Partido Comunista Português
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Intervenção de abertura do 17º Congresso do PCP
Sexta, 26 Novembro 2004
Carlos Carvalhas, Secretário-geral do PCP

 

Caros camaradas
Caros amigos
Estimados convidados nacionais e estrangeiros


Agradeço e saúdo a vossa presença solidária assim como quero saudar fraternalmente todos os camaradas delegados e, pelo vosso intermédio, saudar todo o generoso colectivo partidário que é constituído por várias gerações de comunistas que forjaram, implantaram e consolidaram este grande Partido, o Partido Comunista Português.

Estando certo que interpreto o sentir dos delegados e do colectivo partidário, quero daqui saudar calorosamente o camarada Álvaro Cunhal que, por razões conhecidas, não pode estar neste Congresso, mas que nos enviou uma saudação, bem como os camaradas delegados Dias Lourenço, Jaime Serra, Joaquim Gomes, José Vitoriano, Sérgio Vilarigues, e por seu intermédio todas as camaradas e sublinho todas as camaradas e todos os camaradas que, vindos da luta clandestina, estão felizmente connosco prosseguindo a nossa luta comum.

Camaradas:

Chegamos ao Congresso após um amplo processo de preparação que envolveu na sua participação muitos milhares de membros do Partido, num ambiente de serenidade e de reflexão, mas também de vivacidade e frontalidade, e que trouxeram para o debate as suas opiniões e propostas escritas e orais.

Fizemo-lo sem deixar de dar resposta à situação política. E num processo e numa metodologia de envolvimento e participação dos militantes, pois ao contrário de outros partidos, o nosso Congresso, com toda a sua importância e significado, é um ponto de chegada e de apuramento final de um largo debate e também um momento de prestação de contas e de testemunho da actividade das diversas organizações e áreas de trabalho partidárias.

Um processo em que a análise sobre a evolução política e a actividade partidária pode ser feita sem o embaraço de ter que esconder posições e atitudes políticas assumidas no passado recente e sem a necessidade de apagar um rasto de incoerências para credibilizar a acção futura.

Um processo em que a definição da orientação política é construída a partir da análise aprofundada da situação e da contribuição dada pela reflexão e opinião do colectivo partidário, polarizada na procura das melhores respostas do partido à situação e realidade políticas e às tarefas para lhe responder e não na mera base de disputas pessoais ou de guerras de “personalidades”.

Um processo participado por membros do Partido iguais em direitos e deveres, de que a resultante é a soma da contribuição de cada um desses membros, na diversidade dos seus conhecimentos, experiência de vida ou formação.

Um processo em que a construção das soluções de direcção resulta de um largo exame colectivo de propostas, de observações, de consultas a organismos e organizações e de reflectida avaliação sobre cada quadro e não de uma escolha ditada pela vontade de um único dirigente ou de um chefe do partido, de acordo com o seu círculo de simpatias, ambições ou interesses pessoais.

De uma coisa podem os delegados ao nosso Congresso, a comunicação social e o país inteiro ficarem certos: há de facto coisas que, por mais voltas que o mundo dê, não tencionamos mudar nem copiar de outros partidos e, por isso, tal como aconteceu nos anteriores dezasseis congressos do nosso Partido, também neste XVII Congresso, não passará nenhum filme contando a vida desde pequenino de qualquer dirigente do PCP e não será estreado nenhum novo hino com hossanas e referências a qualquer dos seus dirigentes.

Camaradas:

O debate preparatório confirmou desde a sua primeira fase iniciada em Fevereiro uma significativa vontade de contribuição para a reflexão colectiva. As muitas opiniões, análises e reflexões feitas chegar na primeira fase do debate preparatório incorporadas no projecto de Resolução Política posto à discussão e as propostas escritas de alteração que daqui resultaram, revelam o interesse e envolvimento de milhares de militantes do Partido. Mesmo da parte daqueles camaradas que, por razões várias, não tiveram possibilidade ou não puderam ler os documentos ou que, por diversas razões, não redigiram textos de alteração, a verdade é que se obteve pela sua participação, pelas opiniões que expressaram e pela experiência pessoal que trouxeram, uma importante contribuição ao debate e elementos de enriquecimento às análises e propostas que a direcção do Partido adiantou para discussão.

Um debate que mobilizou todas as organizações, realizado de Norte a Sul do continente, nas Regiões Autónomas e na emigração, centrado na discussão colectiva em reuniões e assembleias plenárias mas adicionada também pela contribuição individual feita chegar através das páginas do Avante ou do «sítio internet» do PCP. Um debate que na segunda fase também se expressa nas mais de 1 100 propostas de emenda ao projecto de Resolução Política e de alteração aos Estatutos. Um debate que expressou ainda o esforço feito para levar o mais longe possível a participação democrática e a intervenção dos membros do PCP traduzidas nas mais de 1 200 reuniões e iniciativas realizadas para debate das Teses e nas largas centenas de assembleias electivas no âmbito da preparação do Congresso, a que se somaram muitas outras decorrentes da actividade normal das nossas organizações e da sua resposta à política do governo.

Com isto não queremos dizer que temos uma visão de perfeição e de auto-satisfação, que não devemos examinar as formas de envolver mais e mais militantes, de tornar mais acessível e menos extenso o projecto de Teses a debater, de combatermos rotulações e classificações em vez do debate de ideias ou qualquer deriva de mando, de autoritarismo ou de imposição de ideias, que por vezes ainda se manifestam. Também a questão do aprofundamento da nossa democracia interna e do controlo do exercício do poder, a todos os níveis, tem que estar sempre presente. Mas é uma evidência que isto nada tem a ver com aqueles que se colocam à margem das regras do funcionamento do Partido que aprovaram, procurando através dos factos consumados ou da comunicação social que a maioria se submeta às suas posições que não fizeram vencimento. É de relembrar que o nosso Congresso não se confina a um mero processo eleitoral e muito menos a um processo eleitoral guiado pelos “medias”. E vale a pena também reafirmar que os delegados ao XVII Congresso, democraticamente eleitos pelos militantes do partido, com inteira liberdade de opinião e de voto, exercerão a soberania de decisão que os Estatutos em vigor e o Regulamento aprovado lhes conferem.

Por isso, quero daqui saudar todos os membros do Partido e todos os que deram o seu contributo na preparação deste Congresso, por mais modesto que tenha sido; todos os que defenderam os seus pontos de vista, quer eles tenham sido de concordância ou de crítica ao projecto de Resolução Política que esteve em debate ou à actividade da Direcção; todos os que legitimamente nos fizeram chegar a sua preocupação ou discordância sobre tal ou tal questão ou solução em apreço; todos os que exerceram plenamente os seus direitos e responsabilidades de membros do Partido.

Desde que anunciamos a data e a preparação do Congresso, sabíamos igualmente que se iriam intensificar as linhas de intoxicação, que de fora para dentro do Partido sempre procuram a perturbação e a divisão e que, com o anúncio de que deixaria as funções de Secretário-geral neste Congresso, iríamos assistir ao relançamento de intrigas e especulações e às rotulações sobre os dirigentes do PCP. Na verdade, desde que anunciamos a preparação de um Congresso, não têm faltado os analistas encartados e sobretudo dos que mais se têm distinguido no anticomunismo a manifestarem a sua preocupação com o reforço do PCP, dando múltiplos conselhos e apontando os caminhos radiosos que o PCP deveria seguir. Um tal desvelo, uma tal preocupação, e sobretudo vindos de quem vêm, não pode deixar de merecer da nossa parte os melhores agradecimentos designadamente pela clareza com que revelam as suas intenções. E, como é evidente, não estamos a falar em nenhuma “campanha” contra o PCP e muito menos em qualquer famosa “cabala não intencional” do não menos famoso ex-ministro dos Assuntos Parlamentares. Estamos a falar, como se sabe, de gente preocupadíssima com a saúde do PCP!...

Outros, sobre diversas formas, voltaram a repetir o velho e falso “dilema” da morte anunciada do Partido! Se o PCP se renova fica igual aos outros. E, como entre a cópia e o original, é sempre preferível o original a sua sorte é o desaparecimento. Se o PCP se mantém “puro e duro” inadaptado à mudança, fora da “modernidade”, como eles dizem, a sua sorte é também o desaparecimento, eventualmente de forma mais lenta, acrescentam...

