
determina a financeirização crescente da economia. Tal é também o caso da lei
da pauperização relativa, que ilumina as causas de fundo inultrapassáveis
pelo capitalismo das crises de sobreprodução. E tal é o caso da validade das
teses de Lenine sobre o imperialismo, nomeadamente da lei do desenvolvimento
desigual do capitalismo, que mostra a impossibilidade de
constituição de um mecanismo único capitalista (um «super-imperialismo») que
anule a concorrência dos monopólios e as contradições inter-imperialistas,
causa primeira do militarismo, da agressão e da guerra.
A resposta do capitalismo à
crise em que se debate tende para expressões de força cada vez mais violentas. O que não significa que, quando
necessário, como na presente crise, o Estado capitalista não procure recorrer a
medidas de tipo keynesiano, visando a salvaguarda dos interesses do grande capital,
com os quais a social-democracia se encontra estruturalmente comprometida. É
uma perigosa ilusão pensar que, mantendo intocável o poder económico e político
do grande capital e a hegemonia do capital financeiro, é possível dar resposta
aos anseios dos trabalhadores e dos povos e preservar a Humanidade de terríveis
convulsões e regressões de civilização. Só profundas transformações de carácter
antimonopolista e anticapitalista impostas e defendidas pelas massas o podem
conseguir.
2. A ofensiva do imperialismo
Os últimos quatro anos foram
marcados pela intensificação da ofensiva imperialista, com o avanço do militarismo e multiplicação
das guerras imperialistas; o crescente e articulado ataque à soberania dos
Estados, ao direito internacional e ao exercício pelos povos do direito à sua
autodeterminação, e a abertura de frentes simultâneas de conflito
diversificadas quanto aos seus objectivos, métodos utilizados e países e povos
visados.
Dando corpo a um revanchista e violento processo de ajuste de contas com
a luta dos trabalhadores e dos povos, e com a História do século XX, o
imperialismo procura por todos os meios perverter
o edifício legal saído da II Guerra Mundial, de natureza fundamentalmente pacífica e antifascista, que,
apesar dos retrocessos e alterações verificadas, nomeadamente no mapa político
da Europa, continua a ser um obstáculo às pretensões hegemónicas do
imperialismo dos EUA e seus aliados.
Sendo certo que o aprofundamento da ofensiva revela uma correlação de
forças ainda muito desfavorável, não é menos certo que a incapacidade do
imperialismo em derrotar resistências e mistificar ou esconder os aspectos mais
violentos da sua ofensiva, revela dificuldades e perda de margem de manobra no
plano político e ideológico, favoráveis à luta anti-imperialista.
Dando expressão aos objectivos económicos
centrais da ofensiva imperialista de alimentar os lucros das grandes
multinacionais e de globalizar a exploração capitalista, são hoje
particularmente nítidos os grandes objectivos geo-estratégicos que visam expandir o domínio das principais
potências imperialistas a todo o globo: dar cobertura política e militar à
expansão e instalação das multinacionais; assegurar o controlo directo das
fontes e dos fluxos energéticos, das reservas de minérios, água e terras
aráveis, das comunicações e principais vias de transporte de mercadorias a
nível mundial; aprofundar o cerco geo-estratégico e militar às «potências
emergentes» com especial destaque para a Rússia e a China, e conter processos
de afirmação de relações económicas, políticas e estratégicas que fujam ao
férreo controlo do imperialismo.
Esta é uma ofensiva que visa conter
ou «domesticar» expressões autónomas de afirmação de soberania, como as que se
verificam na América Latina mas também em África, no Médio Oriente e no
continente asiático; prevenir revoltas sociais e sobretudo a sua transformação
em movimentos de luta política que ponham em causa os interesses da classe
dominante; criminalizar forças revolucionárias e focos de resistência anti-imperialista.
Multiplicam-se os ataques ao
direito internacional e à soberania dos Estados numa estratégia global que,
por via do reforço de relações de natureza colonial, do desmembramento de
países e da criação de protectorados, como é exemplo o caso do Kosovo, visam a
recolonização do planeta e redesenhar o mapa político mundial em favor dos
interesses hegemónicos do imperialismo. Com ou sem cobertura da ONU, o
objectivo é assegurar às multinacionais fontes de matérias-primas, mão-de-obra
barata e mercados e impedir, com a corrupção e a ajuda das classes dominantes
dos respectivos países, uma segunda vaga do movimento de libertação nacional e
social.
O fortalecimento de directórios de potências; a promoção e
«institucionalização» de centros de concertação e decisão do grande capital
(como o G7 ou o Fórum de Davos); o papel das instituições económicas
internacionais do imperialismo (OCDE, FMI, BM, OMC) como rolos compressores das
economias nacionais e carrascos dos direitos sociais e laborais dos trabalhadores
e povos; a afirmação de instituições internacionais - como o Conselho da Europa
- como centros de diversão ideológica profundamente anticomunistas; o processo
de transformação da Organização de Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) num
instrumento da cavalgada do imperialismo para Leste desencadeada após a
desagregação da URSS; a instrumentalização da ONU pelas grandes potências da
NATO, subvertendo o seu papel de garante do cumprimento do direito
internacional e de defesa da paz, são preocupantes expressões de uma política de crescente centralização do
poder político e da sua submissão ao poder económico e às estratégias de
militarização das relações internacionais.
Insere-se nesta linha a evolução
na União Europeia que corresponde a uma nova fase da intervenção
imperialista da Alemanha e de outras grandes potências europeias que se
constituem como um bloco político, económico e militar, intimamente coordenado
com a NATO, um pólo imperialista que, não obstante reais rivalidades e
contradições inter-imperialistas, concerta e partilha com os EUA zonas de
influência e intervenção. Apresentado como um «espaço de democracia» e de
«defesa dos direitos humanos», trata-se na realidade de um centro
político-ideológico do imperialismo, profundamente antidemocrático na sua
essência e desrespeitador dos direitos dos trabalhadores e dos povos de todo o
mundo.
Tentando ocultar a sua natureza exploradora, o imperialismo aprofunda e diversifica a ofensiva ideológica. Intensificam-se
os processos de concentração dos meios de comunicação social e de
instrumentalização das novas tecnologias da informação para impor aos
povos um pensamento e um padrão cultural e comportamental únicos. Promove-se
o consumismo, o individualismo e a apatia e estimulam-se comportamentos anti-sociais.
Projecta-se o conformismo e animam-se factores de divisão de classe como o
racismo e a xenofobia. Instrumentalizando o conceito de solidariedade, impulsionam-se organizações e eventos altamente
mediatizados que, visando substituir o respeito de direitos por práticas
caritativas, desencorajam a luta e favorecem os mecanismos de exploração.
Conceitos como «guerra de civilizações» ou «valores ocidentais» e
a instrumentalização das questões étnicas, religiosas, ambientais e de direitos
humanos, convergem numa estratégia para submeter países e povos.
O carácter profundamente reaccionário das políticas económicas, sociais
e de relações internacionais, e a conversão da social-democracia ao
neoliberalismo, afirmando-se como um pilar fundamental da ofensiva
imperialista, são factores que, cruzados com as consequências sociais,
económicas e demográficas da exploração capitalista, estão intimamente ligados
a expressões de ressurgimento do
fascismo e ao acesso de forças neofascistas ao poder em vários países,
nomeadamente na Europa. Paralelamente, prossegue a reescrita da História, com o branqueamento das ditaduras fascistas e
a obscena equiparação entre fascismo e comunismo, e aposta-se no anticomunismo, na criminalização dos que
resistem ao imperialismo e na perseguição às forças que, das mais variadas
formas, resistem à exploração, à opressão e à guerra, ou lutam pela
transformação revolucionária da sociedade.
A militarização das relações internacionais foi a vertente da
ofensiva imperialista que mais se desenvolveu nos últimos anos. O mundo está
hoje profundamente instável e inseguro. A retórica capitalista sobre a paz, que se sucedeu ao desaparecimento da
URSS e do socialismo como sistema mundial, é desmentida por uma realidade
assente na multiplicação de guerras imperialistas de ocupação e na afirmação do
militarismo como arma política e económica das maiores potências capitalistas.
Os conceitos fascizantes contidos na
«Estratégia de Segurança Nacional dos Estados Unidos da América», adoptada
entretanto pela NATO e pela União Europeia, foram assimilados pelas legislações
ditas «anti-terroristas» de vários países. Generalizou-se a teoria da
«guerra preventiva» e desenvolvem-se sofisticadas campanhas
mundiais de banalização da violência e
de tolerância de práticas criminosas como a tortura, os campos de
concentração, as detenções ilegais, o rapto e o tráfico ilegal de prisioneiros
(efectuados, em muitos casos, através do território e do espaço aéreo
nacionais), o apoio a grupos paramilitares e a protecção a confessos
terroristas.
Tal ofensiva militarista e securitária é sustentada no discurso do
combate ao «terrorismo global». O
terrorismo, sob todas as suas formas, incluindo o terrorismo de Estado, é
profundamente contrário aos interesses dos trabalhadores e povos. A História e
a actualidade demonstram que o imperialismo promove e alimenta o terrorismo, invocando-o depois para difundir uma falsa
dicotomia entre segurança e liberdade, e para fortalecer a componente
repressiva dos Estados e a devassa e controlo da vida dos cidadãos e das
relações sociais.
O rasgar de tratados internacionais essenciais para o equilíbrio estratégico
(como o Tratado ABM); a agressão e desmantelamento da Jugoslávia; a instalação do chamado «sistema de defesa anti-míssil» norte-americano na Europa e a expansão da NATO e das bases militares do
EUA para as fronteiras da Rússia; a militarização da Alemanha; a ofensiva
política e militar nos países da bacia do mar Cáspio e no Cáucaso; as provocações contra a China; o «regresso a África» de várias potências
militares, com destaque para os EUA, e a instalação do comando militar AFRICOM;
a reactivação da IV Esquadra
norte-americana na América Latina; o
rearmamento do Japão e a revisão
militarista da sua Constituição; os acordos
nucleares com a Índia e as manobras de desestabilização e ingerência em Timor Leste, por parte da Austrália e
EUA, são exemplos elucidativos do carácter
global da ofensiva militar e geo-estratégica do imperialismo e dos intentos
recolonizadores que lhe estão associados.
O
Médio Oriente e o continente asiático mantêm-se como os principais focos de instabilidade. O prosseguimento
da ocupação imperialista do Iraque
e dos crimes sionistas de Israel na Palestina; a intensificação da guerra no
Afeganistão e o seu progressivo alastramento ao Paquistão; as provocações e
ameaças de intervenção ou provocação militar contra o Irão e a Síria por parte
de Israel e dos EUA; as ingerências e agressões no Líbano; as ameaças à República Popular Democrática da Coreia;
a instabilidade política provocada no Sri Lanka, Bangladesh e Myanmar,
configuram um perigoso cenário para a paz mundial, que assume dimensões
potencialmente explosivas com a recente escalada bélica no Cáucaso por parte de
uma Geórgia totalmente enfeudada ao imperialismo e por este instrumentalizada.
A realidade
evidencia que é dos centros políticos e militares do imperialismo que emanam
a insegurança e os perigos que caracterizam a situação internacional. O
facto de as despesas
militares mundiais terem aumentado, desde 1998, cerca de 45%, e de os
orçamentos militares dos EUA e dos principais aliados da NATO atingirem valores
recorde, demonstram bem a aposta numa nova corrida armamentista que alimenta os
fabulosos lucros da sua indústria - como
o comprova o aumento superior a 100% das vendas das 100 maiores empresas do
complexo militar industrial na última década (74 das quais de Estados membros
da NATO) - e de um conjunto de empresas de recrutamento de mercenários e de
logística que florescem num novo fenómeno de «privatização» dos conflitos
militares.
As declarações de inquietação com o
investimento militar por parte de países em desenvolvimento são cabalmente
desmascaradas pelo facto de os EUA e a
NATO dominarem quase hegemonicamente as capacidades militares mundiais, incluindo a produção e o comércio de
armas. Só o orçamento militar dos EUA representa cerca de metade das despesas
militares mundiais, envolvendo 761 bases e outras instalações militares em
território estrangeiro.
Num quadro de grandes inquietações quanto à possibilidade de
generalização de conflitos com consequências imprevisíveis para a Humanidade, a questão nuclear readquire uma importância
crescente. As principais potências imperialistas desenvolvem programas
multimilionários de modernização dos seus arsenais nucleares e de sistemas de
mísseis estratégicos. Ao mesmo tempo que procura impedir o desenvolvimento da
indústria nuclear para fins pacíficos por parte de países que recusam a sua
hegemonia, o imperialismo admite criminosamente utilizar novamente a arma
nuclear.
A um rápido desenvolvimento do militarismo e do carácter multifacetado
da ofensiva imperialista tem correspondido um fortalecimento das estruturas de coordenação estratégico-militares do
imperialismo. A NATO, na sua cimeira de Riga, em Novembro de 2006, acentuou
a sua natureza de organização global de carácter ofensivo, concretizando, na
Cimeira de Bucareste de 2008, a sua expansão nos Balcãs e a linha estratégica
de futura inclusão da Ucrânia e Geórgia nos planos de dominação do Cáucaso e mar
Negro. Paralelamente, desenvolve um vasto conjunto de acordos de «parceria» nos
continentes asiático e africano, alargando a sua esfera de influência e
tentando submeter o maior número de países possível. Os objectivos, métodos e
evolução da NATO comprovam o seu carácter de «polícia de choque» do
imperialismo e reforçam, de acordo com a própria Constituição da República
Portuguesa, a exigência de dissolução desta organização agressiva, de cuja
estrutura militar Portugal deve progressivamente desvincular-se.
A ofensiva do imperialismo desenvolve-se num quadro de acelerada mutação
e rearrumação de forças, quer no plano da luta de classes quer dentro do
próprio campo imperialista, que tende a acentuar-se com a crise capitalista.
Adquire, neste contexto, particular importância a interpretação das dinâmicas inter-imperialistas em que,
num quadro de crescentes e sobretudo mais visíveis rivalidades entre os dois
mais importantes pólos da «Tríade» - União Europeia e Estados Unidos da América
- em torno da competição por mercados, áreas de influência e recursos,
subsistem aspectos centrais de concertação de classe e de partilha de poder.
A principal potência imperialista mundial - os EUA - confirmou-se nos últimos quatro anos como a ponta de lança
do militarismo e belicismo imperialistas com a política fascizante da
Administração Bush. Esse papel não será abandonado sem uma profunda alteração
da correlação de forças no plano mundial, em favor da paz e do progresso social
e sem uma profunda alteração do sistema económico e político dominantes na
sociedade norte-americana. A eleição de Obama e a projecção internacional que
lhe foi atribuída, suportada numa intensa e sofisticada campanha mediática, não
pode ser dissociada da operação que, a propósito das eleições presidenciais
norte-americanas, se desenvolveu para procurar reverter o crescente isolamento
e descrédito dos EUA no plano internacional. Reflectindo a ampla rejeição
popular das políticas da Administração Bush, a eleição de Obama está longe de
corresponder às expectativas que, no plano interno e internacional, em torno
dela se geraram quanto a uma possível alteração substancial das orientações,
conteúdos e objectivos da política dos EUA.
A realidade demonstra que, a não ser travada, a ofensiva do imperialismo
pode pôr em causa a própria existência da Humanidade. O mundo está confrontado
com grandes perigos que não devem ser subestimados. Simultaneamente, tais
perigos coexistem com uma forte resistência dos trabalhadores e dos povos e com
reais potencialidades de desenvolvimento progressista e mesmo revolucionário.
3. «Resistir é já vencer!» A
luta dos comunistas, dos trabalhadores e dos povos
A intensificação da ofensiva do imperialismo deparou-se com uma
crescente resistência dos trabalhadores e dos povos.
Face ao generalizado agravamento das condições de vida das massas
trabalhadoras, às limitações ou destruição de importantes conquistas sociais e
direitos democráticos, aos ataques às soberanias nacionais, a luta de classes
agudizou-se e intensificou-se em diversas frentes, assumindo formas, conteúdos
e objectivos muito diferenciados convergindo na condenação e rejeição das
políticas do grande capital e do imperialismo. Apesar da correlação de forças
se manter desfavorável, prosseguiu por toda a parte a luta das forças do
progresso social, de libertação nacional, da paz e do socialismo.
A luta dos trabalhadores pelas suas
reivindicações e por uma
sociedade mais justa, envolvendo a classe operária e outras camadas de
assalariados, no sector público e privado, traduziu-se em importantes
movimentos grevistas, manifestações e jornadas nacionais de luta. Em todos os
continentes milhões de trabalhadores associaram a luta reivindicativa nos
locais de trabalho a manifestações de rua por trabalho com direitos, valorização
dos salários, liberdade sindical, segurança social, justiça fiscal, e contra as
privatizações, o encerramento e deslocalização de empresas, o ataque aos
serviços públicos. As greves gerais em numerosos países são apenas alguns
exemplos de lutas que se travam diariamente por todo o mundo e que a
comunicação social dominante, ao serviço do capital, se esforça por ocultar. A
resistência à ofensiva exploradora do capital, em que, a par da destruição de
conquistas históricas dos trabalhadores, sobressai a dramática situação de
pobreza para que são empurrados cada vez mais milhões de seres humanos, assumiu
novas expressões em sectores e países muito diversos, como a manifestação de
crianças trabalhadoras no Bangladesh e a marcha dos pobres na Índia, ou os motins
contra o brutal aumento dos preços dos bens alimentares e, mais recentemente,
os protestos populares contra os efeitos das falências bancárias. A organização
da classe operária e dos trabalhadores e, em primeiro lugar, a existência de um
combativo movimento sindical unitário, de classe e de massas, é de decisiva
importância para uma correcta orientação no desenvolvimento e eficácia da luta.
Particular projecção assumiu a luta dos trabalhadores imigrantes,
nomeadamente nos EUA e na Europa, contra
as leis racistas e xenófobas, pela legalização e igualdade de direitos e contra
a sobre-exploração.
Fortemente atingidas pela ofensiva do grande capital estão as massas camponesas que, face às
orientações da OMC, ao desenvolvimento da agro-indústria e dos agro-combustíveis,
vêem a sua sobrevivência ameaçada pelo negócio e a especulação capitalistas. As
reivindicações dos camponeses e do proletariado agrícola pelo direito a
produzir, por preços compensadores à produção, contra a utilização dos
transgénicos, pelo direito à terra, têm estado no centro da luta de classes em
numerosos países, como testemunham as grandes manifestações no Paraguai, no
Brasil ou na Índia, e têm sido o motor de profundas transformações políticas e
sociais, como na Bolívia e no Equador, em defesa das comunidades indígenas e
das produções tradicionais, em defesa da água pública e do meio ambiente.
A exploração crescente das massas camponesas pelas multinacionais da
indústria alimentar e a especulação em torno dos preços dos alimentos trouxeram
para primeiro plano da situação internacional o flagelo da fome, potenciando-a como geradora de novos conflitos e
confirmando a soberania e segurança alimentar como componente fundamental da
independência nacional e do progresso social. A questão da propriedade da terra
e da reforma agrária, de acordo com o lema «a terra a quem a trabalha», é de
redobrada actualidade.
A crise do sistema também se reflectiu sobre a pequena e média burguesia urbana, nomeadamente sobre os micro,
pequenos e médios empresários, que reagem de forma mais organizada aos efeitos
da concentração capitalista em todas as áreas de actividade. Destaque merece
também a luta dos intelectuais e quadros
técnicos que, como camada cada vez mais proletarizada, sofre a perda de
direitos, o espectro do desemprego e a degradação dos rendimentos. A luta das mulheres, integrando as mais
diversas organizações ou através dos seus próprios movimentos, assume cada vez
maior importância, desde logo contra a exploração da mão-de-obra feminina e em
defesa dos seus direitos específicos, na solidariedade com as mulheres vítimas
das mais diversas formas de violência, e da ofensiva agressiva do imperialismo.
As lutas da juventude adquirem uma
enorme importância não apenas na defesa dos seus interesses imediatos pelo
direito ao trabalho e em defesa da escola pública, mas também na defesa dos
mais amplos direitos dos trabalhadores, da liberdade, da democracia e da paz.
A luta contra o imperialismo conheceu um
desenvolvimento particularmente importante nos últimos anos. A resistência à política de ingerência,
agressão e guerra, em particular dos EUA, foi um traço marcante da luta dos
povos em defesa da sua soberania e do direito inalienável a decidir dos seus
destinos. No Iraque, no Afeganistão, na Palestina, no Líbano, em Cuba, na
Venezuela, na Bolívia, no Equador, assim como na Síria, no Irão, na R.D.P. da
Coreia, nos Balcãs, na Colômbia ou em Chipre, prosseguem processos e batalhas
decisivos para o futuro desses povos e para a estabilidade nas respectivas regiões
que merecem a activa solidariedade dos comunistas portugueses. Nelas intervêm
forças muito distintas na sua origem, objectivos e formas de luta, mas dispondo
de real apoio de massas e convergindo na rejeição de arrogantes e humilhantes
imposições externas e na defesa da cultura e soberania nacionais. A luta contra
a integração capitalista europeia é parte integrante deste vasto movimento.
O movimento da paz, após uma ampla e combativa expressão
associada às ameaças dos EUA ao Iraque e ao desencadear da guerra, tem agora
manifestações mais dispersas. Mas há sinais positivos que importa encorajar. Na
Europa desenvolveu-se a oposição à acelerada militarização da UE e a luta
contra a instalação do sistema anti-míssil dos EUA e o alargamento da NATO para
Leste. Desenvolveu-se a luta contra as bases militares estrangeiras, e grandes
manifestações contra o militarismo tiveram lugar no Japão e na Índia. O
Conselho Mundial da Paz reforçou-se e desempenha hoje um papel mais activo.
Mas, não estando o movimento da paz à altura da gravidade da situação, é
necessário prestar-lhe mais atenção e intensificar a solidariedade com todos os
povos vítimas das ingerências e das agressões do imperialismo.
Em particular é necessário expressar activa solidariedade à luta dos povos pela sua autodeterminação e
independência, como na Palestina, Saara Ocidental,
Chipre, ou pela consolidação de processos democráticos de independência
nacional, como em Timor-Leste, assim como para com corajosos processos de
afirmação de soberania que encerram um grande significado político e apontam
para uma rearrumação de forças em detrimento do imperialismo. Tal é o caso do
continente latino-americano onde os EUA, depois de sérios reveses, e com a
ajuda de governos fascizantes como na Colômbia, estão a lançar uma perigosa
contra ofensiva que é necessário denunciar e derrotar.
A evolução da situação na América Latina num sentido progressista
e anti-imperialista, apesar de traços contraditórios e da própria diversidade e
originalidade dos processos, constitui um dos mais encorajadores exemplos de
avanço libertador desde o XVII Congresso. As mudanças a nível do poder em
numerosos países, impulsionadas e sustentadas por poderosos movimentos
populares, com tradução em importantes vitórias eleitorais, têm revertido na
adopção de importantes medidas de carácter democrático e social. Foram
abandonadas algumas orientações neoliberais e sustidos alguns dos seus aspectos
mais agressivos, o que possibilitou a rejeição da Área de Livre Comércio das
Américas (ALCA) e avanços num processo de integração latino-americana de
sentido global positivo. Com múltiplas expressões, desde o Mercosul que,
inscrevendo-se num funcionamento capitalista, afronta objectivamente a
hegemonia norte-americana, até à ALBA - com um conteúdo vincadamente solidário
e anti-imperialista -, outros instrumentos de cooperação têm sido criados na
base de relações mais equitativas e justas. Procurando reverter tais
desenvolvimentos e depor governos democraticamente eleitos, os EUA desenvolvem
intensa actividade subversiva apoiando as forças mais reaccionárias, como os
recentes acontecimentos da Bolívia revelam.
O exemplo revolucionário de Cuba socialista, a defesa intransigente da
sua soberania, face a ameaças e actos terroristas por parte do imperialismo e a
um feroz e prolongado bloqueio, e a sua activa solidariedade com os povos e
processos em desenvolvimento na América Latina, tem constituído precioso
estímulo para as transformações progressistas na Venezuela bolivariana, no
Equador, na Bolívia e outros países.
A luta em defesa da soberania
nacional, o seu carácter popular
e de massas, envolvendo forças sociais, políticas e religiosas muito diversas,
sendo uma importante expressão da luta libertadora dos povos, é, no actual
contexto da globalização imperialista uma expressão viva da luta de classes,
assumindo um incontornável conteúdo internacionalista e pondo em evidência a
importância do marco nacional da luta de transformação social e emancipação dos
povos.
Importante realidade do quadro internacional, nomeadamente pelo seu
papel de resistência à «nova ordem» imperialista, são os países que definem como orientação e objectivo a construção duma
sociedade socialista - Cuba, China, Vietname, Laos e R.D.P. da Coreia. Com
percursos diversos, experiências históricas próprias, evoluções distintas,
problemas e contradições inerentes ao processo de transformação social num
quadro de relações capitalistas dominantes, estes países estão sujeitos pelo
imperialismo a uma intensa campanha de pressões económicas, ameaças militares e
operações de desestabilização e intoxicação mediática que encerram graves
perigos para a segurança internacional e que, a vingarem, significariam um
grave retrocesso na luta libertadora. Independentemente das avaliações diferenciadas
em relação ao caminho e às características destes processos - a exigir uma
permanente e cuidada observação e análise - e das inquietações e discordâncias,
por vezes de princípio, que suscitam à luz das concepções programáticas
próprias do Partido, o PCP
considera que não há vias únicas de transformação social e reafirma o
inalienável direito destes países e dos seus povos, como de todos os povos do
mundo, a decidir livremente sobre o seu próprio caminho. É esse o interesse da
causa do progresso social e da paz em todo o mundo.
A revolução cubana, que assinalará na viragem do ano o seu 50º
aniversário, defrontando ao longo deste meio século permanentes campanhas de
ingerência, desestabilização e agressão, projecta-se no mundo pelas conquistas
políticas, económicas, sociais e culturais alcançadas, pela defesa
intransigente da sua soberania nacional, pelo seu exemplo de patriotismo e
internacionalismo, e pela sua posição de vanguarda nos domínios da saúde e da
educação. A solidariedade com Cuba socialista é um imperativo de todas as
forças revolucionárias e amantes da paz.
A convergência da luta dos povos pela sua libertação nacional e social
com a luta da classe operária e dos trabalhadores e de outras camadas
antimonopolistas é hoje uma tarefa central de todas as forças que se opõem à
hegemonia do imperialismo.
A frente anti-imperialista alargou-se e diversificou-se. Com
componentes sociais e políticas muito diferenciadas, nela se incorporam
correntes ideológicas distintas e até antagónicas nos seus objectivos
estratégicos, o que torna difícil a unidade na acção, mesmo quando intervêm com
idênticas reivindicações. É necessário precisar e potenciar conteúdos e formas
de intervenção que favoreçam a acção comum ou convergente e a eficácia na
resistência à ofensiva do grande capital e do imperialismo, e por uma nova
ordem internacional, democrática, pacífica, respeitadora da soberania dos
povos.
No actual quadro de crescente agressividade do imperialismo, assume-se
como prioritária a frente da luta pela paz e a solidariedade com os povos
vítimas da ingerência e da agressão do imperialismo. Frente que comporta
nomeadamente a luta contra o militarismo e a guerra e contra o recurso à força
nas relações internacionais; contra o alargamento e pela dissolução da NATO e
outros blocos político-militares, designadamente contra a militarização da UE e
o militarismo japonês; pelo desarmamento e a proibição da arma nuclear e todas
as armas de destruição massiva; contra a instalação de sistemas anti-míssil e a
militarização do espaço; pela democratização da ONU e o respeito pelos
princípios da sua Carta e do direito internacional.
Com o desenvolvimento da crise do capitalismo ganha ainda maior relevo a
luta contra a exploração e as tentativas de transferir para os trabalhadores e
os povos os custos da crise. Tal objectivo insere-se na luta mais geral por
relações económicas internacionais mais equitativas e mais justas; contra as
políticas neoliberais de desmantelamento dos direitos dos trabalhadores e de
destruição dos serviços públicos; contra o subdesenvolvimento e pela
erradicação dos flagelos da fome, da doença e do analfabetismo; em defesa do
meio ambiente.
No quadro do fortalecimento das diversificadas expressões da frente
anti-imperialista valoriza-se o papel desempenhado por organizações unitárias
internacionais surgidas no fluxo da vitória sobre o nazi-fascismo na II Guerra
Mundial como o Conselho Mundial da Paz, a Federação Mundial da Juventude
Democrática (incluindo o amplamente unitário movimento dos Festivais Mundiais
da Juventude e dos Estudantes, com o seu carácter anti-imperialista e de
massas, por ela impulsionado), a Federação Democrática Internacional das
Mulheres, a Federação Sindical Mundial, sendo importante agir para que se
reforce a sua intervenção e alargue a sua dimensão de massas.
O «movimento
anti-globalização», no
seio do qual se tem travado uma intensa luta ideológica, para a qual o PCP tem dado activa contribuição, combatendo a
sua instrumentalização por forças social-democratizantes e defendendo a
acentuação da sua componente anticapitalista e anti-imperialista, vive
hoje um período de menor impacto. A realidade da luta de classes, e da
importância decisiva da luta no marco nacional, pôs em evidência os limites do
movimentismo e do chamado «novo internacionalismo» daqueles que semeiam a
ilusão de que é possível «humanizar» a globalização capitalista. O PCP, que desde o início caracterizou tal
movimento como expressão do estreitamento da base social de apoio do
capitalismo na sua forma actual, continua a considerar de grande importância a
acção convergente de todos os que sofrem as consequências da contra-ofensiva
exploradora e agressiva do grande capital.
É também importante valorizar e acompanhar
os mais variados movimentos em torno de temas específicos e objectivos
concretos que ganharam força nos últimos anos no quadro dos progressos da
ciência e da técnica e da globalização capitalista, como sejam os movimentos em
torno das questões ambientais, do software e bases de informação livres
e muitos outros.
Num tempo que é ainda de resistência e de acumulação de forças, mas
também de fortes potencialidades progressistas e revolucionárias, enormes
responsabilidades recaem sobre os
partidos comunistas e o movimento
comunista e revolucionário internacional. A par da defesa
intransigente dos interesses dos trabalhadores, cabe-lhes identificar os
conteúdos unificadores para as alianças necessárias da classe operária com as
diferentes componentes sociais e políticas que integram a frente
anti-imperialista, e colocar com confiança a perspectiva da alternativa, mesmo
que no imediato se coloquem apenas objectivos limitados e etapas intermédias de
luta pelo socialismo e pelo comunismo.
Contrariando aqueles que há duas décadas anunciaram o fim da história e da
luta de classes, é cada vez mais evidente a impossibilidade do capitalismo em
dar resposta aos problemas e anseios dos trabalhadores, que a classe operária
continua no centro da luta de classes e que, para a superação revolucionária do
capitalismo, os trabalhadores assalariados e outras classes e camadas
antimonopolistas devem contar com fortes partidos comunistas.
O fortalecimento dos partidos
comunistas e o reforço da sua cooperação e solidariedade recíproca,
tendo como núcleo o internacionalismo proletário, são exigências historicamente
comprovadas para o êxito da luta. A aproximação e cooperação entre partidos
comunistas e operários, de que o processo dos Encontros Internacionais (cuja
oitava edição se realizou em Lisboa e que vai já na sua décima edição) é uma
importante expressão, tem progredido, e o PCP fará o que estiver ao seu alcance para que
progrida ainda mais no futuro, para criar as condições para formas mais
estáveis e eficazes de articulação.
Esta realidade não anula, contudo, as enormes debilidades, dificuldades
e problemas que persistem no movimento comunista. Ainda muito marcado pelas
negativas consequências das derrotas do socialismo, assiste-se, por um lado, a
valiosos processos de resistência, afirmação e recuperação de partidos comunistas,
mas, por outro lado, continuam a desenvolver-se tendências revisionistas e
reformistas envolvendo processos de degenerescência, autoliquidação e diluição
em frentismos de «esquerda», com o abandono das referências ideológicas e
objectivos revolucionários que definem os comunistas como corrente
revolucionária necessária ao fortalecimento da frente anti-imperialista, e
insubstituível para a liquidação do capitalismo e para a construção de uma nova
sociedade sem exploradores nem explorados. Neste sentido, o Partido da Esquerda
Europeia, que o PCP não integrou pela sua lógica supranacional
e natureza ideológica, não só se confirmou como uma falsa resposta ao
reconhecidamente necessário reforço da cooperação das forças de esquerda
anticapitalistas na Europa, como introduziu factores de divisão, afastamento e
preconceito, que se manifestaram nomeadamente no Grupo da Esquerda Unitária
Europeia / Esquerda Verde Nórdica no Parlamento Europeu.
A luta pelo reforço dos partidos comunistas defronta-se com rápidas
mudanças socioeconómicas, suas repercussões na classe operária e na sua
condição (desemprego, precariedade, deslocalização, e/imigração) e com a enorme
pressão ideológica do grande capital, só ultrapassável pela firmeza de
convicções e pelo seu enraizamento na classe operária e nas massas populares,
impulsionando a sua luta, apontando a perspectiva revolucionária de
transformação social e dando combate a posições oportunistas que negam a luta
de classes.
Apesar da crescente compreensão da necessidade dos partidos comunistas e
da sua estreita cooperação, o movimento
comunista vive ainda uma fase de grande instabilidade e continua a ser
difícil definir, com rigor, as suas componentes e fronteiras. A diversidade de
situações e tarefas imediatas, experiências, culturas, de avaliação da
História, sempre foram características do movimento comunista, e a existência
hoje de profundas diferenças exige que a cooperação, visando a unidade na
acção, assente nos princípios de igualdade de direitos, soberania e não ingerência
nos assuntos internos, rejeitando tanto nacionalismos e particularismos
redutores, como «modelos» e concepções uniformizadores sem correspondência com
a realidade.
Perante a crise do capitalismo, e os perigos que esta encerra, cabe ao
movimento comunista e revolucionário desenvolver a mais ampla cooperação das
forças progressistas e revolucionárias anti-imperialistas, intercambiando
experiências, análises e opiniões, vencendo atrasos, combatendo o reformismo e
o espontaneísmo, e dando vigoroso combate à ideologia dominante.
A ofensiva imperialista só poderá ser travada com a conjugação da luta
dos povos, das forças comunistas e progressistas e dos países que assimilem, no
desenvolvimento da luta, a condição essencial de associar à luta anti-imperialista
o objectivo da superação revolucionária do capitalismo e da construção do
socialismo.
4. O socialismo, alternativa necessária e possível
O socialismo, objectivo programático do PCP, tendo no horizonte o comunismo, não só
traduz a superioridade dos valores de liberdade e justiça social que animam os
comunistas de todo o mundo na sua luta contra o capital, como constitui, na
actualidade, uma possibilidade real cada vez mais necessária e urgente. Esta
profunda convicção do PCP
assenta em três pilares fundamentais.
Em primeiro lugar, numa concepção materialista e dialéctica da história,
para cuja elaboração científica consequente Marx e Engels trouxeram
contribuições decisivas, que, desvendando as leis gerais do desenvolvimento
social e o papel nele reservado ao proletariado, fundamenta a transitoriedade
do capitalismo como modo de produção e de reprodução do viver, bem como a
possibilidade real e a exigência prática da sua superação revolucionária,
exigência e possibilidade que Lenine aprofundou na época do imperialismo, e a
que a Grande Revolução Socialista de Outubro deu vida pela primeira vez na
história.
Em segundo lugar, no significado histórico universal da Revolução de
Outubro, no empreendimento pioneiro de uma nova sociedade na URSS e demais experiências
históricas do socialismo. Experiências que, todas elas com graus
diferenciados de criatividade revolucionária, maior ou menor consideração das
especificidades nacionais, maior ou menor peso de factores de ordem externa,
foram fruto de grandes batalhas de classe e de situações de crise
revolucionária que impuseram transformações anticapitalistas profundas.
Experiências inseparáveis da criação pelo proletariado do seu partido de
vanguarda, e só possíveis pela abnegação e prestígio dos comunistas e pela
entusiástica adesão e participação populares que suscitaram. Experiências que
se traduziram em realizações e conquistas de grande valor, que já demonstraram
a superioridade do poder dos trabalhadores e da nova sociedade sem exploradores
nem explorados, do socialismo sobre o capitalismo. A contribuição da URSS e,
posteriormente, do campo dos países socialistas, para os grandes avanços de
civilização verificados no século XX foi gigantesca. Países atrasados
transformaram-se num curto prazo de tempo em países altamente industrializados
e socialmente avançados em que foram alcançados direitos historicamente
inéditos. As conquistas sociais e democráticas do movimento operário dos países
capitalistas, vulgarmente identificadas com o «Estado social», a derrocada dos
impérios coloniais e o impetuoso avanço do movimento de libertação nacional dos
povos de África, Ásia e América Latina, são inseparáveis da existência e das
realizações da URSS e dos países socialistas. Sejam quais forem as tentativas
de negar e subverter a verdade, a vitória sobre o nazi-fascismo ficará para
sempre gravada na História como um feito para o qual o povo soviético e os
comunistas na Europa e em todo o mundo deram a mais heróica e decisiva
contribuição. A política de paz e de solidariedade internacionalista da URSS e
a conquista do equilíbrio militar estratégico entre a URSS e os EUA e entre o
campo socialista e o imperialismo, foram decisivas para a contenção da natureza
agressiva do imperialismo, a salvaguarda da segurança na Europa e da paz
mundial, o avanço das forças do progresso social. Como tantas outras, a
revolução portuguesa do 25 de Abril enquadra-se no clima europeu e
internacional de desanuviamento da década de setenta, e o povo português contou
com a solidariedade internacionalista dos povos da União Soviética e demais
países socialistas.
A caminhada da Humanidade para o socialismo e o comunismo sofreu
profundos reveses no findar do século com as derrotas do socialismo na URSS e
no Leste da Europa.
O estudo das suas causas e consequências prossegue no movimento
comunista e no campo progressista, e o PCP deverá consagrar-lhe ainda mais atenção
para tirar todas as experiências e ensinamentos que comporte, a fim de
prosseguir a luta com reforçada confiança. Temos muito de valioso já adquirido
pela elaboração e reflexão colectivas do Partido desde o XIII e XIV Congressos.
Revelou-se particularmente fecunda a tese avançada pelo PCP de que (ao contrário do que pretendeu a
violenta campanha desencadeada pelos nossos adversários sobre a «morte do
comunismo» e o «declínio irreversível dos partidos comunistas») o que foi
derrotado não foram os ideais e o projecto comunistas mas um «modelo»
historicamente configurado, que se afastou, e entrou mesmo em contradição com
características fundamentais de uma sociedade socialista, sempre proclamadas
pelos comunistas, relativas ao poder dos trabalhadores, à democracia política,
às estruturas socioeconómicas, ao papel do Partido, à teoria. Tendo como base
as análises e orientações do XIII e XIV Congressos, é necessário continuar a
aprofundar a reflexão.
A construção do socialismo na URSS, e ulteriormente noutros países da
Europa, Ásia e América Latina, enfrentou desde o primeiro momento o cerco e a
agressão do imperialismo, continuadas operações de provocação e
desestabilização interna, sofisticadas campanhas de diversão e subversão
ideológica. Tudo isto impôs pesados sacrifícios, obrigou ao desvio de recursos
imensos para a esfera militar, levou a distorções e desequilíbrios no
desenvolvimento socioeconómico socialista, e mesmo a situações de crise. Tudo
isto influenciou os caminhos e as soluções encontradas no processo de
construção do socialismo e contribuiu, em medida considerável, para os atrasos,
erros e deformações que se verificaram com violação de princípios essenciais do
socialismo. Graves cedências e capitulações ideológicas, políticas e de classe
que se manifestaram sobretudo a partir de meados da década de 80, acabaram por
determinar que, da aguda competição e confrontação entre os dois sistemas,
resultasse temporariamente um sério retrocesso no caminho do progresso social.
Perante os complexos problemas que se manifestaram na construção do
socialismo na URSS, assim como noutros países do Leste da Europa, o PCP expressou compreensão e solidariedade para
com os esforços e orientações que proclamavam visar a sua superação, alertando
simultaneamente para o desenvolvimento de forças anti-socialistas e para a
escalada de ingerências imperialistas, confiando em que, apesar das
dificuldades e deformações, existiam forças capazes de defender o poder e as
conquistas dos trabalhadores e promover a necessária renovação socialista da
sociedade. Mas certas medidas tomadas agravaram os problemas ao ponto de
provocar uma crise geral. O abandono de posições de classe e de uma estreita
ligação com os trabalhadores, o apagamento do marxismo-leninismo e a penetração
em profundidade da ideologia social-democrata, a claudicação das pressões e
chantagens, a rejeição do imperialismo, a desvalorização e mesmo rejeição do
heróico património histórico dos comunistas e do povo soviético e, finalmente,
a traição de altos responsáveis do Partido e do Estado, desorientaram e
desarmaram os comunistas e as massas para a defesa do socialismo,
possibilitando o rápido desenvolvimento e triunfo da contra-revolução com a
reconstituição do capitalismo.
Esta dura realidade não anula, porém, o alcance libertador do
empreendimento inédito de construção de uma sociedade nova, sem exploradores
nem explorados, iniciada com a Revolução de Outubro. O valor das suas
realizações ressalta ainda mais com as trágicas consequências destas derrotas.
Para estes países, com o terrível retrocesso social provocado pela
contra-revolução, a perda de soberania, a invasão exploradora das multinacionais
e o esbulho das suas riquezas, a anexação pela NATO e pela UE, os ataques a
direitos e liberdades fundamentais, o avanço de forças fascistas e do
anticomunismo. Para o mundo, com o desequilíbrio da correlação de forças daí
resultante e a contra-ofensiva desencadeada pelo grande capital e pelo
imperialismo contra os trabalhadores e contra os povos. A vida demonstrou de
modo dramático que o desaparecimento do poderoso factor de contenção que a URSS
representava deixou o mundo mais exposto à natureza exploradora e agressiva do
capitalismo, tornando-o mais injusto e perigoso.
