Partido Comunista Portugu�s
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Declaração política sobre as condições precárias de habitabilidade dos residentes nos Bairros dos Lóios e das Amendoeiras, em Chelas, e dando conta da iniciativa do grupo parlamentar do PCP no sentido de promover uma audição do membro do Governo responsável pela tutela da habitação para discutir esta questão
Intervenção de António Filipe
Quarta, 15 Fevereiro 2006

Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Nos Bairros dos Lóios e das Amendoeiras, em Chelas, vivem 1400 famílias, há mais de 30 anos, em habitações que eram, até há alguns meses, propriedade do IGAPHE/INH.

Em 1974, altura em que essas casas foram construídas, foi estabelecido, entre os moradores e a Secretaria de Estado da Habitação, um regime de renda fixa, tendo em atenção as finalidades sociais da construção desses Bairros.

Tal como tem acontecido com outros bairros propriedade do IGAPHE, o Estado não gastou um centavo no melhoramento das habitações ao longo destas três décadas. Todas as obras de conservação foram efectuadas e integralmente suportadas pelos moradores, na medida das suas possibilidades. Acontece, porém, que, devido às dificuldades económicas de muitas famílias residentes nesses Bairros, muitos prédios de habitação encontram-se em situações extremamente degradadas.

No último sábado, dia 11 de Fevereiro, acompanhado pelos vereadores da CDU na Câmara Municipal de Lisboa e por muitos moradores, tive oportunidade de verificar, no local, as condições de degradação habitacional que esses Bairros apresentam. Existem torres de 10 e 12 andares, com elevadores avariados há sete anos e sem qualquer fiscalização das suas condições de segurança.

Existem habitações onde chove e escorre água pelas paredes. Existem situações de extrema perigosidade quanto à segurança de instalações de gás e de electricidade. Existem perigos sérios de desabamento e edifícios de grande dimensão que vão desabando aos poucos, pondo em causa a segurança das populações.

Desde há vários anos que se sabia ser propósito da administração central transferir a responsabilidade da gestão desses Bairros para as câmaras municipais, geralmente em condições inaceitáveis para estas.

Foi esse também o caso do município de Lisboa, que recusou assumir a gestão desses Bairros nas condições que o IGAPHE pretendia impor. Ou seja, a Câmara Municipal de Lisboa, não rejeitando, por princípio, vir a assumir a responsabilidade pelos Bairros, exigia o que é óbvio: que essa transferência fosse precedida pelas indispensáveis obras de recuperação desse património habitacional.

Aconteceu, entretanto, que há um ano atrás, no início de Fevereiro de 2005, quando o anterior governo se encontrava já em funções de gestão, os moradores foram informados da transferência das suas casas para uma tal Fundação D. Pedro IV, em cuja direcção pontifica, por estranha coincidência ou não, um antigo responsável pelo IGAPHE e pelo INH.

Ou seja: com base num concurso que terá sido tudo menos transparente, um governo, em funções de mera gestão, ofereceu à tal Fundação D. Pedro IV, supostamente de solidariedade social, os Bairros dos Lóios e das Amendoeiras.

Consumada essa transferência, as consequências não se fizeram esperar: se alguém esperava que a transferência da responsabilidade dos Bairros dos Lóios e das Amendoeiras para uma Fundação se pudesse traduzir em maior sensibilidade social para com os moradores, ou que fossem feitas as obras indispensáveis para garantir condições decentes e seguras de habitabilidade das casas, depressa perdeu as ilusões.

A tal Fundação D. Pedro IV não gastou um único cêntimo nas indispensáveis obras de recuperação dos Bairros. O que a tal Fundação fez foi instalar-se no Bairro das Amendoeiras, num bunker de janelas gradeadas e câmaras de videovigilância, em atitude provocatória, reveladora, aliás, de má consciência, e informar os moradores de que passariam a estar sujeitos ao regime de renda apoiada, o que representa, para cada família, um aumento de renda que pode variar entre os 2000% e os 4000%, sendo que muitas delas não estão pura e simplesmente em condições de o poder pagar.

Pude mesmo verificar, no local, que a Fundação considerou em óptimo estado, para efeitos de aplicação de rendas máximas, casas que se apresentam em condições deploráveis de habitabilidade. Mas fez pior: confrontada com o natural protesto das populações, que viram os seus direitos, adquiridos há muitos anos, serem completamente espezinhados e se organizaram em associações para fazer valer esses direitos pelos meios legais ao seu alcance, a tal Fundação não tem hesitado em recorrer a actos de intimidação e a ameaças sobre as pessoas, os quais se aproximam do puro banditismo.

Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Perante uma decisão tomada de forma ilegítima por um governo em gestão, reveladora de uma tremenda insensibilidade social, que se traduz num verdadeiro esbulho do património público e que lesa o mais elementar direito à habitação de cerca de 1400 famílias, entendemos que o actual Governo não tem outra atitude digna a tomar que não seja a de fazer reverter para a esfera pública a responsabilidade pelos Bairros dos Lóios e das Amendoeiras.