Copiando-se uns aos outros numa magnífica originalidade, quem o afirma são em muitos casos os que não querem aparecer como anticomunistas primários. Mas o que eles estão a dizer sem se darem conta ou sem o assumirem, é que o PCP faça o que fizer não tem lugar na sociedade portuguesa. Está condenado à morte, à morte rápida ou à morte lenta! Com as derrotas do socialismo a Leste, o que estes querem inculcar sem o assumirem é a velha tese de que não há lugar para os partidos comunistas. Não são necessários. E o que está subjacente a esta afirmação é a concepção, também não assumida, de que não há alternativa ao capitalismo. É a concepção do capitalismo como fim da história. Como para estes não há alternativa ao capitalismo, o PCP não é necessário. Para “melhorar” o capitalismo, para servir o capital financeiro e as classes possidentes, quando a direita está desgastada, têm o PS e a social-democracia, campeões das privatizações, do neoliberalismo e que não põem em causa, antes pelo contrário, a privatização de empresas básicas e estratégicas. Para estes o rotativismo chega-lhes. A sua concepção de “esquerda” fica por aqui: lutar em discurso por um capitalismo bonzinho, mais “humano”, com os trabalhadores e os povos resignados à concentração da riqueza, à dominação e à exploração.

Não querem entender nem ver que, para o PCP a renovação, não é a da capitulação ideológica ou da adaptação e submissão face à ofensiva neoliberal e à agressividade do imperialismo. Para o PCP, “renovar” é uma exigência para quem quer transformar a sociedade: renovação em oposição ao rotineirismo e às soluções gastas, renovação nos métodos, nas análises, nas respostas aos novos problemas, renovação dos seus quadros e dirigentes.

Por mais que tomem os desejos pela realidade, este partido que luta pela transformação social, que não se rende ao capitalismo, que se bate pela satisfação das aspirações populares mais prementes e reivindicações imediatas continua a inscrever na sua luta, o socialismo como futuro de Portugal; este Partido que enfrenta o grande capital e a política de concentração de riqueza, que combate a política de direita, seja ela conduzida pelos partidos de direita seja pelo PS, é um Partido necessário e imprescindível à classe operária, aos trabalhadores e ao país e com fortes e sólidas raízes populares.

O “dilema” que estes deviam explicitar é o dilema alternativa ou alternância. Isto é, o dilema da social democracia que veste a roupagem de esquerda no verbo quando está na oposição e imita a direita e pratica o neoliberalismo quando chega ao poder. Razão pela qual a alternância não tem passado no fundamental, de uma mudança de caras, isto é, de um rotativismo sem alternativa.

Não haverá alternativa sem o PCP. O que não dizem os sofistas do “dilema” é que o PCP é o grande obstáculo à política de direita, a força que nas lutas sociais e políticas combate com firmeza, coerência e determinação o bloco central de interesses. O que não dizem tais profetas do anticomunismo, resignados ou acomodados no sistema, é que o PCP é a grande força política mobilizadora de vontades, de energias e da luta. O que não dizem tais instalados no rotativismo e no verbalismo tribunício é que nenhum outro partido substitui o PCP e o seu papel na luta de massas em defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país. O que não dizem os “velhos do Restelo” é que o PCP ao contrário de outros, não se limita à luta institucional nem anda atrás do se que diz ser modernidade ou que pode ser mediático ou que estreleja como os foguetes, porque para o PCP o que conta é a resolução dos problemas concretos das populações e do povo e o que é moderno e serve o povo não é a crescente subordinação do poder político ao poder económico e designadamente ao poder económico estrangeiro, mas sim a defesa da soberania nacional, a defesa dos «centros de decisão nacionais» e o aprofundamento da democracia em todas as suas vertentes. Digam o que disserem os teólogos e os “Bin Laden’S” do «Pensamento único» que sustentam a pretensa eternidade e superioridade do capitalismo, o que é moderno e serve o povo é ter a coragem de lutar pela emancipação dos trabalhadores. De lutar pela construção de novas sociedade libertas da exploração do homem pelo homem.
O que é moderno e tem futuro, não é a apropriação dos recursos e riquezas, mundiais ou nacionais, por uma minoria de privilegiados, não é a dominação dos interesses do grande capital sobre os povos e países através de guerras preventivas, processos neocoloniais e trocas desiguais à custa de trágicos e incontáveis sofrimentos, humilhações e ofensas à dignidade dos seres humanos, mas a coragem de proclamar o Homem, os seus direitos, as suas aspirações, a sua dignidade e a sua felicidade como eixo central da organização das sociedades e de definição das respectivas políticas.


II
Um outro mundo é possível

Camaradas, o XVII Congresso do PCP, como se afirma no projecto da Resolução Política realiza-se no contexto de uma violenta, agressiva e generalizada ofensiva do imperialismo que conheceu após os atentados do 11 de Setembro um novo e perigoso desenvolvimento.

Hoje sabe-se com mais clareza, que o 11 de Setembro deu um pretexto ideal à Administração Bush e aos seus falcões para estabelecer a doutrina da guerra preventiva, invadir o ocupar o Iraque e com um cinismo notável tirar partido do traumatismo psicológico na sociedade americana para aumentar o orçamento militar, avançar com a repressão interna e a limitação de liberdades através da aprovação do “Patriot Act” e outras leis criando uma situação de suspeição generalizada.

Hoje sabe-se com mais clareza, que antes do 11 de Setembro a Administração Bush já planeava ocupar o Iraque, para deitar mão ao petróleo e controlar aquela importante área estratégica.

Hoje sabe-se também com mais clareza que a guerra de ocupação foi feita sob a mentira, pois os dois argumentos invocados eram falsos. Não havia no Iraque armas de destruição massiva, nem se provaram as ligações de Saddam a Bin Laden.

Mas foi na base da mentira e de provas e relatórios forjados para vender a guerra à opinião pública que o imperialismo americano e os seus vassalos, entre os quais se conta o governo do PSD/CDS-PP, invadiram e ocuparam o Iraque depois de intensos bombardeamentos com a morte de milhares de civis e a destruição das infraestruturas do país.

A instilação do medo, a hipocrisia e a mentira foram a base para declarar a guerra e são a base da doutrina oficial do imperialismo para novas agressões.

A mentira dos relatórios falsificados, a mentira das ridículas provas de Colin Powell apresentadas no Conselho de Segurança, classificadas por Hans Blix como falsificação grosseira, a mentira de que Saddam estava a matar prisioneiros a sangue frio como jurou esse grande vulto da esquerda renovadora e moderna, que dá pelo nome de Tony Blair. Até a libertação heróica da soldado Jessica Linch foi uma inqualificável encenação.

E como se viu também, mesmo logo a seguir à invasão e à ocupação, ao contrário do que vaticinava o cínico Donald Rumsfield, não houve nem deserções em massa do exército iraquiano, nem levantamentos populares contra o regime, nem o exército da coligação foi recebido com flores e aplausos. Não tardou sim em ser recebido à bomba e a ter de se enclausurar nos quartéis. Desde que Bush declarou a guerra como acabada, não cessaram os atentados, os bombardeamentos, as destruições em massa.

As sevícias físicas e sexuais, os tratamentos sádicos infligidos a vários prisioneiros em Abou Ghraib, e também em Guantamano e nas prisões secretas no Afeganistão põem a nú a hipocrisia americana da construção no Iraque de uma democracia fundada sobre o respeito dos direitos humanos. Fundada à bomba, como se vê em Falluja numa política de terra queimada e destruição, com o silêncio da chamada comunidade internacional que só acordou agora com as cenas de horror das imagens dos disparos sobre um iraquiano ferido e desarmado!

Ao contrário do que dizia Bush, não há nem estabilidade, nem democracia no Iraque, nem estabilização do mercado petrolífero – o barril atingiu valores elevadíssimos–, nem o mundo está melhor e mais seguro, como é reconhecido em vários quadrantes políticos.

O império com toda a arrogância prossegue a guerra no Iraque, ameaça outros Estados, acentua as ingerências e o bloqueio a Cuba, multiplica as ingerências na Venezuela e deu carta branca a Sharon para continuar a construção do muro na Cisjordânia e para continuar com os massacres dos palestinianos. E agora, EUA e Israel, que já não têm sequer o pretexto do dirigente histórico do povo da Palestina, Yasser Arafat, a quem prestamos homenagem, dizem cinicamente que vão relançar o “Roteiro para a Paz”!

Nós, daqui deste nosso XVII Congresso, saudamos o povo palestiniano e exigimos o fim da ocupação da Palestina, dos colonatos, do muro do appartheid e o relançamento do diálogo, que se concretize numa solução justa para o Estado da Palestina e a vivência em paz e segurança dos povos israelita e palestiniano.

Nós, daqui deste nosso XVII Congresso, saudamos igualmente todos os povos em luta, todos os povos vítimas do imperialismo e manifestamo-lhes a nossa activa solidariedade.

É também com base na mentira continuada e na esfarrapada desculpa da farsa das eleições em Janeiro, que o governo de Santana/Portas decidiu prolongar a missão da GNR no Iraque. Como se vê, para prolongar e reforçar as missões militares no Iraque, no Afeganistão, ou no Kosovo, já não há falta de dinheiro!