Em terceiro lugar, a convicção do PCP de que o socialismo é na actualidade cada
vez mais necessário e urgente, assenta na análise do sistema capitalista e
das suas tendências de desenvolvimento actual.
O capitalismo tem revelado capacidades de adaptação e de recuperação por
vezes inesperadas, mas está ferido de insanáveis contradições e, como a crise
actual evidencia, são patentes os seus limites históricos.
Com as derrotas do socialismo lançou uma gigantesca campanha visando
apresentar-se como sistema terminal sem alternativa. Mas o mito do «fim da
História» - e com ele do «fim» do comunismo, dos partidos comunistas, da luta
de classes, da revolução, das ideologias e outros - durou pouco. O triunfalismo
capitalista dos anos 90 que, frente às derrotas do socialismo, anunciava mais
liberdade, mais paz e segurança internacionais, mais progresso social, não
resistiu à prova dos factos. As receitas do neoliberalismo e as teses justificativas
da globalização capitalista, incluindo as da chamada «terceira via», embora
ainda dominantes, desacreditaram-se rapidamente. O capitalismo não só se revela
incapaz de dar satisfação aos interesses e aspirações dos trabalhadores e dos
povos como põe em perigo a própria Humanidade. A contradição entre as imensas
potencialidades das conquistas da ciência e da técnica e as terríveis
regressões que percorrem o mundo contemporâneo - desemprego, fome, doença,
analfabetismo, degradação dos recursos naturais, catástrofes ambientais -
constitui, em si mesma, uma violenta acusação ao sistema capitalista.
A necessidade e possibilidade do socialismo
estão inscritas nas próprias contradições do sistema que o capitalismo
contemporâneo tende a agudizar extraordinariamente. O antagonismo entre o capital e o trabalho, com o brutal agravamento da
exploração e a proletarização acelerada da pequena burguesia e camadas
intermédias da população. A não correspondência entre o desenvolvimento das
forças produtivas e as relações de produção capitalistas que entravam o seu desenvolvimento e pervertem a sua
utilidade social. A contradição entre o carácter social (cada vez mais
acentuado) da produção e a propriedade privada (cada vez mais concentrada) dos
grandes meios de produção.
A actual crise capitalista
comprova a necessidade de rupturas que coloquem a economia ao serviço dos
trabalhadores e dos povos.
A extraordinária centralização e concentração de capital, a formação de
gigantescos monopólios que, isoladamente ou em aliança, dominam ramos inteiros
da produção, do comércio e serviços e das finanças, os próprios mecanismos de
regulação internacional do capitalismo, são expressão de reais processos de
socialização que mostram a necessidade do socialismo, como solução racional necessária
à desumana anarquia e concorrência capitalistas. A solução dos grandes
problemas que afectam toda a Humanidade, a começar pelo problema da paz, mas
também os problemas dos recursos naturais, da energia, do ambiente, da pobreza
e outros, exige a utilização de métodos racionais de planeamento inerentes ao
socialismo.
Estão objectivamente interessadas na superação histórica do capitalismo
monopolista como modo de produção dominante, todas as classes e camadas não
monopolistas. Mais do que nunca é o próprio futuro da Humanidade que está
ameaçado pela desenfreada corrida ao máximo lucro. Nunca foi tão verdadeira a
tese marxista de que, libertando-se, a classe operária liberta simultaneamente
todas as outras classes e camadas oprimidas pelo capital monopolista, o que
hoje significa libertar a Humanidade.
Sem dúvida que o caminho do socialismo se revelou mais complexo e mais
acidentado e demorado do que os grandes avanços libertadores alcançados no
caminho aberto pela Revolução de Outubro faziam prever. E que o movimento
comunista e revolucionário não recuperou ainda de grandes retrocessos da década
de 90. Nada disso anula, porém, a realidade de que a época em que vivemos é a
época da passagem do capitalismo ao socialismo, inaugurada pela Revolução de Outubro,
que o capitalismo não só não resolve como agrava os graves problemas do nosso
tempo, que só o socialismo pode responder às mais profundas aspirações dos
trabalhadores e dos povos e salvar a Humanidade da catástrofe anunciada pela
insaciável e destrutiva gula do capital. É com esta profunda convicção que o PCP
aponta, para Portugal e para o mundo, o socialismo como possibilidade real e a
mais sólida perspectiva de evolução da Humanidade.
II - Situação nacional
0. Introdução
1. Evolução da União Europeia
2. Situação económica e social
3. A evolução política e o regime democrático
4. A política necessária
0. Introdução
A formação do Governo PS, suportado na Assembleia da República por
uma maioria absoluta e a eleição de Cavaco Silva para a Presidência da
República traduzem, no plano político-institucional, a afirmação e
consolidação de um bloco de poder ao serviço dos grandes grupos económicos e
financeiros.
A realização das eleições legislativas antecipadas de Fevereiro de 2005,
na sequência da dissolução da Assembleia da República, correspondeu, ainda que
tardiamente, a uma ampla e crescente aspiração popular, e culminou um largo
processo de resistência à ofensiva prosseguida pelos governos do PSD e CDS-PP
de Durão Barroso, Paulo Portas e Santana Lopes.
A vinculação do PS à política de direita, agravada pela obtenção de uma
maioria absoluta gorou a possibilidade que das eleições resultasse, não apenas
a mudança de governo e a derrota do PSD e CDS-PP, mas a criação de condições
que contribuíssem para a derrota da política de direita e o alcançar de uma
efectiva e verdadeira política alternativa.
Os três anos e meio de Governo PS ficam marcados por uma nova fase, quer
pela intensidade, quer pelo seu carácter global de uma ofensiva dirigida para a
destruição dos direitos sociais, para o aumento da exploração do trabalho e
para a concretização dos interesses do capital. No quadro do prosseguimento e
desenvolvimento da política de direita dos últimos trinta e dois anos, o actual
Governo tem em curso uma acção não apenas destinada a reduzir e a liquidar
direitos e a impor retrocessos no plano social, mas também dirigida contra o
regime democrático consagrado na Constituição.
O processo de reconfiguração da estrutura e papel do Estado aos
interesses do capital monopolista e o ataque a direitos no plano económico e
social têm-se traduzido no empobrecimento da democracia política e na crescente
restrição às liberdades e garantias dos cidadãos.
Suportados numa relação de crescente promiscuidade e comprometimento com
o Governo, e pela «cooperação estratégica» oferecida pelo Presidente da
República à sua acção, sectores e estruturas proeminentes do grande capital
inscreveram na sua agenda e objectivos já não só a reclamação de políticas
económicas e sociais mais favoráveis aos seus interesses, mas a apresentação de
uma verdadeira agenda de subversão do regime político e constitucional.
Três décadas de política de direita, de reconstituição do capitalismo monopolista, traduzidas no
agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo, na crescente
dependência e subordinação externa do país e num inquietante empobrecimento do
regime democrático, colocam como grande questão da actualidade política e do
futuro do país a exigência de ruptura com estas políticas e a construção de
um novo rumo para o país.
1. Evolução da União Europeia
A recente evolução da União Europeia é inseparável do conjunto de
processos económicos,
sociais e políticos que marcam a fase actual do capitalismo.
A evolução da União Europeia nos últimos quatro anos, a par do
prosseguimento e aprofundamento das suas políticas neoliberais, federalistas e
militaristas, foi significativamente marcada pela rejeição, em 2005, da chamada
«constituição europeia» pelos povos da Holanda e da França e pela rejeição,
pelo povo irlandês, da segunda tentativa para a sua imposição, agora na versão
denominada «Tratado de Lisboa». Uma rejeição que representa para o grande
capital e as grandes potências um significativo revés nos seus projectos de
aprofundamento da integração capitalista europeia. No plano nacional, constitui
uma significativa derrota do PS e do PSD e da sua opção de retirarem ao povo
português o direito de debater e se pronunciar sobre o real conteúdo e
objectivo de uma proposta de Tratado contra o qual o PCP firmemente se bateu, e contra o qual vai
continuar a lutar.
As manobras que procuraram impedir a realização de novos referendos nos
países da UE, ou onde não puderam impedir a sua realização, a pressão para a
sua repetição até um resultado favorável, bem como as que antecederam e se
seguiram ao referendo na Irlanda expõem o carácter profundamente
antidemocrático da integração europeia e do desrespeito das suas instituições
supranacionais pela vontade dos povos.
No quadro da agudização da crise estrutural do sistema capitalista
avançou a denominada «Estratégia de Lisboa» com a intensificação da sua agenda
e prioridades, sistematizada com a criação dos «Planos Nacionais de Acção», a
adopção da directiva de liberalização dos serviços e de novas etapas na
liberalização e privatização dos serviços públicos (energia, água, transportes,
correios, educação) e no desmantelamento da administração pública, a
desregulamentação do mercado de trabalho, promovendo a dita «flexigurança», os
acórdãos do Tribunal de Justiça Europeu no sentido de impor a liberalização dos
mercados e a concorrência capitalista, nomeadamente colocando em causa legislações
laborais nacionais, para além de uma política monetária ao serviço dos grandes
interesses financeiros, que promove a moderação salarial e a transferência
crescente dos ganhos de produtividade do trabalho para o capital.
Prosseguiu a liberalização da agricultura, com a desvinculação das
ajudas da produção, decidida na reforma da Política Agrícola Comum de 2003, e o
desmantelamento das organizações comuns de mercado (vinho), acentuando as
desigualdades na distribuição das ajudas entre produtores, produções e países.
Promoveu-se uma Política Comum de Pescas orientada para a destruição do sector
e a entrega da gestão dos recursos biológicos marinhos nacionais às
instituições supranacionais da UE. Políticas comuns que comprometem estes
sectores estratégicos do país e a sua soberania e segurança alimentares.
Intensificou-se uma política de relações comerciais bilaterais,
regionais e multilaterais que visa a liberalização do comércio mundial, seja ao
nível da Organização Mundial do Comércio ou da criação de zonas e regiões de
livre comércio, privilegiando, apesar de contradições, uma parceria estratégica
com os EUA.
O quadro financeiro comunitário para 2007-2013, adoptado em 2006,
estabeleceu, por imposição das potências da União Europeia, na sua ofensiva contra
os trabalhadores e os povos, um limite de 1% do Rendimento Nacional Bruto ao
nível da UE para o orçamento comunitário, penalizando os países economicamente
menos desenvolvidos - como Portugal, que perde cerca de 15% de verbas face ao
quadro comunitário anterior - e condicionando a utilização destes meios à
concretização da agenda neoliberal da «Estratégia de Lisboa».
Foram dados novos passos no sentido de uma política comum da justiça e
assuntos internos, subtraindo competências à soberania dos Estados, adoptando
um amplo conjunto de medidas securitárias que, a pretexto da «luta contra o
terrorismo», colocam em causa direitos, liberdades e garantias fundamentais dos
cidadãos e reforçam o aparelho repressivo na União Europeia. Foi sendo
implementada a política de imigração ao nível da UE, de cariz securitário,
selectivo, repressivo e criminalizador dos imigrantes, que os reduz a uma
mão-de-obra barata, desprovida de direitos e descartável, de que são exemplos a
recém aprovada directiva europeia de retorno, bem como o Pacto Europeu de
Imigração e Asilo, onde se integra o «cartão azul».
Aprofundou-se a militarização da União Europeia que, adoptando o
conceito ofensivo da NATO, se confirma como o seu pilar europeu, desenvolvendo
a sua «Estratégia de Segurança», assente na militarização das relações
internacionais e na violação do direito internacional. A UE avançou no reforço
e criação de novas capacidades militares e na prossecução de «missões
militares» que, como em África ou no Kosovo, visam o domínio de mercados e de
recursos naturais e a partilha de zonas geo-estratégicas.
Pelas suas políticas e objectivos, a União Europeia confirma-se
plenamente como o instrumento de classe do capitalismo transnacional e das
grandes potências, bem evidente na coincidência das prioridades e decisões das
suas instituições supranacionais com os interesses do grande capital e no
domínio dos processos de decisão por parte das grandes potências da UE. Uma
«integração» que tem contado, em questões centrais (de que são exemplo os
Tratados, a Estratégia de Lisboa ou a «flexigurança»), com o acordo da
Confederação Europeia de Sindicatos (CES).
A evolução recente da União Europeia confirma que, apesar dos
importantes e graves avanços verificados no sentido da sua consolidação como
pólo imperialista, não está isenta de contradições e resistências que resultam
do confronto do grande capital com a enorme massa dos assalariados, em
particular dos sectores operários, e outras camadas sociais profundamente
atingidas pelas políticas de direita. Contradições inerentes ao choque de
interesses políticos e económicos entre as grandes potências e as que tenderão
a desenvolver-se entre estas e os restantes países, e que, inevitavelmente,
crescerão à medida que a «crise financeira» se aprofunda, criando sérias
dificuldades à manutenção de países com economias mais débeis no espartilho do
euro, e à medida que a União Europeia violente direitos de soberania,
interesses nacionais e identidades culturais profundamente enraizadas.
Às contradições e aos obstáculos que o desenvolvimento do processo de
integração capitalista gera, os mentores da integração capitalista europeia
respondem ocultando e escamoteando a sua origem, apontando falsas soluções e
saídas e procurando assegurar uma dinâmica de factos consumados para novas e
perigosas fugas em frente.
A panóplia de mistificações e sofismas que sustenta a constante
investida ideológica dita «europeísta» - como as teses dos «egoísmos nacionais»
versus «interesse europeu», da «falta de líderes europeus com a dimensão
política dos fundadores», da UE «anã política», do «método comunitário» versus
«federalismo», do federalismo como resposta alternativa e diferente ao
directório, do federalismo encapotado de «europeísmo de esquerda» ou ainda a
alegada «falta» de uma «base constituinte na elaboração de uma Constituição
europeia» - procura iludir a questão essencial: a de que a União Europeia é, no
actual quadro internacional, um pólo imperialista orientado para o aumento da
exploração e do intervencionismo agressivo.
O PCP, consequente com as suas posições de
combate à integração capitalista europeia, reafirma que recusa e dará firme
combate a qualquer dita «solução» que - sustentada, ou não, na criação de um
«núcleo duro» -, reforce a natureza federal das instituições da União Europeia
e, consequentemente, o domínio do conjunto das grandes potências nos processos
de tomada de decisão, nomeadamente através da valorização de critérios
demográficos, em detrimento da representação de Estados soberanos e do princípio
da igualdade entre estes, da eliminação das presidências semestrais rotativas
do Conselho Europeu, do fim do princípio de um comissário permanente por país,
da redução do número de deputados no Parlamento Europeu, da ampliação da
co-decisão e da adopção de decisões por maioria qualificada no Conselho, em
prejuízo de países como Portugal, e do seu poder de veto na salvaguarda de
interesses fundamentais.
O PCP reafirma que rejeita e dará firme combate a
uma qualquer dita «solução» que represente possibilidades acrescidas para a
ofensiva neoliberal contra os trabalhadores e os povos, e que se traduza na
perda de direitos sociais e civilizacionais, na agudização das desigualdades
sociais, na multiplicação de assimetrias entre países e regiões, na multiplicação
dos problemas ambientais e no reforço das dependências dos países como
Portugal.
O PCP reafirma que recusa e dará firme combate a
uma qualquer dita «solução» que tenha como objectivo alicerçar um bloco
político-militar que visa a disputa concorrencial de mercados, matérias-primas
e mão-de-obra, integrando ou não articulações, alianças e acordos de partilha
com os outros pólos da Tríade, Japão e EUA.
Mais de vinte anos após o Acto Único, quinze
após o Tratado de Maastricht e dez após a União Económica e Monetária (com os
seus BCE, Pacto de Estabilidade e Euro), os resultados dos referendos
realizados em França, na Holanda e na Irlanda colocam em evidência a ampliada
rejeição de uma «integração europeia», que desrespeita as soberanias, as
economias nacionais e a democracia e agride as conquistas sociais dos
trabalhadores, a segurança e a paz.
As lutas dos trabalhadores e dos povos em
defesa da democracia, da soberania e independência nacionais e de conquistas
políticas, económicas, sociais e culturais em cada país, são uma contribuição
para o aumento da consciência política quanto ao carácter de classe da União
Europeia e para abrir o caminho de uma outra Europa, de cooperação, progresso e
paz.
A rejeição consequente e determinada desta
«integração europeia» exige que, em cada país, se reforcem as forças políticas
que, explorando as contradições e obstáculos, e conjugando a luta de massas com
a acção institucional, dão frontal e coerente combate à sua dinâmica
federalista, neoliberal e militarista.
As importantes mobilizações e significativas
lutas que ocorreram por toda a Europa revelam e reafirmam a necessidade do
reforço da cooperação, designadamente por parte das forças de esquerda
vinculadas aos interesses dos trabalhadores - claramente demarcadas da
social-democracia rendida ao neoliberalismo -, e da convergência de todos
quantos lutam, na base de objectivos de transformação social anticapitalista,
por um novo caminho para a Europa.
O PCP continuará a assumir como sua prioridade o
prosseguimento e reforço da cooperação dos comunistas e de outras forças de
esquerda e progressistas na Europa, com respeito pelas diferenças de situação,
reflexão e proposta, colocando no primeiro plano a acção comum ou convergente
em torno das questões mais sentidas pelos trabalhadores e outros sectores e
camadas sociais afectados pela «integração europeia», e afirmando e projectando
à escala europeia acções e propostas comuns. Com a convicção de que a
necessária expressão europeia e internacional da luta adquirirá uma dimensão e
um significado tanto mais representativos quanto mais enraizada e organizada
ela for a nível de cada país.
O PCP continuará profundamente empenhado no
desenvolvimento da cooperação e convergência dos partidos comunistas, forças e
partidos progressistas e de esquerda, nomeadamente: na salvaguarda,
consolidação, forte intervenção e afirmação do carácter unitário, confederal e
progressista do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde
Nórdica, do Parlamento Europeu; no desenvolvimento de iniciativas comuns de
expressão europeia; na dinamização e apoio à luta dos trabalhadores e outros
sectores e forças sociais pelas conquistas e direitos sociais, contra as
políticas do capitalismo, pela paz, contra o militarismo e a guerra, pela democracia
e a soberania nacional, contra o federalismo e o domínio das grandes potências.
Ao longo das últimas duas décadas, PS e PSD
e CDS-PP, numa elucidativa e constante convergência de posições, foram os
responsáveis pela condução, e aprofundamento sucessivo, da integração de
Portugal na CEE/UE, participando activamente na definição, defesa e
implementação das suas políticas e orientações neoliberais, federalistas e
militaristas.
Uma convergência responsável pela alienação
de componentes essenciais da soberania nacional; pela submissão perante as
instituições da União Europeia e as grandes potências; pela aceitação de
imposições e medidas gravosas para o país; pela entrega de sectores
estratégicos da economia nacional ao capital estrangeiro; pela ideia da
fatalidade das políticas da União Europeia; pela apresentação dos problemas e
das dificuldades do país como a moeda de troca aos ditos «benefícios» dos
fundos comunitários; pela não consulta do povo português sobre questões
fundamentais; pela não utilização da margem de manobra de que, apesar de tudo,
Portugal ainda dispõe pela aplicação, entre outros, do denominado «princípio da
subsidiariedade» e do direito de veto.
Também o Bloco de Esquerda, com o seu
denominado «europeísmo de esquerda», atrás do qual esconde o seu federalismo,
se confirma como uma das forças políticas favoráveis ao avanço do carácter
supranacional da União Europeia, desvalorizando e menosprezando a importância
central da preservação da soberania nacional como alicerce incontornável do
desenvolvimento do país e instrumento indispensável para a luta por uma outra
Europa.
A União Europeia surge como um dos
principais alicerces da política de classe realizada em Portugal e como um dos principais esteios e pretextos da
ofensiva contra os direitos e conquistas sócio-económicas dos trabalhadores que
coloca em causa o interesse nacional e o projecto de desenvolvimento patriótico
e internacionalista consagrado na Constituição da República Portuguesa.
Uma política externa de diversificação das
relações internacionais e de cooperação, paz e amizade com todos os povos, a
salvaguarda da soberania nacional e a promoção dos interesses de Portugal e dos
portugueses constituem orientações fundamentais para a intervenção do país num
projecto de cooperação na Europa.
Perante o processo de integração da União
Europeia, a soberania nacional constitui ponto de partida inegociável e uma
questão central e decisiva para a afirmação dos interesses de Portugal e dos
portugueses. A defesa e afirmação da soberania nacional exigem a consagração
institucional da possibilidade da reversibilidade e da alteração de acordos e
tratados que regem a integração europeia, ajustando o estatuto de cada país à
vontade do seu povo e à sua real situação, incluindo o direito à decisão
soberana sobre a desvinculação da UE.
Não há arquitectura institucional no quadro
do figurino federal (uma ou duas Câmaras, mais ou menos comissários, mais ou
menos poder do Parlamento Europeu, este ou aquele sistema de votação) que
resolva a desigualdade de poder resultante das significativas diferenças entre
os Estados-membros. E as suas dimensões neoliberal e militarista são
intrínsecas à sua natureza de integração capitalista, indissociável no plano
institucional de soluções federalistas. Cada nova etapa e avanço deste processo
consolidam um poder político e económico favorável ao grande capital e às
grandes potências e fortalece o seu «super-Estado», para melhor explorar os
trabalhadores e os povos, nas suas relações de concorrência e convergência,
económicas e políticas, com os outros dois pólos da «Tríade» da globalização
capitalista, Japão e EUA. Estes factos consolidam a ideia de que a União
Europeia, na sua essência, não é reformável.
O PCP, pese a análise e avaliação que faz do
processo da integração capitalista europeia, continuará, nas instituições
nacionais e comunitárias, nomeadamente no Parlamento Europeu, um intransigente
combate pelos interesses nacionais, pelos direitos dos trabalhadores e outras
camadas não monopolistas, pela cooperação entre todos povos europeus e por uma
relação de paz e cooperação da União Europeia com todos os outros povos do
mundo, na perspectiva de outra Europa.
Outra Europa não só é possível como
necessária. O caminho para outra Europa faz-se e afirma-se no combate
intransigente à integração capitalista configurada pela União Europeia.
Combatendo cada novo passo no seu aprofundamento federalista, neoliberal e
militarista. Apresentando alternativas concretas de ruptura. Trabalhando pela
convergência das forças de esquerda e progressistas, pelo esclarecimento e
mobilização dos trabalhadores e dos povos, por transformações progressistas e
na perspectiva de um futuro socialista para a Europa.
A uma União Europeia federal, onde se
consolida a assimetria de poder a favor das grandes potências, contrapomos uma
Europa de cooperação de Estados e povos, soberanos e iguais em direitos, que
respeite a identidade cultural e a independência de Portugal e de todos os
países.
A uma União Europeia onde prevalecem os
interesses do capital e se acentuam as diferenças entre países e as assimetrias
regionais e sociais, contrapomos uma Europa dos trabalhadores e de outras
camadas laboriosas, que favoreça o desenvolvimento assente na relação
sustentável entre natureza e a sociedade e na convergência económica e no
progresso social, com o objectivo de coesão de cada país e entre todos os
países.
A uma União Europeia militarista, bloco
político-militar com pretensões imperiais, convergindo estrategicamente com o
imperialismo norte-americano, promovendo e alargando a intervenção da aliança
agressiva NATO, contrapomos uma Europa empenhada na promoção da paz e
desanuviamento no continente europeu e no Mundo e na cooperação para o
desenvolvimento com todos os povos do planeta.
2. Situação económica e social
O enquadramento da situação económica
nacional é inseparável da fase actual do desenvolvimento do capitalismo, com os seus principais traços, tendências
e contradições.
As relações económicas externas do país -
fluxos de capitais, mercadorias, bens e serviços, e posições nas estruturas de
regulação económica mundial - são crescentemente condicionadas pela integração
comunitária e também por outros centros de articulação supranacional do
imperialismo. Condicionamento reforçado pela colaboração activa de sucessivos
governos do PSD e PS, com uma evolução da União Europeia que conflitua com o
necessário desenvolvimento do país, na completa submissão às orientações
económicas comunitárias e na total abdicação e ausência de afirmação de uma
estratégia de defesa dos interesses e soberania nacionais.
Três vectores no actual quadro comunitário
conflituam de forma cada vez mais determinante com a economia nacional e o
próprio futuro do país, a sua independência e soberania nacionais: o acentuar
da configuração federal sob o comando político e económico das grandes
potências; a consolidação da zona euro e da sua gestão pelo BCE; e o domínio
das políticas e orientações neoliberais estruturantes da Estratégia de Lisboa.
A acentuada e crescente dependência estrutural externa, bem patente no elevado
endividamento líquido externo (90% do PIB em 2007) e na importância do capital
transnacional no tecido económico português, nomeadamente através da
subcontratação e do peso na estrutura accionista de empresas e sectores
estratégicos (EDP, 48%, PT, 64%, GALP, 50%, CIMPOR, 30%, BCP, 36% e outras,
como a BRISA, SEMAPA, BES, BPI, SOMAGUE), é outro factor que conflitua com a
independência e soberania nacionais, agravando a vulnerabilidade face a centros
de decisão estrangeiros/capital transnacional.
O crescente federalismo das instituições
comunitárias reduz, ou mesmo anula, a capacidade para influenciar a condução
das políticas económicas por parte dos países como Portugal, como sucede no
comércio externo da União Europeia, nomeadamente na OMC em torno da agricultura
e do sector têxtil.
A União Económica e Monetária (UEM), com a
perda das políticas monetária e cambial, com as limitações impostas à política
orçamental, pela sua submissão aos critérios de convergência nominal no Pacto
de Estabilidade, a estrita política monetarista levada a cabo pelo Banco
Central Europeu (BCE) por um euro fortemente valorizado e a gestão da taxa de
juro nessa óptica, e com o objectivo máximo da estabilidade dos preços/moderação
salarial, constituiu um fortíssimo constrangimento para uma economia com as
debilidades da portuguesa.
A última versão da «Estratégia de Lisboa»,
reforçando os seus fundamentos neoliberais de privatização e liberalização de
serviços públicos, sectores estratégicos e do mercado de trabalho, a negociação
da agenda neoliberal da OMC e de vários tratados comerciais bilaterais pela
União Europeia e, em geral, as orientações respeitantes à Política Agrícola
Comum (PAC) e Política Comum das Pescas (PCP), amplia os problemas e fragilidades da
economia nacional e acentuam a sua dependência e défices estruturais.
O processo de alargamento da União Europeia,
já realizado ou em curso, a países com uma mão-de-obra mais barata e mais
qualificada, veio reforçar a falência da estratégia de sucessivos governos de
fazer de Portugal localização privilegiada de unidades produtivas de trabalho
intensivo, assentes em baixos salários e de baixo valor acrescentado. Um
processo que se adiciona e converge com outras políticas comunitárias para uma
divisão do trabalho no espaço europeu altamente desvantajosa para o país, com
crescente e negativo impacto na economia nacional, cada vez mais periférica e
«iberizada». A deslocalização de empresas do sector produtivo, acompanhada crescentemente
pela deslocalização de serviços, causam não só graves problemas sociais
(desemprego, encargos para a segurança social), como tem contribuído para a
perda de importantes unidades produtivas.
Esta situação, para além de criar sérios
constrangimentos ao desenvolvimento económico do país - em particular pela
extrema dependência externa da economia nacional e pela condução, através de
órgãos comunitários ou entidades ditas independentes, como o BCE, de
determinantes políticas (agrícola, pescas e outras) que defendem interesses e
objectivos das grandes potências europeias e do grande capital europeu -,
estabelece a perda ou limitações drásticas, no âmbito do uso de importantes
instrumentos económicos como a moeda, a taxa de câmbio, as taxas de juro, a gestão
orçamental e o comércio externo.
Estes condicionamentos e limitações exigem a
afirmação clara e inequívoca da soberania nacional como princípio inalienável
da inserção e relacionamento de Portugal na Europa e no Mundo, nomeadamente na
reconsideração do enquadramento e integração da economia portuguesa no âmbito
da UE e suas determinações.
A sociedade portuguesa tem hoje uma
estrutura económico-social determinada pela ditadura dos grupos económicos
monopolistas associados ao capital transnacional. Uma poderosa oligarquia financeira
(associada a outros sectores da grande burguesia portuguesa e estrangeira)
assegura, através da titularidade desses grupos a continuidade, reprodução e
expansão do seu poder político, económico, social e ideológico, exercendo o que
configura um autêntico poder absoluto sobre a generalidade das outras camadas
sociais e sob diversos ângulos. Estruturados e representados por grupos
familiares velhos conhecidos (que suportaram e apoiaram a ditadura fascista) ou
que despontaram com a contra-revolução, tecem entre si, e com o capital
estrangeiro, uma densa rede de ligações económicas e financeiras, sociais e
políticas.
Trinta e quatro anos depois das
transformações revolucionárias de Abril, esse conjunto de grupos económicos, resultante
da política de recuperação capitalista e monopolista, tem um papel dominante e
determinante no quadro das relações de produção capitalista da sociedade
portuguesa.
Existem em Portugal 139 grandes grupos
económicos, 78% dos quais criados nos últimos 18 anos, em resultado directo do
processo de privatização e consequente restauração dos grandes grupos
monopolistas. As operações de privatização efectuadas nas duas últimas décadas
pelos vários governos fizeram regressar às mãos do sector privado, em condições
altamente vantajosas, sectores estratégicos como a banca, seguros, energia,
telecomunicações, transportes colectivos rodoviários, cimentos, pasta de papel
e sector químico. Sucessivos aumentos de capital reforçaram a presença do
grande capital nacional e abriram portas a capital estrangeiro.
A análise dos maiores grupos económicos
nacionais no final de 2005, mostra-nos que dos doze grupos com lucros mais
elevados, com um valor superior a 250 milhões de euros, apenas dois se
encontram ligados predominantemente à actividade produtiva de bens
transaccionáveis (cimentos - Cimpor e papel - Semapa). Este conjunto de grupos
económicos, ao mesmo tempo que o PIB crescia a um ritmo médio de apenas 1,3%
entre 2004 e 2007, viu os seus lucros aumentarem de 75%, atingindo os 6,8 mil
milhões de euros - 4,2% do PIB.
A evolução tão díspar entre os grandes
grupos económicos e o restante tecido produtivo nacional, espelha uma das
características mais marcantes da evolução desigual da nossa economia nos
últimos anos - enquanto o sector produtivo fornecedor dos chamados bens
transaccionáveis vem evoluindo a ritmos de crescimento muito baixos, quase
nulos, o sector dos bens não transaccionáveis - financeiro, energia,
imobiliário, telecomunicações, serviços - cresce a ritmos elevados,
reproduzindo lucros sobre lucros. Esta terciarização da economia nacional tem
também profundos impactos ao nível do emprego com a destruição continuada de
postos de trabalho no sector dos bens transaccionáveis.
Com um poder fortemente monopolista sobre um
conjunto de sectores e áreas estratégicas para o país e para o restante tecido
económico, e particularmente activos nas operações de privatização do que resta
do Sector Empresarial do Estado, estes grupos vêem reforçada esta natureza monopolista,
quer pela destruição e absorção de concorrentes nacionais, quer por associações
em que cruzam participações e/ou repartição de mercados e concertação de
preços, quer pela aliança privilegiada com poderosas transnacionais.
É também significativo a sua profunda
articulação com o capital transnacional, através da posse de grande parte dos
activos - em muitos casos superior a 50% da estrutura accionista - dos grandes
grupos económicos nacionais por parte de capitais estrangeiros. Uma situação
que é insustentável, já que coloca a economia portuguesa nas mãos dos capitais
externos e, no limite, põe em causa a soberania nacional. Os acordos de
exclusividade promovidos pelo Governo com algumas multinacionais, como sucedeu
com a Microsoft, com a compra de software para os sectores públicos,
reforçam essa dependência.
A extraordinária dimensão e poder económico
actual destes grupos capitalistas e monopolistas consolida-se e desenvolve-se
em permanente articulação, cumplicidade e promiscuidade com o poder político e
os partidos que o exercem desde 1976 - PS, PSD e CDS-PP. O poder económico remunera-se através dos
dividendos, lucros e vencimentos fabulosos dos seus representantes, o poder
político através dos vencimentos e privilégios da sua clientela e dos negócios
lícitos ou até ilícitos) que a sua presença na administração desses grupos,
conjugada com o poder político que detêm, lhes vão proporcionando.
A utilização do Estado, nomeadamente da sua
componente legislativa, como instrumento de reforço do domínio dos grupos
monopolistas e do capital transnacional, explica a ampla produção legislativa
da Assembleia da República e dos governos, destinada a consagrar os seus
interesses de classe, designadamente através do desequilíbrio, a favor do
grande patronato, das relações laborais e níveis salariais, da condução das
políticas orçamental e fiscal, do favorecimento dos mecanismos de transferência
de rendimento e mercados dos micro, pequenos e médios empresários para esses
grupos, e da apropriação de património e mercados públicos, com as
privatizações e liberalizações feitas à medida das capacidades de encaixe
desses grupos.
A generalidade dos grandes grupos económicos
possui hoje imensas capacidades e instrumentos para o exercício de um efectivo
poder ideológico, através de meios para a produção e transmissão, directa e
indirecta, da ideologia dominante.
É particularmente significativa a sua
posição no sector dos media, onde alguns grupos - Cofina, Impresa,
Controlinvest, Sonae Com, Impala - absorveram mais de uma centena dos
principais órgãos de comunicação social, com influência decisiva na formação e
condicionamento da opinião e dos comportamentos dos portugueses. O recente e
crescente domínio por estes grupos do sector editorial, as suas acções de
promotores e mecenato no campo das artes e a sua articulação multifacetada com
estruturas do ensino (do Básico ao Superior) e de Investigação e
Desenvolvimento, contribuem igualmente para a sua hegemonia no plano da
produção ideológica.
O Estado, pela sua natureza de classe,
integra, mantém e assegura o funcionamento do modo de produção capitalista,
tentando concretizar um permanente e crescente processo de acumulação. Em
resultado de processos económicos, políticos e sociais complexos e,
fundamentalmente, das lutas de classes no século XX, o Estado passou também a
integrar estruturas e políticas viradas para a prestação de serviços sociais
relevantes e empresas para o fornecimento de bens essenciais. Em Portugal esta
presença do Estado, posta em causa com o processo contra-revolucionário, foi
fundamentalmente constituída e configurada com a Revolução do 25 de Abril, com
o impulso aos sistemas públicos de educação, de saúde e segurança social e com
as nacionalizações.
A ofensiva neoliberal em curso visa a
destruição ou a redução a expressões residuais das funções e missões do Estado
nas áreas sociais e empresariais. Simultaneamente reforçam-se as orientações e as políticas que
favoreçam a acumulação capitalista e o desenvolvimento monopolista.
Preocupados com baixas taxas de
rentabilidade, em particular em sectores tradicionais, e com a volatilidade dos
mercados financeiros, o capital procura novos espaços económicos sólidos para a
realização e apropriação da mais-valia. O capital não só se apropria das
empresas do sector empresarial do Estado privatizadas e dos mercados públicos
liberalizados, como se expande e absorve áreas crescentes de serviços públicos
(saúde, educação, segurança social, correios, água) e mesmo de serviços típicos
da Administração Central (notariado e áreas da justiça, segurança,
consultadoria) transformados em importantes fontes de lucros.
A penetração do grande capital/capital
monopolista faz-se por via directa - o investimento na criação de novas
empresas de serviços, como sucede com novos hospitais privados - e através de
fórmulas sofisticadas e diversificadas, como acontece com as «concessões» (rede
de auto-estradas), com as «parcerias público-privadas» (rede de novos hospitais
construídos com dinheiros públicos), com os «protocolos de contratação de
serviços» (área da saúde) ou, antecedendo uma previsível privatização (parcial
ou total), com a empresarialização de actividades tradicionalmente a cargo da
Administração Central, como acontece com os hospitais EPE, ou a recente
transformação da Estradas de Portugal em Sociedade Anónima, a quem é entregue,
«em concessão», a rede viária nacional por 75 anos. Uma centralização do
capital que encontra no nosso país um Estado dedicado à reconstrução
monopolista.
Contrariando a tese do «Estado a mais», defendida
pela direita a propósito do sector público empresarial, o Estado assume um
papel instrumental através da reforçada ligação entre o poder político e o
poder económico, ao serviço do favorecimento e financiamento públicos da
acumulação, concentração e centralização aceleradas do capital privado, com a
recomposição dos grandes grupos económicos privados.
Adoptando e adaptando o Estado às teses
neoliberais do grande capital - o «menos Estado», a «maior eficiência da gestão
privada», o Estado regulador e não produtor - a política de direita, apoiada
nas orientações comunitárias, concretiza as privatizações, liberaliza o mercado
de trabalho, promove a transferência de fundos comunitários para o grande
capital e permite o papel predador do sector financeiro junto das micro,
pequenas e médias empresas, do sector produtivo e da generalidade dos cidadãos,
proporcionando lucros obscenos e o crescimento exponencial dos patrimónios
mobiliário e imobiliário.
Quando necessário, mesmo negando as teses
que dizia defender, a política de direita coloca explicitamente o Estado e os
dinheiros públicos ao serviço dos interesses e negócios da oligarquia
financeira, como vem sucedendo com os avales do Estado, injecções de capital e
intervenções temporárias no sector bancário, ditas nacionalizações, como
sucedeu com o BPN.
Na reorganização e redefinição das funções
do Estado destaca-se na actualidade, como conceito nuclear, o das chamadas
«entidades reguladoras» e a teoria, que lhe está associada, da separação das
funções de prestação das de regulação, usada para justificar a progressiva
retirada dos serviços públicos da prestação de serviços e intervenção em áreas
essenciais. A entrega da regulação a essas entidades administrativas especiais
- as entidades reguladoras - alheias elas próprias aos serviços públicos, que
intervêm de facto no sentido do favorecimento da monopolização das actividades
que deviam regular.
A tese sobre um Estado
regulador visa iludir o papel do Estado enquanto instrumento que impõe, no
quadro do capitalismo, a manutenção e aprofundamento das relações de produção
baseadas na exploração. A
ideia de um Estado e de um poder acima da vida económica e sem vocação
económica, supostamente confinado a um papel de mediador de conflitos nos casos
em que o mercado se revelasse incapaz de assegurar a harmonia das relações
económicas, visa iludir a natureza de um poder político inteiramente
subordinado e ao serviço do poder económico. A ideia de uma regulação atribuída
a entidades apresentadas como «independentes», visa iludir a missão que lhes
está atribuída de garantir a gestão dos interesses e dos ganhos dos grandes
grupos económicos que operam nas áreas que regulam.
O agravamento da situação económica geral do
país, e a própria
deterioração da posição de Portugal no contexto dos países da União Europeia,
em particular da divergência real medida pela evolução do PIB per capita, é
a resultante consistente das políticas económicas e sociais ao longo dos
últimos trinta e dois anos. E muito em particular das opções pela inserção
internacional e integração comunitária descrita; das políticas de
reconstituição dos grupos económicos monopolistas e destruição do sector
empresarial do Estado; da destruição dos sectores produtivos por contraponto à
financeirização da economia nacional; do lugar estratégico concedido ao capital
estrangeiro; das políticas de subestimação do papel nuclear da educação, da
cultura e da I&D para uma mão-de-obra qualificada; das políticas de
restrições orçamentais e de desvio do investimento de objectivos estratégicos e
nacionais (designadamente a má utilização de três quadros comunitários de
apoio); e das políticas que acentuaram o défice energético com uma elevada
dependência dos combustíveis fósseis.
O crescimento económico em Portugal tem vindo
a desacelerar de década para década, atingindo o ponto mais baixo no período
2000-2007. Entre 2004 e 2007, após a recessão económica de 2003, o PIB cresceu
em média 1,2% e o PIB por habitante 1%. Ao mesmo tempo, Portugal tem vindo a
desacelerar a sua convergência com a União Europeia, de década para década,
divergindo no período 2000-2007.
Contrariamente ao que o Governo PS procura
inculcar na opinião pública, o actual agravamento da situação económica do país
é anterior ao detonar e ao desenvolvimento da crise financeira internacional.
Sem subestimar os impactos desta, a grave situação do país é o resultado
directo de 32 anos de políticas de direita, consolidando profundas fragilidades
e dependências do tecido económico português, tornando-o extremamente
vulnerável a crises, como a que agora se encontra em curso.
Os resultados de trinta e dois anos de
política de direita traduziram-se numa economia caracterizada pela consolidação
de uma estrutura produtiva de reduzida composição orgânica do capital e um
perfil produtivo de baixo valor acrescentado, assente na exploração de
mão-de-obra barata e precária e dos recursos naturais do país.
Na avaliação da estrutura económica
produtiva podem destacar-se, de forma sumária, um sector primário -
agricultura, pescas, indústria extractiva - que se confronta com uma crise
profunda e uma continuada redução da capacidade produtiva no caso das duas
primeiras actividades, agravando a dependência externa do país face a
matérias-primas essenciais, ao mesmo tempo que não se aproveitam os recursos
mineiros existentes ou se dá ao capital estrangeiro a sua exploração.
O sector agrícola foi profundamente afectado
na sua capacidade produtiva, limitado nas suas potencialidades de expansão
decorrentes dos constrangimentos da Política Agrícola Comum e da falta de um
plano estratégico nacional de desenvolvimento do sector, encontrando-se a
braços com uma profunda crise económica e social traduzida num aumento da
dependência alimentar, com um défice da balança agrícola que ronda os 80%,
pondo em causa a soberania alimentar.
