Partido Comunista Portugu�s
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Intervenção de Bernardino Soares na AR
PCP interpela governo sobre transparência nas políticas públicas
Sexta, 27 Novembro 2009
20091111.jpgBernardino Soares anunciou hoje na AR, na sequência das iniciativas que o PCP tem vindo a tomar em matéria de combate à corrupção, a realização de uma interpelação ao Governo, no próximo dia 17 de Dezembro sobre o tema da “transparência nas políticas públicas”.

 

 

 

Declaração política anunciando a realização de uma interpelação ao Governo no próximo dia 17 de Dezembro, sobre o tema «Transparência nas políticas públicas»

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Começo esta intervenção referindo alguns factos concretos.

Em Abril, o PCP requereu ao Governo o envio do contrato da Concessão Rodoviária do Baixo Alentejo.

Passados três meses, o Ministério das Obras Públicas respondeu ao Deputado José Soeiro, autor do requerimento, que não tinha o contrato. Sim, sim! Eu disse bem: «que não tinha o contrato», «que o pedisse à Estradas de Portugal».

Este foi apenas um dos casos que o PCP entregou ao Tribunal de Contas para investigação, depois de meses de perguntas sem resposta quer aos Deputados, quer a comissões parlamentares. Outros houve, como o das Pousadas de Portugal, o das Pirites Alentejanas ou o do Protocolo com a Microsoft, e outros, em que o Governo sistematicamente negou informação ao Parlamento.

Outro facto: em Fevereiro e Abril de 1996, a Comissão de Trabalhadores da CP denunciou à respectiva administração várias situações suspeitas, pedindo informação sobre questões concretas, como, e cito, «a fiscalização da passagem do material fornecido ao empreiteiro, que se apresenta hoje quase como monopolizador da compra da sucata à CP» ou ainda o facto de que, e cito novamente, «um sucateiro que adquire frequentemente o material usado da CP adjudicou, há meses, a compra de algumas centenas de postes de catenária, que se encontram ainda no local onde foram vendidos, sendo voz corrente que os postes ainda não foram levantados pelo comprador, porque, a curto ou médio prazo, poderão voltar ao antigo dono, ou seja, à CP». O Ministro da tutela era, então, João Cravinho, sendo Secretário de Estado Guilhermino Rodrigues (hoje, Presidente da ANA) e o Presidente do Conselho de Administração da CP era Brito da Silva, gestor nomeado, sucessivamente, por diversos governos para diversas empresas públicas.

Quanto às denúncias da Comissão de Trabalhadores, em 1996, nunca houve resposta!

Mais um facto: no Programa do Governo anuncia-se, com pompa e circunstância, que todos os apoios a micro, pequenas e médias empresas serão tornados públicos. Questionado pelo PCP sobre se o mesmo critério se aplicaria aos apoios às grandes empresas, o Ministro não se comprometeu. Isto é, quer manter secretos os apoios às grandes empresas.

Ainda outro facto: apesar de obrigado a isto, o Presidente da REN José Penedos não entrega há 10 anos o registo de interesses a que a lei o obriga - repito, há 10 anos! - e nenhum governo, designadamente o actual, actuou sobre este facto, obrigando-o a fazer essa entrega.

Mas tudo isto tem uma razão: em Portugal, é assim! Em Portugal, os governos e este Governo em concreto praticam uma política de oposição à transparência da gestão pública, são inimigos da fiscalização e do escrutínio público.

E isto tem uma razão: quando se escondem as decisões públicas relativas a privados, é legítimo suspeitar, diria mesmo que é legítimo concluir, que isto acontece porque as decisões públicas favorecem interesses privados.

O que se passa é que o interesse público está subordinado pelo Governo aos interesses privados, contra o que diz a Constituição.

O País assiste à opacidade de muitas das decisões públicas e das relações do Estado e entidades públicas com o sector privado. Assiste a recorrentes suspeitas de benefício de interesses privados ou de grupo a partir de decisões de gestores públicos nomeados pelos governos.

É, aliás, na dança das cadeiras e das nomeações políticas, designadamente para o sector empresarial do Estado, que se apreende o verdadeiro significado da expressão «bloco central de interesses». As empresas públicas estão, por isso, muitas vezes ao serviço do interesse privado, por via da gestão que as comanda e da tutela que as nomeia. Rejeitamos a ideia de que o problema é as empresas serem públicas. Ao contrário, o problema é que muitas destas empresas que gerem importantes bens e serviços de interesses públicos servem agora, prioritariamente, os lucros dos seus accionistas privados, com o apoio dos governos. O problema é tantas delas terem sido privatizadas!

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Estamos num momento político em que os portugueses assistem ao avanço de investigações sobre processos de corrupção, dificultadas pelos que, como o Governo e o PS, têm sido até aqui, na Assembleia da República, um obstáculo à criação dos mecanismos legais eficazes para esse combate.

O PCP está na primeira linha na proposta de regras indispensáveis para um eficaz combate à corrupção, como o enriquecimento ilícito ou a alteração das regras do segredo de justiça feitas à medida da impunidade da criminalidade económica e financeira.

O PCP está na primeira linha da rejeição do ataque do Governo e do PS à justiça e à investigação criminal, bem patente na descarada acusação de espionagem política do Ministro

Vieira da Silva, logo seguido, aliás, por outros.

É preciso combater a corrupção; é preciso lutar pela transparência.