Com a derrota das experiências de construção do socialismo a leste, o imperialismo, nomeadamente a potência hegemónica, os EUA, ficaram com as mãos mais livres. O seu sonho é o domínio planetário. Mas não têm as mãos totalmente livres. Têm pela frente o combate, a resistência, a intervenção e a luta das forças progressistas, dos trabalhadores e dos povos. As grandes manifestações concertadas a nível mundial pela paz, contra a guerra, por exemplo, constituíram um facto novo e mostraram as potencialidades de resistência e de luta.

O “movimento antiglobalização” contra o neoliberalismo e a guerra, apesar do seu carácter social e politicamente diversificado, tem mostrado, objectivamente uma orientação anti-imperialista e anti-capitalista.

É cada vez maior a consciência entre as massas de que a globalização neoliberal, isto é, que a globalização capitalista, condena milhões de seres humanos a uma pobreza extrema, à polarização da riqueza como nunca se viu, à destruição ou submissão dos aparelhos produtivos e industriais dos países de economias mais débeis, realizando uma “pilhagem planetária”. Com a liberdade de circulação de capitais, o grande capital passou a dispor de um elemento de domínio, de liquidação de actividades produtivas nos países com economias mais débeis e de chantagem através das deslocalizações dos investimentos, dando-se ao luxo de pôr em disputa países e escolher o que lhe dá mais condições e subsídios. Simultaneamente impõe uma troca cada vez mais desigual e utiliza o garrote da dívida externa.

Para essa pilhagem o imperialismo dispõe também de instituições internacionais com os seus aparelho ideológicos, as suas redes de influência e de pressão, com os seus meios e acções próprias e que vão difundindo o “Pensamento único” assente nos dogmas e na teologia do neoliberalismo, nos “dez mandamentos” do consenso de Washington e na santificação dos mercados: o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) e a Organização Mundial do Comércio (OMC). A ideologia do neoliberalismo é também difundida pelo G8 – o clube dos ricos e pelo Forúm de Davos – reproduzida e papagueada nas universidades, nos meios da comunicação social e por comentadores económicos. Estas instituições são poderosos instrumentos de domínio ideológico, de submissão e estrangulamento das economias. Já alguém disse que Mac Namara matou mais seres humanos à frente do Banco Mundial do que como secretário da Defesa dos EUA em relação aos massacres do Vietname.

O G8 e designadamente os EUA dominam as instituições financeiras internacionais, que constróem o quadro institucional da globalização neoliberal tendo como um dos elementos fundamentais a OMC (Organização Mundial do Comércio).

Todos vão martelando no tripé: estabilização, liberalização, privatizações. Todos recitam os “dez mandamentos do consenso de Washington” com a disciplina fiscal, liberalização do comércio; privatizações; desregulamentação e, último mandamento... direitos de propriedade... Isto é, todos defendem o derrube dos diversos obstáculos para que o peixe grande coma o pequeno e máximas garantias para que o “peixe grande” possa regressar de onde partiu mais gordo e anafado!

Face ao derrube de barreiras aduaneiras técnicas e fiscais e perante a livre circulação de capitais, a competitividade é, como já foi afirmado, erigida em “evangelho”. Para sobreviver à concorrência, à guerra tecnológica, industrial e comercial, dizem eles, há que baixar custos de trabalho, e tudo fazer nas escolas, nos sindicatos, nas infraestruturas, nos impostos, para que as empresas sejam competitivas à escala planetária.

Os evangelistas do “pensamento único” – alguns economistas de renome, formatados nos EUA, Inglaterra, Japão, vão codificando as ditas leis naturais da economia moderna...

Como é evidente, tudo isto é embrulhado com o objectivo de promover o desenvolvimento e combater a fome no mundo.

Mas, como a vida nos mostra, há hoje cidadãos com património e fortuna superior ao PIB de vários países. Nunca os ricos estiveram tão ricos e os pobres tão pobres, apesar dos imensos avanços científicos e tecnológicos, e da possível criação de bens e serviços capazes de resolver os problemas mais agudos da humanidade: uma pequena percentagem dos gastos no armamento ou uma pequena percentagem sobre as operações financeiras especulativas, ou uma pequena gota do que foge aos impostos nos paraísos fiscais ou uma pequeníssima fracção dos fabulosos lucros da droga e da economia criminosa resolveria esses problemas. Tantos seminários, tantos congressos, tantas reuniões da ONU, de governos, de igrejas, tantos votos pios. Se se quer garantir os direitos humanos e resolver os problemas da fome e do subdesenvolvimento, ataque-se onde se deve atacar. Veja-se o fosso colossal da sociedade de informação em que 19% da população mundial representa 91% dos utilizadores da internet a que se junta a fantástica desigualdade de rendimentos – 25% da população dos países ricos detêm 85% do rendimento mundial. E atente-se, por exemplo, na recusa e boicote de propostas na declaração final da Cimeira da ONU sobre a sociedade de informação organizada pela União Internacional de Comunicações, comparada por alguns com a Cimeira da Terra no Rio para o ambiente, em que os países ricos e as grandes empresas recusaram financiar um «Fundo de Solidariedade» para expandir as novas tecnologias da informação nos países menos desenvolvidos. E quanto a uma gestão multilateral da Internet, transparente e democrática no seio de uma instância especializada das Nações Unidas esta proposta foi recusada pelos EUA com o pretexto de que só o sector privado garante que a Internet seja um instrumento de liberdade!

Precisamente em sentido contrário, a globalização capitalista neoliberal continua a vender-se como a salvação da humanidade e como os resultados não o demonstram, os teólogos neoliberais vão repetindo os seus dogmas, dizendo que é preciso mais, silenciando e perseguindo todos os heréticos, organizando fóruns messiânicos, com os seus círculos de intelectuais quimicamente puros, com as “trilaterais”, com os fiéis promovidos a grandes sábios e catedráticos, pelas universidades pertença dos grandes senhores do dinheiro.

Mas, como é evidente, não conseguem explicar a crescente acentuação das desigualdades, as regressões democráticas e sociais, os milhões de seres humanos condenados a uma vida miserável ao lado da maior opulência, não conseguem explicar porque é que o livre cambismo tem um sentido único, com os EUA a serem o país mais proteccionista do mundo, nem porque se promove o dumping social e ambiental, nem quais os direitos humanos dos milhões de desempregados e dos civis mortos e estropiados da guerra preventiva de Bush, nem dos “condenados da Terra” pelo sistema capitalista.

E como também é evidente em vez de combaterem o terrorismo fomentam-no. Não se combate o terrorismo sem combater os seus mais importantes factores, a fome, a acentuação das desigualdades, o subdesenvolvimento, as injustiças sociais, a exploração e a dominação.

Também não se combate o terrorismo com governos terroristas que exercem cinicamente o terrorismo de estado, que determinam friamente assassinatos selectivos como o fez o governo de Sharon.

Um intelectual americano disse recentemente que quem votou Bush, votou no aumento do terrorismo sem o saber. Pensamos que é uma verdade, sem esquecer que na maravilhosa democracia americana apenas 55% dos eleitores exerceram o seu direito de voto.


Camaradas

O capitalismo não se libertou das suas crises, nem das suas taras, nem da contradição antagónica entre o capital e o trabalho, nem das políticas de exploração, opressão, domínio, violência e guerra.

Como se afirma no projecto de Resolução Política, a luta é o caminho. Nas actuais circunstâncias de grande incerteza e instabilidade, as transformações progressistas e revolucionárias que a alternativa ao actual estado de coisas reclama, não serão fruto de esquemas e medidas preconcebidas, nem de voluntarismos, mas das lutas de massas, das lutas das diversas forças progressistas e revolucionárias de forma convergente ou complementar, da dialéctica da luta revolucionária nos planos nacional, regional e mundial.


III
Derrotar o governo PSD/CDS-PP

Camaradas e amigos:

Com diferenças que não se negam, mas sobretudo no mais acessório, com graus e aprofundamentos diferentes, estes quatro anos ficaram marcados nas questões mais essenciais e fundamentais pela continuação das políticas de direita, quer com o governo do PS quer depois com os governos do PSD/CDS-PP. Concentração de riqueza, privatizações, submissão crescente do poder político ao poder económico, aperto do cinto aos trabalhadores e reformados, regressão e empobrecimento das diversas componentes da democracia.

Como se afirma no projecto de Resolução Política, o êxito eleitoral dos partidos de direita está indissociavelmente ligado no essencial à política seguida pelos governos PS.

Num quadro de grande desencanto e descontentamento com a política do governo PS e de uma ofensiva particularmente violenta contra o nosso Partido, o PSD desenvolveu uma campanha populista, de promessas e mais promessas que lhe deu a vitória.

Foi a promessa da baixa dos impostas, de melhoria dos salários, do combate ao desemprego, do combate à fraude e à evasão fiscal, foi a promessa de que, com o PSD, no governo, Portugal cresceria dois pontos percentuais acima da média europeia acelerando a convergência da nossa economia.