Nos campos da grande propriedade do Sul
(Alentejo e Ribatejo), a destruição da Reforma Agrária, a consequente
reconstituição da propriedade latifundiária, a PAC e as políticas agrícolas de
direita no país, determinaram a coexistência da manutenção de grandes
explorações com terras incultas ou subaproveitadas, a par de um surto de
capitalismo agrário, dinamizado em grande medida por capital estrangeiro,
centrado em algumas produções com modos de exploração super-intensivos, e de
uma significativa pressão sobre o uso da terra para projectos de agro-turismo e
especulação imobiliária. Na zona do minifúndio do Norte e Centro assiste-se a
aumentos da dimensão média das explorações agrícolas, enquanto cresce a liquidação
de pequenas e médias unidades, o abandono dos campos e a desertificação do
mundo rural, resultado da perda de rendimento agrícola, fruto das dificuldades
de escoamento e baixos preços dos produtos e do aumento dos custos de produção.
O sector das pescas sofreu uma evolução
semelhante, face à ausência de uma política de defesa do sector a nível
nacional e os condicionalismos impostos pela Política Comum de Pescas. Nos
últimos 20 anos verificou-se um aumento do défice comercial ao nível dos
produtos das pescas, que ronda hoje os 70%. A dificuldade de manter preços de
primeira venda, conjugada com o aumento dos custos de produção, nomeadamente
dos combustíveis, tem provocado uma perda de rentabilidade do sector, agravando
a situação económica e social das regiões costeiras dependentes da pesca.
O domínio completo do sector mineiro pelo
capital estrangeiro e a ausência de transformação no país, que tem excluído
oportunidades de valorização da importante fileira de produtos metálicos e
químicos, mantém a sua grande vulnerabilidade e dependência dos mercados
externos. Nas rochas ornamentais e industriais, a valorização nacional continua
igualmente muito reduzida e insuficiente.
No sector secundário, depois da liquidação
ou redução de sectores como o siderúrgico, naval, metalomecânico ou químico,
predomina um tecido industrial constituído em grande parte por empresas
tecnologicamente atrasadas e por uma significativa presença da chamada economia
paralela ou informal.
A presença significativa da indústria automóvel
e de alguns outros subsectores, e os seus efeitos indutores na indústria de
componentes, não compensou os aspectos negativos assinalados e agrava
traçosde dependência de um único sector em várias regiões do país. É
preocupante o início de encerramentos e deslocalizações na fileira. Na
construção civil e obras públicas verificou-se uma evolução contraditória com
uma brutal sobreprodução na habitação de fogos novos, uma muito insuficiente ou
nula reabilitação de habitação antiga e um desenvolvimento reduzido das obras
públicas.
O sector terciário tem tido um elevado
crescimento nas últimas décadas. Sob o ponto de vista qualitativo são de
destacar as profundas alterações nos dois últimos decénios, com o crescimento
explosivo dos novos formatos comerciais, onde avultam as grandes superfícies
(hipermercados e supermercados) e a redução brutal do pequeno comércio. A
actividade imobiliária - fortemente penetrada pelo sector bancário e os fundos
de investimento, sujeita a movimentos especulativos e processos de lavagem de
dinheiro - teve, a partir de meados da década de 90, um grande e anormal
desenvolvimento, com implicações directas na política de habitação. Os
designados serviços prestados às empresas incluem um amplo e diversificado
conjunto de actividades - originadas muitas vezes em processos de
reestruturação empresarial com externalização de serviços - com uma forte
contribuição para a precariedade laboral. No turismo, sector que conheceu
índices de crescimento significativos na última década, assiste-se a uma
concentração ditada pela crescente penetração e domínio do capital financeiro e
de grupos económicos.
O sector financeiro - coração dos principais
grupos monopolistas portugueses e um lugar estratégico do capital transnacional
-, que funciona como centro de acumulação e de distribuição de capital, através
da transferência de riqueza do sector produtivo e das pequenas empresas, e bem
assim das poupanças e das pensões de reforma, vem assumindo preponderância
crescente no processo económico, o que lhe permite apropriar-se de uma parcela
crescente da mais-valia, seja por via do crédito concedido a elevada taxa de
juro, seja por via dos dividendos resultantes da sua participação no capital de
empresas produtivas, ou da cobrança de taxas e comissões sobre os depósitos e
as várias operações bancárias, tanto das empresas como dos trabalhadores. Em
íntima associação com a banca, os seguros, vêem alargar-se o âmbito e volume
dos seus negócios, em resultado de políticas de desresponsabilização do Estado
e de privatização de serviços públicos seguidas pelos sucessivos governos. O
sector financeiro multiplica as suas receitas ao colocar e transaccionar os
mais diversos títulos nos mercados de valores mobiliários, nacionais e
estrangeiros, à semelhança de estabelecimentos congéneres e com a sua
cumplicidade, para realizar «mais valias» que não têm contrapartida na
economia, assim contribuindo para gerar os pressupostos para graves e
criminosas crises financeiras, com catastróficas consequências económicas e
sociais.
Os principais défices estruturais do país
são de insuficiente produção material - bens alimentares e industriais -
energética, de transportes e logística e de I&D, com consequências no galopante
endividamento externo.
A dependência de bens materiais agravou-se
nos últimos anos. A balança corrente (constituída pelas balanças de
mercadorias, serviços, rendimentos e transferências correntes) agravou-se em
90% entre 2003-2007, atingindo mais de 16 mil milhões de euros (10% do PIB).
Dependência que tem vindo a acentuar-se desde a década de 80, após a nossa
adesão à União Europeia. A dependência alimentar, medida no desequilíbrio da
balança de bens agro-alimentares, agravou-se 11,9%. Manteve-se um forte défice
energético e a forte dependência do petróleo e outros combustíveis fósseis. Um
défice que resulta da ausência de medidas de racionalização do uso da energia,
no sentido da redução da intensidade energética da economia nacional, em
particular na política de transportes, e do insuficiente investimento na produção
das energias endógenas, renováveis e limpas. Manteve-se igualmente um
persistente défice da estrutura de transportes e logística, resultado de
políticas e medidas sujeitas ao objectivo de total privatização e liberalização
do sector, e total subordinação aos interesses do grande capital. A actividade
de I&D, a investigação científica e o desenvolvimento de produtos e
serviços, apesar da existência de importantes pólos, bem como actividades
conexas de carácter científico e técnico, permanecem a níveis insignificantes e
marginais. Mantêm-se reduzidos níveis de formação científica e técnica dos
sistemas de ensino e formação profissional, a liquidação de múltiplas
actividades produtivas e o baixo nível de integração do conhecimento científico
na actividade económica.
Em Portugal coexistem várias formações
económicas com dinâmicas diversas e contraditórias, no quadro determinante do
desenvolvimento do capitalismo monopolista: o sector público empresarial viu
diminuído drasticamente o seu peso, as empresas privadas alargaram fortemente o
domínio e presença, as empresas de capital estrangeiro ganharam relevo e
protagonismo. A estrutura empresarial da economia portuguesa é dominada
por empresas com menos de 50 trabalhadores - em 2006, 99,4% do total de empresas, 49,1%
do volume de negócios e 62,2% do emprego; o sector público tem ainda algumas
grandes e médias empresas onde se verifica a presença, por vezes muito
significativa, de capitais públicos - cerca de 110 empresas - onde se incluem
algumas com o estatuto de empresas públicas ou equiparadas; o sector
cooperativo e social tem um peso económico e social significativo (4,2% do PIB
e 175 mil trabalhadores), destacando-se o sector agrícola (em especial o
leiteiro e o vitivinícola), a habitação, o consumo e o apoio social.
As políticas económicas de direita de
sucessivos governos do PS e PSD assumiram uma identidade que vai muito para
além de simples proximidade ou semelhanças traduzidas em acordos parlamentares
ou pactos em torno de certas matérias. Porque é uma identidade fundada em
idênticos princípios, objectivos e práticas governamentais, tendo por base o
capitalismo e por enquadramento a integração capitalista europeia. Essa
identidade, que a retórica de oposição mal disfarça, tem expressão concreta num
importante conjunto de políticas governamentais, como a orçamental e a fiscal,
as privatizações e liberalizações, as políticas de emprego e investimento.
A política orçamental tem sido assumida como
um instrumento basilar dos sucessivos governos no prosseguimento de objectivos
centrais da política de direita, entre os quais a reconfiguração neoliberal do
Estado. As imposições do Pacto de Estabilidade e Crescimento (aprovadas e
apoiadas por PS, PSD e CDS/PP) têm sido usadas para, ano após ano, reduzirem o
peso das despesas de carácter social, o financiamento das estruturas do Estado
e para penalizarem, por via do agravamento dos impostos e taxas cobradas, os
trabalhadores e as pequenas e médias empresas, enquanto promovem a
transferência de fundos públicos e garantem vultuosos benefícios fiscais para o
grande capital nacional e estrangeiro.
A política de privatizações vem expulsando o
Estado da esfera empresarial tanto da produção de bens materiais como de
serviços essenciais ao desenvolvimento económico do país.
O Governo PS demonstra ser um bom executante
dessa política, quer pelas privatizações já realizadas (PORTUCEL, EDP, GALP,
Siderurgia, EDA) quer pelas que já anunciou, algumas disfarçadas de
«concessões» (ANA, Estradas de Portugal, TAP, Águas de Portugal, Matas
Nacionais). Com o estrito objectivo de obtenção de receitas para redução da
Dívida Pública e reforço de grupos monopolistas, sendo de destacar a entrega da
GALP ao Grupo Amorim, a sua concretização não tem qualquer justificação
económica ou de interesse público. Estas decisões assumem particular gravidade
dada a natureza dos bens e serviços produzidos pelas empresas privatizadas, o
reforço de estruturas monopolistas privadas na economia nacional (algumas são
monopólios «naturais») e o seu papel estruturante no ordenamento do território
(REN, ANA, Estradas de Portugal) ou estratégico (caso da PORTUCEL na fileira
florestal, agora agravada com a anunciada entrega da gestão de matas nacionais,
como o Pinhal de Leiria). Fica igualmente demonstrada, através da evolução das
alterações estatutárias das formas societárias e faseamento das privatizações
das empresas públicas, a fraude política da argumentação de sucessivos governos
que, sempre assegurando a garantia da presença e comando do Estado, acabam por
as entregar total e definitivamente ao capital privado e grandes grupos
económicos.
Enquanto aumenta o peso da sua tributação
nas receitas fiscais, os trabalhadores vêem reduzidos os benefícios fiscais e
os escalões do IRS actualizados abaixo do aumento da inflação, o Governo
permite a manutenção de taxas efectivas de tributação do sector financeiro dez
e mais pontos percentuais abaixo da taxa nominal, e concede muitos milhões de
euros de benefícios fiscais ao offshore da Madeira, apoiando e
financiando a banca e o sector financeiro e especulativo. Em simultâneo, o PS
no Governo, bem como PSD e CDS-PP, recusam a implantação de medidas de efectivo
combate à fuga e evasão fiscais e ao branqueamento e fraude de capitais.
A política de investimento está há muitos
anos aquém das necessidades quantitativas e qualitativas da nossa economia.
Desde 1997 o investimento público vem perdendo peso no investimento total,
atingindo o mínimo histórico em 30 anos de 2,3 % do PIB, em 2007, deixando de
assumir um papel dinamizador da economia, especialmente necessário em momentos
de crise económica, como os vividos nos últimos anos. Mantém-se uma manifesta
insuficiência do investimento privado. Os fundos comunitários, correspondentes
aos três primeiros quadros comunitários, atingiram o valor de cerca de 56 mil
milhões de euros, mas com uma muito reduzida eficácia em termos estruturantes,
inclusive na reprodução do mapa assimétrico do investimento público. O
investimento directo estrangeiro, IDE, assumiu um papel quantitativo significativo.
Em sentido contrário a este e ao das reais necessidades nacionais, aparece, a
partir de meados da década de 90, uma nova orientação estratégica do grande
capital nacional, que é a do investimento directo português no estrangeiro,
IDPE, o qual atingiu a soma de 90 mil milhões de euros a preços correntes,
entre 1997 e 2005.
As políticas de sucessivos governos
transformaram o capital estrangeiro no elemento central do desenvolvimento do
país, pelo que tem vindo a ocupar, de forma crescente, importantes e
estratégicos espaços na economia portuguesa, inclusive o controlo e exploração
de recursos naturais e Infra-estruturas públicas essenciais. O que tem vindo a
acontecer, não só através do investimento directo em novos projectos, como por
via do processo de privatizações, de associação do capital nacional ao grande
capital internacional e da aquisição de activos, que a livre circulação de
capitais, decorrente da UEM, facilitou. O investimento estrangeiro, que pode
constituir um elemento de desenvolvimento em função da sua dimensão, condições
e actividades, representa, na sua maioria, uma ameaça de deslocalização, com
toda a chantagem e ofensiva que lhe estão associadas, relativas aos salários,
horários de trabalho e direitos dos trabalhadores, uma opção por actividades de
baixa incorporação tecnológica e baixo valor. É ainda responsável pela
crescente saída de rendimentos para o exterior, pela transferência de lucros,
não cuidando de reinvestimentos e baixando o rendimento nacional disponível,
reduzindo a quota de riqueza produzida que permanece em território nacional.
Absorveu ainda parte muito significativa dos fundos comunitários e de outros
apoios públicos.
Sem fazer qualquer avaliação da diversidade
geográfica, social e económica do país, as políticas nacionais de limitação do
acesso aos serviços públicos e de redução de investimentos públicos têm vindo a
agravar, de forma continuada, as assimetrias de desenvolvimento do país,
condenando ao desaparecimento muitas vilas e aldeias e à estagnação grave
muitas cidades do interior, impedindo o aproveitamento dos recursos locais.
A recusa da criação das regiões
administrativas - nível de administração autárquica indispensável a uma
efectiva descentralização e capaz de contribuir para o desenvolvimento regional,
para a valorização da vida democrática, para a racionalização da administração
do Estado e dos seus recursos - e a sua substituição por estruturas sem
legitimidade democrática tem agravado a coesão territorial do continente.
O modelo de desenvolvimento determinado por
políticas e opções de direita contribuiu para comprometer a coesão territorial
e social. As políticas seguidas têm tido como consequência no ordenamento do
território a consolidação de um modelo marcado por acentuadas assimetrias e desequilíbrios
regionais, de uma integração territorial subalterna no quadro ibérico e pelo
favorecimento da grande especulação imobiliária.
A política de ambiente, gestão de recursos naturais e ordenamento do
território promovida pelos sucessivos governos, e agora agravada pelo Governo
PS, é a da entrega e submissão aos grandes interesses privados, que orbitam em
torno da especulação imobiliária, da exploração dos recursos energéticos e da
distribuição de água.
A mercantilização da água, configurada na Lei de 2005, avança
aceleradamente: entregando a «água da natureza», leitos dos rios, margens,
praias e infra-estruturas essenciais a «concessionários» privados; instalando
taxas e tarifas a suportar pela população; estruturando um «mercado» de
sobre-utilização e poluição da água; impondo uma imputação de custos ao
utilizador final - as populações - destinadas a rentabilizar os
concessionários. A privatização dos serviços de abastecimento de água e águas
residuais conhece, com o actual Governo, novos desenvolvimentos com a
implementação do Plano Estratégico de Abastecimento de Água e de Saneamento de
Águas Residuais (PEAASAR II), a pressão para a alienação por parte dos
municípios dos serviços e das competências no abastecimento de água e esgotos e
a anunciada privatização do grupo Águas de Portugal, que já controla a maioria
dos sistemas de abastecimento «em alta» de água e saneamento. A privatização
destes sistemas não só transformaria o direito universal à água em mercadoria,
como retiraria às populações e ao poder local qualquer possibilidade de
intervenção democrática na sua gestão.
A legislação destinada a
contornar os instrumentos de ordenamento do território em função da dimensão do
investimento, através dos chamados Projectos de Interesse Nacional (PIN), é
parte de uma estratégia cujo objectivo é o de colocar o território nacional, e
as suas riquezas naturais e paisagísticas, à disposição do grande capital e das
suas estratégias. A implantação de empreendimentos imobiliários/turísticos de
grande envergadura, sem interacção económica com o tecido natural e social em
que se inserem, contribui para o abandono da terra pelas populações locais, com
maior intensidade nas áreas protegidas, e para o acentuar do processo de
desertificação de vastas áreas do interior do país.
Prossegue e acentua-se a
desresponsabilização do Estado na preservação da natureza, com a redução dos
meios de gestão e fiscalização em domínios como os das Áreas Protegidas ou da
produção e rotulagem de organismos geneticamente modificados. A preservação da
natureza é, assim, cada vez mais relegada para o nível do negócio, onde se
insere também a mercantilização da biodiversidade, com a entrega da gestão das
áreas protegidas (através das «concessões» de Parques e Reservas Naturais) e de
explorações mineiras de recursos finitos a grupos privados, ou o negócio das
cotas de emissão de CO2, e a privatização da «água da natureza», dos
rios e das praias.
A evolução da situação no plano social fica marcada nos últimos anos, em resultado do prosseguimento e
aprofundamento da política de direita por parte do Governo PS, por um
extraordinário agravamento.
A acção do Governo PS e da sua maioria parlamentar - assumindo com o
apoio do PSD e CDS-PP as exigências do grande capital -, deu novos e graves passos
no sentido da destruição de direitos conquistados pelos trabalhadores e o povo
português.
O Sistema Público de Ensino, a Segurança Social e o Serviço Nacional de
Saúde sofreram nestes últimos anos uma das maiores ofensivas de sempre.
Conquistas universais e civilizacionais no plano social são, pela mão do actual
Governo e na linha de políticas prosseguidas por executivos anteriores, objecto
de tentativas liquidatárias.
A revisão do Código do Trabalho, ao arrepio dos compromissos anteriormente assumidos pelo PS aquando da
aprovação pelo governo PSD/CDS-PP, no sentido de rever as normas mais gravosas
do Código da responsabilidade de Bagão Félix, constitui um passo adiante na
fragilização das relações de trabalho e na criação de condições para o aumento
da exploração.
Aprofundar a flexibilização e a desregulação das relações laborais,
liquidar a contratação colectiva, enfraquecer os sindicatos, reduzir garantias
dos trabalhadores e reforçar o poder discricionário dos patrões, constituem as
principais linhas de alteração ao Código do Trabalho agora aprovadas pela
maioria parlamentar do PS.
O Código do Trabalho agora aprovado tem em vista facilitar os
despedimentos, legalizar a precariedade laboral e liquidar, a pretexto de
simplificar o regime de caducidade das convenções colectivas, a importante
conquista que a contratação colectiva representa. A eliminação do princípio do
tratamento mais favorável para o trabalhador constitui um grave retrocesso no
Direito do Trabalho e na relação entre trabalho e capital. A definição do tempo
de trabalho, pedra angular da exploração, e a histórica conquista do horário de
trabalho das 8 horas diárias e 40 semanais, são hoje postas em causa pelo
Código, que possibilita a imposição pelo patronato de horários de trabalho que
podem ir até às 12 horas diárias e 60 horas semanais, sem o pagamento de
trabalho suplementar, com graves consequências na organização da vida pessoal
dos trabalhadores.
De forma articulada e simultânea, o Governo desenvolve uma fortíssima ofensiva
legislativa contra os trabalhadores da Administração Pública, destinada a
retirar direitos e a fragilizar as relações de trabalho. O Regime de
Contrato de Trabalho em Funções Públicas, dando corpo à inconstitucional lei
dos vínculos, carreiras e remunerações, materializa o fim do vínculo público de
emprego para milhares de trabalhadores e introduz o conceito de inadaptação
que, cruzado com o Sistema Integrado de Avaliação e Desempenho na Administração
Pública (SIADAP), consagra, sem qualquer direito de audição, critérios de
discricionariedade e arbitrariedade conducentes ao despedimento. A mobilidade
especial, a alteração conceptual de quadros de pessoal para mapas de pessoal, a
fixação de objectivos por serviço, a introdução do princípio da dependência
orçamental do serviço para a definição anual do número de trabalhadores
necessários ou possíveis para as promoções, constituem elementos, a par do
SIADAP, do Estatuto Disciplinar e da Lei dos Vínculos Carreiras e Remunerações,
de um processo mais vasto.
A teia legislativa urdida contra os trabalhadores da administração
pública, além da sua natureza intimidatória, não é separável do processo de
ataque às funções sociais do Estado e da inerente degradação da sua prestação,
nem da crescente partidarização e submissão da administração pública aos
interesses do grande capital. As campanhas contra a administração pública e a
sua dimensão tentam ignorar, deliberadamente, que a sua configuração está
associada aos direitos conquistados e que o número de trabalhadores ao seu
serviço e a extensão da sua desconcentração territorial são expressão da
profunda transformação democrática resultante das conquistas sociais e
económicas.
O aprofundamento da
política de direita acentuou as desigualdades. Aumentou o fosso entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres, sendo o
rendimento dos 20% mais ricos, em 2005, mais de oito vezes superior ao dos mais
pobres. Cerca de 18% da população portuguesa vive abaixo do limiar da pobreza, percentagem esta que atinge os 20% de crianças e jovens
até aos 17 anos, e 25% dos portugueses com mais de 65 anos. Quase 3 milhões de
portugueses vivem com menos de 10 euros por dia, e mais de 230 mil com menos de
5 euros. De acordo com o Relatório Anual de Execução do Rendimento Social de
Inserção, em 2007 cerca de 37% dos beneficiários auferiam rendimentos do
trabalho, confirmando o empobrecimento acentuado dos que vivem do seu trabalho.
Enquanto aumenta o custo de
vida e as taxas de juro à habitação atingem os valores mais altos dos últimos
anos (obrigando milhares de portugueses a entregar as suas habitações aos
bancos), os salários degradam-se, o endividamento familiar atinge níveis
incomportáveis, o nível de vida da maioria da população portuguesa baixa
aceleradamente.
A evolução dos salários, do
emprego e do desemprego nos últimos anos explica a razão porque Portugal é um
dos países com maiores desequilíbrios na distribuição dos rendimentos. Os
salários continuam em perda contínua: num país que detém um valor médio dos
salários abaixo de metade da média europeia, e a divergir desde 2000 face ao
ordenado médio da OCDE, o salário médio real caiu 2,6% em 2006, sendo agora o
quarto país com menor poder de compra. A que se acrescenta o facto de o salário
mínimo nacional ser o mais baixo da UE a 15. A distribuição da riqueza
produzida situa-se em cerca de 60% para o capital e 40% para o trabalho (dados
de 2005), quando em 1975 chegou a ser o inverso.
Os níveis de desemprego - disfarçados pela subavaliação e
manipulação dos critérios estatísticos e pelo crescente recurso à emigração -
são os mais elevados das duas últimas décadas, atingindo cerca de 600 mil
trabalhadores, o valor mais elevado desde o 25 de Abril, correspondendo a uma
taxa de 10,5% em sentido lato (8% em sentido restrito). Verifica-se uma
acentuada destruição de empregos qualificados e de vínculos efectivos, e uma
elevada incidência do desemprego de longa duração, que tem vindo a agravar-se
(a taxa dos que procuravam emprego há mais de 12 meses passou de 43,2%, em
2004, para 47,3%, em 2007). O desemprego absorveu quase na totalidade o
crescimento registado na população activa. A protecção no desemprego foi
significativamente reduzida e os desempregados afectados na sua dignidade. A
manutenção de uma elevada taxa de desemprego tem constituído um factor
adicional do aumento da exploração.
O emprego tornou-se mais vulnerável e inseguro em
resultado das opções da política económica e social do Governo PS. A qualidade
do emprego degradou-se e o trabalho sem direitos tornou-se uma realidade
estrutural na sociedade portuguesa. A precariedade - para a qual as empresas de
trabalho temporário deram um importante contributo - transformou-se em política
de Estado afectando cerca de um terço dos trabalhadores e um quarto da
população empregada, ou seja cerca de 1 milhão e 200 mil trabalhadores
(registando um aumento de quase 185 mil entre o primeiro trimestre de 2005 e o
primeiro trimestre de 2008, ou seja, um aumento de 16,7%.). Neste mesmo
período, o emprego entre a população residente em Portugal aumentou em 99.600,
enquanto o emprego com vínculo precário cresceu cerca de 85 mil, o que
significa uma ampla substituição de trabalhadores com contrato sem termo por
contratos com termo.
O desrespeito pelas leis
laborais, para o qual tem contribuído a insuficiência de meios da Autoridade
para as Condições do Trabalho e a limitação do acesso à justiça do trabalho, o
emprego precário, a economia paralela e o falso trabalho independente
representam as principais formas de desregulamentação do trabalho no nosso
país.
Em resultado da política
seguida por sucessivos governos, a situação da juventude viu-se
particularmente agravada com a acção do actual Governo. O agravamento da
precariedade e do desemprego, com particular incidência nas camadas mais jovens
(14,3%, nos trabalhadores até aos 24 anos), as alterações na educação,
designadamente com o aumento das propinas e a elitização do ensino e o ataque à
escola pública, as limitações ao acesso à habitação, de que são expressão os
cortes a uma política de incentivo ao arrendamento jovem, comprometendo ainda
mais o acesso à habitação, são algumas das expressões de uma política que
consagrou a instabilidade, a incerteza e as dificuldades na vida de milhares de
jovens, comprometendo o seu futuro e o direito a uma vida digna.
Uma situação extensível ao
conjunto de novas gerações de trabalhadores que, perante a insegurança de
emprego e as elevadas cargas horárias, o não pagamento do trabalho
extraordinário, os baixos salários, os constantes e incomportáveis aumentos das
taxas de juro nos empréstimos para aquisição de habitação, a falta de apoio
social, designadamente de equipamentos de apoio à infância, vêem dificultado,
ou mesmo comprometido, o seu objectivo de começar a vida activa, ganhar
autonomia e independência financeira, constituir família.
Com a criação de um sistema
de três patamares - sistema de protecção de cidadania, sistema previdencial e
sistema complementar -, o Governo PS procedeu a profundas alterações ao sistema
de Segurança Social, subvertendo o seu carácter público, universal e
solidário, com repercussões especialmente gravosas no ataque ao direito à
reforma e a uma pensão digna.
O processo de convergência
dos regimes de protecção social da Administração Pública com o Sistema Público
de Segurança Social que, a partir de 2005, o actual Governo impôs é responsável
por consideráveis retrocessos na protecção social dos trabalhadores, tanto do
sector público como do privado.
O objectivo de redução das despesas com pensões deu corpo a um conjunto
de medidas que reduz o valor das reformas dos trabalhadores em resultado da
aplicação do chamado «factor de sustentabilidade» que, dando início a um
processo de desvalorização das pensões, representa em 2008 uma redução do valor
da pensão de 0,56%, e que atingirá 20% em 2050. Esta redução é ainda mais
penalizadora para os baixos salários, em resultado da antecipação da aplicação
da nova fórmula de cálculo com base na média ponderada da carreira
contributiva. As novas regras para a indexação e actualização das pensões,
tendo por base um Indexante de Apoios Sociais (IAS), condicionam injustamente
os seus aumentos anuais à taxa da inflação e ao crescimento do PIB. A criação
de um regime público de capitalização de contas individuais, a ser financiado
por contribuições «voluntárias» dos trabalhadores, representa uma forma
artificial de «atenuação» da quebra dos valores das suas pensões e visa o
fomento dos fundos privados de pensões.
A redução dos direitos dos trabalhadores está patente, ainda, nas
alterações ao subsídio de desemprego, responsáveis pelo aumento do número de
desempregados excluídos desta prestação social; na destruição da universalidade
do direito ao abono de família e na desvalorização do seu valor para milhares
de famílias com um ou dois filhos; no estabelecimento da diferenciação do valor
do subsídio de maternidade e paternidade para licenças de 120 e 150 dias (de
100% para 80%).
A criação de novas prestações sociais, de combate à pobreza entre os
idosos e de apoio à maternidade e paternidade, pelo Governo PS, salda-se pelo
reduzido alcance social em resultado da imposição de um conjunto de requisitos
que são um factor de exclusão dos que delas necessitam.
Utilizando o aparelho do Estado para disseminar uma concepção caritativa
e assistencialista, o Governo PS avança no processo de privatização da Acção
Social e da rede de equipamentos e serviços sociais de apoio à criança, à
família, à terceira idade e aos cidadãos com deficiência. Esta opção abre novos
caminhos de lucro para o sector privado e transfere para a «organização» dos
cidadãos a realização de actividades de prestação de serviços e de
solidariedade social. Cresce, assim, a par do papel crescente das
Misericórdias, o número de associações que inserem a sua acção neste âmbito, a
maioria das quais com o estatuto de IPSS.
Intensificaram-se os níveis de exploração e violação sistemáticas dos
direitos das mulheres trabalhadoras, designadamente em função da
gravidez, da maternidade e do apoio à família, o que contribui de forma
decisiva para a perpetuação do «tradicional» ciclo de discriminação que pesa
sobre as trabalhadoras, e que se repercute negativamente na vida familiar e na
participação na vida social e política.
Aumentou a precariedade e o desemprego entre as trabalhadoras de diversas
idades e qualificações, ao mesmo tempo que se acentuou a sua desigual
distribuição pelas profissões e níveis hierárquicos, acompanhada pela
degradação do seu estatuto remuneratório e por profundas desigualdades
salariais, factores que se reflectem e explicam, designadamente, os valores
mais baixos das pensões e reformas das mulheres. Acentuou-se a exclusão do
acesso a equipamentos sociais de apoio por parte das famílias trabalhadoras de
mais baixos rendimentos. Mantêm-se a ausência de políticas adequadas de
prevenção e apoio às vítimas de violência (doméstica, no local de trabalho e
exploração na prostituição).
A política social do Governo PS para a terceira idade
caracteriza-se pela imposição de um conjunto de medidas de redução do valor das
reformas e pensões, penalizando os actuais e futuros reformados, agravando e
aprofundando a injustiça social na política de distribuição dos rendimentos, e
trazendo como consequência imediata a acentuação e a extensão da pobreza e a
perda do poder de compra, não só dos pensionistas com valor mais baixos, como
da generalidade dos reformados do sector privado e dos aposentados da
Administração Pública.
A privatização dos equipamentos e serviços sociais em detrimento da
existência de uma rede pública, com o aumento crescente de dificuldades de
acesso às valências de apoio domiciliário e de lares por parte dos idosos
dependentes e com baixos rendimentos, e a falência de medidas como a criação do
Complemento Solidário para Idosos, a par de novas taxas moderadoras e da
redução na comparticipação de medicamentos, põem em causa o direito dos idosos
à protecção social. O encerramento de serviços públicos, designadamente os de
saúde, a desertificação e o envelhecimento de importantes regiões do país,
acrescentam novos factores de isolamento, de vulnerabilidade social e de
pobreza entre os reformados e idosos.
A forte incidência das desigualdades sociais e da pobreza entre
crianças e jovens até aos 18 anos está patente nas situações que, ao longo
dos anos, têm vindo a ser sinalizadas pelas Comissões de Protecção de Crianças
e Jovens em Risco. Uma realidade inseparável da situação dos agregados
familiares correspondentes, 38,2% dos quais com elevada precariedade económica
(subsídio de desemprego, rendimento social de inserção, pensões de
sobrevivência social ou de invalidez).
A situação das pessoas com deficiência, especialmente vulneráveis
às situações de marginalização social, de desemprego e de aumento de preços dos
bens e serviços essenciais e das despesas com a saúde, viu-se agravada com a
redução de direitos dos trabalhadores deficientes, como é patente na retirada
de benefícios fiscais, na redução do valor das suas reformas, no Código do
Trabalho e nos retrocessos em matéria de reparação por acidentes de trabalho - designadamente
com uma nova Tabela de Incapacidades que fragiliza a protecção social dos
acidentados de trabalho e favorece as seguradoras.
O agravamento da situação económica e social teve também repercussões
graves nos trabalhadores imigrantes, a maioria em situação de maior
fragilidade no mercado de trabalho, ocupando, na sua grande maioria, trabalhos
pouco qualificados, de baixos salários, em condições de precariedade e de
ausência de direitos, com excessivas cargas horárias.
O recurso à mão-de-obra imigrante, barata, mais fragilizada e muitas
vezes em situação irregular, é, na lógica da exploração capitalista e da
obtenção de acrescidas mais-valias, utilizado para pressionar a desvalorização
dos salários, aumentar a precariedade e limitar o exercício dos direitos.
Vítimas, eles próprios, a exemplo dos restantes trabalhadores, da degradação da
situação económica e social e da exploração, os imigrantes são responsáveis por
cerca de 5% do PIB nacional, sendo o seu contributo para as contas públicas,
através de impostos e taxas, maior que os custos que lhe estão associados,
fazendo-os por isso contribuintes líquidos para a nossa sociedade.
A perspectiva de uma nova vaga de imigração, a concretizarem-se as obras
públicas anunciadas para os próximos anos, torna mais urgente o combate às
formas ilegais de contratação de trabalhadores imigrantes e às redes de
imigração ilegal, o cumprimento da legislação do trabalho por parte do
patronato e a extensão progressiva dos direitos políticos dos imigrantes.
A estimativa de cerca de 5 milhões de portugueses a viver no estrangeiro
reflecte, só por si, a importância da emigração para Portugal. O crescimento no
número de portugueses que saíram de Portugal entre 2003 e 2006, 18,7% segundo o
relatório da OCDE de Junho de 2007, é expressão do agravamento da situação
económica e social do país e um desmentido sobre o alegado fim dos fluxos de emigração
em consequência da adesão de Portugal à então CEE. Com a acrescida agravante
de, a par do abandono do país por parte de trabalhadores qualificados e com
formação académica, o aumento da emigração dos últimos anos se realizar em
condições de grande precariedade e enorme exploração, onde predomina o trabalho
temporário e sazonal.
O encerramento de consulados e sua entrega à gestão de privados, as
alterações ao regime de contratação de professores na rede do ensino do
português no estrangeiro com reflexos negativos na qualidade do ensino, a
governamentalização do Conselho das Comunidades, a manutenção da discriminação
que atinge os ex-militares emigrantes impedindo-os de ver o tempo de serviço
militar contado para efeitos da reforma, a anulação do porte-pago aos órgãos de
informação regionais e da emigração, a eliminação das contas «poupança
emigrante», vêm fragilizando a ligação às suas terras de origem.
A política de habitação
do actual Governo, ao serviço dos interesses do grande capital e dominada por
uma orientação de favorecimento da especulação imobiliária, confirma e acentua
a progressiva desresponsabilização do Estado, que vem pondo em causa o direito
à habitação, constitucionalmente consagrado. Associado a esta política, o
capital financeiro tem onerado desmesuradamente os orçamentos das famílias,
nomeadamente através do aumento das taxas de juro, forçando-as a elevadas taxas
de endividamento. Esta política é responsável pelo aumento da especulação
imobiliária sobre as periferias e o abandono dos núcleos históricos das
cidades, pela existência de um excedente de 650 mil fogos, ao mesmo tempo que
persistem problemas de sobrealojamento e inabitabilidade, pela imposição do
modelo único de habitação própria, com o estrangulamento do mercado de
arrendamento. A publicação pelo actual governo de uma proposta de Plano
Estratégico de Habitação, confirmando no seu diagnóstico a grave situação dos
problemas da área, insiste em soluções orientadas para um papel do Estado
subsidiário da dinâmica do mercado de habitação e de mero regulador,
comprometendo a adopção da política necessária para garantir o efectivo direito
à habitação.
A recente criação dos Fundos
de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional, sob o pretexto de
apoio aos milhares de famílias em dificuldades no pagamento aos bancos das suas
prestações mensais, mais não serve que os interesses do sector imobiliário e do
sistema bancário que assim se liberta do crédito de cobrança duvidosa.
Beneficiários de uma total isenção de impostos, estes fundos, autênticos
paraísos fiscais para os seus investidores, permitem aos bancos a limpeza dos
seus balanços e, embora possam a curto prazo aliviar os orçamentos das famílias
que a eles recorrem, conduzirão à perda por muitos da sua própria habitação e à
possibilidade de despejo nas situações em que não assegurem o pagamento das
rendas.
Na saúde, os últimos
anos ficam marcados por uma ofensiva sem precedentes contra o Serviço Nacional
de Saúde (SNS), assente em quatro eixos principais: a desresponsabilização do
Estado face à sua obrigação constitucional de garantir o acesso aos cuidados de
saúde de todos os portugueses em condições de igualdade; o encerramento
sistemático de múltiplos serviços de saúde; a transferência para as famílias de
uma parte crescente dos custos com a saúde, nomeadamente pelo aumento e criação
de taxas moderadoras; uma política laboral contra os direitos dos
profissionais. A política governamental do medicamento cifrou-se, globalmente,
pela sobrecarga de custos para os utentes, pela desresponsabilização do Estado
com a eliminação e/ou redução da comparticipação em muitos medicamentos.
A estratégia de degradação da
oferta pública de cuidados de saúde e encerramento de serviços (SAP; urgências
hospitalares e maternidades; hospitais psiquiátricos e numerosos serviços de
saúde mental), fruto da sintonia entre os governos do PSD/CDS-PP e do PS com os
grandes grupos financeiros, que vêem na saúde uma importante área de negócio,
tem-se traduzido na redução da capacidade de resposta e no desacreditar do
Serviço Nacional de Saúde (SNS), ao mesmo tempo que abre portas à sua
privatização e empurra os utentes para sistemas e serviços privados de saúde.
A política de
desresponsabilização do Estado, assente na lógica do «Estado mínimo» e no
princípio do utilizador-pagador para garantir a progressiva separação dos
papéis de financiador, regulador e prestador, assumindo o Estado os dois
primeiros, tem como objectivo delegar em entidades não públicas a prestação de
cuidados mediante mecanismos de contratualização ou pela via da privatização de
serviços.
É neste contexto que se sucedem os licenciamentos para novas unidades
privadas de saúde, nomeadamente hospitais, com o Estado a assumir-se como
principal cliente, como é o caso dos contratos da ADSE com os novos Hospitais
privados e dos projectos de revisão da legislação relativa às convenções.
Uma política desastrosa de formação de profissionais de saúde,
particularmente médicos, enfermeiros, administrativos e outros profissionais, e
uma política laboral que, no sector público, reduz vencimentos, restringe
direitos, aumenta a precariedade e destrói a perspectiva de uma carreira,
empurra os médicos para as unidades privadas e os enfermeiros para o desemprego
e desmotiva os outros profissionais de saúde, pondo em causa a própria
existência do SNS a curto prazo.
Os Cuidados Primários, sector que o Governo mais utilizou na propaganda
para esconder as graves insuficiências aí existentes, acabaram por esbarrar na
contradição insanável entre os que defendem o seu desenvolvimento no serviço
público e aqueles que, entendendo este sector como fundamental para «alimentar»
os hospitais privados, apostam na sua privatização.
No contexto político em que a chamada reforma dos cuidados primários foi
anunciada - marcado pelo ataque mais violento de sempre contra o SNS, sem
recursos financeiros, sem profissionais, em particular médicos e enfermeiros de
família, sem instalações e equipamentos adequados -, a criação de Unidades de
Saúde Familiares (USF) mais não é de que um canto de sereia para abrir caminho
à privatização dos cuidados de saúde primários. O número, claramente reduzido
face às perspectivas iniciais, de USF em funcionamento e a desorganização que
em alguns casos tem marcado esse início, são testemunhos do carácter meramente
propagandístico da «Reforma».
A inércia governamental e falta de vontade
política dos sucessivos governos, nomeadamente o do PS, não fazendo aplicar a
legislação existente, torna-os responsáveis pela chaga social, que são os
acidentes de trabalho, que atinge o país. A inexistência de uma adequada rede
de serviços de SHST, de qualidade, intervindo nos locais de trabalho, orientada
para a saúde dos trabalhadores e com a participação indispensável, através dos
seus representantes eleitos, cujos direitos deverão ser garantidos, também é
causa responsabilizante da situação actual.
O quadro está claro: de um lado estão os que defendem uma reforma
democrática do SNS como garante do acesso em igualdade aos cuidados de saúde
por parte de todos os portugueses; do outro, os que o querem pura e
simplesmente destruir para que desta forma o acesso e a qualidade aos cuidados
de saúde fiquem dependentes das regras do mercado.
Apesar de, nos últimos anos, a visibilidade
social da toxicodependência ter diminuído - devido às medidas de combate ao
consumo da heroína - assiste-se hoje a uma diversificação do tráfico, do tipo
de drogas consumidas e dos consumidores.
O fenómeno da
toxicodependência, inseparável dos enormes interesses económicos e políticos
associados ao tráfico e ao consumo de drogas, continua a ser uma realidade
profundamente influenciada pela degradação da situação económica e social e que
deixa atrás de si um rasto de destruição e desintegração humana e social que,
afectando sobretudo as camadas mais jovens da população, tem registado, por via
da perpetuação dos consumos, um número crescente de consumidores mais velhos.
Apesar do papel
assumido pelo SNS através do Instituto da Droga e da Toxicodependência na
prevenção, tratamento e combate à toxicodependência, constituem sinais
inquietantes: o crescente peso dos interesses privados nesta área; a
concentração e redução de serviços públicos; a instabilidade profissional em
que se encontram os técnicos e funcionários do IDT; a não aplicação da Lei da
Droga por falta de capacidade de resposta e de articulação entre as estruturas
do estado; o abandono e falência da componente de reinserção social e do
emprego; os cortes orçamentais para esta área.
A absorção por
parte do IDT da estrutura pública de combate e tratamento do alcoolismo - também este um
gravíssimo problema social -, constitui uma medida que, tendo sido sobretudo
determinada por critérios economicistas, necessita de ser acompanhada dos meios
técnicos e profissionais necessários a um avanço do país nesta área.