É por isso que, na sequência das iniciativas que temos vindo a tomar em matéria de combate à corrupção, anunciamos a realização de uma interpelação ao Governo no próximo dia 17 de Dezembro, sobre o tema da «transparência nas políticas públicas».

A falta de transparência pública é irmã da corrupção. A luta pela transparência pública é a luta contra a corrupção.

E se o povo diz, em voz corrente, que «Quem não deve, não teme!», nós dizemos, claramente, que quem esconde é porque deve, deve à transparência, deve ao interesse público, deve ao regime democrático.

Impõe-se, por isso, um sobressalto democrático em defesa da decência e do interesse público para o qual procuraremos contribuir com a nossa interpelação.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Pedro Soares,

Muito obrigado pela sua pergunta.

De facto, a interpelação que queremos fazer é sobre transparência nas políticas públicas, contra a falta de transparência que tem sido a regra nos últimos anos.

O Sr. Deputado fala muito bem em relação aos contratos das auto-estradas, pois é inacreditável que, durante toda uma legislatura, o Governo não tenha fornecido à Assembleia da República contratos das concessões das auto-estradas da Estradas de Portugal, contratos da transferência das Pousadas de Portugal para um operador privado, protocolos do Acordo com a Microsoft e muitos outros contratos e apoios públicos a empresas e a grupos privados, os quais se mantiveram no segredo dos gabinetes ministeriais. É preciso que o povo saiba o que se está a dar a estes grupos económicos, porque é assim que se avaliam bem as decisões do Governo, se foram justas ou não, nos apoios que decidiu dar a este ou àquele grupo económico.

Quem esconde esses contratos ilegitimamente está a esconder más decisões para o interesse público. É esta presunção, esta regra que temos de aplicar, porque, se não há qualquer problema em relação ao interesse público, não há qualquer problema em disponibilizar a informação à Assembleia da República. Nós não vamos deixar cair este assunto. Não o deixámos cair na anterior legislatura e não o vamos deixar cair nesta Legislatura.

Aliás, a sua pergunta lembrou-me uma antiga e muito esclarecedora, não nas suas conclusões mas nos seus trabalhos, comissão de inquérito à Junta Autónoma das Estradas, em que se concluiu que um dos problemas mais graves era o das tais obras a mais, que sempre apareciam, não se sabia muito bem de onde, e que, às vezes, duplicavam e triplicavam os custos dos contratos. Agora, com este Governo, é mais difícil ver essas obras a mais, porque, em muitos casos, nem conhecemos o contrato inicial, e tudo fica no segredo dos deuses, que é o mesmo que dizer na «panelinha» do interesse público subordinado ao interesse privado.

 (...)

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Ricardo Rodrigues,

Vou dizer-lhe qual foi a única coisa, na minha intervenção, que teve como fonte a comunicação social: foi a afirmação do Ministro Vieira da Silva de que havia um processo de espionagem política contra o Partido Socialista e o Governo.

Só esta questão é que foi retirada da comunicação social, tudo o resto não tem como fonte a comunicação social.

Se o Sr. Deputado encontrar, na Internet, os contratos da concessão de estradas do Baixo Alentejo, de apoio à Tayco, das Pousadas de Portugal, das Pirites Alentejanas, da Microsoft e de mais um resto da lista que posso enviar-lhe depois e que já entregámos no Tribunal de Contas, agradecia que os enviasse para o nosso correio electrónico. Mas vai ter dificuldade, porque eles não estão lá, Sr. Deputado!

Eles não estão lá! E fique sabendo, provavelmente não sabe, não tem a obrigação de conhecer os trabalhos de todas as comissões, que alguns deles foram pedidos não só pelo Grupo Parlamentar do PCP mas também por deliberação de comissões e, mesmo assim, o Governo não os enviou. O seu Governo, o Governo apoiado pelo seu partido não os enviou.

Eu não disse, Sr. Deputado, ...

Não, não! Depois de assinados e de o dinheiro disponibilizado! Não é enquanto estão a decorrer as negociações! Não esteja a tentar baralhar as questões.

Estamos a falar de contratos efectivados, que não sabemos o que importaram em termos de apoios públicos, porque o Governo não nos diz, mas nós queremos saber. Aliás, queremos saber e temos o direito de saber. Isto é a transparência que os senhores obstaculizam com o vosso Governo e a vossa prática!

Creio que fui bem claro quando disse que o PS tem sido, até aqui, obstáculo à investigação. Eu disse isto no plano legislativo, porque quem não quer aprovar o tipo criminal de enriquecimento ilícito, sabendo que ele é recomendado por uma convenção das Nações Unidas, ratificada pelo Estado português...

Em Itália, não há de certeza, mas, em Portugal, pode muito bem haver este tipo de crime de enriquecimento ilícito.

O que dizemos é que, se temos um quadro criminal penal em que o crime de corrupção é de tão difícil aplicação, temos de encontrar os meios para que a corrupção seja punida e o nriquecimento ilícito seja um tipo criminal consagrado no Código Penal português. Isto é combater a corrupção no plano legislativo.

Termino, Sr. Deputado, dizendo que nada insinuei! O que eu digo é que quem quer esconder da

Assembleia da República e do controlo e fiscalização políticos contratos com empresas privadas, com grupos económicos privados, fica responsabilizado por concluirmos que está a esconder decisões que foram contrárias ao interesse público, porque só isto é que justifica esta opacidade e esta falta de transparência.