Depois tivemos o discurso de tanga. Corte cego na despesa pública. Recessão. Desemprego. Encerramento e deslocalização de empresas. Negociata das privatizações. Desresponsabilização crescente do Estado das suas funções sociais. Escândalos com diversos ministros que levaram às demissões de Isaltino de Morais, Pedro Lince e Martins da Cruz.

A política do governo PSD/PP é a responsável pela recessão do país e pelo seu aprofundamento e prolongamento. A economia portuguesa em vez de convergir continua a afastar-se da média europeia. Agravou-se a situação social.

O cartão vermelho dado à política governamental nas eleições para o Parlamento Europeu, a crise que se seguiu com o abandono do governo por Durão Barroso, a política desastrosa que tinha sido levada a cabo exigia que a palavra fosse dada ao povo.

O que se passou é conhecido. Contrariando-se um profundo sentimento que se expressava na sociedade portuguesa, em nome de uma pseudo estabilidade, decidiu-se indigitar Santana Lopes para o cargo de Primeiro-Ministro e empossar um governo de involução na continuidade.

A estabilidade aí está, no aumento do desemprego, no agravamento das dificuldades para milhares e milhares de famílias, na colocação dos professores, na nomeação dos boys, na política clientelar, na política orçamental, no continuado encerramento de empresas e nas deslocalizações.

A estabilidade aí está nas demissões de secretários de Estado e na remodelação ministerial que no dizer de Santana Lopes não é uma remodelação, mas apenas, uma reestruturação, um “re-arranjo”.

A estabilidade aí está, na situação de segurança das populações principalmente nas áreas urbanas em que tem aumentado a criminalidade e a criminalidade violenta e grupal, com o silêncio comprometido de Paulo Portas. A estabilidade aí está, na acentuação das desigualdades, no agravamento da situação social, na dependência económica, na venda ao desbarato de empresas públicas, no controlo crescente da comunicação social e na desfiguração do regime democrático!

Os casos da demissão do Director do Diário de Notícias, da Direcção de Informação da RTP, o caso da TVI – Marcelo, as ameaças directas e indirectas por membros do governo a diversos órgãos de informação e à Alta Autoridade para a Comunicação Social, as preocupações com os acessores para a imprensa e a imagem do Primeiro-Ministro pagos a peso de ouro, a luminosa central de informação agora vetada pelo Presidente da República, são alguns exemplos da política do governo de Santana Lopes no marketing político e no controlo da Comunicação Social.

A grande tarefa do Ministro Morais Sarmento, tanto no governo de Durão Barroso, como no de Santana Lopes, tem sido de facto o controlo dos órgãos de comunicação social do Estado e de estabelecer através dos favores, dos “acordos de cavalheiros” com os principais patrões da comunicação social privada, a concretização, no plano prático, de uma rede de comunicação que promova a imagem do chefe e do governo. E isto, num quadro em que quatro ou cinco grandes grupos detêm a grande maioria dos meios de informação. É uma situação inaceitável.

Por isso, afirmamos que assume uma grande importância o apoio e o estímulo à luta dos jornalistas e outros profissionais de informação contra a precarização laboral e pela afirmação dos seus direitos de autonomia e isenção, a luta por uma informação pluralista vinculada ao interesse público bem como a luta por soluções legislativas que enfrentem corajosamente a questão da crescente concentração da propriedade.

Para alguns nunca houve austeridade

Camaradas:

O Primeiro-Ministro afirmou no recente Congresso do PSD que o tempo da austeridade terminou!

Para alguns, isto é, para a clientela do PSD, para os que recebem os favores do Estado; para os assessores do Primeiro-Ministro e de Paulo Portas; para os boys e girls dos famosos jobs; para os reformados de luxo e para o capital financeiro, para os 200 bilionários que a revista Fortuna publica anualmente, a austeridade, como já afirmámos, não acabou pela simples razão de que nunca começou. Pelo contrário, foram tempos de abastança e de acumulação...

A austeridade também não terminou com a magnífica descida do IRS para os trabalhadores por conta de outrém decidida por Bagão Félix. Descida da taxa que no essencial só se fará sentir em 2006 e que por mero acaso é ano de eleições.
No final do ano passado, Durão Barroso também afirmou solenemente perante o país que «o pior já passou», depois de o ter andado a repetir durante todo o ano. Foi o que se viu! Santana Lopes substitui o “o pior já passou” de Durão Barroso, pelo “fim da austeridade”, isto é, muda as palavras e repete o mesmo truque.

Para os portugueses cujos rendimentos e condições de vida foram fortemente atingidos pela escalada dos aumentos de preços muito acima das taxas oficiais da inflação e estas acima das estabelecidas no Orçamento, o pior não passou, tal como a chamada austeridade não vai acabar em 2004. Não vai acabar também para os 500 mil desempregados, nem para milhares de reformados, nem para os trabalhadores da Sorefame, ou da Cometna e de outras empresas, nem para os pequenos e médios agricultores do Douro, nem para os trabalhadores em geral. O pior ainda está para vir, pois os seus direitos e regalias, duramente conquistados, vão ser laminados pelo intolerável e retrógrado código do trabalho.

O fim da austeridade não se resolve com marketing político, nem com discursos populistas, mas com factos, medidas e propostas concretas. Na Assembleia da República, Santana Lopes foi obrigado a dar o dito pelo não dito e a afirmar que de facto a austeridade não acabou para muitos que vivem em dificuldade e, com a maior desfaçatez, acrescentou que no entanto era necessário um discurso optimista. Tudo se resolve para este governo ao nível do discurso e da propaganda!

Por isso, sr. Primeiro-Ministro se nada podemos fazer sobre os pesadelos que povoam os seus sonhos, pois isso é de outro foro, o que lhe sugerimos é que fique com os pesadelos para si em vez de os atirar para cima dos portugueses. Por favor não os revele publicamente, como fez no Congresso do seu Partido dizendo que sonha em ficar dez anos no governo... Nada menos do que Cavaco!

Em tempos natalícios, não assuste o país e meta antes uma prenda no sapatinho dos portugueses. Demita-se, vá para férias e deixe os portugueses aliviados e permita que estes se pronunciem.

Se não o fizer, pela nossa parte tudo faremos para que não chegue até Agosto para que vá repousar o mais depressa possível. Pela nossa parte, não nos resignamos como outros a que prossiga com Paulo Portas na grande agência de publicidade “Santana Lopes-Portas S.A.” até 2006, com as sistemáticas malfeitorias e com a obra de destruição do aparelho produtivo e regressão social e democrática.

E, por isso lhe dizemos, pode contar com a nossa luta firme e determinada. A luta continua!

A chamada Constituição Europeia

Camaradas:

A chamada Constituição Europeia é um texto inaceitável. Baptizada de Constituição sem qualquer processo constituinte, elaborado na “liturgia giscardiana” da opacidade, do segredo, dos factos consumados e com os fiéis ditos europeístas, este novo Tratado é uma perfeita impostura consagrando o modelo neoliberal e o seus postulados ideológicos.

“Constitucionaliza” o primado da “livre concorrência” sobre toda e qualquer outra norma; a subordinação dos serviços públicos às regras comunitárias, afirma que o livre cambismo corresponde ao «interesse comum» proibindo, como não poderia deixar de ser, qualquer restrição à circulação de capitais e fixa a “independência” do BCE, órgão não eleito, nem sujeito a controlo e que tem poderes exorbitantes.

É a consagração e endeusamento do mercado, a generalização da concorrência com o ataque aos serviços públicos, o estímulo ao prolongamento da duração dos horários de trabalho e à sua flexibilização.

É também um significativo avanço para o federalismo, isto é, a federalização dos pequenos estados tutelados através do processo de decisão/votação dominado pelo Directório das grandes potências.

A denominação de Constituição Europeia ao que é apenas um tratado, não é inocente. Visa impôr a cultura federalista e tornar aceitável pelos factos consumados a prevalência das normas da dita constituição sobre as legislações e constituições dos Estados membros.

A prevalência da lógica do peso da população sobre a igualdade entre Estados soberanos permitiu a dominação das grandes potências.

Inaceitável igualmente o facto de se lançar neste tratado as bases institucionais da militarização da União Europeia, com a subordinação de facto, da União Europeia à Nato!

Inaceitável é ainda o facto de se ter avançado para o alargamento com praticamente o mesmo Orçamento o que contraria frontalmente a concretização do princípio da coesão económica e social.

O projecto de Orçamento para 2005 ficou uma vez mais abaixo de 1% do PNB comunitário e ainda por cima com uma progressiva mudança das prioridades orçamentais para a Justiça, políticas securitárias, política exterior e de segurança comum em detrimento de prioridades como o emprego, apoio social e a cooperação com países menos desenvolvidos.