Na educação foram dados novos e qualitativos passos nos últimos
anos, na continuidade da política de direita, tendo como linhas condutoras a
desresponsabilização do Estado, o ataque à escola pública, o processo de
privatizações em curso, a promoção do ensino privado e a subalternização das
necessidades do país e de critérios pedagógicos a preceitos economicistas e
elitistas.
As alterações que têm vindo a ser implementadas são, no essencial,
desrespeitadoras da Lei de Bases e da própria Constituição da República,
consubstanciam um retrocesso muito significativo em matéria de ensino, o que,
por si só, constituirá um forte condicionamento ao nosso desenvolvimento
futuro.
A política de desresponsabilização do Estado nesta área social
fundamental prosseguida pelos governos do PSD/CDS-PP e do PS, visando a sua
progressiva privatização, tem como eixo central a desvalorização da Escola
Pública enquanto instrumento para a concretização do preceito constitucional
que obriga o Estado a garantir o direito ao ensino de todos os portugueses e a
igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolares.
O objectivo é óbvio: colocar a Escola Pública ao serviço da perpetuação
das assimetrias e injustiças, tornando-a reprodutora das relações de classe e
da ideologia dominante, reservando o acesso ao conhecimento para as elites e
atribuindo às camadas trabalhadoras apenas a oportunidade de adquirir
competências profissionais necessárias às flutuações do mercado capitalista,
sem a preocupação de formação integral. O novo Estatuto do Aluno e os exames
nacionais visam, no essencial, colocar mais obstáculos ao prosseguimento dos estudos.
O fosso entre os estudantes encaminhados, logo à partida, para o prosseguimento
de estudos destinados à entrada imediata no mercado de trabalho e outros, é
cada vez maior, para o que também contribui, de forma significativa, a actual
concepção dada pelo governo ao ensino profissionalizante.
A escola afirma-se, cada vez mais, como um aparelho ideológico de
importância fundamental. As alterações introduzidas aos conteúdos curriculares,
os conteúdos de alguns manuais escolares e até algumas provas de exame
confirmam a manipulação cada vez mais abusiva do ensino pelo aparelho político
ao serviço do capital.
Num contexto em que a educação assumiu também um novíssimo valor como
oportunidade de negócio para o capital, o Governo PS encerrou cerca de 3 mil escolas
do ensino básico, não investiu na criação de creches e estabelecimentos do
ensino pré-escolar, desenvolveu o processo de privatização indirecta da
educação, através de licenciamentos de colégios privados apoiados com dinheiros
públicos, desvirtuando o princípio do carácter supletivo do ensino privado em
relação ao público, com claros prejuízos para este, através do estrangulamento
das escolas que se vêem obrigadas a abdicar da sua autonomia e a cada vez
maiores cedências ao capital privado na sua gestão e, também, com as chamadas
Actividades de Enriquecimento Curricular. Uma outra oportunidade de negócio
prende-se com a criação da Empresa Parque Escolar, EPE, que ficará proprietária
dos edifícios das escolas, geralmente situados nas zonas centrais das cidades,
onde está ou vai intervir.
É neste quadro de desvalorização da Escola Pública que se integram a
imposição de um novo modelo de gestão das escolas do ensino pré-escolar, básico
e secundário, a delegação de novas competências para as autarquias locais na
área de todo o ensino básico, as medidas que estão a ser implementadas no
ensino especial, e o ataque às escolas especializadas no ensino das artes.
Contrariando o preceito constitucional de que incumbe ao Estado garantir
a gratuitidade do ensino obrigatório e a progressiva gratuitidade dos restantes
níveis, os custos com a educação e ensino são cada vez mais elevados, atingindo
valores insuportáveis para muitas famílias, com consequências no abandono
precoce e na degradação da qualidade das aprendizagens.
A concepção existente para as vias profissionalizantes tem uma marca de
classe: conhecimento conceptual maioritariamente para as classes dominantes,
competências técnicas para as classes exploradas, condicionando fortemente o
acesso a outros níveis de ensino. O «Programa Novas Oportunidades», confundindo
competências, qualificações profissionais e habilitações académicas, e não
assegurando a qualidade e rigor necessários para a obtenção destas
habilitações, visa resolver estatisticamente o problema dos baixos índices
educativos dos portugueses e reduzir artificialmente a taxa de desemprego.
A desvalorização social da profissão docente e o ataque a todos os
trabalhadores das escolas têm sido uma tónica dominante da política do governo
PS, nomeadamente através de um novo Estatuto da Carreira Docente para impedir a
esmagadora maioria dos docentes de acederem aos escalões de topo, de um modelo
de avaliação de desempenho burocrático e sem qualquer valor pedagógico, e de
uma prova geral de ingresso, criando uma barreira aos novos docentes.
O afastamento desumano de dezenas de milhar de alunos com necessidades
educativas especiais das medidas de educação especial, processo agora agravado
por uma avaliação destas necessidades feita com base numa Classificação
Internacional de Funcionalidade e Incapacidade (CIF) da área da saúde, é uma
faceta brutal da política de direita na educação.
A intenção governamental de delegar competências às autarquias locais na
área da educação favorece objectivamente, com a asfixia financeira das
autarquias, a privatização do Ensino Básico e impedir a concretização do
carácter universal do sistema de ensino a nível nacional.
Depois de - também pela mão do PS - ter sido dificultada e limitada, o
novo decreto de gestão vem amputar o que resta de participação democrática na
vida das escolas. Os professores, funcionários e estudantes têm uma presença
menorizada na gestão escolar e a direcção da Escola é centralizada num órgão
unipessoal, funcionando como um veio de transmissão de orientações superiores e
braço administrativo do Governo. Os critérios pedagógicos são subjugados por
critérios empresariais de gestão, burocráticos e autoritários.
No Ensino Superior, o Governo PS, acelerando o passo do anterior,
não hesita em desmantelar este importante património do povo português, para o
adequar ao chamado «Espaço Europeu de Ensino Superior», impondo reformas
consubstanciadas no modelo de organização do ensino segundo o Processo de
Bolonha, no Regime Jurídico da Avaliação da Qualidade no Ensino Superior, no
Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (com o evidente propósito
de promover a transformação das instituições públicas do ensino superior em
Fundações de direito privado, e a progressiva liquidação da gestão democrática e
da participação dos estudantes, a submissão da actividade da investigação a
interesses transnacionais e impedindo os politécnicos de promoverem
doutoramentos, transformam o ensino superior politécnico em ensino de segunda
qualidade), no modelo de financiamento (com destaque para as propinas e o
aumento brutal do seu valor, não inclusão de verbas para que as instituições
possam programar a investigação própria, com consequências desastrosas sobre a
programação do 2.º e 3.º ciclos de Bolonha), mesmo que em resultado destas
opções o Ensino Superior em Portugal fique colocado numa posição ainda mais
periférica relativamente às principais potências europeias e sem capacidade de
decisão soberana.
As medidas que têm vindo a ser implementadas no Ensino Superior contribuem
para a sua degradação material e, consequentemente, para as insuficiências
pedagógicas e humanas, que reproduzem e acentuam as desigualdades sociais, ao
invés de garantir a igualdade de acesso, a frequência e o sucesso; limitam a
liberdade de ensino e aprendizagem e o acesso à criação e fruição culturais;
restringem as áreas de investigação científica e de desenvolvimento
experimental e de formação às áreas de aplicação directa, ao serviço dos
interesses imediatos e exclusivos do capital, com o abandono de áreas sem valor
no mercado, a cultura multidisciplinar, as humanidades, as artes e as ciências
básicas, todas necessárias para o desenvolvimento do país.
A estratificação em ciclos curtos, resultado da assimilação no Processo
de Bolonha, também reflecte a intenção de negar a formação integral que prepare
o cidadão para assumir uma posição consciente no controlo da sociedade.
Reflecte, pelo contrário, a intenção de criar um exército de mão-de-obra barata
mas disponível para entrar no sistema económico sem a cultura formativa crítica
que as escolas superiores tradicionalmente deveriam conferir. Essa intenção
encontra-se também substanciada na promoção dos Cursos de Especialização
Tecnológica (CET), formações pós-secundárias não superiores, mas ministradas em
universidades e outros estabelecimentos do ensino superior visando concretizar
o velho desígnio de «ensino superior curto».
O modelo de financiamento, assente na desresponsabilização estrutural do
Estado nesta esfera estratégica e exercido com alienante arbitrariedade, mantém
a inaceitável aplicação de propinas, que atingem os quase mil euros no 1.º
ciclo e dezenas de milhar de euros no segundo e terceiro ciclos, enquanto
desfalca e privatiza a Acção Social Escolar, situação agravada pela recente introdução
dos empréstimos escolares, o que, objectivamente, mercantiliza o conhecimento e
promove a elitização no acesso a níveis superiores de conhecimento.
No
que respeita à ciência, tecnologia e
inovação, a situação está marcada pela política da direita de sucessivos
governos, traduzida: no subfinanciamento da maioria das unidades e centros
tecnológicos e de I&D ligados ao sector do ensino superior e dos
laboratórios do estado, levando à redução dos efectivos de pessoal
especializado e à exploração da precariedade do trabalho, de largo número de
bolseiros, forçando uma descaracterização da actividade destas instituições
para garantir a sua sobrevivência e ameaçando o próprio pagamento de salários;
pela centralização da gestão do financiamento da I&D na Fundação para a
Ciência e Tecnologia e na Agencia de Inovação, sem garantia de montantes e
prazos de pagamento; pela ausência de objectivos sectoriais estratégicos
assumidos por órgãos próprios da política cientifica e tecnológica, na
existência de planos de aplicação industrial das inovações tecnológicas
produzidas e de qualquer controlo efectivo e participado por parte da
comunidade cientifica; pelo desvio discricionário do magro bolo da ciência para
universidades estrangeiras de dinheiros públicos com objectivos políticos
opacos e um binómio custo benefício indefinido.
A reforma desastrosa dos
laboratórios do Estado, incluindo fusões arbitrárias, desmantelamento e
extinção de serviços e competências que importaria consolidar e reforçar, a
crescente utilização de mão-de-obra cientifica e técnica com vínculo laboral
precário e sem condições de trabalho adequadas, a par da constante degradação
do rácio pessoal técnico/pessoal investigador e da muita fraca contribuição do
sector empresarial para as actividades de I&D e Inovação, confirmam a não
opção no investimento produtivo que o país precisa.
A evolução da situação nas áreas
e actividades culturais no período decorrido desde o XVII Congresso
apresenta traços que significam a clarificação - negativa - de tendências
contraditórias, que vinham coexistindo desde as últimas décadas do século
passado.
Uma clarificação que tem correspondência nas áreas da cultura artística
e científica que subordinam todo o viver social aos critérios de lucro do
grande capital explorador e que se traduz em novos passos no sentido da
fragilização de um tecido cultural vulnerável e precário, novas limitações no
acesso à criação e à fruição culturais por parte das camadas populares, novas
dificuldades para os criadores, em particular os mais jovens.
A política cultural prosseguida pelo actual Governo PS, marcada pelo
abandono de responsabilidade pública nas políticas culturais, acentuou a
identidade das orientações e opções com as que caracterizaram a acção dos
governos do PSD e CDS-PP: desresponsabilização do Estado; estreitamento das
zonas de responsabilidade directa da Administração Central; asfixia orçamental;
privatização e entrega ao mercado de actividades, equipamentos e património;
elitização; inserção subalterna nos circuitos mercantis da cultura
internacional hegemonizada pelos grandes interesses financeiros transnacionais;
instrumentalização de iniciativas de «prestígio».
As verbas postas à disposição da cultura expressam a orientação de
cedência ao neoliberalismo em toda a linha. As promessas de afectação de 1% do
PIB ao sector, rapidamente substituídas pela formulação mistificatória de 1% do
Orçamento do Estado, deram origem à redução, de facto, das verbas afectas ao
sector. Verbas estas que, para além da sua exiguidade, se vêem comprometidas em
prioridades injustificáveis, como sucede com o acordo com a Colecção Berardo
que onera pesadamente o Estado e hipoteca a diversidade programática do Centro
Cultural de Belém. O Ministério da Cultura - em vez do elevado grau de profissionalização,
eficiência e capacidade técnica que se exige a uma dinâmica efectiva e
descentralizada de defesa do património, e de apoio à criação artística e ao
desenvolvimento cultural - concentra institutos, precariza e despede
trabalhadores e aliena responsabilidades, de que são exemplo a multiplicação de
fundações e a transformação dos teatros nacionais em empresas públicas (que
conduzirão à sua privatização e maior elitização).
Uma política que se traduz na adopção de uma intervenção mínima do Estado
na promoção das políticas culturais, na utilização dos recursos, meios e
equipamentos do Estado em beneficio de interesses privados e clientelas
elitárias.
Na política para a área do desporto, a chamada reforma do
desporto desarticulou serviços, governamentalizou o Instituto do Desporto de
Portugal e o Conselho Nacional do Desporto e aprovou uma Lei de Bases que, a
par da preparação de um novo Regime Jurídico das Federações Desportivas,
acentua a intromissão do Estado no associativismo desportivo.
As manobras mediáticas do actual Governo, de que é exemplo o chamado
Congresso do Desporto, não esconde o corte de investimentos e verbas e a
inexistência de um programa e um projecto consistentes que assegurem o fomento
da prática desportiva e a sua democratização, e o apoio ao desporto federado e
de alta competição. Estas políticas têm posto em causa a generalização do
acesso à actividade física e desportiva, conduzindo a que o nosso país tenha a
mais elevada taxa de inactividade física da UE.
A acção de sucessivos governos para transformar o país numa entidade
organizadora de eventos desportivos de nível internacional, com elevados custos
financeiros, de retorno duvidoso para o país e sem qualquer reflexo no
desenvolvimento da prática desportiva, e o descarado aproveitamento político
dos resultados desportivos obtidos a nível internacional, visa iludir a
situação de atraso a que a política de direita conduziu o desporto nacional.
3. A evolução política e o regime
democrático
A evolução da situação
política nacional desde o
XVII Congresso foi marcada pela formação de um Governo PS, suportado numa
maioria absoluta na Assembleia da República; pela eleição de Cavaco Silva nas
eleições presidenciais, assegurando pela primeira vez a vitória do candidato da
direita nas eleições para aquele órgão de soberania; pela intensificação da
ofensiva contra direitos e conquistas sociais prosseguida pelo Governo
presidido por José Sócrates; e por desenvolvimentos na continuada postura de
conivência, envolvimento e submissão de Portugal a interesses e estratégias
externos, de que a Presidência Portuguesa da União Europeia e o Tratado de
Lisboa são elucidativo testemunho. Uma evolução que torna mais exigente e
complexa a luta por uma ruptura democrática e de esquerda com a política de
direita.
A acção do Governo, na
sequência da obtenção pelo PS de uma maioria absoluta nas eleições legislativas
de 2005, veio confirmar não apenas a previsível intenção do PS em dar
continuidade aos eixos essenciais da política de direita prosseguida pelo PSD,
como as condições que essa maioria lhe facultaria para a sua intensificação.
A eleição de Cavaco Silva
animou, como o PCP previra, os projectos de liquidação de
direitos e de apagamento de importante conquistas da Abril por parte dos
sectores mais reaccionários e revanchistas da direita e do grande capital, e o
seu desejo de voragem dos recursos e da riqueza nacional.
A designação dos membros para
o Conselho de Estado; o apoio explícito às políticas do Governo na área
económica; o apoio ao processo de integração na União Europeia e ao abandono
pelo Estado das suas obrigações constitucionalmente consagradas; o acordo com
as alterações que têm vindo a verificar-se no plano da legislação laboral; o
envio de forças militares portuguesas ao serviço do imperialismo; a
negação do direito do povo português de se pronunciar sobre o novo tratado da
UE, são alguns dos posicionamentos que confirmaram, ao longo dos primeiros dois
anos do seu mandato, a articulação, que este ou aquele veto não desmentem, entre
a acção do Governo PS e os interesses da direita que o actual PR representa.
O actual Governo PS prossegue
uma ofensiva global visando a reconfiguração do papel do Estado e a
privatização das suas funções que, em total submissão face aos interesses do
capital nacional e internacional, se confirma como elemento central da ofensiva
mais geral que visa liquidar as principais conquistas e direitos alcançados com
a Revolução de Abril, que a Constituição consagra.
A
crescente subordinação do poder político ao poder económico do grande capital
nacional e transnacional é um dos traços essenciais da evolução política dos
últimos quatro anos em Portugal. Uma subordinação que se concretiza, também,
através de mecanismos e instâncias «informais» - Opus Dei, fundações, ordens
maçónicas e diversas organizações supranacionais como o Grupo Bilderberg, a
Trilateral, ou os encontros de Davos - que gozam de enormes privilégios e poder
e que decidem, sem qualquer legitimidade ou controlo democráticos, políticas
estratégicas, partilhando meios e orçamentos geridos pelo Estado. Subordinação
do poder político ao poder económico bem expressa, nestes últimos anos, nas
iniciativas do chamado «Compromisso Portugal», quer pelo que representou de
definição dos novos objectivos do grande capital, quer pelas indisfarçáveis
ligações e apoios que os seus promotores e as suas novas reivindicações
revelaram ter no PS, PSD e CDS-PP e nos principais órgãos de soberania.
A crescente limitação das
liberdades e o progressivo empobrecimento da democracia, consequência directa e
inevitável da ofensiva económica e social, constituem, pela sua expressão
agravada, um facto novo e inquietante.
As sucessivas revisões da
Constituição da República e a sua violação sistemática, por omissão ou
acção, têm constituído parte integrante da ofensiva contra o regime
democrático. A possibilidade aberta por uma revisão ordinária em 2009 animou,
nos sectores mais vinculados com o processo de restauração monopolista e de
desfiguramento do regime democrático, expectativas quanto a alterações que
conduzam a uma total subversão do texto constitucional. A declarada formulação
por parte dos representantes do grande capital das suas pretensões em matéria
de revisão constitucional, que anseia constitucionalizar o que é inconstitucional,
traduzindo um novo passo na arrogante intromissão do poder económico sobre o
poder político que a acção do Governo e as declarações de importantes
dirigentes do PSD animam, é um sinal claro dos objectivos e perigos em
presença.
No quadro de uma política
sistematicamente desconforme ao texto constitucional, o propósito inscrito pela
direita de uma nova ofensiva contra a Constituição confirma que esta, apesar
das mutilações a que foi sujeita, não apenas continua a ser um obstáculo a
projectos mais avançados do grande capital, como mantém no seu texto
princípios e disposições susceptíveis de constituir orientação para políticas
económicas e sociais opostas às que têm conduzido ao agravamento dos problemas
do país. A luta contra os projectos que visam novas e mais profundas mutilações
à Constituição é parte integrante da luta contra a política de direita e por
uma política alternativa.
Como instrumento ao serviço
do branqueamento das responsabilidades da política de direita e dos partidos
que a aplicam, a recorrente ideia sobre a chamada reforma do sistema político,
sempre concebida na perspectiva de um empobrecimento democrático, tem nos
projectos de revisão das leis eleitorais - no sentido do favorecimento da
bipolarização e da diminuição da pluralidade - um elemento central da sua
concretização.
A evolução da situação
política e as crescentes dificuldades que PS e PSD possam vir a sentir para
manter a base de apoio político necessária ao prosseguimento das políticas de
direita constituem, por si, um factor adicional para procurarem na alteração
dos sistemas eleitorais - quer para as autarquias, com a eliminação da eleição
directa das Câmaras e a transformação artificial de maiorias relativas em
absolutas, quer para a Assembleia da República, com a criação dos círculos
uninominais e uma eventual redução do número de deputados -, o que mais
dificilmente obterão pelo voto.
A nova legislação sobre a
«limitação de mandatos» e a «paridade», corporizando uma clara ingerência na
vida dos partidos e na sua soberania de decisão no processo eleitoral,
constitui: a primeira, uma ilegítima limitação dos direitos políticos e uma
inaceitável suspeição sobre os eleitos locais; a segunda, a paridade, uma
iniciativa que, aparentando prosseguir o justo objectivo de uma maior
participação de mulheres em funções políticas, se destina a iludir, pela
imposição em lei, os problemas sociais e económicos que estão na origem dos
reais obstáculos à participação política das mulheres.
São parte integrante da ofensiva contra a democracia política as limitações às
liberdades e às garantias dos cidadãos, o reforço do aparelho repressivo, o
ataque ao poder local democrático, a ostensiva partidarização das instituições
e a sua colocação ao serviço dos projectos do partido do poder, o controlo e
centralização das políticas públicas regionais e locais, a legislação sobre os
partidos políticos e o seu respectivo financiamento.
As limitações a direitos e garantias fundamentais - impedimento da
liberdade sindical e de associação, limitações ao direito à greve e crescente
coacção sobre o direito de expressão e de manifestação, cerceamento do direito
à propaganda, a par de outras tentativas de criminalização do exercício de
direitos - que acompanham a intensificação da ofensiva económica e social,
convivem com crescente recrudescimento das ideias e da actividade de
organizações fascistas.
O reforço dos aparelhos e medidas especiais de repressão - concentração de
polícias e serviços de informações, alargamento de ficheiros e bases de dados,
conservação de registos de comunicações, generalização da videovigilância, das
buscas e escutas sem controlo judicial.
O ataque dirigido contra o poder local e a sua autonomia conheceu com o Governo PS graves
desenvolvimentos, alterando substancialmente o seu quadro de actuação, de que
se destaca: a aprovação de uma nova Lei das Finanças Locais, que reduz a
capacidade e repõe um regime de consignação de verbas e de tutela de mérito
sobre a gestão dos recursos financeiros; instituição de mecanismos de controlo
e tutela administrativa para lá dos limites constitucionalmente previstos;
imposição de medidas limitadoras da cooperação intermunicipal contrárias ao
princípio de livre associação, como é o caso do novo regime de associativismo
municipal e da extinção das regiões de turismo enquanto entidades com emanação
autárquica e com autonomia.
A partidarização do aparelho do Estado, alimentada por uma densa teia de quadros que
ocupam, designadamente por nomeação, lugares estratégicos da Administração e do
aparelho do Estado, ou que beneficiam da concessão de áreas e funções nos
serviços públicos, tem por base decisões ditadas não por razões de interesse
público, mas sim de favorecimento de posições e influência do PS.
A opção por uma política centralista, em que se insere a opção pela não regionalização, a
redefinição de estruturas do Estado e o direccionamento de investimentos à
medida de interesses partidários, e em particular o modelo de gestão do Quadro
de Referência Estratégico Nacional (QREN), tem em vista favorecer o controlo de
políticas e decisões, marginalizar as autarquias e os agentes económicos
locais, alargar a teia clientelar e o tráfico de influências sob comando do
Governo e da suas estruturas desconcentradas.
As Leis dos Partidos Políticos e do seu Financiamento confirmam-se como peças
centrais na progressiva limitação de liberdades e de empobrecimento
democrático. A par da intolerável ingerência e limitação, confirmada pela
recusa das alterações propostas pelo PCP, à soberania de decisão
sobre as formas de funcionamento e organização dos partidos - que tem em vista
procurar impor ao PCP o modelo dominante no PS, PSD e CDS-PP -, assiste-se
à crescente intervenção que, a propósito da fiscalização da contas, visa não a
sua compreensível verificação, mas sim, através de uma acção assente no
arbítrio e abuso de poder, objectivos persecutórios contra o PCP, e em particular contra
a Festa do Avante!, a mais importante
iniciativa política e cultural do país.
No plano das autonomias regionais, não obstante o desenvolvimento constitucional e
legislativo aprovado nos últimos anos (clarificação e desenvolvimento no texto
constitucional das competências regionais, a revisão do Estatuto
Político-Administrativo dos Açores ou o Estatuto dos Representantes da
República), verificou-se, designadamente ao nível do regime financeiro, um
condicionamento acrescido. A Lei de Finanças Regionais aprovada pela maioria
parlamentar do PS, assente em critérios não objectivos e determinado pela
obsessão do défice e por uma deliberada discriminação entre as regiões
autónomas, está longe de se constituir como o elemento necessário à construção
de um regime financeiro adequado ao aprofundamento das autonomias regionais.
O regime democrático saído da Revolução de Abril, correspondendo a uma nova
realidade na sociedade portuguesa consagrada na Constituição da República, tem
tido nos detentores do poder e na política de direita o seu principal inimigo e
agressor. A evolução da vida política nacional fica marcada pelo permanente
conflito de mais de três décadas entre a acção e os objectivos prosseguidos
pelos sucessivos governos do PS e PSD, com ou sem o CDS-PP, e o carácter
progressista e avançado do regime democrático, e da activa intervenção do poder
dominante para o procurar amputar, limitar e liquidar.
Resultado de um longo processo de descaracterização,
suportado em sucessivas revisões constitucionais e sobretudo na produção de
legislação ordinária (muita dela contrariando o texto constitucional), o regime
democrático, num Portugal cada vez menos soberano, apresenta-se politicamente
empobrecido e desfigurado, amputado da sua dimensão social e económica
originária e crescentemente asfixiado pelos interesses do grande capital.
A vida política e democrática apresenta-se hoje crescentemente reduzida
à dimensão formal das democracias burguesas actuais, comum à generalidade dos
países capitalistas, e bem distante do regime democrático que a Revolução
originou e a Constituição de 1976 consagrou.
Embora, e sublinhando esse valor distintivo não subestimável, o regime
constitucional mantenha no seu texto fundamental princípios e disposições
susceptíveis de ser invocados em defesa de direitos fundamentais, de opções de
desenvolvimento económico compatíveis com os interesses do país, da soberania e
da independência nacionais.
O processo de desfiguramento da concepção do Estado, tal qual a Constituição o consagra, e do
consequente empobrecimento do regime democrático que a política de direita de
sucessivos governos prosseguiu, conheceu com o actual Governo um novo impulso.
São traços desse processo:
- - O incremento da subordinação do poder político ao
económico, dando continuidade a um processo em que o Estado é
reflexo do poder económico e, simultaneamente, agente activo na prossecução
dos interesses desse poder.
- - A reconfiguração do aparelho administrativo, orientado para
a acelerada redução de funções e responsabilidades
sociais do Estado e para a sua redução a funções
de soberania, de justiça e repressivas.
- - A destruição do vínculo público de emprego,
na linha de uma concepção de alienação de políticas
públicas.
- - A limitação, condicionamento e controlo do poder judicial,
comprometendo a independência dos tribunais e o princípio constitucional
da separação de poderes.
- - O desenvolvimento de um novo conceito (e uma nova lei) de segurança
interna com o reforço de orientações e missões
de carácter securitário e repressivo.
- - A progressiva «europeização», fusão, governamentalização
e opacidade dos serviços de informações.
- - O reforço das orientações centralizadoras e um ataque
à autonomia administrativa e financeira das Regiões Autónomas
e do poder local, procurando também condicionar a sua autonomia política.
A progressiva alienação de soberania em
matéria de política externa, de defesa ou orçamental ditada pelo processo de
integração capitalista da União Europeia, assim como pela participação na NATO,
e por tratados e acordos lesivos do país.
A defesa e concretização
dos direitos políticos, económicos, sociais e culturais são inseparáveis de uma
alteração em sentido democrático do Estado e das suas funções. Uma alteração que assegure a assunção pelo
Estado das funções sociais que lhe cabem, que modernize e desburocratize a
administração pública, que combata o tráfico de influências e o comando pelo
poder económico das políticas nacionais, que reforce as autonomias regionais e
o poder local e concretize a regionalização, que efective os direitos de
participação dos trabalhadores e das populações. A construção de um Estado
democrático constitui simultaneamente um objectivo programático autónomo e uma
condição de realização de outros objectivos.
O sentido geral da política de direita, que o actual
Governo acentuou expressivamente, em matéria de Administração Pública e dos
trabalhadores ao seu serviço, é o de liquidação ou redução dos serviços que
deveriam garantir os direitos económicos sociais e culturais, de privatização
dos serviços rentáveis, de degradação dos direitos e carreiras dos seus
trabalhadores.
A intensa campanha de sucessivos governos para fazer
crer que o Estado tem tido um papel excessivo na vida social e económica,
apresentando-o como mau administrador dos recursos económicos e dos serviços e
funções que lhe estão atribuídos, visa justificar a entrega ao grande capital
de fatias importantes desses mesmos serviços e funções.
Esta campanha tem suportado o processo de desmantelamento da Administração
Pública que,
iniciado há muito e tendo como protagonistas os partidos da política de direita
PS, PSD, CDS-PP, conheceu com o Governo PS novos e qualitativos avanços.
Sob o pretexto da redução e da contenção orçamental,
do Pacto de Estabilidade e Crescimento, da racionalização, eficácia,
rentabilização e desburocratização de serviços públicos e da pretensa
necessidade de fazer emagrecer o aparelho do Estado, o Governo desenvolve uma
ofensiva global que ataca, em simultâneo, direitos das populações e dos
trabalhadores da Administração Pública, e acentua as características
autoritárias e repressivas do Estado de classe.
Constituindo sem dúvida a materialização de forma integrada das
reivindicações feitas pelo grande capital em matéria de Administração Pública,
a aprovação do Plano de Reforma da Administração Central do Estado (PRACE) visa
a implementação de uma «Reforma» da Administração Pública orientada para
reforçar o domínio do poder económico sobre o Estado e limitar as suas funções
a áreas residuais.
O processo de desmantelamento da Administração Pública promovido pelo PS
visa não a sua modernização e desburocratização ao serviço das populações e do
desenvolvimento do país, mas sim a adaptação da administração do Estado ao novo
estádio de desenvolvimento do capitalismo monopolista e aos seus projectos de
acumulação capitalista.
O PRACE, instrumento desse desmantelamento, contempla uma opção de
classe sobre o papel e funções do Estado, perspectiva um processo de
privatização de serviços que asseguram essas funções, cometidas ao Estado pela
Constituição da República, e deu lugar ao desenvolvimento de uma ofensiva
legislativa sem precedentes que põe em causa a prestação de serviços básicos às
populações.
Um processo que tem conduzido, não a uma descentralização de serviços e
sua aproximação aos utentes, mas sim à sua concentração e centralização, à
desorganização e vazios em vários sectores, de que são exemplos os
encerramentos de maternidades, serviços de urgência, centros de saúde, escolas,
ou os anunciados encerramentos de tribunais e repartições de finanças.
Os mecanismos que decorrem do PRACE, o conjunto de legislação já
aprovada e o processo em curso para aprovação de outras matérias representam
uma ruptura com Abril.
A área da Segurança Interna tem sido sujeita a profundas alterações que têm
modificado as formas de organização, funcionamento e actuação das forças
policiais no sentido repressivo. Efectivamente, a reconfiguração da Segurança
Interna, sustentada na lei de Segurança Interna, numa concepção de «liberdade
possível com a autoridade necessária», tem tido consequências no reforço de
orientações e missões de caracter securitário e repressivo contra o interesse
público, a vontade dos profissionais do sector e a Constituição.
O Governo PS desencadeou um vasto e perigoso plano de
reestruturação e reorganização deste importante sector do Estado que, através
de alterações profundas em toda a legislação de enquadramento e de modificações
no dispositivo e organização das forças e serviços de segurança, visa a
concentração e militarização, reforça os poderes da actividade da segurança
privada e das polícias municipais e viabiliza um maior controlo e
governamentalização, dentro de uma estratégia repressiva para toda a
intervenção policial, que tipifica novas e mais graves ameaças. Ao mesmo tempo
que o desinvestimento se tem revestido de consequências profundamente negativas
na segurança pública, na operacionalidade das forças e serviços de segurança e
nos direitos e dignidade estatutária dos profissionais de polícia.
O actual Governo acentuou a supressão de direitos e a
degradação das condições de vida e prestação de serviço dos profissionais das
forças de segurança, necessárias ao cumprimento das suas missões. Continuam a
ser negadas aos profissionais importantes e justas reivindicações
sócio-profissionais, designadamente em matéria de actividade associativa e
sindical, em que se verificam limitações e mesmo perseguições a dirigentes
associativos.
A insegurança prevalecente na sociedade, bem como os
problemas da criminalidade em geral, inseparáveis do agravamento da situação
social, exigem uma política de prevenção eficaz, uma actuação resoluta contra o
crime, no quadro de opções claras de serviço público, respeitadoras da
Constituição, da legalidade democrática e dos direitos dos cidadãos.
No quadro da União Europeia, a política do actual
Governo tem sido marcada pela subordinação do país aos aspectos mais gravosos
da chamada «cooperação europeia» em matéria de segurança interna, tanto ao
nível das informações como da integração em forças especiais de intervenção
supranacionais e participação das forças de segurança em teatros de guerra,
subvertendo e desviando as forças de polícia das sua missões prioritárias, numa
lógica de projecção de força e atentatória dos imperativos constitucionais.
No plano da protecção civil mantém-se ausente uma política centrada na prevenção, no
planeamento e na educação para a prevenção de riscos. Privilegiando a resposta
imediatista, pós acidente ou pós-calamidade, o Estado tem vindo a demitir-se
progressivamente das sua responsabilidades, transferindo para as autarquias as
responsabilidades e os custos, fazendo com que estas e os bombeiros sejam, na
prática, a estrutura visível no terreno.
A protecção civil surge sistematicamente subfinanciada e transformada em
espaço de negócio. Apostando na privatização de partes do sistema, o Governo PS
persiste na linha da sua militarização e na procura de controlo e
governamentalização das associações de bombeiros (apoiada na ausência de
clareza nos mecanismos de financiamento), estabelecendo uma hierarquia de
comando, de carácter militar, envolvendo a GNR, tentando excluir as entidades
detentoras de corpos de bombeiros e subalternizando a autoridade e a autonomia
das autarquias.
A soberania do poder judicial (e a independência dos tribunais) é
uma pedra de toque do regime democrático no que respeita às instituições do
sistema político. Inserida no quadro da ofensiva geral contra o regime
democrático, a crescente e indevida intromissão do poder político na esfera do
judicial põe em causa o princípio constitucional da separação de poderes, e tem
como consequência maior desprotecção dos cidadãos e o enfraquecimento da luta
por direitos.
A política de justiça do Governo PS fica marcada por uma ofensiva sem
precedentes visando alterar substancialmente a natureza, a organização e o
funcionamento do sistema judicial. A reconfiguração de todo o actual modelo de
justiça, prosseguida pelo Governo, com vista à sua governamentalização e
controlo, limita a autonomia do Ministério Público e a independência do poder
judicial face ao poder económico e ao poder político, consagradas na
Constituição.
Numa estratégia que vem de trás, claramente apontada à soberania do
poder judicial, é pela mão da maioria absoluta do PS que graves medidas e
decisões têm sido tomadas, no âmbito do Pacto de Justiça e fora dele, com o
apoio expresso ou encapotado do PSD e do CDS-PP. Medidas que têm resultado em
maior impunidade do crime organizado e dos seus autores e pior justiça para a
generalidade dos cidadãos.
O carácter de classe da justiça no nosso país acentuou-se nos últimos
anos, favorecendo os mais poderosos e desprotegendo direitos e interesses dos
trabalhadores e de outras camadas sociais. Essa desigualdade, bem como o
sentimento generalizado de impunidade estão na base do descrédito da justiça e
minam inexoravelmente o próprio regime democrático.
A ausência de apoio judicial efectivo (da responsabilidade do Estado)
leva a que o acesso de milhares de portugueses ao sistema de justiça esteja
cada vez mais dificultado, sobretudo por razões económicas - elevadas taxas e
custas judiciais. Situação particularmente grave na justiça laboral, em que os
trabalhadores se vêem na prática, impossibilitados de defender os seus direitos
laborais contra a precariedade, os salários em atraso e o encerramento de
empresas, num quadro em que o Governo se prepara para extinguir os tribunais de
trabalho. Igualmente, a aprovação do novo mapa judiciário, com o fim das
actuais comarcas e o quase certo encerramento de tribunais, afastará ainda mais
as populações e agravará inevitavelmente as desigualdades dos cidadãos face à
Justiça.
Ao mesmo tempo, com o actual Governo tem-se assistido, também nesta
área, a uma cada vez maior desresponsabilização do Estado, numa linha
privatizadora e de mercantilização, deixando a justiça ao mero jogo de
interesses privados - apoio judiciário quase inexistente, privatização das
acções de cobrança de dívidas, incremento da mediação e arbitragem privadas.
O Sector prisional tem conhecido uma continuada degradação no seu
funcionamento, com repercussões negativas quer ao nível das condições de
detenção ou dos direitos dos profissionais, quer, sobretudo, na sua função
ressocializadora. Com o Governo PS há sinais preocupantes que apontam para a
privatização de funções e serviços e a alienação do vasto e valioso património,
que põem em causa medidas e reformas imprescindíveis a uma verdadeira
modernização e dignificação de todas as componentes do sistema prisional.
Na política
de Defesa Nacional e Forças Armadas aprofundaram-se, nestes últimos quatro anos, os
traços essenciais da política de direita seguida por anteriores governos. A
revisão constitucional de 1997 pôs fim ao Serviço Militar Obrigatório (SMO) e
conduziu à total profissionalização das Forças Armadas. Esta medida integrou-se
em objectivos mais profundos de alteração da sua natureza, doutrina e base
organizativa, reestruturação, reequipamento, infra-estruturas militares,
legislação e política de pessoal, com impactos negativos na condição militar.
Acentuou-se o conceito de segurança nacional,
subvertendo o quadro constitucional, numa continuada tentativa de confundir os
conceitos de Defesa Nacional e Segurança Interna (de que o recém-criado Sistema
de Segurança Interna é expressão) e misturar os usos das respectivas forças, na
base de compromissos externos, abrindo para o seu uso da componente militar no
plano interno.
A proposta do Governo para a reorganização das Forças
Armadas, cujo objectivo deveria centrar-se na reformulação e modernização de
vários instrumentos, nomeadamente de âmbito estatutário e regulamentar, na reorganização
operacional, na racionalização do dispositivo e na reestruturação dos sistemas
de saúde e de ensino militar, não passa, afinal, de um reforço das competências
do Ministério da Defesa em detrimento do papel dos três Ramos, padronizando as
nossas Forças Armadas com o modelo que predomina no quadro da NATO e numa
estrita concepção do seu emprego em forças multinacionais, obedecendo às
prioridades constantes no Conceito Estratégico da NATO e da política de
militarização da União Europeia.
A Lei de Programação Militar, em vez da definição do
nível de prioridade que assume a componente militar de defesa nacional,
nomeadamente quanto às opções, aos volumes financeiros envolvidos e à forma de
os conseguir, está prisioneira das exigências da NATO e da Força Europeia de
Reacção Rápida, secundarizando assim o interesse nacional. No actual quadro de
integração de Portugal é imperativo de independência nacional o desenvolvimento
de estruturas que visem a preparação de quadros e o desenvolvimento técnico e
tecnológico integrados no tecido produtivo nacional, ao mesmo tempo que a nova
Lei de Programação de Infra-estruturas Militares tem como único objectivo a
alienação, por diversas formas, do património militar e dos Estabelecimentos
Fabris das Forças Armadas.
A política de pessoal nas Forças Armadas continua a
padecer de graves entorses. Esta política obedece às orientações do Pacto de
Estabilidade, preparando a submissão do Estatuto dos Militares ao regime geral
da Função Pública, mantendo a distorção no sistema retributivo e bloqueio
carreiras, pondo em causa o Estatuto da Condição Militar, desarticulando as
áreas da segurança social e da saúde. Uma política que, no seu conjunto, mantém
especiais deveres a que os militares devem ser obrigados, suprime direitos
fundamentais, e que introduziu novos elementos de perturbação na instituição,
geradores de legitima indignação e protesto, a que o Governo PS tem respondido
com dezenas de castigos e com a adopção de medidas legislativas restringindo
direitos consagrados, numa tentativa de intimidação dos militares.
O Governo PS estabeleceu novas prioridades
sustentadas no aprofundamento dos compromissos externos que tudo justificam,
subalternizando as missões de interesse público e pondo em causa a soberania
nacional e os princípios e valores constitucionais das Forças Armadas.
A situação no sector da comunicação social continuou, em termos
globais, a aprofundar uma orientação política de classe, agravando a qualidade
e pluralismo informativos e os direitos, condições de trabalho e autonomia dos
jornalistas e de outros profissionais do sector, e contribuindo para um
crescente empobrecimento da cultura portuguesa e da democracia.
São de sublinhar um conjunto de aspectos mais
marcantes, profundamente interligados entre si:
- - O controlo do grande capital sobre os órgãos de comunicação
social, decorrente da crescente concentração e consolidação
da propriedade dos media num reduzido número de grandes grupos económicos,
cada vez mais com forte penetração do capital financeiro e estrangeiro
e com uma estratégia multimédia, constituindo assim um problema
de grande profundidade para a pluralidade do regime democrático, que
poderá ser agravado caso se confirmem as intenções do
Governo com a actual iniciativa legislativa sobre a concentração
na comunicação social, que visa a legalização
dos actuais níveis existentes.
- - A crescente degradação das condições de trabalho
dos jornalistas e de outros profissionais dos media, em particular com o aumento
da precariedade, dos ritmos de trabalho, diminuição das remunerações
e usurpação dos direitos de autor, recurso ao trabalho ilegal,
acarretando pressões e constrangimentos à sua independência
e isenção. A aprovação do novo estatuto do jornalista,
da iniciativa do Governo PS, vai neste sentido.
- - A submissão da informação e dos critérios jornalísticos
à lógica do mercado, da concorrência e da luta pelas audiências
constituem um factor de empobrecimento e degradação, com reflexos
negativos no plano ideológico, nas atitudes e nos valores sociais,
culturais e políticos.