É, aliás, essa a posição defendida pela Câmara Municipal de Lisboa, que aprovou por unanimidade uma proposta dos vereadores do PCP sobre esta matéria. Nessa deliberação, aprovada — sublinho — por unanimidade, a Câmara Municipal de Lisboa decidiu interceder, com urgência, junto do Governo, no sentido de suspender quaisquer actos promovidos pela Fundação D. Pedro IV, revertendo os prédios à posse do IGAPHE/INH; interceder, junto do Governo, para que, através do IGAPHE/INH, encontre as soluções adequadas à situação, acautelando as legítimas expectativas das famílias residentes, em diálogo com as associações de moradores; e interceder, junto do Governo, para que, ao abrigo da lei, consulte todos os arrendatários, no sentido do eventual interesse na compra dos respectivos fogos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Perante a grave situação que está criada, o Governo assume uma responsabilidade de que não se pode alhear e tem a obrigação de encontrar uma solução justa, em diálogo com a Câmara Municipal de Lisboa e com os moradores dos Bairros.

Esta situação é conhecida de todos os grupos parlamentares e, segundo nos informaram as associações de moradores, todos eles se comprometeram a desenvolver esforços no sentido de ser encontrada uma solução.

Está, portanto, na altura de trazer esta questão para a Assembleia da República, para que este órgão de soberania possa assumir um papel concreto na resolução desse problema.

Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do PCP vai propor que, em sede de comissão parlamentar, seja promovida a audição urgente do membro do Governo responsável pela tutela da habitação, para discutir a questão dos Bairros dos Lóios e das Amendoeiras, e que sejam também convidados a pronunciar-se, em audição, a Câmara Municipal de Lisboa e as associações de moradores desses Bairros.

Esperamos que haja, da parte de todos os grupos parlamentares, concordância com esta iniciativa e que todos assumam as suas responsabilidades perante um grave problema social e humano que tem de ser resolvido.

(…)

Sr. Presidente, Srs. Deputados,

Quero agradecer as questões que colocaram, dessa forma ajudando a que esta matéria seja devidamente clarificada. Creio que pelos quatro pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados que intervieram, as coisas ficam um pouco mais claras.

É, de facto, extraordinário que a Sr.ª Deputada Helena Lopes da Costa e que o Sr. Deputado António Carlos Monteiro pretendam responsabilizar a maioria do anterior mandato da Câmara Municipal de Lisboa por uma situação que é da inteira responsabilidade do IGAPHE, isto é, da administração central, do governo PSD/CDS.

Como é evidente, compreendemos em absoluto que a Assembleia Municipal de Lisboa, neste caso concreto, não quisesse aceitar uma situação em que o IGAPHE se limitava a transferir para o município dois bairros de grande dimensão, absolutamente degradados, porque o IGAPHE não gastou um cêntimo nas obras de recuperação que seriam no mínimo exigíveis, e se preparava para pura e simplesmente passar para o município essa responsabilidade, sem qualquer obra!

Portanto, creio que constitui um acto de responsabilidade para com os seus munícipes que um município não aceite uma situação dessas e confronte a administração central com as suas responsabilidades.

O que se passou aqui foi que o governo PSD/CDS, quando já se encontrava em gestão, veio oferecer os Bairros dos Lóios e das Amendoeiras, onde vivem 1400 famílias, a uma fundação privada, onde pontificava, e creio que pontifica, um cidadão que tinha estado à frente do IGAPHE e do Instituto Nacional de Habitação (INH), o que é uma situação de promiscuidade absolutamente inaceitável e que deveria ser clarificada.

A Fundação tem-se comportado, em relação à população, de uma forma absolutamente inaceitável, de que é exemplo os aumentos das rendas, já aqui referidos, para quantias exorbitantes, tendo em consideração os rendimentos da maioria daquelas famílias, e que são em absoluto injustificados tendo em conta as condições deploráveis em que se encontra a maioria das habitações de que estamos a falar.

Dizem que a Câmara Municipal não quis aceitar. E, então, qual é a atitude do governo? É oferecer dois bairros ao primeiro transeunte que lhe apareça?! Não pode ser! O governo não pode alienar as responsabilidades que tem relativamente a uma propriedade sua. Durante 30 anos, não honrou a responsabilidade que tinha para com os moradores e limita-se, ao fim desse tempo todo, a espezinhar direitos adquiridos, compromissos que tinham sido assumido para com eles e passa a responsabilidade para uma Fundação, que tem tido um comportamento absolutamente inaceitável quanto aos moradores.

Sr. Deputado Vasco Franco, quero registar positivamente a concordância do Partido Socialista em relação à proposta que aqui fizemos de se abrir um processo de diálogo na Assembleia da República em que o Governo possa contribuir e dar a sua opinião sobre esse assunto, manifestando a sua disponibilidade ou não — esperemos que seja a sua disponibilidade — para assumir responsabilidades e ajudar a resolver esse problema. Propomos que se abra um processo de diálogo em que intervenham os moradores e a Câmara Municipal de Lisboa, que neste mandato, há muito pouco tempo, aprovou por unanimidade, repito, por unanimidade, uma posição sobre esta matéria.

Portanto, a Câmara Municipal de Lisboa, neste momento, tem uma posição com que nos pode habilitar; não se quer colocar fora, quer ser um parceiro neste diálogo, mas, evidentemente, quer ver os seus direitos respeitados, tal como os moradores.

Esperamos que este processo decorra e que esta Assembleia possa contribuir para que este problema seja resolvido de uma forma justa e que vá ao encontro dos legítimos direitos das populações envolvidas.