Inaceitável foi também a revisão constitucional para introduzir a submissão da Constituição da República Portuguesa à Constituição Europeia e ao direito comunitário, precisamente na celebração do 30.º aniversário da Revolução de Abril, que devolveu a soberania ao povo português!

Mais uma vez, tal como aconteceu na Lei dos Partidos e nas privatizações, o PS fez o papel do costume: desencadeou o processo de revisão, subscreveu a supremacia da dita Constituição Europeia sobre a Constituição Portuguesa, e isto mesmo sem o Tratado, dito Constituição, estar sequer aprovado.

É necessário continuar a denunciar e a combater estes processos.

Não se podendo referendar Tratados internacionais – por disposição constitucional acordado entre o PSD e o PS com a oposição reiterada do PCP – a pergunta aprovada, mais uma vez na base de uma acordo entre PS, PSD e CDS-PP, embora posta em causa agora pelo governo, confusa, extensa, não colocando questões essenciais, se for para a frente indicia que estamos perante uma encenação de referendo, para procurar legitimar um Tratado dito constitucional e a respectiva submissão da Constituição Portuguesa. Também até este momento ninguém esclareceu quais as consequências deste referendo no caso do «Não» sair vencedor. O truque de encontrar três perguntas numa só com questões dignas do sr. de La Palisse, como a pergunta sobre se concorda com a Carta dos Direitos Fundamentais, é uma paródia. A Constituição da República consagra um conjunto de direitos, liberdades e garantias superior ao da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, pelo que nada adianta, nem merece oposição, mas mostra que estamos perante uma farsa para obter um «sim» de qualquer maneira. Não terá qualquer legitimidade tal referendo.

A nossa posição sobre tudo isto é clara e coerente e sobre o Tratado também: a sua rejeição e combate. Uma posição de combate e de ruptura com o neoliberalismo, o federalismo e o militarismo. E esta é que é a questão. Os portugueses e as portuguesas concordam com um novo Tratado que se quer consagrar como Constituição, passando por cima das constituições nacionais, fixando uma organização económica de matriz neoliberal, uma via federalista e a sua militarização como pilar europeu da NATO?

Como se diz no projecto de Resolução Política, face às sucessivas etapas que a «construção» da União Europeia vai consumando, o PCP para alguns, deveria, contrariando os seus objectivos e convicções, render-se à inevitabilidade desses processos, ou seja, ficar condenado à política do «realismo» como a arte do possível, a uma prática política reduzida a um pragmatismo oportunista, sem valores nem princípios, a uma resignada opção pelo menor dos males.

O PCP não se adapta nem se submete e reafirma que outra Europa é necessária!

Uma Europa como livre união de Estados soberanos, iguais em direitos, empenhados na convergência económica e no progresso social, na promoção da paz e de uma cooperação exemplar com todos os povos do mundo.

Uma Europa que favoreça o desenvolvimento assente numa relação sustentável entre a natureza e a sociedade, defenda os interesses dos trabalhadores, respeite a identidade cultural, a soberania e a independência de Portugal.


As contra-reformas da direita

Camaradas:

Prosseguindo a política de direita este governo quer levar à prática de forma acelerada a privatização de importantes serviços públicos. Fala em reformas, mas o que concretiza são contra-reformas ao serviço dos grande interesses.

Em relação ao sistema público de segurança social, a Lei de Bases aprovada pela maioria PSD/CDS-PP e a sua posterior regulamentação é um duro golpe à protecção social e visa dar satisfação aos apetites das seguradoras privadas com o plafonamento e a privatização das suas partes mais rentáveis.

E neste Orçamento, mais uma vez, o governo não cumpre a Lei que obriga a transferência de dois pontos percentuais das contribuições dos trabalhadores para o Fundo de Estabilização Financeira continuando a descapitalização da Segurança Social para depois impor novas medidas gravosas.

Na saúde, o governo quer também concretizar o velho slogan do PSD: “quem quer saúde que a pague!”, agora sob a forma do “utilizador pagador”. Um princípio segundo Santana Lopes para «beneficiar os pobres».

Tal como nos transportes, o Dr. Santana Lopes quer fazer justiça social através da declaração do IRS que só espelha com maior verdade os rendimentos para os trabalhadores por conta de outrém. Quer reproduzir na saúde e nos transportes, como já o é no ensino, a injustiça fiscal de tal sistema. Está-se mesmo a ver os banqueiros, os gestores com cartão laranja e os grandes senhores do dinheiro nas listas de espera e nas consultas externas do SNS ou a correr para um transporte público para depois viajar como sardinha em lata a passo de caracol!

Ora a verdade é que o aumento das taxas moderadoras atinge particularmente os cidadãos mais desfavorecidos, não só em relação ao aumento do seu valor, mas também ao número de actos a serem taxados. Acresce que para muitos utentes também aumentou a factura dos medicamentos em virtude da aplicação do preço de referência.

A partir de 2005 o Orçamento de Estado e os doentes vão pagar as ditas parcerias público-privadas para a construção de 10 novos hospitais. Negócio magnífico e garantido para os grupos económicos... Por alguma razão o Grupo Mello defende e exige a imediata privatização para já, de metade do SNS.

Ao mesmo tempo que acentua a linha privatizadora e celebra um novo e vantajoso contrato para grupo Mello no Hospital Amadora-Sintra, o governo PSD/CDS-PP agravou o problema das listas cirúrgicas, apesar de prometer o seu fim, aplicando um programa (PECLEC) que redundou na criação de uma nova lista de espera.

Problema grave no plano da saúde é também o do aborto clandestino. Hipocritamente esta maioria continua a impedir que este se resolva no plano legislativo, continuando a apostar na criminalização e estigmatização das mulheres que têm que recorrer à interrupção voluntária da gravidez. Esta posição é também acompanhada de recuos em matéria de educação sexual e planeamento familiar.

O crescente número de casos de aborto levados a Tribunal é só por si uma acusação às posições hipócritas e retrógradas da maioria. Não é só a prisão que é uma humilhação para as mulheres. O simples julgamento e a devassa da sua vida privada a que são sujeitas é são por si uma humilhação pública inaceitável.

Camaradas:

Como sabeis, reafirmando com toda a clareza que a resposta de fundo ao problema do aborto clandestino passa de forma incontornável pela aprovação de uma lei de despenalização do aborto e reafirmando que prosseguiremos esse combate a que, desde há 22 anos, dedicamos um incomparável empenho, o nosso Partido acaba de apresentar na Assembleia da República um projecto de lei que, através de uma moratória legal, suspende as investigações, processos e julgamentos de mulheres acusadas da prática de aborto clandestino.

Esta nossa inciativa teve um considerável impacto, suscitou amplos apoios e até parece ter causado novas fricções dentro da maioria governamental.

Mas hoje e a este respeito, queremos sobretudo falar de algo de que ainda ninguém falou e que tem a ver com o profundo significado que esta nossa iniciativa encerra quanto à nossa forma de estar na vida política e de intervir na sociedade portuguesa.

Na verdade, camaradas, esta nossa proposta visa pôr termo ou suspender as investigações, os processos e os julgamentos de mulheres que recorrem ao aborto apesar de sabermos que essas investigações, processos e julgamentos são actualmente os momentos de maior incómodo, aflição e isolamento político da direita e são actualmente momentos de uma grande mediatização que confronta o conjunto da sociedade portuguesa com uma face especialmente chocante deste flagelo.

Pois bem, o que esta nossa iniciativa legislativa significa mais profundamente é que nós, que tantas vezes somos acusados de frieza e calculismo político e que tantas vezes somos acusados de praticar uma política de “quanto pior melhor”, fomos capazes de colocar à frente de quaisquer vantagens imediatas ou de tácticas políticas os direitos e a dignidade de todas as mulheres que são humilhadas e vêem a sua intimidade devassada por estas investigações, processos e julgamentos que, além do mais, estão servindo de estímulo a novas denúncias e de factor de agravamento das condições da prática clandestina do aborto.

Pensamos que esta nossa decisão e opção dá um forte testemunho da visão e dos valores humanistas pelos quais o nosso Partido se guia e estamos convictos que, se este nosso projecto fosse aprovado – o que infelizmente não acontecerá, pois mais uma vez, o PSD voltou a declarar-se prisioneiro do reaccionarismo extremo do CDS-PP – seria possível prosseguir combativamente a luta pela indispensável despenalização do aborto, como exigência elementar de humanidade e justiça e imperativo essencial de valores de civilização.

Camaradas:

Também para beneficiar os pobrezinhos, no dizer do governo foi apresentando na Assembleia da República uma autorização legislativa para alterar a lei do arrendamento.

Uma lei dita para dinamizar o mercado do arrendamento e recuperar para os inquilinos o parque urbano degradado.

Mas o que se vê é que esta lei vai levar ao aumento e aceleração dos despejos, a entrega dos centros e dos centros históricos das cidades à especulação imobiliária e à instabilidade social dos inquilinos e dos lojistas arrendatários.