- - Os extraordinários avanços tecnológicos que, ao mesmo
tempo que potenciam grandes progressos ao nível da recolha, produção
e circulação da informação, são pretexto
para a desvalorização de princípios jornalísticos
básicos e para a repetição e afunilamento de conteúdos,
que o cada vez maior número de títulos e canais não consegue
disfarçar.
- - As crescentes dificuldades dos órgãos de comunicação
social locais e regionais, alguns deles tomados pelos grandes grupos económicos,
e que viram, com o fim do «porte pago» imposto pelo Governo PS,
ser reduzida uma parte fundamental das suas receitas e da sua expressão,
ficando cada vez mais prisioneiros das lógicas editoriais dominantes.
- - A criação de uma única empresa pública de rádio
e televisão e o prosseguimento da ofensiva contra o sector público
de comunicação social (designadamente da televisão),
sem a necessária autonomia financeira, destinada a abrir caminho ao
desenvolvimento de uma estratégia de desvalorização da
concepção de serviço público com vista a uma futura
privatização.
- - A intensificação de critérios e práticas gravemente
discriminatórios e ofensivos do pluralismo, com consequências
no regime democrático (que, em regra, no plano político-partidário,
atingem especialmente o PCP), num quadro em que é cada vez mais determinante
o peso e a influência dos media na agenda, nos temas e no curso da vida
política nacional, e em que se acentuam as pressões e interferências
do Governo PS sobre a comunicação social.
- - A Entidade Reguladora para a Comunicação Social, cuja composição
é resultado de um processo de negociação entre PS e PSD,
não tem contribuído, independentemente de pontualmente manifestar
algumas preocupações sobre o rumo do sector, para o necessário
respeito do pluralismo e do papel da comunicação social enquanto
factor de valorização da vida democrática do país.
A evolução da situação política nacional fica, assim,
marcada por um novo impulso dado pelo actual governo na liquidação das
conquistas e direitos consagrados na Constituição, num rumo que configura uma
perigosa e inaceitável ruptura com Abril.
4. A política necessária
A construção de um
país de progresso, com justiça social, soberano e independente, exige um novo
rumo e uma nova política ao serviço do povo e do país, alcançáveis pela ruptura
com a política de direita que há três décadas agrava os problemas nacionais,
degrada as condições de vida e compromete as possibilidades de desenvolvimento
do país.
As dificuldades que
o país atravessa, a vulnerabilidade crescente da economia nacional, o
continuado agravamento da situação social, o persistente aumento das
desigualdades e injustiças sociais não são uma fatalidade nem o simples
resultado de conjunturas externas, mas sim expressão das opções e políticas de
direita que, baseadas nos dogmas do capitalismo, têm servido uma estratégia de
reconstituição do poder económico pelo grande capital e de destruição dos
direitos e conquistas sociais adquiridos com a Revolução de Abril.
Portugal não está
condenado, como a política de direita o tem feito, à estagnação económica e ao
definhamento do seu aparelho produtivo, à persistência dos crónicos défices
energético e alimentar, a um modelo de desenvolvimento assente em baixos
salários e na fraca incorporação científica e tecnológica no processo
produtivo, à crescente dependência das orientações e interesses da União
Europeia e dos países que a comandam, à exposição das crises do capitalismo.
Há um outro rumo e uma nova política ao serviço do povo e do país. A
política alternativa que o PCP defende integra-se e enquadra-se no Programa do PCP «Uma
Democracia Avançada no limiar do século XXI».
A democracia
avançada com as suas quatro vertentes inseparáveis - a política, económica,
social e cultural, integra cinco objectivos onde, a par de um regime de
liberdade, com um Estado democrático, representativo, participativo e moderno,
de uma política de democratização cultural e uma pátria independente e
soberana, se preconiza um desenvolvimento económico assente numa economia
mista, moderna e dinâmica e uma política social que garanta a melhoria das
condições de vida do povo.
São elementos
centrais da nova política económica e social:
- - A soberania nacional, questão decisiva de uma política alternativa,
no contexto da globalização capitalista e integração
comunitária.
- - A luta pela construção de uma Europa de cooperação
entre Estados soberanos e iguais em direitos.
- - A propriedade social dos sectores básicos e estratégicos
e o papel do Estado na economia, com a suspensão do
processo de privatizações
em curso e a reversão ao sector público, por nacionalização
e/ou negociação, de empresas e sectores privatizados, afirmando
um Sector Empresarial do Estado forte e dinâmico, com uma dimensão
e peso determinantes da economia nacional.
- - O planeamento democrático do desenvolvimento solidário e
integrado de sectores e regiões, com a justa repartição
individual e regional do produto nacional e a coordenação da
política económica com as políticas social, educativa
e cultural.
- - A valorização do trabalho e dos trabalhadores, com a significativa
melhoria dos salários e vencimentos como contributo e condição
indispensáveis para o desenvolvimento económico e uma melhor
repartição do rendimento entre o trabalho e o capital, o respeito
pelos direitos dos trabalhadores e o pleno emprego.
- - O desenvolvimento e a modernização das actividades produtivas,
visando a autonomia relativa do aprovisionamento do país em bens essenciais
à sua estabilidade económica e social, com a defesa da produção
e do mercado nacional, com a dinamização dos investimentos público
e privado, do mercado interno, das acções de investigação
associadas à produção e o apoio prioritário às
MPME.
- - A realização de uma profunda alteração fundiária
que concretize, nas actuais condições, uma reforma agrária
nos campos do Sul que liquide a propriedade latifundiária a par da
racionalização fundiária pelo livre associativismo no
Norte e Centro.
- - Uma reforma da política fiscal que alivie a carga sobre as classes
laboriosas e promova o aumento das receitas e a eficiência do sistema
fiscal, através do alargamento da base e do aumento da fiscalização
tributárias, da significativa redução dos benefícios
fiscais, designadamente no sector financeiro, nomeadamente em sede de IRC,
da diminuição do IVA, do combate à evasão e fraude
fiscais, do fim dos offshores e da imposição fiscal
sobre o património mobiliário e ganhos bolsistas.
- - O ordenamento, a valorização do território e efectivas
políticas de desenvolvimento regional, inseparáveis da criação
das regiões administrativas e de uma nova política de solos,
assumidos enquanto vector essencial de estratégias de desenvolvimento
do país e de combate à desertificação e à
especulação urbanística, de defesa e valorização
do mundo rural e das regiões do interior e insulares.
- - O Estado como promotor do desenvolvimento social, com uma política
educativa nas suas múltiplas vertentes, e o ensino como um direito
de todos e de cada um ao conhecimento e à criatividade, ao pleno e
harmonioso desenvolvimento das suas potencialidades, vocações
e consciência cívica, assegurado por uma escola pública
de qualidade, democrática, inclusiva e gratuita; com a valorização
do papel da investigação científica, do desenvolvimento
experimental e de outras actividades científicas e técnicas;
com uma política de efectiva democratização do acesso
à fruição e criação da cultura, factor
essencial de emancipação individual e colectiva, e a existência
de um serviço nacional de saúde, como serviço público,
universal, gratuito, eficaz e eficiente, mantendo-se o Estado como prestador
geral e universal de cuidados de saúde, com a defesa e afirmação
do carácter público, universal e solidário da segurança
social.
A política
alternativa que o PCP apresenta e propõe
exige uma mudança real nos objectivos e conteúdos da política nacional, uma
política de efectiva confiança em Portugal e no povo português, uma política
assente na dinamização da economia, centrada no bem-estar e num desenvolvimento
económico que considere uma relação sustentável entre as comunidades humanas e
a natureza.
Uma política no
respeito pela Constituição da República Portuguesa e no cumprimento dos
princípios fundamentais da organização económica e social nela consagrados,
liberta dos interesses e orientações do capital monopolista e financeiro, a
recuperação pelo Estado das suas responsabilidades económicas e sociais, a
soberania e a independência nacionais como valores fundamentais para a defesa
dos interesses económicos e sociais do país.
A ruptura com a actual política e a construção de uma política
alternativa é inseparável do decidido combate à política do actual Governo PS e
da firme resistência à ofensiva que este desenvolve contra direitos e
conquistas sociais. Mas é também inseparável do combate à repetição de falsas
alternativas, assentes em meras soluções de alternância que, em nome da rotação
de protagonistas e responsáveis, deixa incólumes o sentido, opções e conteúdos
das políticas que arrastaram o país para a crise que hoje enfrenta.
São elementos centrais de ruptura com a política de direita a ruptura
com: o
domínio do capital monopolista; a reconfiguração do Estado ao serviço da
acumulação acelerada do capital privado; a «obsessão» pelo défice orçamental; a
desvalorização do trabalho e dos trabalhadores; a mutilação e subversão das
políticas sociais - ensino, saúde e segurança social - transformadas em espaços
de acumulação e expansão do capital; a atribuição ao capital estrangeiro de um
lugar estratégico na economia do país; o crescimento económico centrado
fundamentalmente na dinâmica das exportações e da desvalorização e desprotecção
do mercado interno; o processo de integração capitalista europeia; a
subordinação do território e do mar sob soberania nacional a lógicas alheias ao
interesse do país; a subversão da Constituição da República Portuguesa.
A política alternativa que o PCP defende corresponde a
uma ampla aspiração de afirmação de soberania nacional, dá resposta às sentidas
dificuldades que a generalidade da população enfrenta e abre horizontes e
perspectivas de esperança e confiança num Portugal mais justo e desenvolvido.
III Luta de massas e acção do PCP
0. Introdução
1. A luta da classe operária e dos trabalhadores, factor decisivo
de resistência, ruptura e avanço
2. A luta de outras camadas e grupos sociais e das populações
3. A classe operária, os trabalhadores e as suas organizações
de classe
4. Outras organizações e movimentos de massas
5. O PCP no combate à política de direita e na defesa do regime
democrático
6. Batalhas eleitorais
7. O quadro partidário e institucional
8. A alternância enquanto condição de perpetuação da política
de direita
9. As contradições resultantes da política de direita e o
espaço aberto à redução da sua base de apoio
10. A luta por uma alternativa de esquerda
11. Um PCP mais forte. Condição fundamental para a alternativa
de esquerda
0. Introdução
A violenta ofensiva
desenvolvida nestes últimos quatro anos contra os direitos dos trabalhadores e
das populações, os ataques ao regime democrático e à soberania nacional,
tiveram na luta de massas, com particular destaque para a luta dos
trabalhadores, um factor determinante para a combater e enfrentar e uma
contribuição para a elevação da sua consciência social e política.
A significativa
expressão da luta de massas - da classe operária e dos trabalhadores, mas
também, de outras camadas e classes não monopolistas - a sua força e dimensão,
diversidade e grau de convergência, as causas e objectivos que levaram à sua
realização, confirmam a actualidade e validade da luta de massas, enquanto factor
fundamental para travar a política de direita, afirmar e defender direitos e
transformar a sociedade.
Durante estes
quatros anos, confirmou-se o papel insubstituível dos comunistas e do seu
Partido - o PCP para a concretização da luta de
massas, no quadro de uma acção dialéctica com a sua intervenção política geral
e institucional.
A necessidade de
alargar e de aprofundar a luta, num quadro em que a natureza exploradora do
capitalismo se torna mais visível e se reduz a base de apoio à actual política
de direita, reclama do PCP não apenas uma
leitura mais atenta e precisa da realidade mas, sobretudo, uma intervenção que,
sem ignorar dificuldades, afirme a necessidade de ruptura com a política de
direita e contribua para a luta por uma alternativa política de esquerda.
O desenvolvimento da luta, o fortalecimento dos movimentos de massas e a
intervenção política implicam um continuado aprofundamento da análise da
realidade e da sua evolução, designadamente da arrumação das forças de classe e
dos vários aspectos que lhe estão associados.
A análise realizada no XVII Congresso
sobre a arrumação das forças de classe na sociedade portuguesa, sem prejuízo da
evolução entretanto verificada, e mantendo no essencial a sua actualidade,
constitui um elemento de grande importância para a intervenção do Partido que
deve continuar a merecer a sua aferição, aprofundamento, estudo e
desenvolvimento, bem como dos factores objectivos e subjectivos que hoje
promovem e condicionam a consciência de classe.
1. A luta da classe operária e dos
trabalhadores, factor decisivo de resistência, ruptura e avanço
O período que nos separa do XVII Congresso fica marcado pelo
desenvolvimento da luta de massas no quadro do aumento da exploração capitalista,
sustentada nas opções políticas do Governo PS, num clima de repressão e
instalação do medo nos trabalhadores, de aumento da precariedade, do
desemprego, da asfixia de quem trabalha por via dos baixos salários e dos
crescentes encargos financeiros, de ataques profundos à liberdade da acção
sindical e dos trabalhadores e dos atropelos aos direitos conquistados.
O Governo PS desde cedo definiu como alvo principal a classe operária,
os trabalhadores e o movimento sindical unitário, procurando fracturar a
unidade dos trabalhadores, difundindo a ideia da existência de sectores
privilegiados, com o objectivo de nivelar por baixo os direitos de quem
trabalha. A ampla e persistente luta dos trabalhadores e a importante
capacidade de organização e mobilização reveladas, constituíram uma
extraordinária resposta aos objectivos do Governo.
A luta desenvolveu-se em torno do combate ao Código do Trabalho e à sua
alteração para pior, à descaracterização da legislação laboral da administração
pública e do ataque aos direitos dos seus trabalhadores, em defesa da
contratação colectiva, contra a redução das pensões de reforma, pela defesa da
segurança social pública, universal e solidária, contra o desemprego e a
precariedade, pela melhoria dos salários, pelo direito à greve e a efectivação
de outros direitos e liberdades sindicais, associando acções gerais a
iniciativas sobre objectivos concretos de sector e empresa.
Estes anos configuram uma das fases mais intensas da luta da classe
operária e dos trabalhadores nas últimas décadas, com um papel central do
movimento sindical unitário e da CGTP-IN.
Destacam-se: a Greve Geral de 30 de Maio de 2007, com uma grande participação,
determinação e combatividade; as comemorações do
1º de Maio; as grandiosas manifestações nacionais de 12 de Outubro
de 2006 (mais de 100 mil trabalhadores), 2 de Março de 2007 (mais de
150 mil), 18 de Outubro de 2007, aquando da cimeira da União Europeia
(200 mil) e 5 de Junho de 2008 (mais de 200 mil); as manifestações
nacionais da juventude trabalhadora a propósito do 28 de Março,
Dia Nacional da Juventude (em 2006, 2007 e 2008); a campanha nacional e a Estafeta
contra a precariedade (realizadas pela Interjovem e a CGTP-IN no início
de 2008); as jornadas nacionais dos trabalhadores da administração
pública, promovidas pela frente comum dos sindicatos (com manifestações,
greves e outras formas de luta).
De igual modo, destacam-se ainda as acções específicas de diversos
sectores, nomeadamente nos professores que, nas manifestações de 8 de Março e 8
de Novembro de 2008, atingiram a maior expressão de sempre, mas também nos
enfermeiros, militares, forças de segurança e justiça; as lutas pela defesa dos postos de trabalho, contra o
desemprego, com destaque para a Gestnave, a Rodhe, a FAPOBOL e os Estabelecimentos
Fabris das Forças Armadas; as lutas contra as deslocalizações, como na Alcoa,
na GM Azambuja, na Yazaki Saltano; na Lear; as lutas contra a precariedade,
como na COFACO; as lutas pela reabertura das empresas, como na Ceres e contra o
encerramento de outras, como na Maconde; as lutas em torno da contratação
colectiva e em defesa dos direitos, como nos CTT, no sector do material
eléctrico e electrónico, nos sectores ferroviário e metalúrgico, na Repsol, na
Moveaveiro, na Metro do Porto; as lutas contra o alargamento do horário de
trabalho, como na Qimonda; as lutas contra as discriminações salariais nas
Confecções Triumph e no sector corticeiro; as lutas pelo pagamento dos salários
em atraso, como na MB Pereira da Costa, Louçarte e Dâmaso; as lutas pelo
pagamento de créditos devidos a trabalhadores em situação de falência, como na
Estaco, na Brax; as lutas pelos direitos e a liberdade sindical, como na MB
Pereira da Costa, na Cerâmica Torriense; a luta pela defesa do direito à greve,
como na Transtejo, no Metro e na Valorsul.
A luta da classe operária e dos trabalhadores desenvolveu-se em torno de
motivações e reivindicações que, incorporando objectivos gerais e problemas
transversais à generalidade da população, revelaram o seu papel central no
aumento da consciência social e política de milhares de trabalhadores, na
percepção que os problemas concretos ao nível da empresa e local de trabalho
são consequência directa da política de direita e na compreensão da necessidade
de ruptura com essa política.
A luta de massas revelou-se decisiva para enfrentar a ofensiva em curso,
permitiu a conquista de resultados em muitos sectores e empresas, esteve na
base da cedência do Governo no acordo que prevê o aumento do salário mínimo
nacional para 500 euros em 2011 (quando antes havia classificado essa
reivindicação da CGTP-IN de demagógica e fantasista) e - a exemplo do que já representara na
denúncia, isolamento e derrota dos governos do PSD/CDS-PP de Durão Barroso e
Santana Lopes - contribuiu
decisivamente para a erosão da base social e política de apoio do Governo PS,
para o aumento das suas contradições internas e para a acumulação de forças
indispensáveis à ruptura com a política de direita.
2. A luta de outras camadas e grupos sociais e das populações
A luta de massas e
a intervenção organizada dos trabalhadores e das populações em defesa dos seus
direitos e condições de vida e na resistência à política de direita, são
expressão da determinação e confiança na luta e na sua contribuição para a
construção de um Portugal com futuro.
O desenvolvimento
da luta dos trabalhadores, com um papel destacado da CGTP-IN e do Movimento das
Comissões de Trabalhadores, com os seus objectivos específicos e dinâmica
própria, e a sua articulação e convergência com outras camadas e sectores no
combate à política de direita, contribuíram para a ampliação do protesto e para
o desenvolvimento de uma ampla frente social de luta.
No vastíssimo
conjunto de acções e lutas que deram um importante contributo para o
desenvolvimento da luta de massas são de destacar: as lutas dos pequenos e
médios agricultores, dirigidas pela CNA, contra a destruição da agricultura
nacional e as imposições da PAC, a manifestação nacional por ela convocada de
17 de Setembro de 2007, e as acções descentralizadas contra o aumento do preço
dos combustíveis e a baixa de preços na produção, no Verão de 2008; as acções
dos micro, pequenos e médios empresários; as lutas dos pescadores contra a
Política Comum de Pescas e o aumento do preço dos combustíveis e as acções em
defesa da Docapesca que tiveram a sua maior expressão na paralisação geral de
30 de Maio de 2006 e na paralisação de 6 dias em Junho de 2008; a luta pela
interrupção voluntária da gravidez; as lutas dos estudantes do ensino
secundário contra a destruição da escola pública, pelo fim dos exames nacionais
e melhores condições materiais e humanas nas escolas, pela implementação da Lei
da Educação Sexual, com várias manifestações em todo o país, nomeadamente a 31
de Janeiro e 5 de Novembro de 2008; as acções dos estudantes do ensino superior
contra o processo de Bolonha, as propinas, os cortes na Acção Social Escolar, o
novo regime jurídico das Instituições de Ensino Superior e a elitização do
ensino; a manifestação nacional de reformados em 29 de Março de 2008; a
concentração de emigrantes, realizada em Agosto de 2007, contra a política de
emigração do governo português; as acções em defesa da água pública contra o
aumento dos preços e a sua privatização; as acções do movimento associativo de
bombeiros contra o aumento dos combustíveis; a luta em defesa da liberdade e
democracia e contra o branqueamento do fascismo, nomeadamente as acções contra
o museu Salazar; a luta contra o encerramento de postos consulares e em defesa
do estatuto profissional dos trabalhadores consulares; as comemorações em
centenas de localidades dos aniversários do 25 de Abril reafirmando o seu
carácter popular, reivindicativo e progressista.
As
lutas das populações, contra o
encerramento de serviços públicos na saúde e na educação e pela melhoria ou
abertura de novos serviços e unidades; contra o encerramento de postos dos CTT,
de esquadras e postos das forças de segurança; a luta contra o aumento dos
preços dos transportes públicos e pela melhoria da qualidade do serviço prestado;
a luta contra a introdução de portagens e o aumento dos combustíveis, contra
impactos negativos de infra-estruturas na vida das populações (vias de
comunicação, energia e outras), que mobilizaram milhares de portugueses por
objectivos concretos e juntaram camadas e sectores sociais muito diversificados
convergindo, no quadro de uma luta mais ampla no plano social, para o combate à
política de direita.
A
ampla expressão de massas que a luta das populações alcançou nestes anos, a sua
capacidade de mobilização em função de objectivos e interesses específicos,
constituem um dado novo no quadro mais geral da luta e acção de massas.
O
reforço das organizações e movimentos de massas, da sua intervenção social e
política, da sua acção de massas, é necessário para o aprofundamento da luta
contra a política de direita e factor decisivo para alargar a frente social que
a ela se opõe, exigindo do Partido, dos seus militantes e organizações, uma
cuidada atenção no seu estímulo.
Sem
prejuízo da acção própria do PCP
e das suas organizações, a intervenção dos comunistas na actividade e
reforço dos movimentos e organizações de massas e nas lutas por eles
desenvolvidas, sempre no respeito pelo seu carácter unitário, autonomia e
democracia interna, confirma-se como um decisivo contributo para o
desenvolvimento da luta de massas, para o reforço das estruturas do
movimento popular, para o alargamento da unidade e da convergência dos vários
sectores e camadas sociais na luta por uma política alternativa de esquerda.
3. A classe operária, os trabalhadores e as suas
organizações de classe
A classe operária e os trabalhadores reafirmaram, nos últimos anos, que são a grande força social de resistência, luta e transformação, na defesa dos seus interesses e direitos,
no combate a uma política e a um rumo que agrava os problemas nacionais e põe
em causa o regime democrático, na exigência da mudança de política e na
afirmação de um projecto de justiça social e desenvolvimento para Portugal.
Numa situação marcada por uma continuada ofensiva no plano
internacional, europeu e nacional, de agravamento da exploração, ataque aos
direitos dos trabalhadores e às suas organizações de classe, os últimos anos
são caracterizados por uma intensa, profunda e alargada luta da classe operária
e dos trabalhadores, das mais significativas desde a Revolução de Abril.
A Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical
Nacional, CGTP-IN, pela sua natureza, princípios e
objectivos, pela sua intervenção, confirmou-se e afirmou-se como a grande central sindical
dos trabalhadores portugueses.
A CGTP-IN, construção colectiva dos trabalhadores portugueses, actuando
no quadro das suas características de classe, unidade, massas, democracia,
solidariedade e independência, assumiu uma intervenção notável que alargou o
seu prestígio.
A CGTP-IN, pilar fundamental do movimento sindical unitário, tem uma
enorme força organizada de centenas de milhar de trabalhadores, dezenas de
milhar de delegados sindicais e milhares de dirigentes, garantia da ligação aos
trabalhadores, de uma capacidade de intervenção e mobilização sem paralelo em
qualquer outra organização social, e elemento da sua independência de classe.
A UGT, pela acção divisionista e pelo apoio sistemático às políticas
contra os direitos dos trabalhadores, confirmou-se como instrumento do grande
patronato e do poder político, com particular destaque para a sua intervenção
na liquidação de direitos na contratação colectiva, para a subscrição de
alterações da legislação laboral da administração pública e da revisão do
Código do Trabalho e para aceitação da alteração da lei da segurança social,
que representam retrocessos sociais profundos. O esforço de propaganda que
procura branquear a sua acção não conseguiu iludir a sua natureza e papel.
O papel dos comunistas no movimento sindical e nas organizações dos
trabalhadores em geral é de grande importância. Resulta naturalmente do
reconhecimento dos trabalhadores de que os comunistas agem na defesa firme e
coerente dos seus interesses e direitos. A intervenção dos comunistas
concretiza-se, no âmbito do seu projecto de unidade, em conjunto com todos
aqueles que, tendo diversas opções políticas, ideológicas e partidárias ou
confissões religiosas, agem na defesa dos interesses de classe dos trabalhadores.
Nos últimos anos, no quadro do agravamento da exploração, o grande
capital, estimulado pela acção anti-sindical dos governos PSD/CDS-PP e PS,
promoveu uma intensa campanha ideológica contra os trabalhadores e o movimento
sindical unitário, acentuou a limitação dos direitos individuais e colectivos
dos trabalhadores, promoveu o condicionamento da liberdade sindical, a
limitação do direito à greve, a liquidação da contratação colectiva e procurou
dificultar e impedir a acção e a organização sindicais na empresa e no local de
trabalho.
Pelo seu papel, a CGTP-IN e o movimento sindical unitário têm sido e são
alvo de uma pressão permanente para o seu enfraquecimento e descaracterização,
num processo dirigido pelo grande capital e pelo poder político ao seu serviço,
com dimensão nacional e internacional, que estimula linhas potenciadoras de
divisão e diversão no interior do próprio movimento sindical.
A realização e conclusões do XI Congresso da CGTP-IN, reafirmando a sua
natureza, princípios e objectivos - razão da sua força, prestígio e influência -, rejeitando concepções que
os punham em causa e apontando importantes linhas de orientação, constituíram
uma grande vitória dos trabalhadores portugueses.
Prosseguindo e intensificando a política do PSD e do CDS-PP, o Governo
PS e o grande capital, apoiados nas orientações decorrentes das alterações da
legislação laboral da Administração Pública e do Código do Trabalho, vão
procurar dar novos passos no agravamento da exploração e na eliminação de
direitos dos trabalhadores. Os próximos anos vão ser marcados pela agudização
da luta de classes, em que se acentuará o ataque ao movimento sindical
unitário, ao mesmo tempo que se abre uma fase de grandes potencialidades para a
sua intervenção e reforço, cumprindo o seu papel e afirmando as suas
características próprias.
O aumento dos salários (incluindo o salário
mínimo nacional), a defesa, valorização e promoção da contratação colectiva e
de todos os direitos, a dinamização da acção reivindicativa aos vários níveis,
o combate à desregulamentação do horário de trabalho, à precariedade e ao
desemprego, à afirmação da liberdade de organização e acção sindicais são
aspectos centrais da luta a desenvolver.
A decisiva acção reivindicativa nas empresas e locais de trabalho e a
resposta aos problemas concretos e imediatos dos trabalhadores (com as
exigências que coloca à estrutura e organização dos sindicatos), cuja
intensificação deve ser assegurada (prosseguindo experiências e superando
debilidades), são indissociáveis da importância estratégica das grandes acções
de massas de âmbito nacional, e constituem um contributo significativo para o
seu êxito.
O reforço da organização sindical, ultrapassando insuficiências e
obstáculos e garantindo a sua intervenção ao serviço dos interesses de classe
dos trabalhadores, implica linhas de orientação e medidas que envolvem o
prosseguimento da reestruturação sindical, com a sua componente administrativa
e financeira, orientada para a disponibilização de meios e recursos, nomeadamente
financeiros, para a acção sindical, incorpora a contribuição para a dinamização
de pólos sindicais e a descentralização da acção, mas tem como conteúdo central
e prioritário a intervenção na empresa e no local de trabalho, articulando a
acção reivindicativa com o reforço da organização sindical. São objectivos
principais, a sindicalização, o alargamento da rede de delegados sindicais e a
criação e reforço de comissões sindicais e intersindicais.
Este objectivo estratégico e prioritário que está colocado à intervenção
dos comunistas, deverá envolver a generalidade dos quadros a todos os níveis e
um estilo de trabalho que promova, de forma integrada, a acção reivindicativa e
o trabalho de reforço da organização sindical na empresa e no local de
trabalho, com consequências no plano dos quadros e estruturas e das suas
prioridades.
A precariedade dos vínculos de trabalho representa um dos mais graves
problemas dos trabalhadores, contribuindo para a instabilidade no trabalho e na
vida e o agravamento da exploração. Afecta de forma particular os trabalhadores
que se encontram nessa situação e contribui ao mesmo tempo para a fragilização
dos direitos de todos os trabalhadores e para o enfraquecimento da sua
organização e luta. A luta contra a precariedade, luta de todos os
trabalhadores, deve expressar-se por objectivos reivindicativos concretos nas
empresas, locais de trabalho e sectores, apoiados e complementados por acções
mais gerais de denúncia e sensibilização pública.
O prosseguimento da acção em torno destes objectivos, a intensificação e
alargamento do trabalho de sindicalização de trabalhadores em situação precária
e o estímulo à sua participação na luta, são aspectos de grande importância
para dar combate às concepções de divisão dos trabalhadores, entre os que têm
vínculos precários e os que têm vínculos permanentes, e às linhas de acção
anti-unitárias e anti-sindicais de afastamento dos trabalhadores em situação
precária dos sindicatos.
Face à ofensiva global do capitalismo, reforça-se a necessidade da
solidariedade internacionalista dos trabalhadores, a partir da concepção da
defesa dos seus interesses de classe, numa luta que tem como base o espaço
nacional e se desenvolve na convergência de objectivos e acções aos vários
níveis.
Filiada na Confederação Europeia de Sindicatos (CES), cuja orientação,
subordinada ao rumo da União Europeia, conflitua com aspectos significativos
dos direitos dos trabalhadores, de que é exemplo recente a posição sobre a
flexigurança, a CGTP-IN, no quadro destas contradições, intervém na base da sua
independência e orientação própria, decorrentes da natureza, princípios e
objectivos que a definem, e agindo sempre para a convergência e o
desenvolvimento de acções que visem a afirmação desses objectivos.
No plano mundial, a CGTP-IN, as estruturas intermédias e os sindicatos,
no quadro das suas possibilidades, desenvolvem uma intensa acção de
solidariedade internacionalista, relações bilaterais e multilaterais.
O movimento sindical mundial conheceu nestes anos algumas alterações, em
parte já perspectivadas na análise feita no XVII Congresso.
A Confederação Mundial do Trabalho (CMT) e a Confederação Internacional
dos Sindicatos Livres (CISL) fundiram-se dando origem à Confederação Sindical
Internacional (CSI), que não apresenta características diferenciadas das da
CISL. Desde logo porque não assume a indispensável oposição ao sistema
capitalista e à concretização dos aspectos essenciais da ofensiva em curso,
expressa orientações de exclusão de organizações e, apesar da filiação de
algumas centrais nacionais que não pertenciam a nenhuma das organizações
mundiais que lhe deram origem, ficou muito aquém dos objectivos de alargamento
a que se tinha proposto.
Ao mesmo tempo, a Federação Sindical Mundial (FSM) realizou o seu 15.º Congresso
em Dezembro de 2005, cujas decisões têm resultado na superação de
insuficiências e obstáculos limitadores da sua intervenção e em sinais de um
maior dinamismo e capacidade de agregação e atracção de novas organizações.
São ainda parte da realidade do movimento sindical mundial importantes
centrais sindicais nacionais sem filiação mundial e ainda espaços de cooperação
multilateral, cujas práticas e dinâmicas sindicais importa acompanhar.
A posição da CGTP-IN de não filiação em centrais mundiais, tomada tendo
em conta a experiência do movimento sindical português, a sua avaliação
própria, os seus objectivos e a sua unidade, renova a sua actualidade a par da
reafirmação da disponibilidade de relacionamento e cooperação, em torno de
acções e objectivos comuns, com as centrais mundiais e no relacionamento
bilateral e multilateral com diversas expressões do movimento sindical
internacional, sempre orientada pela unidade na acção na defesa dos interesses
de classe dos trabalhadores.
No que respeita ao movimento das Comissões de Trabalhadores comprova-se a sua importância significativa. Contudo, a ofensiva contra
os direitos dos trabalhadores, a precariedade, a repressão, a redução e a
violação dos direitos que regulam a sua intervenção, nomeadamente a limitação
de crédito de horas, e a judicialização dos processos, criam dificuldades à sua
constituição e ao seu funcionamento. Prosseguem os esforços, com particular
expressão entre as empresas multinacionais, para transformar as CT e sub-CT em
comissões de empresa que facilitem a redução dos direitos dos trabalhadores,
sobrepondo-as e contrapondo-as aos sindicatos. Tal orientação do PS, com a qual
o BE, apesar da sua reduzida influência, converge, é uma das linhas de força
das alterações introduzidas no Código do Trabalho para atacar direitos e
comprometer a contratação colectiva.
O movimento das Comissões de Trabalhadores mantém uma importante
vitalidade que se expressa na acção de cada comissão de trabalhadores na
respectiva empresa, mas também na existência de coordenadoras regionais e
sectoriais. Os Encontros Nacionais agora realizados anualmente constituem
formas de cooperação e coordenação que importa prosseguir e dinamizar.
A acção dos comunistas deve contribuir para a dinamização das CT e
sub-CT afirmando, na prática, o direito ao controlo de gestão, exercendo o seu
papel e competências, assegurando a convergência e cooperação com o movimento
sindical unitário, fortalecendo o esclarecimento, a unidade, a organização e a
luta dos trabalhadores.
A eleição de representantes dos trabalhadores na área da Segurança,
Higiene e Saúde no Trabalho constitui uma importante realidade, não apenas para
garantir o direito à saúde nos locais de trabalho, mas também como espaço de
participação dos trabalhadores que deve ser valorizado e desenvolvido no quadro
da intervenção do movimento sindical.
A grave situação que constitui o desemprego em Portugal, o ataque aos
instrumentos de apoio aos trabalhadores nesta situação criou as condições para
o surgimento do Movimento dos Trabalhadores Desempregados - MTD, estrutura de
âmbito nacional, que tem vindo a intervir na denúncia desta realidade e na
mobilização destes trabalhadores para a luta. Linha de trabalho cujo reforço,
em articulação com as acções que os sindicatos desenvolvem com os trabalhadores
desempregados no respectivo sector de actividade, importa desenvolver.
4. Outras organizações e movimentos de massas
O conjunto de organizações e movimentos de massas
que intervêm e organizam interesses e aspirações específicas em muitos e
diversificados sectores da vida social, económica e cultural do país, constitui
uma realidade ampla e dinâmica com uma incontornável importância na vida
política e na sociedade.
Confirmou-se
a crescente importância das associações de pequenos e médios agricultores e da
sua confederação - a CNA, das associações de micro, pequenos e médios
empresários, das organizações dos quadros técnicos e intelectuais, das
associações de estudantes, do movimento juvenil, do movimento das mulheres, do movimento
da paz, dos movimentos dos reformados e das pessoas com deficiência, das
associações sócio-profissionais de militares, das associações
sócio-profissionais e sindicais das forças de segurança, das associações de
pais, das colectividades de cultura e recreio. Assumiram ainda uma nova
expressão e amplitude as lutas desenvolvidas pelas populações, em grande medida
mobilizadas pelos movimentos de utentes, nomeadamente o Movimento dos Utentes
dos Serviços Públicos (MUSP).
Com situações e características diferenciadas, nos últimos quatro anos
acentuaram-se políticas contrárias às necessidades destas organizações e
movimentos - governamentalização, restrições no plano legal, asfixia
financeira, condicionamento dos âmbitos de actividade, desvalorização institucional,
limitação da liberdade de organização - que visam diminuir a
participação e condicionar a intervenção e o seu papel na defesa de interesses
específicos e gerais.
A participação e intervenção dos comunistas nas organizações e
movimentos de massas constituem uma orientação de sempre e assumem-se como
factor essencial para a dinamização da sua actividade, para a preservação do
seu carácter unitário e independente, e para uma mais combativa e consequente
acção, condições essenciais para a elevação do seu conteúdo e objectivos
políticos.
A actividade do movimento
dos pequenos e médios agricultores, onde se destaca a Confederação Nacional de Agricultura - CNA e as organizações suas associadas, desenvolveu-se com significativa
intensidade, enfrentando o agravamento da situação da agricultura familiar e o
desaparecimento de milhares de explorações, bem como uma ofensiva global, com
uma revisão profunda das condições de financiamento da prestação de serviços
por parte do Estado. O Governo PS tenta quebrar a resistência e o ânimo dos
agricultores e das suas organizações de classe no combate à sua política e à
PAC.
Na intervenção contra a política agrícola deste Governo PS e da União
Europeia, a CNA e as organizações associadas mobilizaram um apreciável conjunto
de agricultores e da população rural. Persistindo diferenças regionais,
realizaram-se numerosas iniciativas de âmbito local, regional e nacional, com
uma significativa diversidade.
No quadro de uma intensa actividade, da qual se destaca a realização
do seu V Congresso, a CNA reforçou o seu prestígio, tendo-lhe sido reconhecido
o estatuto de Instituição de Utilidade Pública no seu 30º Aniversário.
Sem prescindir de assegurar aos agricultores serviços de natureza
técnico-profissional, dos quais o Estado tem vindo progressivamente a
desresponsabilizar-se através da sua «transferência» para as organizações de
agricultores, é não só necessário como decisivo que o movimento associativo dos
pequenos e médios agricultores corresponda ao seu principal objectivo: a
organização e a luta na defesa dos interesses económicos e sociais dos
agricultores e do mundo rural.
A situação do movimento associativo das diversas camadas sociais no
campo mantém os seus traços essenciais. Mas, fruto da enorme ofensiva contra a
agricultura nacional, avolumam-se as contradições internas na CAP, na AJAP e na
própria CONFAGRI. Apesar da continuidade da sua natureza e objectivos,
radicalizam pontualmente o discurso, enquanto «esquecem» as suas
responsabilidades pela situação em que se encontram a produção agro-pecuária
nacional, os agricultores e as suas organizações.
A nível europeu, o movimento agro-rural reestruturou-se com a
transformação da CPE - Coordenadora Agrícola Europeia na Coordenadora Europeia
da Via Campesina (movimento de organizações camponesas no plano
intercontinental), que a CNA integra.
A difícil situação da agricultura e dos agricultores, o política do
Governo PS e o que vai sendo conhecido da nova reforma da PAC, impõem um
coerente esforço de debate e abertura para a convergência na acção por
objectivos concretos de todos os agricultores afectados e das associações que
os defendem.
O brutal agravamento da crise no sector das pescas,
na continuidade das políticas liquidacionistas de diferentes governos e da submissão
às imposições da União Europeia com o aprofundamento da Política Comum de
Pescas, a par do aumento do preço dos combustíveis, esteve na origem de uma
ampla movimentação no sector, para onde convergiram sindicatos de pescadores,
associações de pequenos armadores de pesca costeira e artesanal, e até grandes
armadores.
O agravamento dos problemas dos micro, pequenos e médios empresários, decorrente da política de centralização e concentração capitalistas,
que explica o quadro extremamente complexo das estruturas associativas dos
empresários portugueses. Continuando dominadas pelas confederações do grande
capital (CIP, AIP-CE, AEP e CTP), as estruturas associativas do grande capital
são palco de rivalidades e interesses conflituantes, particularmente quanto à
distribuição dos fundos comunitários. É também nesse contexto que se verifica
uma crescente disputa eleitoral pelo seu domínio e evoluções significativas,
como sucedeu na CCSP, a par do afastamento de associações, maioritariamente de
MPME e por estes dirigidas. Crescem também movimentos e estruturas
independentes, constituídas por micro e pequenos empresários que, em demarcação
das estruturas dominadas pelos interesses do grande patronato, procuram afirmar
e defender os interesses de classe, como é visível no sector do comércio
retalhista, nos transportadores de mercadorias e na construção civil.
Apesar das dificuldades geradas pela degradação da situação económica,
as cooperativas geram importantes impactos na criação de emprego, na defesa dos
direitos dos consumidores, na melhoria das condições de vida nos campos e na
atenuação dos processos de desertificação do mundo rural, na edificação e
manutenção de habitação a custos controlados, na promoção da defesa do meio
ambiente, na educação e divulgação cultural, no envolvimento e animação das
comunidades em que estão inseridas.
Independentemente de
contradições inerentes aos diferentes interesses em questão, o conjunto de
acções que em convergência foram realizadas neste período, com destaque para a
luta em defesa do carácter público e dimensão nacional da Docapesca onde a
Mútua dos Pescadores desempenhou um papel central, e a luta por preços dos
combustíveis adequados ao sector, constituíram uma importante movimentação de
massas que colocou em evidência o carácter estratégico que este sector tem para
a soberania do país.
As ameaças decorrentes do aprofundamento desta política, as tentativas
de expropriação e a cobiça sobre este importante recurso nacional implicam que
se reforcem as estruturas representativas dos pescadores e dos armadores da
pesca artesanal e costeira.
Dando resposta colectiva ao significativo
agravamento da situação económica, social e profissional nas áreas respectivas,
num quadro em que continua a registar-se o aumento do seu número, bem como o
seu crescente peso no conjunto dos assalariados, muitos foram os sectores e
grupos profissionais de intelectuais e quadros técnicos que
empreenderam significativos processos de organização e luta com diferente
expressão, alcance e objectivos que, avaliados em conjunto, representam um
muito largo movimento de afirmação de objectivos próprios, de resistência e
oposição às políticas de direita e aos seus efeitos práticos, traduzindo um
crescimento significativo da sua intervenção.
Justificam especial destaque as lutas dos
Educadores e Professores dos Ensinos Básico e Secundário, dos Docentes e
Investigadores do Ensino Superior, dos Trabalhadores dos Espectáculos, dos
Bolseiros de Investigação Científica, dos Jornalistas, dos Psicólogos, entre outros,
sendo ainda de salientar a participação em iniciativas em defesa da liberdade e
da democracia e contra as alterações ao código do trabalho. Deve, entretanto,
registar-se que em alguns sectores o desenvolvimento de movimentos e processos
de luta tem sido prejudicado ou dificultado pela debilidade de algumas
estruturas representativas e pela ausência de disposição combativa e
mobilizadora em alguns órgãos dirigentes. Dificuldades estas que, se em alguns
sectores resultam objectivamente da precariedade de vínculos laborais, da
instabilidade e da pulverização da actividade respectiva, são também reflexo da
persistência nestas camadas sociais de factores subjectivos que se exprimem
ideologicamente numa relativa subestimação da necessidade de formas de organização
colectiva e profissional de classe, da importância interventiva das estruturas
existentes e na resistência a fazer convergir as suas lutas e as suas
reivindicações com as dos outros trabalhadores.