A renda negociada tal como é apresentada é a institucionalização da instabilidade social dos inquilinos e dos lojistas arrendatários.

Aliás o governo nunca conseguiu explicar porque é que os contratos a prazo introduzidos em 1985 não dinamizaram o mercado nem impediram a degradação dos edifícios. Também a existência de 544 000 fogos devolutos provam que não é precarizando e liberalizando o mercado de arrendamento que se atingem aqueles objectivos.

O PCP apoia e apoiará os que lutam contra as injustiças desta lei.

Camaradas:

Na educação apesar dos discursos sobre a sua importância para o desenvolvimento e a competitividade estes últimos anos têm sido marcados por uma crescente elitização no acesso ao ensino superior e pela desvalorização da escola pública.

Quando se olha para o agravamento da situação social de tantas famílias para as atribuladas “reformas” do ensino e quando se vê o caos e a trapalhada que foi a abertura deste novo ano escolar percebe-se também porque é que Portugal é um país com uma taxa de abandono e insucesso escolar que atinge 25% dos estudantes do ensino secundário.

Para o PCP, a educação é um sector estratégico determinante para o desenvolvimento do país e o aprofundamento da democracia. O Estado deve garantir o direito Constitucional à educação, assegurando um ensino público gratuito e de qualidade para todos. A defesa da escola pública, um ensino ligado à vida e as saídas profissionais são questões essenciais na definição de uma política educativa. Na luta pelo ensino valorizado, na luta pela defesa da escola pública de qualidade e gratuito, na luta pelas saídas profissionais e o emprego, é justo destacar a luta da juventude e a luta empenhada da JCP que daqui saudamos calorosamente.

No plano do desenvolvimento do país é necessário também dar resposta ao crescente défice científico e tecnológico. Temos um insuficiente investimento público, o mais baixo investimento privado nas empresas, na investigação e desenvolvimento da União Europeia e um baixo nível, em geral de integração e conhecimento na actividade económica.

Mas se reconhecemos a máxima importância que a educação, a formação e o desenvolvimento científico e tecnológico têm para o desenvolvimento do país, também desmistificamos a ideia que estes só por si determinam um desenvolvimento sustentado.

Se há desindustrialização, crescente subcontratação e dependência da economia e a entrega de empresas básicas e estratégicas ao estrangeiro, o investimento na educação é sobretudo aproveitado pelas transnacionais e empresas estrangeiras e não pela economia nacional. Não entrando na questão da chamada “fuga de cérebros” há mão de obra altamente qualificada que se vê obrigada a emigrar ou a exercer actividades muito abaixo do seu perfil de aptidões. É uma delapidação colossal de meios.


É necessário e urgente uma outra política

Camaradas:

É necessária uma outra política. Uma política que valorize o trabalho e aproveite os recursos naturais e humanos. A política de direita tem também violado de forma sistemática a organização económica configurada pela Constituição da República. As privatizações e liberalizações com a inerente substituição de objectivos de serviço público pelo objectivo único de lucro privado, falsamente temperado por falsas entidades reguladoras – CP, EDP, CTT, Portugal Telecom, têm-se traduzido em processos de reestruturação com profundas e negativas implicações no território e para as populações agravando as assimetrias regionais.

A política necessária que o PCP defende, implica a ruptura com as políticas de direita, com o neoliberalismo e a concentração de riqueza e a valorização do aparelho produtivo, um perfil produtivo de maior e mais rico valor acrescentado, a centralidade e a valorização do trabalho dos portugueses como questão nuclear da economia, o combate aos principais défices – tecnológico, energético, agroalimentar – a defesa da soberania e o interesse nacional na União Europeia. Exige coragem e visão larga que determine uma efectiva estratégia de desenvolvimento nacional e não uma navegação à vista ao sabor dos ventos de Bruxelas! Portugal não pode continuar a destruir e a desvalorizar o seu aparelho produtivo e a entregar o pouco que resta às transnacionais. Nos últimos anos foram liquidados, submetidos ou fortemente comprometidos sectores e fileiras inteiras: química básica e fina (sector farmacêutico) siderurgia e metalurgias diversas, metalomecânica pesada. E também a agricultura e pescas se vêem limitadas por políticas comunitárias inclusive, no necessário aumento da produção. E temos uma indústria têxtil, de vestuário e calçado ameaçado quer pela liberalização ditada pelo OMC já a partir de 2005, quer pela valorização do Euro!

A economia portuguesa tem que marchar nas duas pernas: actividade produtiva e serviços aproveitando os recursos nacionais e desenvolver uma estratégia de desenvolvimento assente simultaneamente no aumento das exportações, no alargamento do mercado interno e na produtividade. A “salvação da economia”, não está nas mezinhas nem na diversão ideológica ao serviço da concentração e centralização de capitais – capitalismo neoliberal embrulhado nas tecnologias de informação – a famosa nova economia ou no não menos famoso capitalismo renano, ou na regulação «ética» do mercado numa dita «economia de comunhão»! Comunhão para alguns!

A ofensiva do grande capital e dos governos ao seu serviço para anular direitos e conquistas tem-se traduzido numa regressão social, mas também económica e democrática. O não cumprimento de promessas, a não resposta aos problemas, os escândalos de corrupção, a crise da justiça tem criado um terreno propício ao descrédito da política, dos políticos, dos partidos políticos como se todos fossem iguais.

Também a justiça como todos reconhecem atravessa uma grave crise. Mantém-se extremamente lenta, cara e afastada do cidadão. As políticas de direita dos vários governos, são responsáveis pela degradação da justiça criminal e por danos gravosos na credibilidade dos Tribunais, das magistraturas e da polícia Judiciária e o que se tem passado com os casos mais mediáticos como sejam o processo da «Casa Pia» e «Apito Dourado» também não lhe tem trazido maior prestígio. O que desejamos é que se faça justiça e com celeridade. Paralelamente temos tido uma grande ofensiva contra os direitos dos trabalhadores.

O código do trabalho é um instrumento laminador de direitos e conquistas duramente alcançados e tem por objectivo enfraquecer e criar dificuldades à organização e à luta dos trabalhadores.

O desemprego, as desigualdades sociais, o endividamento das famílias, a redução dos salários reais e as baixas reformas alimentam as dificuldades sociais e a pobreza, um flagelo social que se está a expandir na sociedade portuguesa. Particularmente atingidos pela pobreza, pelo desemprego e pela precariedade são as mulheres. Queremos daqui saudar deste nosso XVII Congresso as mulheres portuguesas e a sua luta pelo emprego, pelos salários, pelos seus direitos, pela sua intervenção em igualdade e saudar muito especialmente o MDM, a Comissão Nacional de Mulheres da CGTP e a Organização das Mulheres Comunistas em defesa dos direitos da mulher.

Esta situação e designadamente o quadro das desigualdades é também ampliada pelos muitos milhares de imigrantes muitos deles com uma situação irregular, sendo depois vítimas de uma feroz exploração.

Como sempre dissemos o sistema de quotas, grande bandeira de Paulo Portas e da direita, o que está a fomentar é a legião dos imigrantes ilegais que depois ficam à mercê de empresários sem escrúpulos aviltando na prática salários, horários de trabalho e direitos criando um mal estar entre trabalhadores legalizados e ilegalizados. Naturalmente que tudo isto não é do interesses dos trabalhadores.

Um jornal diário dizia-nos em Setembro deste ano: «o sistema de quotas só legalizou três pessoas... Um cidadãos brasileiro, trabalhador agrícola; um cidadão moldavo, escriturário; e um cidadão ucraniano, copeiro».

Para as 8 500 vagas para trabalhadores estrangeiros estipulados pelo governo após “rigorosíssimo” estudo e diversos discursos ministeriais apareceram 60 candidatos e desses apenas três conseguiram o visto de trabalho.

Como é evidente os empresários portugueses continuam a preferir recrutar ilegalmente imigrantes em vez de enveredarem pelo processo oficial e legal. É uma retinta hipocrisia. Não nos esquecemos do discurso contra os imigrantes que marcou no ano passado a rentrée do CDS/PP. Mas como se vê o discurso xenófobo para a opinião pública conservadora é depois traduzido na prática pelo sacrifício dos direitos mais elementares dos cidadãos imigrantes ao serviço de empresários sem escrúpulos!

A situação actual é marcada pela imposição de um modelo económico e social de sobre-exploração que atinge os trabalhadores portugueses e estrangeiros. Por isso, o nosso Partido tem lançado a consigna “trabalhadores portugueses e imigrantes a mesma luta” e eu creio que vós estais de acordo com este nosso apelo à unidade na acção em torno de reivindicações sociais mas também contra as políticas de direita de «dividir para reinar», colocando trabalhadores contra trabalhadores e imputando aos imigrantes a responsabilidade pelo desemprego e pela degradação social.