Deve, no entanto, ser valorizada uma
tendência positiva para a crescente participação destas camadas de
trabalhadores nas acções promovidas pelo movimento sindical unitário, assim
como a grande diversidade de formas de acção, com destaque para a Confederação
Portuguesa dos Quadros Técnicos, assim como a Associação de Bolseiros de
Investigação Científica.
A intervenção do movimento das mulheres
no seu conjunto deve ser compreendida à luz de uma violenta ofensiva levada a
cabo pelo actual Governo PS contra os seus direitos - particularmente o direito
ao trabalho e o direito à maternidade como função social -, escondida muitas
vezes por detrás de uma crescente retórica de preocupações em torno da
igualdade, da «conciliação entre a vida profissional e familiar», da paridade e
acompanhada pela disseminação de concepções (com as quais convergem PS, PSD e
BE) que, ao mesmo tempo que procuram ocultar as contradições de classe como
causa primeira das desigualdades e discriminações nas relações de produção
capitalista, visando restringir a luta das mulheres e condicionar as
possibilidades de alargamento, convergência e unidade no movimento das
mulheres.
O fim da criminalização das mulheres pela prática de aborto até às 10
semanas, no seguimento do resultado positivo do 2º referendo realizado em 2007 -
culminando um longo processo de luta para o qual os comunistas deram o mais
longo, coerente e sólido contributo - constitui uma inequívoca vitória da luta
das mulheres, na qual teve um importante papel a CGTP-IN e o MDM juntamente com
outras organizações, sob o lema «Em Movimento pelo Sim». Este facto não apaga
uma ofensiva política geral que acentuou desigualdades e discriminações
dirigida também contra as organizações de mulheres, com a redução drástica dos
apoios às suas actividades, ao mesmo tempo que lhes procura impor, pela linha
do financiamento (nacional e comunitária), calendários, áreas de intervenção e
objectivos políticos e ideológicos, que visam condicionar a sua independência e
actividade.
A alteração, levada a cabo pelo Governo PS, da composição e objectivos
do organismo governamental que acompanhou nos últimos 30 anos a área dos
direitos das mulheres - o Conselho Consultivo do CIDM -, traduziu-se na
exclusão de um conjunto de organizações, entre as quais a Organização das
Mulheres Comunistas, e numa ainda maior governamentalização da nova estrutura -
a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG).
Destaca-se a acção desenvolvida por expressões do movimento de mulheres
que têm assumido uma intervenção autónoma, visando a organização e luta das mulheres
em defesa dos seus direitos específicos e contra a política de direita, e que
se integram e convergem para a luta mais geral dos trabalhadores e das
populações, conforme se verificou nas grandes acções de massas realizadas nos
últimos anos.
O movimento de mulheres, na sua diversidade, encontra na organização das
trabalhadoras no movimento sindical e na CGTP-IN a sua expressão mais forte e
combativa, como está patente no alargamento do esclarecimento e do protesto das
mulheres a partir dos locais de trabalho e na crescente participação na luta de
massas pelo trabalho com direitos, contra as discriminações e a precariedade,
contra a violação dos direitos de maternidade e paternidade. As mudanças
verificadas na composição no mundo do trabalho, o agravamento da exploração, as
alterações impostas na legislação laboral, tornaram ainda mais necessária a
presença e a intervenção das mulheres na luta e no movimento sindical.
O Movimento Democrático de Mulheres, confirmando as suas características
de organização democrática, unitária e progressista, desenvolve uma activa
intervenção na luta pela resolução dos problemas concretos das mulheres, em
defesa da igualdade e emancipação, pela melhoria das condições de vida e
progresso social. Inscrevendo na sua acção a solidariedade e a luta pela paz, o
MDM tem dado um importante contributo para o reforço da FDIM.
Tais características e objectivos têm gerado campanhas manipulatórias da
sua história, de silenciamento da sua acção, de desvalorização do seu papel ao
longo dos anos, de tentativas de apropriação do seu património histórico de
intervenção e luta em defesa dos direitos das mulheres, ao mesmo tempo que se
promovem outras estruturas e organizações.
As comemorações do 8 de Março, por iniciativa do MDM (que assinala esta
data desde 1969), do movimento sindical, e também com um envolvimento crescente
das autarquias e outras estruturas unitárias com iniciativas próprias ou
conjuntas, têm representado importantes jornadas de acção de mulheres visando o
reforço da sua luta em torno dos problemas e reivindicações específicas e
gerais.
A juventude, com
características e composição diversa, pela sua força, amplitude e energia
própria, assume-se como uma importante força social com um papel único na nossa
sociedade. No seu comportamento e atitudes diversos, incorpora valores de
solidariedade, partilha e participação representando um factor incontornável no
processo de transformação social e que conta e contará para a necessária
ruptura com a política de direita.
Os anseios e os problemas da juventude
são transversais a diversas áreas da vida nacional. As políticas da educação,
de emprego, da saúde, da habitação, do desporto, da cultura, da paz, têm
reflexos específicos na vida dos jovens. É no quadro de uma violenta ofensiva
contra os seus direitos que cerca de dois milhões de jovens estudam, trabalham
e procuram realizar-se individual e colectivamente. Uma realidade marcada pela
permanente negação dos seus direitos e degradação das suas condições de vida.
Integrando espaços e estruturas das
diferentes organizações e movimentos de massas, é no quadro do movimento
juvenil que a juventude dá maior expressão e realiza de forma mais profunda as
suas capacidades, anseios e aspirações. Com diferenças naturais na sua
organização (formal e informal), nos seus objectivos e tipo de actividade - que
vão desde espaços recreativos, culturais ou desportivos, passando pelos
movimentos sindical, estudantil e juvenil de base local -, o movimento juvenil
é a mais ampla expressão da intervenção democrática de muitos milhares de
jovens, traduz e potencia a disponibilidade, o valor e o espírito de
participação, tem um importante papel na realização e formação individual e
colectiva e na dinamização da luta reivindicativa.
Ao mesmo tempo que o movimento juvenil é
alvo de uma intensa ofensiva da parte daqueles que limitam e cerceiam os
direitos democráticos, os direitos de associação nas escolas, a sindicalização
e actividade sindical, a liberdade de propaganda e de manifestação, a livre
criação artística, a própria autonomia do movimento juvenil assiste-se a uma
permanente campanha que visa diminuir o amplo significado da participação da
juventude no nosso país.
A nova lei do associativismo juvenil,
imposta pelo Governo PS, pretende limitar o potencial transformador e
reivindicativo das associações juvenis, condicionando a sua constituição ao
crivo de mecanismos burocráticos, à aprovação de estruturas governamentalizadas
e reduzindo o seu financiamento. Apesar disso, as mais de mil associações
juvenis de base local assim como os grupos informais de jovens,
constituem uma importante expressão do movimento juvenil, ligada a realidades
muito distintas, proporcionando actividades e oportunidades que não existiriam
de outra forma.
No movimento estudantil quer no
plano do ensino superior, quer no plano do ensino secundário fizeram-se sentir
de forma mais pronunciada as tentativas da sua partidarização e
instrumentalização. Ainda assim, confrontou-se e lutou contra as consequências
decorrentes da crescente elitização do ensino, do ataque à gestão democrática
das escolas e ao ensino público, constituindo uma viva realidade e um factor
incontornável na democratização do sistema de ensino. O movimento estudantil
nas suas múltiplas expressões, e em particular as associações de estudantes,
afirma-se como o principal espaço de participação democrática dos estudantes.
Apesar da crescente precariedade que
atinge as gerações mais jovens de trabalhadores, do desemprego e das limitações
à liberdade e acção sindical, verifica-se uma importante integração e
participação de milhares de jovens trabalhadores no movimento
sindical unitário e no movimento das comissões de trabalhadores, com particular destaque para o papel
da Interjovem (realidade que registou avanços nos últimos anos), o que
constitui uma importante afirmação da participação juvenil na resistência e na
luta pelo direito ao trabalho com direitos.
Nos últimos quatro anos, muitas foram as
lutas que a juventude travou pelos seus direitos. Com outros sectores da
sociedade, a juventude deu também um contributo assinalável e insubstituível
para a luta contra as políticas de direita que agravam a condição de vida, de
estudo, de trabalho e realização de muitos milhares de jovens portugueses.
A JCP, organização autónoma dos jovens
comunistas, aprofundou o conhecimento e a análise da realidade juvenil,
contribuiu para o reforço do movimento e das organizações juvenis, alargou o
esclarecimento e a mobilização de milhares de jovens em defesa dos seus
direitos e do reforço da sua consciência social e política sobre o conteúdo e
consequências das políticas de direita. No quadro de uma profunda ofensiva
ideológica que visa particularmente atingir a juventude, a JCP desenvolveu uma
ampla luta contra a resignação e o conformismo e introduziu elementos de
confiança de que é possível à juventude portuguesa viver numa sociedade que
responda aos seus anseios, mobilizando-a para o exercício e a defesa dos
direitos conquistados com a revolução de Abril.
A JCP, no quadro da orientação geral do PCP,
reafirmou o seu papel insubstituível na ligação do Partido à juventude. Com uma
acção diária prioritariamente virada para os estudantes do ensino secundário,
profissional e superior, com uma crescente intervenção junto dos jovens trabalhadores,
a JCP foi fundamental no esclarecimento e mobilização de importantes sectores
juvenis na luta pela realização dos seus direitos e aspirações.
A JCP alargou ainda a sua acção a vários
sectores da juventude com interesses específicos. Iniciativas em defesa do
desporto e da cultura para todos - com destaque para o Torneio Agit de futsal e
os Festivais de «Bandas de Garagem» -, em defesa do direito à habitação e
contra o fim do Incentivo ao Arrendamento Jovem, em defesa da Paz e contra o
imperialismo e a guerra e na denúncia das tentativas de criminalização do ideal
e de organizações comunistas, na defesa da autonomia e de mais apoios para o
movimento juvenil, na defesa do ensino artístico e dos direitos dos estudantes
do ensino profissional, na luta pela despenalização da IVG, acções que traduzem
uma profunda ligação à realidade juvenil e constituem assinaláveis exemplos da
amplitude da intervenção da JCP junto da juventude.
Esta acção tem contribuído para ganhar
apoio de sectores juvenis para o ideal e o projecto comunista, traduzidos nas
adesões à JCP, mas também na elevada percentagem de jovens recrutados para o
Partido nos últimos anos. O 8.º Congresso da JCP, realizado em Vila Nova de
Gaia em Maio de 2006, sob o lema «Transformar o sonho em vida», com a
participação de cerca de 800 delegados, demonstrou a força e a confiança da
organização dos jovens comunistas.
Também no plano internacional destaca-se
o papel da JCP, pela coerência da sua acção na frente anti-imperialista que se
traduziu no apoio para a sua reeleição, em 2007, como Presidente da Federação
Mundial da Juventude Democrática (FMJD), estrutura juvenil internacional,
progressista, de massas, anti-imperialista e democrática que reúne em si
organizações juvenis em todo o mundo.
A JCP deu
também um importante contributo para a realização com êxito em Caracas, na
Venezuela, do 16.º Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes, em 2005,
onde participaram mais de 17 mil delegados, contribuindo para o reforço do
movimento dos festivais e do movimento juvenil anti-imperialista.
O trabalho articulado entre a JCP e o
Partido tem permitido a este estar em melhores condições para intervir na
defesa dos interesses e aspirações da juventude. Apesar dos avanços registados
é necessário progredir na afirmação própria da JCP e na influência do Partido
junto da juventude. O reforço do trabalho do Partido, a acção própria da JCP,
uma melhor articulação e coordenação entre si, podem abrir novas perspectivas,
que se traduzam no aumento da capacidade de luta do movimento juvenil e no
reforço do Partido e da JCP.
A acção do actual Governo em relação aos reformados, pensionistas e idosos tem-se pautado não só pelo incumprimento
dos direitos constitucionais, como pelo agravamento das suas condições de vida,
nomeadamente com a contínua desvalorização das reformas e pensões, e os
insuportáveis aumentos dos preços da alimentação, medicamentos, energia e
transportes, mas também pelas crescentes limitações aos direitos de
participação social, política e cultural.
Com o objectivo de facilitar o processo de intensificação da
privatização das funções sociais do Estado, o Governo, ao mesmo tempo que
acentua a desresponsabilização do Estado, aprofunda uma política dirigida às
Associações de Reformados para que estas assumam funções sociais da Segurança
Social, transformando-as em meras prestadoras de serviços, através da sua
conversão em Instituições Privadas de Solidariedade Social, tentando diminuir e
condicionar a sua vida associativa e a capacidade reivindicativa em defesa dos
direitos desta camada.
Nos últimos quatro anos, o MURPI - Confederação Nacional dos Reformados,
Pensionistas e Idosos, identificado com o espírito e os ideais de natureza
progressista e solidária, assumiu-se como um movimento politicamente empenhado
na luta pela defesa desta camada. O seu papel na ligação a mais de 200
associações suas filiadas contribuiu para que fossem desenvolvidas acções de
protesto e denúncia contra a pobreza e exclusão social, pela exigência do
aumento das pensões e reformas, pela garantia de reforço da sua participação
social e política e do reconhecimento do estatuto de parceiro social.
Destacam-se neste âmbito, a par da participação nas principais acções da
CGTP-IN, a realização de várias acções de massas, algumas das quais em
convergência com a Inter-Reformados - estrutura da CGTP-IN com uma importante
expressão nacional -, as várias edições do Piquenicão Nacional e o 5.º
Congresso do MURPI. A realidade comprovou a importância do movimento dos
reformados na luta contra a política de direita e o seu importante papel no
alargamento da frente social de luta.
O avanço do processo de privatização e liberalização de funções sociais
do Estado, de serviços públicos ou de bens essenciais, como a educação, a
saúde, a segurança social, a energia, a justiça, o ambiente, as
telecomunicações, os serviços postais e os transportes, com consequências
graves para os portugueses, nomeadamente na acessibilidade a esses serviços e
na degradação da qualidade dos serviços prestados, pondo em causa direitos
sociais fundamentais como o princípio da universalidade do acesso, levou a que
o Movimento dos Utentes, com particular destaque para as estruturas
organizadas no Movimento dos Utentes em defesa dos Serviços Públicos (MUSP),
tivesse um significativo desenvolvimento com o aparecimento de Comissões de
Utentes em várias regiões do país, o aumento do número de acções de protesto no
plano local, regional e nacional e a diversificação da sua intervenção.
Ao longo destes quatro anos, o Movimento dos Utentes organizou e
mobilizou várias camadas da população e novos sectores para a luta. A
intervenção do Movimento de Utentes releva a importância e as potencialidades
da existência de estruturas que respondam às necessidades das populações de se
organizarem no protesto e na acção reivindicativa em defesa dos seus direitos e
interesses específicos. O carácter informal do Movimento e o seu funcionamento
democrático têm permitido a sua renovação e alargamento e uma maior
aproximação às populações.
A participação regular e organizada dos
Utentes e das suas Comissões nas acções de luta convocadas pelo Movimento
Sindical Unitário e a realização de iniciativas articuladas com o MSU e órgãos
autárquicos, nomeadamente no âmbito da defesa do SNS, contra o encerramento de
serviços de saúde, o encerramento de escolas, pela abolição ou contra a
introdução de novas portagens, ou ainda as acções em defesa da água pública,
tornou mais evidente a importância e as possibilidades desta articulação no
alargamento da frente social de luta contra a política de direita.
A desresponsabilização do Estado na efectivação dos direitos económicos
e sociais das pessoas com
deficiência é acompanhada
pela subversão da relação do Estado com as respectivas associações, e pela
pressão para que estas centrem a sua actividade na prestação de serviços e
adoptem modelos de gestão empresarial.
A criação do Instituto Nacional de Reabilitação e a extinção do
Secretariado Nacional de Reabilitação aprofundaram a institucionalização de uma
linha de menor diálogo com as organizações de pessoas com deficiência, de
desvalorização da sua participação na definição das políticas para esta área e
de criação de dificuldades à sua intervenção, com a redução de apoios
financeiros por parte do Orçamento do Estado às associações de deficientes e a
imposição do pagamento de 5% no porte-pago das suas publicações.
Nos últimos quatro anos destaca-se a acção desenvolvida pelas
associações das pessoas com deficiência que, em condições particularmente
difíceis, defenderam os seus interesses, resistiram e enfrentaram esta ofensiva
política e ideológica, defenderam a autonomia das suas associações, exercendo o
direito de as suas direcções decidirem de forma soberana as prioridades que
melhor servem o reforço da participação dos sócios e dos cidadãos deficientes.
O Movimento Associativo Popular (MAP), contando com cerca de 18 mil colectividades/associações, 267 mil
dirigentes associativos voluntários e cerca de 3 milhões de associados,
constitui o maior espaço de intervenção social e trabalho voluntário em
Portugal. Pelas suas características e poder real que exerce nas comunidades, o
associativismo popular vem consolidando a sua afirmação como um poderoso
movimento nacional de cultura, recreio e desporto, uma inequívoca resposta
social e de desenvolvimento local.
Aprofundou a acção nas áreas tradicionais (cultura, desporto, recreio,
etc.) e desenvolveu novas actividades centradas na área social, na
alfabetização, no combate ao sedentarismo e na modernização organizativa das
colectividades. Apoiado nas suas características e valores (escola de vida
colectiva, cooperação, solidariedade, generosidade, afirmação da identidade
local, funcionamento democrático, espaço de aprendizagem e exercício da
democracia participativa), contribuiu para o alargamento da consciência social
e para a luta por objectivos próprios e pelos direitos sociais das populações.
O MAP prosseguiu o processo de estruturação local, concelhio e distrital
e consolidou a capacidade de intervenção e dinamismo na sua estrutura nacional
(Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura e Recreio), aprofundando
os processos de organização e coordenação nacional, quer ao nível de
iniciativas e projectos, quer ao nível das posições e orientações político-associativas,
que visam dar resposta às legítimas aspirações no acesso à cultura, ao desporto
e à participação social das populações.
Desenvolveu a crescente consciência de que o MAP tem as características
de um poderoso movimento popular, cuja acção de intervenção social poderá
convergir nas acções de luta social e política com outros movimentos populares
de massas, no quadro de uma linha de cooperação e coordenação, ao serviço das
populações. O MAP afirmou-se e afirma-se como um amplo espaço de participação popular,
de formação de consciência política e social e promoção de valores e concepções
progressistas.
O MAP tem sido considerado pelos sucessivos governos não como um
parceiro central para a promoção de políticas culturais, desportivas e sociais,
como está constitucionalmente estabelecido, mas como uma realidade secundária,
a que não se atribuem os meios correspondentes, que se tenta menorizar, impondo
mecanismos desajustados de reconhecimento e controlo, apostando na sua
despolitização, manipulação, ao sabor dos interesses conjunturais e de
afirmação pessoal. Neste âmbito
o governo cometeu ao INATEL, distorcendo a sua vocação principal, a tarefa de
apoio ao movimento associativo, escamoteando a necessidade de se criar, para
esta realidade, um interlocutor específico ao nível da administração central,
capaz de lhe dar resposta e contribuir para o seu desenvolvimento.
O
movimento em defesa do ambiente e a luta diversificada de estruturas e associações
que, com objectivos concretos, diferenciados e com diferentes graus de
autonomia, são exemplo do potencial mobilizador do conjunto das preocupações em
torno das questões ambientais, fruto da crescente degradação dos recursos
naturais.
Os Bombeiros são a
mais importante organização de protecção e socorro do país, com 36 mil
voluntários e cerca de 6 500 trabalhadores. O Movimento Associativo de
Bombeiros integra 436 Associações, 20 Federações Distritais e a Liga de
Bombeiros Portugueses. Constitui um poderoso movimento social que desenvolve,
também, uma intensa actividade cultural, social e desportiva.
Numa ofensiva sem precedentes, de ingerência na sua vida interna - na
qual se insere o subfinanciamento e atribuição discricionária de
verbas -, o Governo PS tentou
impor, sem sucesso, um novo regime jurídico das associações. A
insensibilidade do Governo pelas questões laborais levou a que, em Maio de
2007, os bombeiros profissionais, mobilizados pelos sindicatos, se
manifestassem pelos seus direitos e por uma carreira única.
O movimento associativo dos pais, enquanto participante activo na vida das escolas, é um factor positivo
e imprescindível na relação das escolas com as comunidades em que se situam, e
para o cumprimento das funções da escola na educação e socialização das
crianças e jovens e na defesa da escola pública. As associações de pais
continuam a enfrentar dificuldades de consolidação das suas estruturas, devido
às características particulares da sua composição, que resultam em situações de
instabilidade, nomeadamente na composição dos órgãos sociais. A realidade
comprovou a necessidade de se criarem condições objectivas para os pais
acompanharem a educação dos seus filhos e para participarem nos projectos
educativos das escolas e na sua gestão democrática.
Confirma-se a necessidade de um papel activo e dinamizador na formação,
reactivação e intervenção das associações de pais, no quadro do princípio de
uma associação por escola, factor de mobilização dos pais e das famílias para a
participação no movimento associativo e para a intervenção nas questões do
ensino e da educação e em defesa da escola pública.
Está aberto um vasto campo de potencialidades e possibilidades já
realçadas em congressos anteriores, para a expansão e fortalecimento de amplas
movimentações e lutas de MPME. É assim que, apesar de dificuldades e
limitações, a CPPME - Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias
Empresas, única confederação que estatutariamente exclui do seu âmbito as
grandes empresas, se vai afirmando um associativismo de classe intimamente
ligado aos problemas concretos deste importante sector económico e social.
A importância política e social deste sector
- ao nível do emprego,
peso na actividade económica e na produção nacional - e as contradições dos
processos económicos e sociais que o atravessam, tornam possível a evolução da
sua consciência e posicionamento de classe, facilitando o crescimento das suas
organizações independentes.
Mantendo uma importância significativa nos planos económico, social e
cultural, e o reconhecimento constitucional enquanto vector central da
realidade económica do país, o movimento cooperativo
viu agravar-se, pelas políticas do actual Governo PS, a situação de
discriminação imposta por governos anteriores.
A tentativa de desmantelamento do INSCOOP, Instituto António Sérgio, com
a sua externalização e transformação em Regicooperativa, incluindo fundações,
misericórdias e IPSS, representa um violento ataque ao Movimento Cooperativo,
que está associado ao processo de recuperação capitalista e latifundista.
A par da tentativa de adulteração do seu estatuto constitucional, o
Movimento Cooperativo continua sem aceder a direitos de discriminação positiva
constitucionalmente garantidos, como o acesso ao crédito e auxílio técnico, e a
promoção do estatuto e valores cooperativos, de onde deveria decorrer um apoio
preferencial em termos de fundos comunitários, nomeadamente um programa
específico no âmbito do QREN.
O desprezo pelos direitos constitucionais das comunidades portuguesas e pelas suas justas aspirações por parte de
sucessivos governos, tem tido como resposta importantes lutas e movimentações
dos emigrantes em defesa dos seus direitos, impedindo que o Governo levasse
ainda mais longe a sua ofensiva, com destaque para as lutas contra o
encerramento de consulados e pela defesa do ensino, desenvolvidas por comissões
de luta apoiadas pelo movimento associativo e pelo Conselho das Comunidades
Portuguesas.
A afirmação de Portugal como país simultaneamente de emigração e imigração, reforça a sua responsabilidade política e social na consideração de
condições legais e de políticas mais favoráveis ao processo de integração dos
mais de 500 mil imigrantes, em situação regular e irregular, que se encontram
no nosso país.
A luta persistente dos imigrantes e a acção política do PCP foram decisivas, nestes últimos quatro
anos, para progressos legislativos relevantes em matéria de nacionalidade e de
imigração, como se confirmou com a aprovação da Lei da Nacionalidade e da Lei
da Imigração que, apesar de persistirem obstáculos injustificados à legalização
de imigrantes e à aquisição da nacionalidade portuguesa, contribuíram para a
legalização e a naturalização de um número significativo de imigrantes.
O movimento associativo dos Imigrantes, que conta com mais de uma
centena de Associações em Portugal, tem tido uma importância fundamental no
apoio à integração dos imigrantes na sociedade portuguesa. Entretanto, a
fragilidade das suas associações, resultante de uma enorme carência de meios
próprios, da falta de apoios públicos, da dispersão que as caracteriza e das
constantes tentativas de manipulação a que estão sujeitas, constitui uma
dificuldade a que urge dar resposta.
A FAR - Frente Anti-Racista, criada em 1993, afirmou-se no combate ao
racismo e à xenofobia com acções de esclarecimento, sensibilização e informação
dirigidas aos imigrantes e à população, deu passos na ligação com as diversas
comunidades pela sua plena integração e estabeleceu contactos com outras
associações de imigrantes.
Num momento de agravamento da situação económica e social, propício à
intensificação de sentimentos racistas e xenófobos, a intervenção e a luta das
associações de imigrantes e do movimento anti-racista, afirmando a sua
independência face ao poder político, são ainda mais necessárias.
O movimento da paz respondeu,
embora de forma irregular, com uma actividade diversificada aos sérios
desenvolvimentos internacionais resultantes da crescente intensidade da
agressividade do imperialismo.
Destacam-se várias manifestações contra a guerra no Afeganistão, Iraque
e Líbano e de solidariedade com a resistência dos povos contra a ocupação, em
particular com o martirizado povo da Palestina, assim como iniciativas no plano
da solidariedade; acções contra a militarização da UE e o reforço da NATO, com
particular destaque para a luta contra a instalação do escudo anti-míssil no
Leste europeu e a manutenção e proliferação de bases militares estrangeiras;
acções de solidariedade com os povos de Cuba, Venezuela, Colômbia, Brasil e
Saara Ocidental.
O Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC) teve um destacado
papel como organização aglutinadora para o desenvolvimento de um movimento da
paz unitário mais interveniente e combativo, mantendo uma ampla relação e
cooperação com distintas organizações sociais. Como membro do Conselho Mundial
da Paz assumiu responsabilidades ao nível das suas estruturas de direcção,
concretamente da coordenação europeia dos movimentos da paz.
A ofensiva do imperialismo, assente na violação do direito internacional
e no desencadear de guerras de agressão, na corrida aos armamentos, no
alargamento da NATO e na militarização da UE, exige que se reforce o empenho
para ampliar e reforçar o movimento da paz e da solidariedade internacional.
A valorização da luta e da resistência antifascistas, pelo seu papel no
combate ao branqueamento e reabilitação do fascismo e à falsificação da
história, na defesa dos valores da liberdade e da democracia, constitui uma
crescente necessidade. Nesta acção destaca-se o papel assumido pela União de Resistentes Antifascistas
Portugueses - URAP, que
neste período reforçou a sua intervenção, desenvolveu uma importante actividade
no esclarecimento e mobilização dos democratas na defesa dos ideais de Abril e
no combate a acções e iniciativas de carácter ou natureza fascizante.
5. O PCP no combate à política
de direita e na defesa do regime democrático
A ofensiva do grande capital, desenvolvida no momento
actual a partir da política de direita do Governo PS, inscrevendo nos seus
objectivos a destruição do regime democrático, a eliminação do quadro de
direitos constitucionalmente consagrados, a alienação da soberania nacional e a
reconstituição do capitalismo monopolista de Estado, teve no PCP a força que de forma mais coerente,
mais consequente e mais capaz a combateu.
O PCP assumiu um papel central e
insubstituível na luta contra a política de direita. Fê-lo apoiando e dinamizando uma
intensa luta de massas e desenvolvendo uma profunda intervenção política e
institucional, interpretando os problemas e aspirações dos trabalhadores e das
populações que assim ganharam outro alcance.
O desenvolvimento da luta de massas, conjugado com uma reforçada
intervenção do PCP e
dos comunistas nas instituições e na sociedade, confirmou-se como um factor
determinante para travar processos, alcançar novos avanços e conquistas
favoráveis às massas populares, para derrotar a política de direita e para
criar condições para uma verdadeira alternativa de esquerda.
Na Assembleia da República, no Parlamento Europeu, no Parlamento
Regional da Madeira e nas Autarquias Locais, os eleitos do PCP
têm pautado a sua intervenção por elevados padrões de exigência ética, numa
acção articulada com o Partido e as organizações de massas, cumprindo os
compromissos assumidos com o eleitorado e desempenhando de forma qualificada,
oportuna e consequente o mandato atribuído pelo povo, em defesa dos interesses
dos trabalhadores, das populações, da juventude e do país.
Em estreita ligação com os trabalhadores e as populações, os seus
interesses e aspirações, o Grupo Parlamentar, no quadro da acção e orientação
geral do Partido, participou em todas as grandes batalhas políticas travadas na
Assembleia da República, tomou numerosas iniciativas com vista a dar resposta
aos problemas nacionais e às dificuldades crescentes impostas pela política do
Governo, combateu e denunciou o conjunto de legislação que a maioria
parlamentar e o Governo produziram contra direitos e conquistas sociais.
No Parlamento Europeu, a acção dos deputados eleitos pelo PCP
tem-se traduzido na defesa dos interesses nacionais, no combate às medidas e
decisões que comprometem o desenvolvimento económico do país e os direitos dos
trabalhadores e do nosso povo, no quadro de uma estreita relação com as
organizações do Partido, no combate aos problemas que decorrem das políticas
comunitárias, na defesa da soberania nacional, da paz e na solidariedade com
outros povos.
Nas autarquias locais, os eleitos do PCP,
em maioria e minoria, têm pautado a sua intervenção por uma gestão democrática
e participada, pela defesa intransigente dos interesses das populações, pela
isenção e transparência no exercício dos seus mandatos, pela defesa da gestão
pública e das competências e poderes das autarquias locais.
A par de uma empenhada contribuição para o alargamento, unidade e
combatividade das organizações e movimentos de massas, designadamente para o
reforço do movimento sindical unitário e para a afirmação da sua natureza de
classe e princípios, assim como nas batalhas eleitorais realizadas, entendidas
também como uma importante campanha de esclarecimento e mobilização contra a
política de direita, o PCP,
confirmando-se como grande partido nacional, interveio em todas as dimensões da
vida nacional, afirmando a sua identidade própria e o seu projecto para um país
mais justo, fraterno e solidário.
O papel do PCP na dinamização e reforço da unidade dos
democratas e da sua acção, construído num alargado debate, reflexão e diálogo -
no quadro de uma relação baseada no respeito recíproco pela diversidade de
opiniões e pontos de vista -, constitui um importante factor para a construção
de um vasto movimento de opinião na defesa do regime democrático e das
liberdades, na afirmação da soberania e independência nacionais, na exigência
de uma ruptura com a política de direita e na identificação de caminhos e
soluções capazes de dar resposta aos principais problemas do país.
Pela sua profunda ligação e identificação com os anseios dos
trabalhadores e das massas populares, pela sua acção e intervenção política,
pelo firme combate à política de direita e a clara exigência de uma ruptura com
a mesma, pela sua contribuição para o alargamento da consciência política,
ideológica e de classe das massas populares, o PCP
confirmou-se como a mais importante força de oposição à política de direita, e
deu expressão política à frente social que a ela se opõe.
6. Batalhas eleitorais
Nas condições concretas de acção e luta do PCP
consideradas no Programa de uma «Democracia Avançada no limiar do século XXI»,
as eleições - quer do ponto de vista da intervenção quer dos
resultados - assumem uma importância que, devendo ser realçada, exige, simultaneamente, a compreensão de que não
constituem, por si só, factores exclusivo de avaliação e influência do Partido,
nem ajuízam da sua orientação e projecto.
Mais do que um fim em si, tal como são concebidas pelos partidos da
burguesia, as eleições têm de ser assumidas como uma frente de luta e de
intervenção, convergente com os objectivos e a acção geral do PCP,
dela beneficiando e para ela contribuindo. A intervenção eleitoral constitui, e
deve ser, assim, assumida como um importante espaço de acção política e de
contacto com as massas, capaz de contribuir para a afirmação das propostas e
projecto do PCP e para a elevação da consciência
social e política do povo.
Sendo verdade que, devido a factores de conjuntura, nem sempre o reforço
orgânico do Partido se traduz em reforço da influência eleitoral, é inegável a
importância do reforço da organização do Partido na criação de melhores
condições para ampliar a base de apoio e influência eleitorais.
A
importância da intervenção eleitoral e dos resultados eleitorais decorre sobretudo de três
razões: da que directamente resulta das possibilidades de intervenção
institucional, do peso maior ou menor na condução de políticas, dos meios que
indirectamente propiciam para lá do estrito limite da intervenção
institucional; dos reflexos na confiança e perspectivas do colectivo partidário
face aos resultados e à leitura que deles é feito, sobretudo pelos nossos adversários;
dos condicionamentos sobre as massas desses mesmos resultados e das condições
que daí resultam para a capacidade de atracção e de credibilização como força
que conta.
Os resultados eleitorais são, comprovadamente, uma
expressão parcelar e limitada da real influência política e social do PCP. A não correspondência
mecânica entre a influencia social e, em alguns casos política, e a influência
eleitoral, radica num conjunto de factores objectivos e subjectivos. Desde logo, os que resultam,
num quadro de democracia burguesa, dos meios dominantes (ideológicos, materiais
e económicos) em presença, entre os quais avulta o papel jogado pelos
principais grupos de comunicação social; os que resultam dos factores
condicionantes de natureza social, económica, de propriedade e filosófica onde
se alimentam os preconceitos, se reflectem as dependências e coacções
económicas e se cultivam valores éticos e políticos contrários ao nosso
projecto. E, finalmente, por dinâmicas construídas que subjectivamente animam
falsas soluções e condicionam a livre opção eleitoral, como sejam os fenómenos
de bipolarização, a promoção e valorização do efémero e das falsas soluções
(onde a alternância se afirma), o estímulo à política espectáculo (labirinto
onde o rigor e a verdade se perdem e desvalorizam), a campanha anti-partidos
(cujo alcance está para lá dos resultados eleitorais), a redução de eleições a
quem ganha ou perde, de que a manobra da «eleição para primeiro-ministro» é
exemplo recorrente.
A insistente procura pelos partidos dominantes da
manipulação dos sistemas eleitorais e da sua adequação instrumental aos
objectivos de classe que pretendem perpetuar, constitui uma clara expressão de
como encaram as eleições: úteis enquanto servirem os seus interesses e os
resultados contribuírem para prosseguir a sua política. É neste quadro que têm
de ser entendidos os projectos de alteração das leis eleitorais para a
Assembleia da República e para as autarquias, destinados a reduzir, ou
subverter, o princípio da proporcionalidade e a favorecer artificialmente a
criação de maiorias, mesmo quando os eleitores as negam com o seu voto. A luta
contra as alterações às leis eleitorais e pelo reforço da sua
proporcionalidade, já hoje notoriamente diminuída com a redução progressiva do
número de deputados, constitui uma importante batalha em defesa da democracia e
de combate aos projectos de dominação do grande capital.
As
eleições legislativas de Fevereiro de 2005 traduziram-se na concretização de dois dos principais
objectivos inscritos pelo PCP: o aumento de votação e expressão eleitoral da CDU e a
confirmação pelo voto da derrota dos partidos da direita. O resultado obtido
pela CDU - 7,6% e mais de 432 mil votos, correspondendo a um aumento de 54 mil
votos -, verificando uma importante inversão da quebra eleitoral registada nas
últimas eleições, é particularmente significativo pelo facto de ter passado a
ser a terceira força eleitoral, no quadro de uma evolução positiva no número de
votos em todos os distritos e regiões autónomas. Esta votação traduziu-se num
aumento da sua representação parlamentar, tendo passado de 12 para 14
deputados, sendo de assinalar - apesar da redução de um deputado em Setúbal,
embora com um quadro de reforço de votos - a eleição de mais um deputado em
Lisboa, um segundo deputado no Porto e a eleição de um deputado por Braga.
Os resultados obtidos pela CDU nas eleições para as autarquias locais de Outubro de
2005 confirmaram-na como uma grande
força nacional no poder local, com uma expressiva presença nas autarquias de
todo o país e com alargadas responsabilidades pela gestão de numerosos
municípios e freguesias. São elementos particularmente significativos e
importantes da votação obtida pela CDU (que ultrapassa os 650 mil votos para as
freguesias): o aumento de votos, percentagem e mandatos; o aumento do número de
municípios de maioria, de 28 para 32; a conquista de 247 presidências de junta
de freguesia; a conquista de um número significativo de outras posições,
designadamente a obtenção de novas maiorias em freguesias; a eleição de
vereadores em municípios onde não os dispúnhamos (sendo de sublinhar a eleição,
pela primeira vez, de um vereador no Funchal e dois na Horta) e de eleitos em
assembleias de freguesias e municipais. As vitórias em municípios como o Barreiro,
Marinha Grande, Sesimbra, Alcochete, Vidigueira e Barrancos, recuperando
maiorias perdidas em eleições anteriores, ou a conquista de Peniche pela
primeira vez, assumem, sem prejuízo da perda de Estremoz, Alcácer do Sal e
Redondo, particular importância. Comprovando estes avanços constitui um dos
principais elementos destas eleições o facto de a CDU ter conquistado a posição
de primeira força na Área Metropolitana de Lisboa.
Nas eleições
presidenciais de Janeiro de
2006, marcadas negativamente pela eleição de Cavaco Silva, embora por uma
escassa margem de votos, a candidatura de Jerónimo de Sousa confirmou a justeza
da decisão tomada de apresentação de uma candidatura própria e obteve um
importante resultado - 8,6% e 470 mil votos.
Nas eleições antecipadas
para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira de Maio de 2007, a CDU registou um
crescimento do seu número de votos, obteve a sua maior votação de sempre na
região (7659 votos) e afirmou-se, ultrapassando o CDS-PP, como a terceira força
política eleitoral na região. A eleição de dois deputados pela CDU - num quadro
de uma redução em 21 do número de deputados na Assembleia Legislativa Regional
- constituiu um tão mais importante e positivo resultado quanto alcançado no
quadro de um avassalador avanço eleitoral do PSD, e de ter sido a única força
política que se revelou capaz de lhe resistir e de crescer, consolidando a sua
influência e votação.
A recuperação da representação parlamentar da CDU nas
eleições regionais dos Açores, cumprindo os objectivos traçados e mantendo, no
essencial a votação (apesar de uma ligeira subida percentual), constitui um
importante factor para a intervenção política do PCP na região. Os resultados
destas eleições traduzem ainda - como demonstram a perda de um terço da sua
votação e 7 pontos percentuais - um claro sinal de condenação ao PS e à sua
política regional e nacional.
Entre as várias eleições
intercalares para órgãos
das autarquias locais entretanto realizadas, são de destacar as que confirmaram
a CDU como força maioritária na freguesia de Vendas Novas, derrotando o
projecto de PS e PSD de inviabilizar o funcionamento daquela autarquia, e as
eleições para a Câmara Municipal de Lisboa, onde a CDU elegeu, num quadro
alterado e mais exigente de candidaturas em disputa, dois vereadores e se
confirmou como força com um projecto alternativo para a cidade de Lisboa.
A importância e significado de uma evolução eleitoral
marcada por uma continuada progressão do PCP e da CDU, desmentindo aqueles
que precipitadamente decretaram o declínio irreversível do Partido, não anulam
o conjunto de factores e razões que explicaram resultados anteriores menos
positivos nem transformam as próximas batalhas eleitorais em actos menos
exigentes, complexos e difíceis.
A justa e intensa intervenção partidária, o amplo
reconhecimento do trabalho desenvolvido pelos eleitos comunistas, o reforço
verificado da organização do Partido, a ligação aos problemas concretos e
aspirações dos trabalhadores e das populações, levam a que, ainda que com consciência
das exigências que envolve, seja com validada confiança que o colectivo
partidário enfrentará o próximo ciclo eleitoral.
A intervenção da CDU enquanto espaço de participação
democrática e de acção política de milhares de cidadãos sem filiação partidária
- a que o PCP, o PEV e a ID dão suporte político - confirma a Coligação
Democrática Unitária como um valioso factor de acção política e eleitoral, para
enfrentar os próximos actos eleitorais.
O
ciclo eleitoral de 2009, traduzido na realização de eleições europeias,
legislativas e autárquicas, constitui um exigente processo de intervenção
política e organizativa, que exigirá uma empenhada mobilização de todo o
colectivo partidário. Com um calendário ainda por definir para o seu conjunto,
estas eleições reclamam uma abordagem e intervenção integradas que, dando
resposta às especificidades de cada uma das eleições, assegure uma acção
convergente do conjunto do Partido, tendo em conta o quadro político geral que
sobre todas e cada uma delas recairá.
As
eleições para o Parlamento Europeu, a realizar em Junho próximo, são (num quadro mais
exigente decorrente da redução do número de deputados nacionais de 24 para 22),
um momento para a afirmação do trabalho e intervenção dos eleitos do PCP naquele órgão, e para dar mais
força e apoio ao Partido e à CDU na defesa dos interesses do país e da
soberania e independência nacionais, face ao reforço das orientações
neoliberais, federalistas e militaristas da União Europeia.
As
eleições para a Assembleia da República assumem particular importância na perspectiva de um
reforço do PCP e da CDU que, derrotando e penalizando as políticas de
direita do actual Governo PS, afirmem claramente a necessária ruptura com estas
orientações e dificultem manobras tendentes a apresentar falsas alternativas
que, no essencial, resgatem e façam sobreviver as mesmas políticas que tantas
dificuldades têm imposto ao povo e ao país.