Precisamos de uma alternativa
Chega de alternâncias


O país precisa na verdade e com urgência de uma outra política, uma política alternativa à política de direita que cíclica e continuamente tem vindo a ser concretizada tanto pelo PS como pelo PSD sozinho ou acompanhado pelo CDS/PP.

Perante as malfeitorias deste governo, o PS até agora só se comprometeu se for governo em revogar a lei das rendas, mantendo um significativo silêncio em relação ao código do trabalho, às alterações na saúde, às privatizações.

A acentuação da sua deriva neoliberal não augura nada de bom. Ainda recentemente em matéria de redução de impostos sobre o trabalho, IRS, o PS colou-se numa posição mais retrógrada do que Bagão Félix, o que convenhamos não é proeza fácil.

Posto isto, não temos a mais pequena dúvida e antes temos a maior das convicções de que a construção de uma alternativa de esquerda – necessariamente baseada no quadro actual e no acordo ou convergência das principais forças de oposição ao governo da direita – é uma premente necessidade nacional e corresponde a uma viva aspiração de muitos e muitos portugueses.

E agimos sempre, e infatigavelmente, de acordo com esta convicção, procurando a aproximação de pontos de vista, convergências e acordos mais ou menos amplos entre forças democráticas.

Ao mesmo tempo, insistimos naturalmente que o nosso empenho e o nosso compromisso é com a construção de uma alternativa de esquerda que signifique necessariamente uma ruptura quer com as políticas do governo da direita quer com muitas políticas e orientações fundamentais de passados governos do PS.

Por aqui se pode ver que as responsabilidades pelas dificuldades da construção duma alternativa não podem ser genericamente repartidas entre o PCP e o PS, já que é o PS que, primeiro, recusa desde logo a ideia da convergência democrática como base indispensável da alternativa (e procura mesmo afirmar ambições e pretensões arrogantemente hegemónicas) e, segundo, não se mostra disponível para nenhum exame crítico das orientações e políticas que tem realizado quando no governo.

Haverá certamente democratas que pensam que todas as dificuldades se resolveriam com diálogo, chá e simpatia entre dirigentes dos partidos à esquerda do actual governo.

Mas nós continuamos a pensar que os democratas, os homens e mulheres de esquerda não podem ser meros espectadores, descrentes ou entusiasmados, deste processo.

Nós continuamos a pensar que o caminho mais seguro para a conquista de uma alternativa de esquerda é os democratas e homens e mulheres de esquerda perceberem que são as suas aspirações, a sua vontade de ganhar uma nova política (e não apenas outro governo) e as suas escolhas (também eleitorais) que mais podem assegurar um rumo positivo e esperançoso para os acontecimentos.

E, longe de qualquer arrogância ou exclusivismo, continuamos a pensar que é também o reforço do apoio eleitoral do PCP que mais pode aproximar, tornar viável e finalmente concretizar em Portugal uma alternativa de esquerda verdadeiramente digna do nome.


As próximas eleições autárquicas

Camaradas:

Estamos a pouco mais de um ano de uma das mais importantes batalhas políticas a que o partido será chamado a responder em 2005. Uma batalha que exigirá um largo e forte empenhamento do conjunto das nossas organizações e dos membros do partido para, lado a lado com os nossos parceiros de coligação que daqui saudamos e os muitos milhares de independentes que dão corpo á acção da CDU, a enfrentar com êxito. Uma batalha que reclama uma atenta observação das exigências que o novo calendário para a sua realização coloca e uma cuidada programação das medidas e acções com vista à sua preparação.

Partimos para ela certos das dificuldades mas também confiantes nas nossas possibilidades, da força da acção organizada do Partido e do reconhecido valor e prestigio do nosso trabalho autárquico. E seguros também que pela nossa intervenção e presença nesta batalha eleitoral, traduzidas no esforço de nos apresentarmos ao maior número possível de órgãos, podemos e devemos dar um contributo para levar mais longe a afirmação do PCP e do seu insubstituível papel na defesa dos interesses das populações. E justa e legitimamente aspirarmos a que delas resultem a confirmação das nossas posições, a conquista de novas autarquias e o alargamento da nossa presença a outras.

O principal desafio que nos está colocado é o de ter presente que está nas nossas mãos, e no nosso trabalho, agir para influir positivamente o quadro geral em que decorrerão as próximas eleições. E afirmar a CDU e o PCP como uma grande força nacional autárquica, com um peso e uma influência correspondentes ao valor do seu trabalho e do prestigio justamente conquistado pela sua obra junto do nosso povo.


Um Partido diferente
Ao serviço do povo e de Portugal

Camaradas:

Desde o XVI Congresso enfrentando dificuldades e uma ofensiva – que poucos aguentariam – particularmente agressiva, insidiosa e prolongada, com a participação de ex-membros do Partido, criando dificuldades ao reforço da nossa influência social, política e eleitoral, o Partido desenvolveu uma intensa e permanente intervenção e actividade em defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país.

Milhares de militantes do partido assumiram de forma decisiva o esclarecimento, a mobilização e a organização da luta da classe operária, dos trabalhadores e de outras camadas sociais contra a política governamental procurando a sua potenciação dialéctica com a qualificada intervenção institucional do Partido na Assembleia da República, nas autarquias e no Parlamento Europeu.

Correndo o risco de omissão sublinhe-se entre outras a luta dos trabalhadores vidreiros da Marinha Grande, da Bombardier, da metalurgia, da química, da têxtil e calçado, na defesa dos seus postos de trabalho, do aparelho produtivo e da produção nacional, a defesa do sector público e dos serviços públicos, onde se destacam a luta dos trabalhadores dos transportes, Carris, Metro, Transtejo, do sector ferroviário, do sector aéreo, mas também das OGMAS, da EDP, da GALP, da PT; a luta dos trabalhadores da Administração Pública contra as privatizações dos serviços, a desfiguração do Serviço Nacional de Saúde, a defesa da escola pública e da Segurança Social, a luta pela dignificação das carreiras e dos salários, a luta das forças policiais, a luta dos trabalhadores contra a deslocalização das empresas travadas no sector têxtil e calçado e na metalomecânica.

A luta de massas assumiu um ponto alto com a declaração e realização da greve geral em Dezembro de 2002, convocada pela CGTP-IN contra o pacote laboral, onde apesar da posição da UGT participaram mais de 700 mil trabalhadores.

A ofensiva não terminou. Nem sempre os trabalhadores tiveram êxito mas se a luta com o apoio do PCP não tivesse sido travada seria outro e bem pior o Código do Trabalho, seriam socialmente mais dolorosas as consequências da política de direita, outros sectores e camadas sociais não se sentiriam animados a agir e a lutar pelos seus direitos concretos. Valeu e vale a pena lutar.

Enfrentámos também as leis sobre os Partidos que têm como alvo o PCP, numa ingerência inadmissível sobre a nossa liberdade de auto-organização o que só por si diz o suficiente das concepções democráticas de quem as aprovou. São leis feitas a feitio para atingir o PCP, a sua organização, o seu funcionamento, as suas iniciativas, em particular a Festa do Avante! Como se afirma no projecto de Resolução Política, são leis inaceitáveis contra as quais é necessário lutar e cuja revogação vamos continuar a exigir com determinação.

Neste Congresso estamos a discutir as alterações aos Estatutos. Estatutos que correspondem às necessidades e exigências que se colocam á intervenção do Partido.

As alterações que se propõem são as consideradas estritamente necessárias em função da experiência e da avaliação própria do Partido.

É necessário ter em conta que o reforço do nosso Partido é uma questão decisiva para a luta dos trabalhadores e do povo e para a defesa do interesse nacional. O aumento da influência do PCP é uma questão que se coloca a todos os militantes e organismos do Partido mas que é do interesse dos portugueses e da democracia. O colectivo partidário e as suas organizações desenvolveram uma actividade muitas vezes acima das suas forças, só possível com uma grande generosidade, dedicação e empenho dos militantes. E este esforço tem que continuar pois é sobretudo ele que permitirá rasgar novos horizontes. O que queremos é que nos avaliem pelo que somos, pelo que propomos, pelo que realmente fazemos e defendemos, que nos julguem pelas grandes causas que protagonizamos com singular coragem, coerência e seriedade.

Não queremos que andem connosco ao colo, queremos somente isenção e que nos avaliem com severidade pela postura que mais nos orgulha enquanto comunistas – o de protagonistas da transformação social, do combate às injustiças e prepotências dos poderosos, da defesa dos explorados, humilhados e esquecidos.

O fortalecimento do Partido tem de ser considerado em múltiplas vertentes, mas é condição essencial o reforço da sua organização, dos seus meios próprios, da sua coesão baseada nos princípios de funcionamento do Partido.

No seguimento do XVI Congresso e da Conferência Nacional de 2002, lançámos o movimento geral de reforço da organização partidária. Desenvolveu-se a acção nacional de contacto com os membros do Partido com importantes resultados já alcançados, insistiu-se na linha de reforço da organização do Partido nas empresas e locais de trabalho, avançou-se na responsabilização de quadros, na renovação e no rejuvenescimento, verificou-se uma significativa adesão ao Partido, perto de 6 mil novos militantes, cerca de 40% dos quais com idades até aos 30 anos. Dinamizou-se a intervenção junto da juventude com destaque para o importante papel da JCP, com a sua luta, a sua intervenção, com o reforço das suas fileiras, com a sua postura – o sonho tem Partido e esse Partido é o PCP! –. Alargou-se a difusão da imprensa partidária embora estejamos muito aquém das possibilidades. Entre muitos outros aspectos, estes são elementos que mostram que, para além de necessário, é possível um PCP mais forte. E, é necessário e possível com o contributo de todos e de cada um.

Temos um Partido com milhares de militantes activos que dão o melhor de si próprios na concretização dos objectivos transformadores do PCP, mas sabemos que persistem muitas insuficiências e debilidades e que precisamos de um Partido mais forte.

Que precisamos de aproveitar melhor os quadros, de estimular a iniciativa e a intervenção dos militantes e das organizações sobre os problemas concretos.

Que precisamos de continuar com o recrutamento. Mas não basta recrutar, pois a seguir é necessário organizar e enquadrar os novos militantes e procurar aproveitar as suas disponibilidades.

Não conhecemos todos nós aquela frase deste e daquele cidadão: «...inscrevi-me no Partido e ainda não me contactaram...». É necessário libertar novas energias, aproveitar o sangue novo e novas capacidades. Não trabalhamos para a estatística. E é necessário continuar a lutar contra a rotina, contra soluções, atitudes e métodos que não correspondem às exigências actuais.

O Partido não sacraliza e transforma em questões de princípio aquilo que não o é para depois utilizar a argumentação das cedências para manter tudo como está, da mesma maneira que não embarca em falsas modernidades descaracterizadoras e atentórias da sua unidade e coesão só para ter o apreço ou o favor dos “media”. E isto tanto no campo da organização como no da teoria, pois não temos uma visão unilateral, esquemática ou simplista do marxismo-leninismo, nem o reduzimos a um slogan sem conteúdo e prática efectiva, nem transformamos este poderoso e valioso instrumento de análise da realidade em mudança e guia para a acção no seu contrário.

A dogmatização, conduz à estagnação teórica e esta a erros graves e ao esvaziamento da própria teoria. O marxismo-leninismo deve enriquecer-se incessantemente com o estudo de novas situações, fenómenos, processos, conhecimentos e experiências, o que pressupõe também o estudo e o conhecimento da realidade onde queremos actuar, a abertura à vida, ao diálogo e ao debate com os outros. Como já foi afirmado, maus advogados da nossa teoria são aqueles que transformam “os princípios teóricos em verdades eternas”, isto é, que transformam o princípio teórico em dogma, o dogma em lei objectiva e esperam que a sua suposta lei, porque é objectiva transforme a realidade segundo o princípio arvorado em dogma.

Sublinhamos as conhecidas palavras do Manifesto do Partido Comunista: «as proposições teóricas dos comunistas de modo nenhum repousam sobre ideias, sobre princípios, que foram inventados por este ou aquele melhorador do mundo. Elas são apenas expressões gerais das relações efectivas de uma luta de classes existente, de um movimento histórico que se passa ante os nossos olhos» e como interpelava Bertolt Brecht “... não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar...”.

E para isso temos que cuidar deste valioso “instrumento” de mudança que é o nosso Partido.

Na proposta de Resolução Política, no seguimento dos resultados da acção nacional de contacto, avança-se um conjunto de medidas a aplicar de forma integrada com o objectivo de fortalecer o Partido, tendo em conta as forças que temos e as prioridades que se vão definindo e que devem ser cumpridas.

No plano do trabalho de direcção, da responsabilização de quadros, da estruturação, em particular da organização e intervenção junto da classe operária e dos trabalhadores, nas empresas e locais de trabalho e das organizações de base em geral, do reforço dos organismos de direcção intermédios, de uma maior integração e participação dos membros do Partido. A atenção, acompanhamento e trabalho junto das camadas e grupos sociais de grande importância, como os intelectuais e quadros técnicos, outros sectores das camadas intermédias urbanas, os pequenos e médios agricultores e a juventude. Medidas de reforço do trabalho de informação, propaganda e esclarecimento, da difusão da imprensa partidária. Particular atenção também deve ser dada a um grande património do nosso Partido: a acção unitária, o trabalho dos comunistas nas organizações dos trabalhadores e da população, a acção directa do Partido e o desenvolvimento do seu prestigiado e qualificado trabalho nas instituições. Medidas orientadas para a angariação dos meios financeiros indispensáveis, tarefa política de primeira ordem, para a nossa actividade e para uma acção internacional de acordo com os nossos objectivos.

Tais são questões fundamentais que se colocam ao Partido para o reforço da sua organização, intervenção e influência, para que cumpra o seu papel.

Camaradas:

Seríamos irremediavelmente distraídos e inconscientes se não soubéssemos que a maré alta de caricaturas, grosserias, insultos, deturpações e falsificações com que, década após década, ano após ano e mês após mês, se procura soterrar e cilindrar o que verdadeiramente o PCP é, defende, propõe e faz, nos causam consideráveis prejuízos e dificuldades à nossa intervenção, à nossa influência e à capacidade de atracção das nossas propostas e do nosso projecto político.

Mas saber isto e ter consciência disto é uma coisa e outra muito diferente é alguém poder supor ou ter esperança que os comunistas portugueses se rendam, ajoelhem ou se deixem afogar em tal maré ou desistam de defender a sua honra e a sua dignidade e a verdade sobre o que realmente são, realmente fazem e realmente querem.

Com integral respeito pela liberdade de expressão e soberania de decisão dos delegados ao Congresso, confiamos plenamente que os trabalhos deste nosso XVII Congresso do PCP mostrarão:

- um Partido que, como nenhum outro em Portugal, é capaz de enunciar e analisar criticamente as suas próprias deficiências, debilidades, atrasos, erros e dificuldades;

- um Partido que, longe de se fechar sobre si próprio e perder o contacto com a realidade e com as suas mais fortes interpelações, quer ampliar, fortalecer e revigorar a sua intervenção na sociedade portuguesa e estabelecer laços ainda mais profundos de solidariedade e acção com todos os homens e mulheres que, na diversidade das suas aspirações, opiniões e posicionamentos, compartilham da comum vontade de conquistar um outro e melhor rumo para Portugal;

- um Partido que não está disposto a diluir-se gostosamente no pântano do espalhafato, superficialidade, troca-tintismo, demagogia e irresponsabilidade que ameaça submergir a vida política nacional e antes quer continuar a ter a coragem de, mesmo contra a corrente, fazer valer o seu património de coerência, seriedade, dedicação, consistência e sentido de responsabilidade;

- um Partido que não discute a importância das pessoas na vida e na acção políticas mas que entende ser absolutamente necessário revigorar a vida democrática do País, não com mais fulanizações, mas com mais debate, mais escolhas e mais opções em torno de ideias, de causas e de projectos políticos;

- um Partido que quer conviver bem com a dúvida, com as interrogações e com as incertezas do tempo que vivemos mas que, não só não quer trocar por um prato de lentilhas as convicções profundas e as grandes causas que dão sentido à sua existência e á sua luta de 83 anos, como lhes quer dar reforçada e renovada projecção, afirmação e vitalidade;

- um Partido e um colectivo de militantes e apoiantes que, por muito que alguns finjam não ver e não perceber, são um corpo vivo e actuante na democracia portuguesa e constituem uma incomparável corrente de generosidade, de desinteresse pessoal, de consagração ao serviço dos outros, de generosos compromissos de vida e de luta que são um tocante e inesquecível património do Portugal democrático;

- um Partido que, mais e melhor, quer animar, consolidar e dar esperança e força ao amplo movimento de vontades e aspirações que percorre a sociedade portuguesa no sentido de, tão cedo quanto possível, libertar o país da desastrosa governação da direita e conquistar uma verdadeira alternativa de esquerda que signifique, não uma simples mudança de etiquetas e de caras, mas um novo rumo e uma nova política ao serviço dos trabalhadores, do povo e do país;

- um Partido que, longe de fatalismos e determinismos, reafirma no seu pensamento, na sua orientação e na sua luta, a sua profunda confiança na acção transformadora dos seres humanos, a sua profunda convicção de que a história não chegou ao fim e que a democracia e o socialismo continuam inscritos como projectos indispensáveis para um Portugal com futuro e para um mundo mais justo.

Viva o XVII Congresso
Viva a JCP
Viva o Partido Comunista Português