O reforço e ampliação das posições do PCP e da CDU nas eleições autárquicas de 2009 contribuirão para afirmar um
projecto autárquico com provas dadas, na defesa intransigente dos interesse das
populações, na elevação das condições de vida e no desenvolvimento local. O
objectivo de concorrer a todos os órgãos municipais e ao maior número possível
de freguesias constitui, a par de um decidido alargamento unitário das suas
candidaturas, um contributo para a afirmação e ampliação da influência e
presença da CDU.
Tal como em eleições anteriores, a tentativa de apresentar listas de
Cidadãos Eleitores como candidaturas «independentes» - quando na sua larga
maioria constituem um instrumento para disfarçar alianças partidárias ou
projectos políticos pessoais - visa abrir espaço a soluções inconsistentes.
Animadas, e beneficiando simultaneamente das campanhas contra os partidos e os
políticos, estas candidaturas estão, na sua maioria, longe de preencher o
espaço de participação democrática e de intervenção de milhares de
independentes que, em torno de um projecto político claro e responsável, a CDU
representa.
O projecto autárquico do PCP é indissociável de um estilo de gestão
pelos eleitos comunistas das autarquias locais que é expressão dos objectivos,
natureza e concepção democrática e participada de exercício do poder.
A confirmação e
aprofundamento dos traços mais distintivos da acção dos comunistas nas
autarquias, com o valor que lhe é reconhecido, apresentam crescentes exigências
face à complexidade e condicionamentos que a ofensiva política contra o poder
local vem impondo à sua autonomia administrativa e financeira. Exigências que
devem encontrar resposta no reforço do trabalho de direcção do Partido, de uma
mais afirmada actividade política das organizações locais e de uma melhor
articulação entre o trabalho desenvolvido na autarquia com a acção local das
organizações do Partido e a luta das populações.
Mantêm-se válidas e actuais as principais conclusões da Conferência
Nacional do PCP «A intervenção nas autarquias e a acção
local do Partido», realizada em 2003 de que se destacam a assunção do trabalho
nas autarquias como componente da acção geral do Partido enquanto frente de
luta e acção dos comunistas; a intervenção e participação dos trabalhadores e
da população como condição essencial a uma gestão democrática; a isenção,
honestidade e entrega à defesa dos interesses das populações enquanto critério
de decisão e de conduta no exercício dos mandatos; a salvaguarda do serviço
público municipal nas áreas da competência do poder local e o combate à
alienação de funções e competências das autarquias; a permanente procura para
desenvolver uma acção marcada pela proximidade aos problemas, para estimular a
luta e elevar a consciência política e social das populações, indispensável aos
objectivos mais gerais de transformação da sociedade.
O PCP intervirá nas eleições
presidenciais de 2011 com o
objectivo de afirmar as suas próprias ideias quanto ao papel e funções do
Presidente da República, e de contribuir para que seja assegurada na
Presidência da República uma intervenção comprometida com a defesa e respeito
da Constituição da República, liberta dos interesses e posicionamentos do
grande capital.
7. O quadro partidário e institucional
A maioria absoluta obtida pelo PS, resultante sobretudo da
capitalização do vasto descontentamento com os governos do PSD/CDS-PP, constituiu
um elemento negativo quanto à concretização da necessária mudança que o país
exigiu, nas urnas e nas muitas acções de luta dos trabalhadores e das
populações.
A derrota eleitoral do PSD e do CDS-PP (que no seu conjunto
registaram a mais baixa votação de sempre), não só não se traduziu na
necessária derrota da política de direita como criou condições - com a obtenção
de uma maioria absoluta por parte do PS e da ulterior eleição de Cavaco Silva
com a «cooperação estratégica» que este lhe garante - ainda mais favoráveis aos
interesses do grande capital e à afirmação de um bloco de poder de interesses
nos principais órgãos de soberania.
Defraudadas que foram as expectativas de tantos portugueses que confiaram
no PS nas legislativas de 2005, o Partido Socialista assume-se
crescente e inequivocamente como um partido da política de direita. A
posição cada vez mais comprometida com a política de direita
por parte da direcção do PS (mau grado a procura de linhas de
demarcação assentes em questões distantes do carácter
estrutural da sua política), a cada vez maior presença na estrutura
do Estado, a crescente promiscuidade entre altos quadros do PS e as estruturas
dirigentes dos grandes grupos económicos e do capital financeiro, são
factores e posicionamentos que se agravaram nos últimos anos.
Ainda que a atitude e posicionamento do PS de hoje, na concretização
dos objectivos e interesses do grande capital, não seja substancialmente
diferente dos assumidos em outros momentos da vida nacional, a verdade é que o
PS se apresenta cada vez mais comprometido com esses mesmos interesses e cada
vez mais afastado de ser parte activa numa solução democrática que o país
necessita.
As orientações dominantes do PS, e em particular a sua política
governativa, num quadro em que se intensifica a luta de massas, têm conduzido
ao afastamento de milhares de eleitores, participantes na resistência e no
combate à política do governo, muitos deles susceptíveis de convergirem na luta
por uma alternativa política.
As movimentações de alguns sectores que procuram apresentar-se
«à esquerda» dentro do PS são sobretudo resultado
desse crescente isolamento e do descontentamento que tem gerado e das contradições
internas que provoca, inseparáveis do esforço para alimentar ilusões
e para melhor combater as possibilidades de deslocações para o
PCP. Movimentações que, recusando a exigência de ruptura
com a política de direita, e independentemente dos objectivos que as
animem - seja o propósito de travar a provável erosão eleitoral
do PS, seja o desenvolvimento de outros projectos políticos - tenderão
para assegurar as condições que permitam a sobrevivência
da política de direita.
O Partido Social Democrata, no
seguimento da derrota eleitoral de 2005 e do seu afastamento do Governo,
enfrenta um prolongado período de instabilidade e luta interna pelo poder, que
é expressão das dificuldades sentidas por este partido para encontrar e afirmar
um espaço próprio de acção e agendas políticas distinto da acção governativa do
PS. Apesar de uma permanente encenação, o PSD desenvolve o seu apoio em
matérias fundamentais à política do Governo, como aliás pode comprovar-se pelo
conjunto de acordos e pactos em matérias fundamentais na vida nacional. Seria,
no entanto, um erro concluir que o PSD - partido que conta com uma importante
expressão ao nível do poder local e na estrutura do Estado - deixou de
constituir uma das principais expressões políticas da burguesia monopolista no
nosso país, assim como o principal instrumento que esta tem para assegurar a
alternância para continuidade das políticas de direita, o seu domínio sobre o
poder político, como aliás está presente nas permanentes manobras de
branqueamento e reabilitação do PSD na vida política nacional.
O CDS-PP -
afastado que foi do governo depois das importantes derrotas sofridas no plano
eleitoral, apesar do esforço que tem feito no sentido de se desresponsabilizar
do que de pior fizeram os governos de Durão Barroso, Santana Lopes e Paulo
Portas e, também aqui, do continuado branqueamento da sua política (contando
para isso com uma ampla cobertura mediática) - regista uma perda na sua
influência política e social, confirmada também por uma cada vez mais
inexpressiva presença autárquica (na maioria dos casos garantida por coligações
com o PSD).
O CDS-PP, confirmando a sua
natureza reaccionária e populista e a sua identificação com os sectores mais
retrógrados e anticomunistas da sociedade, mantém, pelo seu posicionamento e
pelo papel que o grande capital lhe atribui, a possibilidade de integrar
soluções governativas que garantam, com PS ou PSD, a continuidade da política
de direita.
O Bloco de Esquerda, sob a
capa de uma nebulosa indefinição do seu posicionamento ideológico e de classe,
caracteriza-se fundamentalmente pelo seu carácter social-democratizante,
disfarçado por um verbalismo e radicalismo esquerdizante, herdado das forças
que lhe estiveram na origem, e por uma atitude determinada em muitos casos pelo
anticomunismo.
Beneficiando de uma continuada
promoção mediática e de uma importante aposta dos centros de decisão políticos
e económicos - apesar do esbatimento da sua imagem de modernidade e novidade -,
registou um aumento da sua representatividade institucional.
O BE, com uma actividade assente em grande medida numa opção
pelo acessório e pela busca de protagonismo mediático, regista crescentes
cumplicidades e alinhamentos com a agenda política do PS, de que são exemplo a
imposição do Referendo sobre a IVG, os acordos para a Câmara Municipal de
Lisboa ou a Lei da Paridade.
O Partido Ecologista «Os Verdes» tem vindo a realizar uma acção ecologista cada vez mais activa e a
alargar a sua contribuição no plano político e institucional - apesar de ver a
sua iniciativa política sistematicamente silenciada na comunicação social -,
que se estende muito para além da sua participação na CDU, e que é
susceptível de captar e envolver sectores progressistas e democráticos da
sociedade.
Uma intervenção qualificada que,
privilegiando as grandes questões ecológicas e os problemas do ambiente,
abrange também as grandes questões sociais e económicas do país e do mundo,
reforça a afirmação do seu prestígio e identidade e constitui também factor de
alargamento e reforço da CDU.
8. A alternância enquanto condição
de perpetuação da política de direita
A bipolarização do sistema
partidário e instrumentalização dos grandes meios de comunicação social ao
serviço da ideologia e da estratégia das classes dominantes; o domínio das
instituições do Estado por forças políticas que, não se diferenciando nas
questões essenciais, competem entre si apenas para assegurar o comando das
políticas e do poder; as sistemáticas manobras correspondentes à artificial
dramatização e bipolarização eleitorais e à recorrente mistificação de reduzir
as eleições a um objectivo - a pretensa eleição de um primeiro-ministro; têm
servido para garantir a sobrevivência de eixos essenciais das políticas de
direita.
A alternância na partilha do poder
nos principais órgãos do Estado entre PS, PSD e CDS-PP funciona, assim, como
forma de garantir a perpetuação da política de direita, verdadeiro seguro de
vida dos interesses dos grandes grupos económicos e do capital financeiro,
fonte da recuperação monopolista e de acentuação da exploração, das
desigualdades, da dependência e das injustiças no nosso país.
A realidade confirma que é pela
acção política do PCP e pela
organização e intervenção directa das massas que os trabalhadores e o povo
melhor poderão compreender a importância da acção colectiva, e adquirir a
consciência social e política necessária para as transformações estruturais da
sociedade que rompam com a actual política, sem as quais os seus problemas e os
do país não serão resolvidos.
9. As contradições resultantes da
política de direita e o espaço aberto à redução
da sua base de apoio
Tal como já tinha acontecido com o
PSD e o CDS-PP, em que, fruto das políticas de direita, viram a sua base de
apoio, nos planos social, político e eleitoral, reduzida a valores que, no
plano eleitoral, representaram as maiores perdas de sempre destes partidos no seu
conjunto, também o PS está hoje confrontado com a crescente participação na
luta social e política de sectores que tradicionalmente o apoiam, como
consequência do prosseguimento da política direita, em flagrante contradição
com os interesses dos trabalhadores e das populações.
O conjunto das acções de massas
realizadas, particularmente nos últimos dois anos, quer pela sua dimensão, quer
pela sua diversidade, confirma que continua em formação e em movimento uma
vastíssima e poderosa frente social, abrangendo classes e camadas
antimonopolistas, e que
estão abertas as possibilidades não apenas de redução da base social de apoio à
política de direita, mas também de reforço do Partido.
10. A luta por uma alternativa de esquerda
Integrante da etapa de luta pela construção de uma
democracia avançada inserida na perspectiva de uma sociedade socialista, a luta
por uma alternativa política de esquerda é, em si mesma, inseparável de uma
política alternativa que, inspirada nos valores e nos ideais de Abril, assuma e
concretize a ruptura com a política de direita que tem vindo a ser
protagonizada por PS, PSD e CDS-PP.
No quadro actual, considerando a necessidade e a perspectiva
de construção de uma alternativa de esquerda - um processo complexo e
eventualmente prolongado - e, não podendo deixar de pesar negativamente nesta
avaliação, uma postura e atitude do PS, cada vez mais enfeudadas à política de
direita e aos interesses do grande capital e mais distante de uma solução
democrática, são condições determinantes - articuladas e inseparáveis entre si
- para a concretização de uma alternativa política de esquerda: o reforço do PCP com a ampliação decisiva da
influência social, política e eleitoral; o vigoroso desenvolvimento da luta de
massas que, na base da articulação da luta a partir de objectivos concretos das
várias organizações e movimentos de massas, conflua para a criação de uma vasta
frente social que exija a ruptura com a política de direita e reclame uma
política de esquerda ao serviço do povo e do país; e a correspondente alteração
no plano institucional da correlação de forças entre o PCP e o PS favorável ao PCP, alteração que o reforço do Partido
e o movimento de massas determinará.
A luta por uma alternativa de
esquerda não contradiz, antes reclama, uma firme denúncia da política de
direita praticada pelo PS, do seu papel na destruição das conquistas de Abril e
na reconstituição do capitalismo monopolista, das suas responsabilidades
perante o actual agravamento da situação económica e social, assim como o
combate a todas as operações, mais ou menos declaradas, que visam o seu
branqueamento e o da social-democracia. O alargamento e mobilização de uma
vasta frente social de oposição à política de direita é, a par da
responsabilização do PS pelo prosseguimento e aprofundamento dessa política,
uma condição essencial da luta por uma alternativa.
Alternativa de esquerda será tanto
mais próxima quanto maior for o reforço do Partido, da sua ligação aos
trabalhadores e a outras camadas e sectores não monopolistas e da sua
influência política, social e eleitoral,
quanto mais intensa e dinâmica for a luta de massas, quanto mais ampla for a
frente social de luta.
O
PCP, reafirmando o seu empenhamento no diálogo, na convergência
e cooperação das forças, sectores e personalidades democráticas que, séria e
convictamente, estejam empenhados numa ruptura com a política de direita e na
construção de uma alternativa de esquerda no quadro do actual regime
democrático e constitucional, não está, nem estará, disponível para ser instrumento
ou cúmplice de um governo ou políticas que mantenham orientações estruturantes
da política de direita.
O
PCP, assumindo perante os trabalhadores e o povo a sua
disponibilidade e aptidão para exercer as mais elevadas responsabilidades que
estes lhe atribuírem, possuindo propostas próprias para uma política
alternativa de esquerda, reafirma que a sua intervenção e luta se inserem na
perspectiva de concretização do seu Programa.
11. Um PCP mais forte. Condição
fundamental para a alternativa de esquerda
A vida comprovou que não há alternativa
política nem política alternativa sem o PCP. A questão
mais urgente, mais necessária e mais decisiva para tornar sólida e credível a
construção de um outro rumo para a vida política nacional é o reforço do PCP e da sua
influência social, política e eleitoral.
Reforço que reclama uma mais
profunda ligação aos trabalhadores e às populações, uma mais activa acção e
iniciativa políticas, um papel mais enérgico na dinamização da luta da classe
operária e dos trabalhadores, mas também da juventude, das mulheres, dos
agricultores, dos intelectuais e quadros técnicos, dos pequenos e médios
empresários, de todos os que sentem a marca injusta da política de direita
realizada contra os seus direitos e interesses.
Reforço inseparável da ampliação da corrente
dos que partilham da convicção de que há um outro caminho e outro rumo, e que,
para os conquistar, o que mais conta e contará é a sua opinião, vontade e luta.
Reforço da expressão daqueles que vêem e
identificam no PCP a força mais
consequente e capaz, não apenas para dar combate à política de direita, mas
também para assumir as mais elevadas responsabilidades na construção de uma
alternativa política de esquerda ao serviço do povo e do país.
Portador de um projecto revolucionário, transformador e emancipador,
o PCP, fiel ao seu percurso de intervenção combativa e coerente
em defesa dos trabalhadores e do povo, assume-se como força incontornável
na construção de uma alternativa política que abra um caminho
de justiça, progresso social e soberania nacional de que Portugal precisa.
IV - O Partido
0. Introdução
1. O PCP entre o XVII e o XVIII Congressos
2. Condições em que lutamos, exigências e potencialidades
3. A actualidade do projecto comunista e a identidade do Partido
4. O Reforço do Partido, tarefa decisiva
5. Direcção
6. Quadros
7. Organização
8. Acção política, ligação às massas e alargamento da influência
do Partido
9. Informação e propaganda
10. Luta ideológica
11. Fundos
12. Actividade internacional
13. Nota final
0. Introdução
Desde o XVII Congresso, num quadro de grande exigência no plano político
e ideológico, o Partido desenvolveu uma intensa e diversificada actividade e
intervenção contra a política de direita do Governo PS/ Sócrates, em defesa dos
trabalhadores e do povo e do regime democrático consagrado na Constituição. A
acção do PCP foi determinante para a dinamização da luta
de massas, em articulação com a intervenção nas instituições.
O PCP cresceu, reforçou-se, aumentou a sua
influência política, social e eleitoral e afirmou-se como o grande Partido da
classe operária e de todos os trabalhadores.
Existindo insuficiências e dificuldades que importa ultrapassar, a
experiência recente comprova que é possível consolidar e fazer crescer a
organização, elevar a militância, alargar a acção e a intervenção política das
organizações e tornar o Partido mais forte, condição indispensável para o
prosseguimento da luta pela ruptura com a política de direita, por uma
alternativa de esquerda, pela democracia avançada e pelo socialismo.
1. O PCP entre o XVII e o XVIII Congressos
A realidade confirmou, perante a agudização da luta de classes, os
crescentes condicionamentos à liberdade e à democracia, a ofensiva geral contra
conquistas e direitos, a importância e papel do Partido Comunista Português.
O PCP esteve de uma forma inigualável na luta
contra as alterações à legislação laboral, pelo aumento dos salários e contra a
precariedade, com destaque para a Greve Geral de 30 de Maio de 2007 e para as
manifestações nacionais convocadas pela CGTP-IN; defendeu os direitos e as
liberdades; defendeu o direito à saúde, à educação, à justiça, à água pública,
aos transportes e acessibilidades, à segurança; combateu o encerramento e a
privatização de serviços públicos, assim como o desfiguramento da segurança
social pública e universal; lutou contra o aumento do custo de vida, traduzido
na subida dos preços de bens e serviços essenciais; exigiu a criação de
emprego; defendeu o aparelho produtivo, a produção nacional, a soberania
alimentar e a investigação científica; combateu as privatizações e defendeu a
presença dominante do Estado em sectores estratégicos da economia nacional;
defendeu a soberania nacional, combateu o chamado «Tratado de Lisboa» e
bateu-se pela realização de um referendo; exigiu o fim das desigualdades e
discriminações entre homens e mulheres e empenhou-se na vitória do Sim no
referendo sobre a IVG; opôs-se ao envolvimento de Portugal nas guerras de
agressão e ocupações imperialistas; combateu os ataques à liberdade e à
democracia; propôs uma ruptura com a política de direita e uma nova política ao
serviço do povo e do país.
O PCP interveio em importantes batalhas
eleitorais, como as eleições legislativas, regionais, autárquicas e
presidenciais, com resultados positivos e a realização de grandes campanhas
políticas de massas, integrando múltiplas e diversificadas iniciativas, das
quais se destaca o comício de 14 de Janeiro de 2006, no âmbito das
eleições presidenciais, com a participação de mais de 25 mil pessoas, que
fizeram transbordar o Pavilhão Atlântico.
No quadro da ligação dialéctica entre a acção de massas, a acção
institucional e a intervenção política geral, dirigindo-se aos trabalhadores,
às populações e a importantes sectores e camadas sociais, com destaque para as
mulheres, a juventude, os reformados, os micro e pequenos empresários, os
pequenos e médios agricultores, estimulando a criação e fortalecimento dos seus
movimentos e organizações de massas e dinamizando a sua luta, o Partido
promoveu uma ampla iniciativa política.
O PCP desenvolveu importantes campanhas políticas
de massas, apoiadas em materiais de propaganda e em vendas especiais do Avante!, com regular presença nas empresas e locais de trabalho e junto das
populações, como as acções nacionais «Não ao aumento da idade da reforma»,
«Direito à reforma, as pensões não podem baixar», «A saúde é um direito não é
um negócio», «Basta de injustiças, mudar de política para uma vida melhor»,
«Código do Trabalho: Basta de exploração», «Portugal precisa, o PCP propõe», «Não ao Tratado da União Europeia»
e «É tempo de lutar, é tempo de mudar: mais força ao PCP»; realizou uma intensa e diversificada
actividade com iniciativas políticas, audições, debates, convívios, reuniões,
plenários e assembleias das organizações; comemorou com grande expressão os
aniversários do Partido e do Avante! (salientando-se
respectivamente o 85º e o 75º assinalados em 2006); realizou, com notável
êxito, a Festa do Avante!; promoveu
encontros nacionais sobre questões como as eleições legislativas, a saúde, a
educação, a agricultura, os reformados, a administração pública, o movimento
associativo popular, a protecção civil, os micro, pequenos e médios
empresários, os direitos das mulheres, a cultura e os 20 anos de adesão de
Portugal à UE; acolheu em Portugal o Encontro Internacional Partidos Comunistas
Operários, reuniões do seu grupo de trabalho e outras iniciativas
multilaterais; assinalou os 160 anos do Manifesto do Partido Comunista, o 90º
aniversário da Grande Revolução Socialista de Outubro, o 60º Aniversario da
derrota do nazi-fascismo, os 150 anos do nascimento de Clara Zetkin, o
centenário do nascimento de Lopes Graça; promoveu acções de valorização da
resistência antifascista, sobre o 30º aniversário da Constituição e de
comemoração do 25 de Abril.
O processo de preparação e a realização da Conferência Nacional do PCP sobre questões económicas e sociais, que decorreu em Novembro de 2007 sob o
lema «Por uma nova política ao serviço do povo e do país», constituiu - pela
participação de milhares de membros do partido, pela audição de dezenas de
estruturas representativas de sectores da vida económica e social e, sobretudo,
pelo apuramento e consolidação de um vasto património de análise e proposta
para os principais problemas do país - um momento de extraordinária importância
na projecção da necessidade da ruptura com a política de direita e de afirmação
de uma política alternativa.
Acompanhando um intenso desenvolvimento da luta de massas, o PCP realizou, a 1 de Março de 2008, a Marcha
Liberdade e Democracia, iniciativa que contou com mais de 50 mil
participantes, comunistas e outros democratas, que constituiu, a par de um
momento de grande afirmação partidária, uma oportuna resposta à degradação do
regime democrático, aos ataques à liberdade e à democracia, ao carácter
antidemocrático das leis dos partidos e do seu financiamento, em si
inseparáveis da ofensiva geral da política de direita no plano económico e
social.
A grandiosa homenagem ao camarada Álvaro Cunhal, após o seu
falecimento, traduz um profundo reconhecimento pelo seu papel e intervenção
política, ideológica, cultural e partidária, e é expressão de um largo
sentimento de identificação com os valores e ideais de Abril e o enraizamento
popular do PCP.
2. Condições em que lutamos, exigências
e potencialidades
O PCP pela sua
natureza, objectivos e intervenção, enfrenta um ataque continuado das forças
afectas ao grande capital que visam o seu enfraquecimento e liquidação. Um
objectivo de sempre que não conseguirão concretizar.
O regime fascista com a sua acção repressiva
não o conseguiu, como não conseguiu evitar o crescimento do Partido, o
alargamento da sua influência na sociedade portuguesa e em especial junto dos
trabalhadores. Nesses longos anos na clandestinidade, o PCP organizou a sua
actividade com base nos princípios leninistas de funcionamento orgânico e
independência ideológica, política e financeira. Estes princípios foram determinantes
para assegurar a natureza e independência de classe do Partido e avançar com
determinação no combate contra o fascismo, pela liberdade e a democracia. E
revelaram-se, pela sua contribuição para a coesão e a força do Partido,
decisivos para a Revolução de Abril e as suas grandes conquistas, para a luta
em sua defesa e pelo aprofundamento da democracia e a melhoria das condições de
vida do povo.
O grande capital nunca escondeu o seu ódio
de classe contra o PCP. As leis em vigor sobre os partidos, o seu
financiamento e as campanhas eleitorais, são expressão do seu objectivo de
enfraquecer e destruir o PCP.
Numa correlação de forças que lhe é
favorável, com a cumplicidade e a autoria material do PSD, CDS-PP e PS, o
grande capital procurou impor ao PCP o modelo daqueles
partidos, visando ingerir-se na sua vida interna e retirar aos seus militantes
o poder de decidir soberanamente sobre o funcionamento e actividade do seu
partido.
Estas leis criam dificuldades e restrições
ilegítimas e abusivas à angariação de fundos e são dirigidas ao PCP, o único partido
que concretiza iniciativas de massas que são simultaneamente fonte importante
de receitas, como demonstra o ataque sistemático de que tem sido alvo a Festa
do Avante!. É fundamental prosseguir a luta pela
revogação destas leis, nomeadamente denunciando os seus objectivos junto das
massas populares, como parte integrante da intervenção do Partido em defesa da
liberdade e da democracia.
No ataque ao regime democrático, a ofensiva contra o PCP é um elemento central que se desenvolve com
a participação de forças diversas, unidas pelo anticomunismo. No quadro do
agravamento da situação económica e social e do crescendo da resistência dos
trabalhadores e do papel determinante desempenhado pelo PCP nesse combate, o anticomunismo ganhou nova
relevância e virulência, assumindo formas cada vez mais sofisticadas no arsenal
da grande burguesia e das forças que a servem. É o anticomunismo que dá
sustentação ideológica à ofensiva reaccionária contra o Partido.
Para além da acção quotidiana de ocultação, manipulação e deturpação na
comunicação social dominante que visa silenciar, diminuir ou desvirtuar a
intervenção e as propostas do PCP,
alimentar preconceitos e impedir o crescimento da sua influência, tem ganho peso
crescente nesta ofensiva a tentativa sistemática de impedir o exercício dos
direitos democráticos mais elementares pelo Partido, pela JCP e pelas
organizações de massas. São expressão desta ofensiva o abuso da autoridade e
manipulação das forças policiais para reprimir ou condicionar os direitos de
manifestação e acção política, sindical e de greve, a chantagem económica, o
despedimento ilegal e supressão dos direitos de quem luta, o ataque ao direito
de propaganda com a sua destruição sistemática, a tentativa de imposição de
regulamentos contrários à Lei e a crescente judicialização da vida política.
O assalto à democraticidade e proporcionalidade das leis eleitorais, que
até ao momento PS e PSD não tiveram condições para aprovar, mantém-se como
objectivo prioritário da ofensiva contra o PCP.
Os argumentos usados do «descrédito da política» e de «aproximar os
cidadãos da política» visam iludir as responsabilidades do PS e PSD pela
situação do país e criar condições para se perpetuarem no poder, com recurso à
«bipolarização» forçada e à batota eleitoral.
O PCP continuará a lutar em defesa e
aprofundamento do regime democrático e a assumir a intervenção nos processos
eleitorais como importante frente de luta que pode contribuir para a afirmação
e o crescimento do apoio às propostas e ao projecto do Partido, avaliando a
importância da dimensão eleitoral como um dos elementos significativos da
influência do PCP e não perdendo de vista que esta traduz
apenas uma expressão limitada e parcelar da real força do Partido.
3. A actualidade do projecto comunista e a identidade
do Partido
A situação da Humanidade neste século XXI mostra claramente que o
capitalismo não só não resolve as suas contradições insanáveis, que condenam ao
obscurantismo, à fome, à doença e à exploração milhões de seres humanos, como
agrava o seu carácter explorador, opressivo e promotor da guerra.
Num tempo em que os avanços e conquistas da ciência, da técnica, do
conhecimento e das artes, possibilitariam, se postos ao serviço da Humanidade,
níveis de desenvolvimento e emancipação nunca antes experimentados, reforça-se
a justeza e actualidade do projecto comunista e a necessidade da luta por uma
sociedade liberta da exploração do homem pelo homem.
É neste quadro, nacional e internacional, que o PCP, partido que se orgulha da sua história na
luta contra o fascismo, pela democracia e pela liberdade, reafirma a sua
determinação em concretizar o seu projecto, libertador e humanista.
A identidade do Partido é indissociável do seu projecto e está definida
no Programa e nos Estatutos, como base da sua organização, intervenção e
objectivos. São características fundamentais da identidade do Partido:
O seu
objectivo da construção da sociedade nova, liberta da exploração do Homem pelo
Homem, sem classes sociais antagónicas, discriminações, desigualdades e
injustiças sociais, em que a democracia seja realizada nas suas vertentes
política, social, económica e cultural, em que as massas populares intervenham
de forma criadora em todos os aspectos da vida, em que o bem-estar do povo seja
constantemente elevado - o socialismo e o comunismo;
A sua
natureza de classe, como partido e como vanguarda da classe operária e de todos
os trabalhadores, que se reflecte na sua composição e na estreita ligação à classe
operária, a todos os trabalhadores e ao povo em geral;
A sua
base teórica, o marxismo-leninismo, concepção materialista e dialéctica do
mundo, instrumento científico de análise da realidade, guia para a acção,
ideologia crítica e transformadora, sistema aberto, contrário à dogmatização e
à revisão oportunista dos seus princípios e conceitos fundamentais que, em
ligação com a vida, constantemente se enriquece e renova;
A sua
estrutura orgânica e princípios de funcionamento que assentam no desenvolvimento
criativo do centralismo democrático, de que são características básicas uma
profunda democracia interna, uma única orientação geral e uma única direcção
central;
O seu
carácter de partido patriótico e internacionalista, numa concepção articulada e
indissociável de tarefas nacionais e deveres internacionalistas.
Para que o Partido possa cumprir os seus objectivos, é necessário que
seja independente da influência, dos interesses, da ideologia e da política das
forças do capital.
A independência de classe é condição indispensável à afirmação da
identidade do Partido, revelando-se e afirmando-se nos seus objectivos e na sua
teoria e prática revolucionárias.
A independência do Partido afirma-se também pela adopção de princípios
orgânicos que garantem uma profunda democracia interna, uma única direcção
central e uma única orientação geral, coesão e ligação às massas. A coesão do
Partido pressupõe o compromisso em torno de princípios e o trabalho colectivo
como aspecto essencial da democracia interna e factor de unidade e disciplina -
elementos distintivos do estilo de trabalho do PCP.
A autonomia e independência da acção política do Partido exigem que
conte com as suas próprias forças, a sua organização, a sua imprensa, os seus
quadros e militantes, os seus fundos, património e meios de propaganda. Num
contexto de desproporção de meios entre o PCP e os outros partidos, em que o
silenciamento e a discriminação do Partido se acentuam, em que leis e
regulamentos antidemocráticos procuram limitar a liberdade de organização,
expressão e intervenção do PCP,
os meios próprios revestem-se de uma importância fundamental.
A unidade interna é um dos factores determinantes da força orgânica, da
influência e da capacidade de mobilização de massas do PCP. A não permissão de fracções ou actuação
dentro do Partido como grupo organizado, a recusa de que os seus membros
expressem publicamente opiniões contrárias à orientação do Partido, a não
aceitação da possibilidade de escolher quais as decisões a cumprir e a não
cumprir, são elementos decisivos da disciplina e solidez do Partido.
O Programa e os Estatutos do PCP são instrumentos actuais e indissociáveis a
afirmar, compreender, estudar, aplicar e desenvolver em ligação com a
intervenção e a luta quotidianas. Por definirem a identidade do Partido e por
terem origem na história e na experiência de luta do PCP, têm valor revolucionário e são garantia da
sua independência.
Os Estatutos, que foram objecto de alteração no XVII Congresso,
respondem às necessidades da vida partidária. Contêm princípios orgânicos
revolucionários, provados na prática e em constante aperfeiçoamento.
O Programa do Partido, aprovado no XIV Congresso, é válido para uma
larga etapa histórica e propõe ao povo e ao país uma democracia avançada, que
visa resolver muitos dos graves problemas actualmente existentes, e aponta o
socialismo como futuro de Portugal.
4. O Reforço do Partido, tarefa decisiva
O XVII Congresso apontou a realização de uma nova fase do movimento
geral de reforço da organização partidária sob o lema «Sim, é possível! Um PCP mais forte». Com o objectivo de concretizar
um profundo avanço na agregação, funcionamento colectivo, estruturação e
capacidade de intervenção, definiu as orientações fundamentais para o seu
reforço, a concretizar de forma integrada.
O XVII Congresso constituiu um importante estímulo à afirmação
partidária que se reflectiu na acção de reforço do Partido. O movimento geral
de reforço da organização partidária traduziu-se, nestes anos decorridos, numa
linha de trabalho das organizações e militantes que, com o seu forte empenho,
permitiu alcançar os avanços mais significativos das últimas duas décadas no
reforço da organização partidária.
O período que decorreu desde o XVII Congresso comprovou na prática que
não só é necessário como é possível um PCP mais forte. Concretizou-se um real
progresso na direcção, organização e afirmação partidárias e uma coerente,
corajosa, intensa e diversificada acção partidária.
A persistência de insuficiências, dificuldades e atrasos e o facto de se
estar aquém das necessidades em diversas matérias, não anulam o grande alcance
dos passos dados.
Estando o reforço da organização profundamente ligado à concretização do
papel e da acção política do Partido visando a sua elevação, o trabalho
realizado contribuiu para alargar a compreensão da importância da definição de
objectivos, planificação e programação da acção de reforço do Partido, da
adopção de medidas específicas e do seu controlo de execução, do contributo
concreto dos quadros e militantes na direcção e concretização deste trabalho. O
estabelecimento de orientações, a decisão de objectivos anuais e o seu controlo
de execução, designadamente os expressos nas resoluções do Comité Central de 11
e 12 de Novembro de 2005, de 12 e 13 de Janeiro e de 14 e 15 de Dezembro de
2007 sobre o reforço do Partido, são elementos indissociáveis dos avanços
verificados.
O reforço do PCP é
um objectivo de sempre, alicerçado nas necessidades actuais e numa confiante
perspectiva de futuro. Por Abril, pelo Socialismo, o Partido Comunista
Português é o partido que os trabalhadores, a juventude, o povo e o país
precisam. O XVIII Congresso dirige-se aos jovens, aos trabalhadores e ao povo
português para que apoiem o PCP e
alarguem a sua influência, para que adiram ao PCP e tomem o seu lugar no colectivo partidário
e na luta.
A situação de Portugal e do mundo, ainda mais justifica e exige um PCP mais forte. Analisando a actual situação,
as acrescidas exigências que se colocam nos próximos anos, o XVIII Congresso
lança, com uma concepção global e integrada, a acção geral de fortalecimento do
Partido, sob o lema «Avante! por um PCP mais forte» e apela ao colectivo partidário, a todos os
militantes e organizações para que concretizem esse objectivo de um PCP mais forte que se expressa nos diversos
planos da organização e intervenção partidárias.
5. Direcção
A resposta positiva dada pelo trabalho de direcção teve por base o
reforço do trabalho colectivo, a participação e iniciativa de milhares de
quadros, elemento central dinamizador da intervenção do colectivo partidário.
Exigiu capacidade de direcção, afirmação estratégica, planificação,
flexibilidade táctica e combinação de grandes acções políticas de âmbito
nacional com a iniciativa das organizações partidárias. Apesar de
insuficiências que se mantêm os avanços são significativos.
O XVII Congresso criou uma nova dinâmica que é necessário projectar no
futuro. O XVIII Congresso é chamado a tomar decisões e definir orientações,
para responder às novas exigências da afirmação e reforço do Partido, da sua
organização e projecto, numa fase em que à resistência se associa a iniciativa
e avanço e em que o Partido tem que estar preparado para cumprir o seu papel
insubstituível mesmo nas condições mais difíceis.
Torna-se indispensável prosseguir e aprofundar a reflexão e a adopção de
medidas relativamente ao conjunto das estruturas de direcção e ao seu
funcionamento, em articulação com a política de quadros e a formação política e
ideológica, com a organização, com os meios financeiros, com a propaganda e a
intervenção política. É ao mesmo tempo essencial prosseguir um estilo de
trabalho baseado nos princípios do Partido, nomeadamente: no trabalho e
direcção colectivos, associados à responsabilização individual, em ligação
estreita com as organizações, os militantes e as massas; no reforço da
disciplina partidária, assumida como forma natural de agir; no rigor na
actividade e no funcionamento; na crítica e na autocrítica; na planificação e
programação, associada a uma capacidade de resposta flexível; e num regular
controlo de execução, instrumento de avaliação e aperfeiçoamento da acção.
O Comité Central que realizou 23 reuniões, cumpriu o papel de direcção
superior do trabalho partidário, destacando-se as suas decisões em momentos
particularmente importantes, registando-se a necessidade de ampliar a
contribuição dos seus membros, a discussão e o pronunciamento mais frequentes
sobre matérias específicas.
O Comité Central
eleito pelo XVIII Congresso mantém as características do que cessou funções,
nomeadamente no que se refere às suas competências e dimensão, a qual tem
alguma redução. Quanto à sua composição, no quadro da renovação e
rejuvenescimento, o Comité Central, reflectindo a identidade, natureza e
princípios do Partido, mantém uma larga maioria de operários e empregados, com
forte componente operária. Foi assegurada a participação de quadros do Partido
- funcionários e não funcionários - responsáveis por grandes organizações e
sectores da actividade partidária, vindos directamente de empresas e locais de
trabalho e outros quadros, integrantes de movimentos de massas, com destacada
intervenção e diversidade de conhecimentos em importantes áreas da vida social,
económica, cultural, técnica, intelectual, cientifica, bem como uma reforçada
participação de mulheres e de jovens.
A estrutura da direcção central baseada na Comissão Política e no Secretariado (que asseguram a
direcção do trabalho executivo), acompanhada pela Comissão Central de Controlo
(CCC) nas suas funções específicas, mostrou-se adequada. A orientação geral
única e o papel do Comité Central e dos organismos executivos na sua definição,
bem como na direcção geral do trabalho partidário, no quadro das suas
competências, são elementos que importa continuar a sublinhar.
As Direcções das Organizações Regionais (DOR) confirmaram o seu importante e
positivo papel na direcção do trabalho partidário na sua esfera de
responsabilidade e na articulação entre o trabalho da direcção central e as
organizações partidárias. As 21 DOR existentes são compostas por 820 camaradas.
Mantendo-se a avaliação positiva da existência de organismos de direcção amplos
(com os organismos executivos respectivos) é de contrariar a tendência para um
alargamento excessivo.
Os organismos intermédios de direcção (comissões concelhias, organismos
de direcção de sectores profissionais e de empresas, comissões de freguesia,
entre outros) tiveram um
desenvolvimento positivo, designadamente na assunção das suas responsabilidades
próprias e na dinamização do trabalho partidário, em particular na acção junto
dos trabalhadores e das massas populares. O seu fortalecimento constitui uma
prioridade, de modo a vencer estrangulamentos no aproveitamento da militância e
a desenvolver o trabalho partidário. É indispensável alargar o seu número,
prosseguir na elevação do seu papel e responsabilidades próprias, no trabalho
colectivo, na responsabilização individual dos seus membros (assegurando que
cada um tenha as suas tarefas), na intervenção sobre os problemas concretos das
áreas onde actuam, com grande iniciativa própria no quadro da orientação geral
do Partido.
As estruturas de apoio à direcção central envolvem comissões, grupos de estudo e de
trabalho, departamentos e secções. Na sua diversidade de composição e funções
tiveram um papel destacado no contributo para a elaboração colectiva de
orientações e para a articulação da direcção central com áreas e sectores
específicos e as direcções regionais. As exigências actuais e futuras colocam a
necessidade de uma avaliação global mais profunda sobre a sua dimensão,
características, composição e funcionamento, a definição e concretização de
orientações que sem prejuízo da iniciativa do Partido, tenham em conta as
disponibilidades de quadros e financeiras.
A coordenação de empresas e sectores de âmbito nacional ou
pluri-regional corresponde
a uma necessidade de dinamização do trabalho partidário e de articulação de
orientações entre organizações de vários distritos. A experiência é positiva,
mas persistem um peso excessivo de questões sindicais e algumas sobreposições
de funções e conteúdos com outras estruturas. Importa proceder a uma avaliação
global mais aprofundada e aos aperfeiçoamentos decorrentes das necessidades e
possibilidades existentes.
6. Quadros
A natureza de classe do Partido e os objectivos políticos e
organizativos que pretende alcançar determinam o conteúdo e os princípios
fundamentais que orientam a sua política de quadros.
As medidas aprovadas no XVII Congresso levaram a uma ampla discussão
sobre a política de quadros e à necessidade de alargar a sua responsabilização,
acompanhamento e formação, com incontestáveis avanços.
O levantamento e responsabilização de novos quadros progrediu desde o
XVII Congresso, com destaque para o êxito da acção geral concretizada no ano de
2006, que se saldou pela responsabilização de mais de 1400 quadros, 712 dos
quais com menos de 35 anos. Entre os quadros responsabilizados há um número
importante de camaradas que antes eram da organização da JCP e nela tinham
tarefas atribuídas.
Mantêm-se insuficiências no conhecimento, na integração, na
responsabilização e no acompanhamento dos quadros, com consequências em
estrangulamentos de desenvolvimento orgânico, bem como carências na
responsabilização de operários, jovens e mulheres.
No conjunto dos quadros destacam-se, pela sua dedicação e acção política
e revolucionária, os funcionários do Partido, quadros a tempo inteiro, com
grande disponibilidade, indispensáveis ao desenvolvimento da organização,
orientações e actividade do Partido e à afirmação dos seus princípios e
objectivos. Actualmente o Partido conta com cerca de 350 funcionários, dois
terços dos quais em tarefas políticas e de organização (incluindo camaradas
reformados que permanecem activos). A renovação e o rejuvenescimento
verificados continuam a ser insuficientes, bem como o reforço geral do número
de funcionários, pois é condicionado pelas disponibilidades financeiras do
Partido.
Assentando o essencial da formação dos quadros no funcionamento e na
actividade do Partido, os cursos e acções de formação política e ideológica
assumem igualmente uma grande importância e mereceram atenção particular, o que
permitiu um salto quantitativo considerável neste trabalho.
No plano central, na Escola do Partido, realizaram-se cerca de 40 cursos
com uma participação aproximada de 700 camaradas. Nas Organizações Regionais
realizaram-se 150 cursos e outras iniciativas de formação que envolveram cerca
de 2100 camaradas. Para este resultado, que constitui um avanço notório, foi
essencial a preparação de monitores para cursos regionais e locais.
As exigências da situação colocam a necessidade de quadros capazes de
enfrentar com firmeza e confiança a violenta ofensiva do grande capital, de
responder aos desafios criados pelas condições objectivas para o
desenvolvimento da luta e para o processo de transformação social, e exigem uma
audaciosa política de quadros que responda às variadíssimas tarefas e ao
reforço do Partido. São orientações quanto à política de quadros:
- - A integração dos quadros na vida partidária fazendo
da militância, nos organismos aos vários níveis e nas
organizações de base, uma escola insubstituível de formação
de novos quadros. Uma integração indispensável à
assunção pelos quadros, a par de uma necessária especialização,
do conceito de colectivo partidário, duma visão ampla da acção
e da luta e duma regular prestação de contas da actividade,
seja aos organismos de direcção, seja às organizações
a que pertencem, enquanto factor de conduta de alcance político, ideológico
e ético e estilo de trabalho.
- - O desenvolvimento do conhecimento, acompanhamento, ajuda, avaliação
e responsabilização de quadros do Partido.
O trabalho com os actuais quadros e de responsabilização e formação
de futuros quadros exige audácia e ao mesmo tempo que se evitem soluções
pouco reflectidas. Aos quadros que assumem, em tarefas de organização,
institucionais ou outras responsabilidades, é necessário dar
todo o apoio, para os ajudar a superar eventuais dificuldades, e espaço
para estudar e aprofundar os problemas políticos e para a vida pessoal.
A atenção aos quadros operários, mulheres e jovens, responsabilizando-os
aos diferentes níveis de organização constitui uma prioridade
essencial.
Na solução dos problemas de quadros, de natureza político/partidária,
é necessária mais atenção e celeridade. Deve promover-se
a relação fraternal, a crítica construtiva e a ajuda
solidária nos problemas pessoais.
- - A formação política e ideológica, cultural
e humana dos quadros, preservando e desenvolvendo a sua solidez ideológica,
criatividade, iniciativa e capacidade de direcção e intervenção.
- - De modo a atingir um patamar mais elevado neste trabalho, considerando
a formação e a preparação ideológica como
um processo permanente, é necessária a instituição
do plano anual de formação de quadros, com a valorização
da Escola do Partido, utilizando plenamente as suas potencialidades e a responsabilização
das direcções das organizações regionais, comissões
concelhias e organismos de direcção de sectores e das organizações
de base, bem como a todos os níveis da organização do
Partido, pela resposta a programas centrais e por uma maior iniciativa própria
articulada com o trabalho geral de formação.
A leitura e o estudo (individuais e colectivos) são de uma grande importância
e devem ser promovidos e incentivados.
- - A política de quadros relativa aos funcionários do Partido,
procedendo a um mais alargado rejuvenescimento, integrando mais quadros operários,
dedicando mais atenção à sua preparação
e incentivando a elevação do seu nível político,
ideológico e cultural. A disponibilidade dos quadros deve continuar
a ser considerada como elemento de grande valor e indissociável da
sua correcta distribuição, consoante as necessidades do trabalho
de organização do Partido.
- - O fortalecimento do Partido exige, a par do trabalho regular a todos os
níveis, a realização dum levantamento nacional dos quadros
do Partido e a concretização de uma acção geral
de responsabilização, acompanhamento e formação
de quadros.
7. Organização
A organização, no quadro dos meios próprios do Partido, é garantia da
sua independência. A sua avaliação é indissociável da acção notável
desenvolvida pelo Partido.
Segundo os dados do último Balanço da Organização, o Partido
regista 58 928 membros. Este apuramento resulta da aplicação, pela primeira
vez, dos critérios de contabilização definidos pelo XVII Congresso, no
seguimento da acção de contacto e esclarecimento da situação dos inscritos, que
referem que «os efectivos partidários aos vários níveis passam a ser
contabilizados pelo número de membros do Partido que por sua iniciativa ou
iniciativa das organizações partidárias têm os seus dados actualizados,
comprovando assim também a sua vontade de continuarem como membros do Partido».
Esta acção atingiu uma parte essencial dos seus objectivos com reflexos
positivos na organização partidária. Quando está ainda por esclarecer a
situação de cerca de 44 mil inscritos - apesar de serem provavelmente, em
grande parte, pessoas cujo contacto se perdeu - é de prever que alguns milhares
confirmem a sua qualidade de membros do Partido.
Estabilizou o número de camaradas que integram organismos e dos que
pagam quotas, com ligeira descida e oscilações em várias organizações
regionais.
A composição social continua a revelar uma forte maioria de operários e
empregados (cerca de 72%), com uma composição operária de 42%, que assinala
alguma redução, e cerca de 30% de empregados, cujo peso aumenta. Intelectuais e
quadros técnicos, estudantes e pequenos e médios empresários sobem
ligeiramente.
Quanto à composição etária, sem contabilizar os membros da JCP que não
são membros do Partido, 15,9% têm até 40 anos, 49,3% entre 41 e 64 anos e 34,9%
mais de 64 anos. Aumenta o peso dos militantes com menos de 40 anos e também o
dos que têm mais de 64 anos. A estrutura etária do Partido confirma a tendência
positiva de muitos milhares de militantes, que aderiram ao Partido em
diferentes épocas e se mantiveram na organização, afirmando o compromisso com o
seu ideal e projecto. O número de jovens é ainda insuficiente, apesar do
elemento positivo que constitui um terço dos novos militantes terem menos de 30
anos e cerca de 60% menos de 40 anos (à data da sua inscrição).
Reforça-se significativamente a participação das mulheres, que atinge
29,7% dos membros do Partido.
Quanto à estruturação da organização partidária, referencia-se a
existência de 2505 organismos ou organizações que reúnem em plenário, número em
que se incluem as comissões para diversas frentes de trabalho e que traduz um
ligeiro aumento. Os organismos de base local são 727 e os organismos a partir
das empresas e locais de trabalho são 383, o que significando um aumento
continua a ser insuficiente.
Os anos que decorrem desde o XVII Congresso ficam marcados por avanços
no reforço da organização partidária, expressos: na forma de tratar o reforço do Partido; na organização e
acção junto da classe operária e dos trabalhadores (responsabilidades,
organismos, prioridade à integração por local de trabalho, intervenção); na
realização de assembleias das organizações (mais de 660); na definição e
dinamização das organizações de base; no recrutamento de novos militantes, um
dos níveis mais elevados das ultimas duas décadas (mais de 7 mil), com
importante componente juvenil e número elevado de mulheres; na acção e conteúdo
da intervenção das organizações partidárias.
Persistem entretanto insuficiências e obstáculos, nomeadamente: na
responsabilização de quadros; na estruturação; nas organizações de base; no nível
de organização e intervenção nas empresas e locais de trabalho e junto de
diversas camadas e sectores sociais; na assunção regular de tarefas; na
integração dos militantes em organismos; no pagamento regular das quotizações e
na estruturação com esse objectivo.
O Partido é de facto uma grande força organizada, um grande colectivo
militante. As exigências que lhe estão colocadas impõem a necessidade de um PCP mais forte só possível com a discussão regular dos problemas e das matérias de organização, o
conhecimento da realidade objectiva de cada organização e a
concretização de uma acção permanente e integrada a todos os níveis. São
orientações para o reforço da organização partidária decorrentes dos objectivos
gerais do Partido:
- - O reforço da organização e intervenção
junto da classe operária e dos trabalhadores, nas empresas e locais
de trabalho. Prosseguindo os passos dados, esta é uma questão
essencial que exige: consolidar e ampliar um largo núcleo de quadros,
incluindo funcionários do Partido, que tenham como tarefa a responsabilidade
por organizações de sector e empresa; dar especial atenção
às empresas com mais de mil trabalhadores e/ou de importância
estratégica; criar novos sectores profissionais e de empresas e novas
células (designadamente a partir de empresas e agrupamentos de empresas
e locais de trabalho); alargar o número de militantes organizados em
estruturas a partir das empresas e locais de trabalho, promovendo a transferência
para elas de membros do Partido trabalhadores por conta de outrém,
particularmente os que têm menos de 55 anos e inserindo aí prioritariamente
os novos militantes; contribuir para a organização e luta dos
trabalhadores e para o alargamento da intervenção, influência
e capacidade de mobilização do Partido. O XVIII Congresso reafirma
que a concretização destes objectivos é tarefa de todas
as organizações e de todos os militantes, aponta a necessidade
de um controlo de execução regular sobre a sua aplicação
e decide a realização durante os próximos anos de uma
iniciativa nacional sobre estas questões.
- - O trabalho junto de diversas camadas e sectores sociais - intelectuais
e quadros técnicos, micro, pequenos e médios empresários,
pequenos e médios agricultores, imigrantes, jovens e apoio à
JCP, mulheres, reformados e pessoas com deficiência -, que exige, face
a desenvolvimentos e potencialidades novas, a consideração de
medidas relativas a quadros, estruturas, conteúdos e iniciativas.
- - O reforço da estruturação, a dinamização
das organizações de base e a realização de assembleias
das organizações.
O alargamento do número de organizações de base - células
- e a dinamização do seu funcionamento, respondendo simultaneamente
à necessidade de cada militante ter o seu espaço de participação
e ao papel central que estas têm no trabalho do Partido e na sua ligação
às massas, quer nas empresas e locais de trabalho, quer nos locais
de residência, são tarefas de grande importância. No seguimento
dos passos dados na sua definição nominal e da avaliação
ao seu funcionamento efectivo, deve proceder-se a uma mais rigorosa definição
tendo em conta o número de membros, os camaradas activos e o quadro
ou organismo capazes de dinamizar cada uma delas, de modo a assegurar o seu
funcionamento regular e uma acrescida intervenção política.
A realização das assembleias das organizações
deve ser dinamizada, com particular atenção em relação
às organizações de base, continuando a superar resistências,
designadamente o bloqueio à realização de assembleias
de pequenas organizações e alargando as experiências de
sua realização anual.
- - O estímulo à militância e à participação
dos militantes, alargando a consciência que a força do Partido
é determinada pela acção dos seus membros no quadro do
colectivo partidário. Assume particular importância que além
de tarefas pontuais cada membro do Partido possa assumir tarefas regulares
de acordo com as suas possibilidades e disponibilidades, por pequenas que
sejam, dando particular destaque a tarefas de direcção de organismos
e organizações.
- - A integração dos membros do Partido em organismos
e o aperfeiçoamento das formas e estruturas para sua ligação,
contacto e participação partidária.
Este objectivo exige o reforço dos organismos existentes e a criação
de novos organismos. Deve ser dada uma atenção prioritária
à integração dos militantes que intervêm nos movimentos
de massas e de todos aqueles que podem contribuir para irradiar a orientação
do Partido.
É indispensável e insubstituível a ligação
aos militantes na base da sua participação em reuniões
regulares e do contacto pessoal, designadamente no âmbito do recebimento
de quotas e da venda do Avante! e de O Militante. No entanto,
há que aproveitar complementarmente meios de contacto como o correio
(há muito utilizado), o SMS (que se generalizou nos últimos
anos) e o correio electrónico (que precisa de maior uso).
Importa prosseguir o esclarecimento da situação dos inscritos
no Partido devendo ser objectivo de cada organização completar
este trabalho, ao mesmo tempo que se impõe uma maior regularidade na
actualização de dados dos membros do Partido. A entrega do cartão
de membro do Partido é uma oportunidade para essa actualização.
- - O prosseguimento do recrutamento de novos militantes, na base do
trabalho regular e geral e de acções especiais (aos vários
níveis), com prioridade para operários, jovens e mulheres, bem
como dos activistas que se destacam em movimentos de massas e a adopção
de medidas para assegurar a sua integração partidária.
- - A promoção de um estilo de trabalho que coloque no centro
das atenções das organizações e militantes a intervenção
e resposta aos problemas e aspirações dos trabalhadores e da
população, da área onde actuam, desenvolvendo a luta
reivindicativa, as organizações e movimentos de massas, tendo
presente que o critério fundamental da força do Partido é
a ligação às massas, a influência de massas e a
capacidade da sua mobilização.
O Partido tem 302 centros de trabalho que, em condições
e graus de aproveitamento muito diversos, constituem uma base de grande
importância para a acção partidária. É necessário fazer uma avaliação da sua
situação e da sua distribuição territorial e assegurar que as suas condições
contribuam para o trabalho de organização e o alargamento do prestígio e
influência do Partido.
8. Acção política, ligação
às massas e alargamento da influência do Partido
A ligação às massas, o conhecimento profundo da situação, dos problemas
e dos anseios dos trabalhadores e do povo, o contributo para o seu
esclarecimento, organização, unidade e luta, na concretização do papel de
vanguarda do Partido e visando o alargamento da sua influência é uma questão
central do trabalho partidário, da acção das organizações e dos militantes, que
se concretiza através de diferentes linhas de orientação e iniciativas.
A acção dos comunistas nos movimentos unitários de massas, agindo no
quadro da orientação do Partido, pauta-se por uma atitude de construção da
unidade, da independência, de reforço da capacidade de luta desses mesmos
movimentos, de elevação da consciência social e política de quem neles
participa. A participação dos comunistas nos movimentos unitários é de grande
importância para os dinamizar e lhes dar confiança e constitui simultaneamente
uma componente muito significativa na ligação do Partido às massas, aos seus
problemas e aspirações.
O desenvolvimento da luta, em que participam, pelas suas justas
reivindicações, muitas pessoas sem partido ou influenciados por outros
partidos, é o terreno que lhes permite ganhar consciência social e política,
confiança e determinação para alargar a luta ao objectivo da transformação da
sociedade. A tarefa principal de muitos militantes do Partido é a participação
nos movimentos unitários de massas, em particular nos sindicatos e nas
comissões de trabalhadores, poderosos instrumentos de luta da classe operária e
de todos os trabalhadores contra a exploração, por melhores salários e pelos
seus direitos.
O facto de muitos camaradas intervirem em movimentos que lutam por
reivindicações transversais do ponto de vista social, mobilizando camadas
sociais muito diferenciadas, abre-lhes um potencial e alargado campo de
influência.
Este trabalho, com os contactos e o conhecimento que permite adquirir,
constitui uma importante base de recrutamento para o Partido.
A organização é o instrumento mais determinante para dinamizar e
reforçar a acção política e a luta de massas e para o alargamento da influência
política e ideológica do Partido. As organizações do Partido, pelo conhecimento
que têm dos problemas e aspirações dos trabalhadores e outras camadas sociais,
pela sua estruturação e ligação às massas estão em boas condições para
assumirem, de facto, a vanguarda da luta.
Os militantes do Partido, com a sua acção esclarecida, determinada e
convicta junto daqueles que os rodeiam, com quem trabalham e convivem,
constituem um valoroso potencial de intervenção e influência.
O XVII Congresso identificou diversos bloqueios no trabalho de ligação
às massas, nomeadamente a existência de organizações desligadas da vida e do
meio social e político onde desenvolvem a sua actividade e outras com um
trabalho acentuadamente institucional. A situação melhorou, mas persistem
bloqueios.
Na ligação às massas adquirem importância significativa a imprensa, a
informação e a propaganda, bem como as iniciativas partidárias, designadamente
no plano político, político-cultural e de convívio.
O trabalho político unitário possibilita a acção com outras pessoas em
torno de objectivos comuns dando força e consequência à luta por esses
objectivos, sendo também um contributo para que estas conheçam melhor as
opiniões e propostas do PCP e
para a sua aproximação ao Partido. As organizações têm um amplo campo unitário
à sua frente, com importância decisiva para a convergência de esforços na
intervenção sobre as mais diversas questões, que pode contribuir
significativamente para o alargamento da influência e prestígio do Partido e
para a intervenção em torno dos problemas nacionais.
A acção institucional do Partido, nomeadamente o trabalho desenvolvido
pelos eleitos nas autarquias locais e pelos deputados na Assembleia da
República, no Parlamento Europeu e nas Assembleias Legislativas das Regiões
Autónomas, insere-se também no contributo para a ligação às massas, para a
dinamização da luta e para o alargamento da influência do Partido.
A intensificação e alargamento da acção política, da ligação às massas e
da influência do Partido, questões essenciais que se colocam a todas as
organizações e militantes, precisam de ser concebidas de forma global e
expressam-se segundo orientações e objectivos gerais em várias frentes e áreas
de intervenção. São
orientações para este trabalho:
- - A avaliação em todas as organizações das várias
frentes e áreas em que se concretiza a ligação e influência
de massas, a definição de objectivos, planos e linhas de trabalho,
a tomada de medidas de direcção e a promoção do
controlo de execução, indispensáveis à sua concretização.
- - O empenhamento dos comunistas no fortalecimento e desenvolvimento da luta
de massas e dos movimentos unitários de massas, devendo cada organização
assumir a sua responsabilidade na dinamização e intervenção
na luta dando a relevância necessária à sua discussão
nas reuniões, destacando quadros e tomando as medidas necessárias
para que a luta dos trabalhadores e das populações, a partir
dos seus problemas concretos, se alargue e se intensifique.
- - O aumento da eficácia e o alargamento da difusão e impacto
da informação e propaganda, da imprensa e das iniciativas partidárias,
concretizando o seu papel específico para o reforço da ligação
às massas e da influência do Partido.
- - A discussão de modo a estimular cada militante a tomar a iniciativa
na acção política diária e no contacto junto daqueles
com quem se relaciona, como um dos elementos essenciais da ligação
e influência do Partido e da sua capacidade de esclarecimento e mobilização.
- - A dinamização do trabalho político unitário
promovendo o diálogo e a acção comum com outras pessoas
e sectores democráticos, bem como o contacto com organizações,
estruturas e instituições que, na actual situação
assume particular importância, designadamente o trabalho com outros
democratas que participam nas candidaturas ou no apoio à CDU, acção
que carece de organização e planificação, com
a consideração de iniciativas e o estabelecimento regular de
contactos individuais para ouvir as suas opiniões e dar a conhecer
as posições do Partido.
- - A consideração e desenvolvimento do trabalho nas instituições,
no quadro das suas exigências próprias, de forma a que seja concebido,
coordenado e conjugado com a dinâmica da luta de massas e pensado de
modo a aproveitar plenamente os seus conteúdos, formas e meios muito
diversos, para o estímulo à participação popular
e para o alargamento da influência do Partido junto dos trabalhadores
e do povo português.
9. Informação e propaganda
O trabalho de comunicação do Partido, num quadro em que se acentuam as
tentativas de silenciamento do PCP,
se promove o anticomunismo e se favorecem (sobretudo a partir dos grandes
órgãos de comunicação social) outras forças políticas, obriga a uma maior
atenção, estruturação, coordenação e organização das tarefas de propaganda e
informação, a par de um persistente combate contra as crescentes limitações à
liberdade de informação e propaganda e pela igualdade de tratamento por parte
dos media.
As tarefas de propaganda e informação, decorrentes da natureza, da
identidade e dos objectivos de um partido revolucionário, são inseparáveis da
sua intervenção política e institucional e da acção de massas.
Assente no papel decisivo da organização, a presença da propaganda
partidária junto dos trabalhadores e das populações confirma-se como um dos
mais importantes instrumentos de ligação do Partido às massas.
A análise sobre o trabalho desenvolvido ao longo destes quatro anos
comporta o reconhecimento de um valioso contributo do trabalho de propaganda e
informação para a afirmação das posições e iniciativas partidárias, num quadro
de agudização da luta ideológica e de limitações de meios e quadros. Tal não
significa que não se tenha verificado e não se reconheça a existência de
inúmeras deficiências, dificuldades e atrasos na implementação de orientações e
linhas de trabalho que têm sido identificadas nos últimos congressos e que
mantêm inteira actualidade.
Apoiada no trabalho do Departamento de Propaganda, do Gabinete de
Imprensa e das organizações regionais, os últimos quatro anos ficaram marcados
por uma intensa e diversificada intervenção que assegurou, entre outros
aspectos, a realização de campanhas eleitorais, de grandes campanhas nacionais e
da intervenção local e sectorial, de importantes aspectos do conteúdo da Festa
do Avante!, dos tempos de antena, a par do contacto com a comunicação social para
difusão das posições e iniciativas partidárias e para corresponder às suas
solicitações.
O sítio do PCP na Internet, integrando várias componentes
entre as quais a Rádio Comunic, constitui também um importante instrumento de
divulgação da actividade geral do Partido, nomeadamente da sua imprensa,
iniciativas e propostas.
As alterações e aceleradas mudanças que percorrem o sistema mediático e
que têm uma grande influência na vida política nacional, longe de implicarem o
esbatimento do papel da informação
e propaganda partidária, impõem, tal como identificámos em anteriores
congressos, o seu fortalecimento, a sua melhoria e qualificação, a sua
expansão, na base das seguintes orientações:
- - A necessidade de uma maior responsabilização e formação
de quadros nesta área, o desenvolvimento e criação de
estruturas regionais de propaganda e informação, uma gestão
adequada dos meios, uma permanente capacidade de acompanhamento das possibilidades
criadas pelas tecnologias de informação e comunicação,
uma maior articulação entre a estrutura central e as organizações
regionais, uma enérgica e criativa capacidade de iniciativa e realização,
uma mais rápida e concertada resposta na concepção, produção
e distribuição dos materiais;
- - A realização de um trabalho central, no domínio da
relação com a comunicação social, apoiada em estruturas
e quadros que assegure a resposta adequada às necessidades da actividade
de comunicação central do Partido e garanta o necessário
apoio complementar às organizações e à sua actividade
e iniciativa própria, a par de um planeamento e dinamização
da intervenção destas junto dos meios de comunicação
social nacional, regional e local;
- - O desenvolvimento e apoio a uma efectiva descentralização
da iniciativa e do trabalho de comunicação, nomeadamente ao
nível das organizações de base, como elemento de uma
intervenção mais pronta e mais próxima dos acontecimentos
e das pessoas e, portanto, mais eficaz;
- - O aprofundamento de conceitos e princípios que têm orientado
a actividade de comunicação do Partido - coerência entre
a forma e o conteúdo; diferenciação da propaganda política
relativamente à publicidade; iniciativa descentralizada com presença
de elementos unificadores e nacionais; valorização da organização
e dos militantes como factor decisivo de comunicação - e a progressão
na pesquisa e inovação nos meios e nas formas de propaganda
e informação;
- - O aproveitamento das formas clássicas e provadas de informação
e propaganda como os boletins de célula, os documentos sobre problemas
concretos ou a colocação e exposição pública
de materiais, sem prescindir do estudo sobre as mudanças qualitativas
em curso e no horizonte de modo a assegurar uma activa e eficaz intervenção
que tenha em conta a diversidade e diferenciação das pessoas
a quem se dirige, dos seus níveis de literacia e de graus de acesso
às novas tecnologias de informação;
- - A valorização e desenvolvimento da presença do Partido
na Internet, potenciando os meios existentes e a sua crescente massificação
e tomando novas iniciativas aos vários níveis, com as correspondentes
soluções de direcção;
- - O combate a concepções e políticas antidemocráticas
que, sob os mais diversos pretextos, procuram de forma crescente restringir
e condicionar o livre direito de liberdade de expressão e propaganda
partidária, não prescindindo em nenhum momento da livre e legítima
iniciativa política do Partido.
As realizações
político-culturais são uma componente importante da actividade do
Partido com particular destaque para a Festa do Avante!.
A Festa do Avante!, festa de Abril, do povo e da juventude, confirmou-se como a maior
realização político-cultural e de massas no nosso país, mantendo pelo seu
programa e ambiente uma elevada capacidade de atracção.
Alvo preferencial de campanhas contra o Partido, que assumem insidiosas
formas anticomunistas e precisam de renovado combate, a Festa do Avante! constitui uma grande demonstração da capacidade de realização dos
comunistas e do seu Partido, tradução das suas características fundamentais,
exemplo de militância, elemento dinamizador e mobilizador da sua organização,
expressão da luta de resistência contra a política de direita, momento alto de
afirmação dos valores democráticos e do ideal comunista.
A Festa do Avante! pujante obra
colectiva, com as suas características ímpares, permanente aperfeiçoamento e
inovação, afirma-se como grande realização nacional e internacional.
A actividade editorial
influenciada pelo Partido, que conheceu diferentes fases, enfrenta hoje, numa
nova realidade do sector editorial e livreiro, fortes constrangimentos. Da
produção editorial é de salientar em particular a edição das obras dos
clássicos do marxismo-leninismo e das obras escolhidas de Álvaro Cunhal,
importante instrumento para a formação ideológica. A Editorial Avante!, que deve valorizar e incentivar a sua actividade própria, pode
beneficiar de uma maior articulação com a dinâmica partidária e dar,
simultaneamente, resposta às necessidades no plano da intervenção editorial e
da acção política e ideológica do Partido. As organizações partidárias e a sua
ligação às massas podem ser um instrumento privilegiado da difusão e distribuição
das suas edições. Tendo em consideração os recursos disponíveis, as
possibilidades geradas pelos desenvolvimentos tecnológicos e as potencialidades
dum trabalho colectivo, militante, criativo e audacioso, é possível superar as
dificuldades presentes, com uma nova dinâmica editorial, que intervenha mais na
luta política e ideológica.
A imprensa do Partido, o Avante! e O
Militante, constituem
instrumentos essenciais e insubstituíveis na vida e na actividade do Partido.
Cada um por si e em conjunto, desempenham um papel fundamental quer na
divulgação das opiniões, análises e orientações do Partido nos planos nacional
e internacional, na troca de experiências, na batalha das ideias e na formação
política e ideológica, na mobilização e estímulo para a acção dos militantes,
na crítica ao capitalismo, na informação, com verdade, e valorização das lutas
dos trabalhadores e dos povos que se travam no país e no mundo, quer, ainda,
como veículos para o reforço orgânico do Partido e para a sua influência junto dos
trabalhadores e das populações.
Neste quadro, o alargamento da sua divulgação, a sua leitura e estudo
pelos militantes comunistas e a sua difusão e venda junto das massas
trabalhadoras são factores decisivos para o aumento da capacidade interventiva
do Partido e da sua influência social, política e eleitoral.
Como instrumento para o reforço do Partido, a imprensa partidária assume
também um lugar privilegiado ao permitir, por um lado, o contacto regular entre
o Partido e os seus militantes (potenciador de outros contactos partidários) e,
por outro, ao garantir uma melhor preparação dos militantes para a sua
intervenção quotidiana na defesa das posições e análises do Partido,
nomeadamente a necessidade de continuar a melhorar a articulação com as organizações
do Partido - designadamente ao nível do envio de sugestões, informações ou
notícias sobre questões partidárias, laborais ou sociais, a adopção de medidas
orgânicas de responsabilização e venda por parte das organizações, ou a
continuação e aprofundamento da experiência das vendas especiais do Avante! sobre assuntos de particular importância e
relevo.
Nos últimos quatro anos, marcados por uma profunda e inquietante
desinformação, pelo aprofundamento do silenciamento, diminuição ou deturpação
das posições do Partido e das lutas dos trabalhadores, a imprensa do Partido,
nomeadamente o Avante!, assumiu-se mais uma vez como a única
informação de esquerda a nível nacional. Reconhecendo o esforço que se tem
verificado na ampliação e diversificação do conteúdo da imprensa partidária, é
necessário prosseguir esse esforço alargando o tratamento a outras questões da
actualidade.
10. Luta ideológica
A ofensiva geral desencadeada pelo capitalismo tem sido acompanhada por
uma intensa campanha ideológica com a intenção de perpetuar as posições
dominantes do grande capital e das forças e interesses que o representam. São
componentes dessa campanha:
- - A defesa e promoção do capitalismo como sistema ideal para
o qual não haveria alternativa, iludindo a sua crise, com a ocultação
permanente dos seus limites, a mistificação sobre a sua natureza
exploradora, opressora e agressiva e a apresentação de retrocessos
sociais e de ataques a direitos individuais e colectivos como expressões
de «modernidade» e de adequação às «exigências
dos tempos actuais»;
- - Uma permanente e intensa divulgação de concepções
reaccionárias e obscurantistas de carácter fascista e fascizante,
de combate à liberdade e à democracia, de promoção
de guerras, de justificação e defesa dos crimes do imperialismo,
de branqueamento do fascismo e agudização do anticomunismo -
base de sustentação ideológica da ofensiva contra o ideal
comunista e, em concreto, contra o Partido, da propagação de
preconceitos que dificultam a unidade dos trabalhadores, das massas populares
e a convergência das forças democráticas e progressistas;
- - A promoção da resignação e da inevitabilidade
face às políticas dominantes e às suas consequências,
destinada a desvalorizar alternativas, a estimular o conformismo perante as
injustiças e as desigualdade e a difundir sentimentos de inutilidade
da luta e da acção colectiva e a desviar vontades e energias
da luta pela ruptura com a actual política.
A resposta política e ideológica por parte do Partido, a partir da sua
base teórica, é um elemento fundamental para alargar a sua influência, para armar o conjunto dos seus militantes
e organizações dos argumentos de combate às campanhas contra o ideal comunista
e o PCP, para elevar a disposição para a luta e a
consciência política das massas, que se expressa nas orientações da luta
ideológica e em medidas, estruturas e iniciativas para a concretizar. São
orientações para a luta ideológica:
- - A divulgação da orientação, posições
e propostas do Partido, do seu projecto de ruptura com a política de
direita e de construção de uma alternativa de esquerda, do Programa
do Partido, do seu carácter eminentemente patriótico e internacionalista,
da actualidade da sua identidade e valores de combate ao capitalismo - evidenciando
a sua natureza, contradições, limites e falência das teses
de sustentação da sua propaganda - e da afirmação
do ideal e projecto comunista de construção de uma sociedade
nova.
- - O combate à ideologia reaccionária, obscurantista, fascizante
e fascista que, assente na contestação aberta aos valores da
democracia e da liberdade, promove a campanha anti-partidos, proclama abertamente
a criminalização dos que resistem, preconiza a eliminação
dos direitos dos povos, estimula o racismo, a xenofobia e estimula a guerra;
- - O combate à ideologia social-democrata que, nas suas expressões
diversas, por acção própria de cada uma e convergência
entre si, visa a afirmação de soluções que perpetuam
os interesses do capitalismo através do preconceito anticomunista,
da negação da luta de classes, da desvalorização
do papel dos trabalhadores e da sua luta e da difusão de uma cultura
anti-partidos que tende a afastar crescentemente as populações
de uma intervenção activa na vida política e dificulta
a construção de verdadeiras alternativas.
- - O combate ao anticomunismo que, assente em linhas de falsificação
histórica - designadamente adulterando e subvertendo o significado
e as causas da derrota das tentativas de construção de sociedades
socialistas na URSS e nos países da Europa de Leste -, visa criminalizar
a acção dos comunistas em geral, deturpar e falsificar as posições
e projecto do PCP, procurando avolumar preconceitos e dificultar a aproximação
que as propostas e a intervenção do Partido suscitam junto dos
trabalhadores e da população em geral.
11. Fundos
Partido da classe operária e de todos os
trabalhadores, o PCP assegura os seus recursos materiais, com
base na quotização, nas contribuições de militantes, simpatizantes e dos seus
eleitos nas instituições, nas acções de angariação de fundos e numa gestão
rigorosa e criteriosa do seu património.
Os meios materiais próprios para a
intervenção política são decisivos para o Partido e para a manutenção da sua
independência política e ideológica. Ao contrário, outros partidos (PS, PSD,
CDS-PP e BE) vivem sobretudo do financiamento do Estado, valor muito reforçado
pela actual Lei do Financiamento dos Partidos.
Esta lei, da responsabilidade do PSD, CDS-PP
e PS, para além do grande aumento das subvenções estatais, tal como o Partido
sempre denunciou e a vida está a comprovar, tem como objectivo central criar
graves dificuldades aos partidos que, como o PCP, vivem sobretudo
das suas receitas próprias.
O limite estabelecido à verba proveniente de
«iniciativas de angariação de fundos» e o limite ao valor resultante do
conjunto das contribuições recebidas em numerário, representam um ataque, sem
precedentes, à Festa do Avante!, a outras
iniciativas político-culturais e à liberdade de acção e iniciativa do PCP.
A Entidade das Contas e Financiamentos
Políticos (ECFP) tem pautado a sua intervenção por uma inaceitável intromissão
na vida e organização partidárias, por concepções e práticas autoritárias, por
exigências de procedimentos arbitrários. O PCP tem sido o alvo
principal dos ataques e campanhas públicas desencadeados pela ECFP.
A luta pela revogação da Lei do
Financiamento deve prosseguir inserindo-se na luta geral do Partido contra a
política de direita.
O XVII Congresso traçou como objectivo «a
necessidade de garantir um equilíbrio financeiro sem recurso às verbas de
gestão do património e uma redução da dependência de subsídios centrais por
parte das organizações regionais». As medidas adoptadas foram insuficientes
para atingir estes objectivos.
A evolução positiva nas receitas e o esforço
para conter ou diminuir despesas ficaram aquém das necessidades. As receitas
aumentaram mais do que as despesas, sendo as taxas de variação homólogas
respectivamente de 21,25% e 18,86%.
Salienta-se o aumento verificado na
quotização (+13,77%), nas contribuições dos militantes (+ 49,05%) e dos eleitos
(+ 33,83%), que demonstram uma evolução positiva na compreensão e no
envolvimento dos membros do Partido na sua actividade.
Com o aumento dos preços, a rubrica de
«fornecimentos e serviços externos» aumenta (+18,06%) e a de «outros custos
operacionais» diminui (-12,53%). Os custos com quadros cresceram 3,53%,
reflectindo um esforço de contenção.
As contas entre 2004 e 2007 apresentaram
resultados negativos, sendo o resultado operacional de -2.101.707 euros, mais
de 500 mil euros/ano. Só com o recurso a receitas extraordinárias, (gestão do património, subvenções,
restituição do IVA, entre outras) se fez face a esta situação, contribuindo
para que o saldo final seja de menos 29.460€. Confirma-se assim a necessidade
da ampliação de receitas próprias decorrentes da actividade e reforço do
Partido.
As receitas próprias, entre 2000 e 2003,
correspondiam a 92%. Entre 2004 e 2007, correspondem a 91,2% do total,
confirmando que o financiamento do Partido resulta no essencial do esforço das
suas organizações e dos seus militantes.
A situação actual é insustentável mas possível de ultrapassar com a
intervenção forte e determinada do colectivo partidário, exigindo, para a sua superação o
apuramento de orientações e um forte empenho na sua concretização. São
orientações para o trabalho de fundos:
- - O alargamento da compreensão de todas as organizações
e militantes sobre a importância decisiva dos fundos do Partido
e a intervenção prática coerente com essa compreensão.
O alargamento da consciência e, nalguns casos, a mudança de atitude
e estilo de trabalho, para ultrapassar estrangulamentos que originam o desaproveitamento
das possibilidades reais de reforço da capacidade financeira.
Ao mesmo tempo, a reflexão, a discussão, a intervenção,
o trabalho colectivo e o controlo de execução, devem ser intensificados
e reforçados em todos os planos de direcção, incluindo
a direcção central, de modo a romper com um conjunto de incompreensões,
subestimações políticas e deficiências na actividade
financeira ainda existentes.
- - A garantia da organização e de estruturas adequadas,
de um elevado rigor na gestão e no controlo financeiro e de um controlo
de execução eficaz.
Impõe-se a responsabilização de quadros e a criação
de estruturas para o acompanhamento das questões financeiras, do controlo
financeiro, da dinamização da recolha de fundos, da execução
e controlo dos orçamentos das organizações aos vários
níveis.
Exige-se que o trabalho na área financeira tenha como suporte orçamentos
que tracem objectivos de aumento de receitas, planifiquem e estabeleçam
limites às despesas e permitam um efectivo envolvimento colectivo no
controlo de execução das medidas decididas.
- - O estabelecimento do objectivo do efectivo equilíbrio financeiro,
que será alcançado com o empenhamento a todos os níveis
na concretização de medidas que contribuam para a redução
de despesas, incentivem o aumento de receitas (componente essencial do objectivo
do equilíbrio financeiro) e diminuam a dependência das organizações
regionais em relação à caixa central.
- - O aumento da receita das quotizações, que depende
unicamente das forças próprias do Partido, é indispensável
e exige o aumento do número de membros do Partido com a quota em dia
e do aumento do seu valor, tendo como referência 1% do vencimento (ou
remuneração), responsabilizando mais camaradas pela sua cobrança
em todos os organismos, tendo como referência 1 para cada 20 membros
do Partido e utilizando o pagamento por transferência bancária
e por Multibanco.
- - O aumento de outras receitas.
O aumento das contribuições de eleitos e membros do partido
nomeados em cargos públicos, elevando a compreensão sobre o
significado do princípio estatutário de não ser beneficiado
nem prejudicado no exercício desses cargos, constitui uma importante
forma de aumento das receitas.
A recolha de contribuições especiais de militantes, simpatizantes
e outros democratas, valorizando as campanhas de «Um Dia de Salário»,
as iniciativas em torno da participação nas mesas de voto e
outras que as organizações têm promovido, deve ser ampliada.
O aumento da difusão e venda do Avante! e de O Militante,
instrumentos de esclarecimento e intervenção partidária,
organizando bancas, brigadas de venda e listas de compradores, representa
uma possibilidade real de crescimento das receitas.
A promoção de iniciativas e a abertura dos centros de trabalho
dinamizando o seu funcionamento para a recolha de meios financeiros, a par
da afirmação política e de ligação às
massas, devem também ser asseguradas.
A manutenção e conservação do património
e a rentabilização daquele que não está afecto
à actividade política são igualmente de grande importância.
- - A gestão, contenção e mesmo redução
de despesas, particularmente daquelas que, sendo custos de estrutura,
não implicam directamente com a acção política,
de modo a contribuir para o equilíbrio financeiro indispensável
à sustentabilidade do Partido e à manutenção da
sua intervenção política.
12. Actividade internacional
Num quadro internacional marcado pela intensificação da ofensiva do
imperialismo, o PCP interveio com maior frequência na batalha
política e ideológica, através de posições públicas sobre questões
internacionais.
A actividade internacional do PCP caracterizou-se por um grande empenho no
reforço das relações com os partidos comunistas, onde se insere o processo dos
Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e Operários que em 2006 se
reuniu em Lisboa e também com outras forças progressistas e de esquerda de todo
o mundo.
Procurando alargar as suas relações a outros partidos e movimentos na
perspectiva da consolidação da frente anti-imperialista, o PCP interveio nos Fóruns Sociais, no movimento
da paz e anti-globalização.
Na Europa, apesar de persistirem tendências negativas em vários partidos
e das dificuldades decorrentes do processo do Partido da Esquerda Europeia, o PCP organizou duas iniciativas sobre questões
europeias em que participaram a maioria dos partidos com que mantém relações.
A par da importância que atribui ao seu relacionamento no quadro
europeu, o PCP orientou a sua actividade em relação a
todos os continentes. Salientam-se as delegações dirigidas pelo
Secretário-geral à África do Sul, a Angola, Brasil, China, Cuba, Espanha,
Grécia, Índia, República Checa, Suécia e Vietname. Várias delegações participaram
em numerosos congressos, conferências e seminários, festas e iniciativas de
solidariedade.
Mantém-se como elemento negativo o reduzido número de delegações que, no
plano bilateral, visitaram o nosso país. Entretanto, no plano multilateral,
várias dezenas de delegações participaram no Encontro Internacional de Partidos
Comunistas e Operários, nas iniciativas europeias e no seminário sobre África e
tiveram presença regular na Festa do Avante!.
Destaca-se neste período uma maior divulgação para o exterior das
posições e análises do partido, quer sobre questões nacionais quer
internacionais.
A actividade do PCP
deverá continuar a ser marcada pelo seu contributo para o reforço do movimento
comunista e revolucionário internacional e da sua unidade na acção; pela sua
intervenção na frente anti-imperialista, nomeadamente no movimento da paz; pelo
desenvolvimento de acções de solidariedade com os povos em luta; por uma mais
activa intervenção na luta das ideias e pela projecção do socialismo como
alternativa ao capitalismo.
13. Nota final
O XVIII Congresso do Partido Comunista Português reafirma a determinação
e o empenho deste grande colectivo partidário na luta contra todas as formas de
exploração e pela emancipação dos trabalhadores e do povo.
As grandes conquistas da Revolução de Abril significaram extraordinários
avanços na sociedade portuguesa, ainda hoje atacadas por um prolongado e duro
processo contra-revolucionário. Os valores de Abril, enraizados nos
trabalhadores e no povo, projectam-se como realidades, necessidades objectivas,
experiências e aspirações no futuro democrático de Portugal. A defesa dos
ideais e das conquistas de Abril integra-se na luta por uma democracia
avançada.
A liquidação da exploração do homem pelo homem é uma tarefa histórica
que só com a revolução socialista se pode concretizar. É por esse projecto que
gerações de comunistas e trabalhadores combateram, é por esse projecto que os
comunistas portugueses lutam neste Portugal do século XXI.
O PCP, partido da classe operária e de todos os
trabalhadores, profundamente ligado aos problemas, interesses e aspirações do
povo português, das mulheres e da juventude, partido patriótico e
internacionalista, o grande partido da resistência ao fascismo e da Revolução
de Abril, é o partido capaz de impulsionar a luta pelas transformações
revolucionárias de que a sociedade necessita e exige, no caminho do socialismo
e do comunismo. O reforço do PCP é
indispensável para avançar neste caminho.
Por Abril, pelo socialismo, um Partido mais forte!
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