Partido Comunista Português
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Resolução Política aprovada no XVII Congresso do PCP
Domingo, 28 Novembro 2004

RESOLUÇÃO POLÍTICA
(aprovada no XVII Congresso do PCP)

1. Internacional

1. A SITUAÇÃO INTERNACIONAL

1.0. Introdução
1.1. O capitalismo e a sua crise
1.2. A ofensiva do imperialismo
1.3. A resistência e a luta dos trabalhadores e dos povos
1.4. A alternativa. Um outro mundo é possível, um mundo socialista

1.0. Introdução

O XVII Congresso do PCP realiza-se no contexto de uma violenta e generalizada ofensiva do imperialismo. Simultaneamente, estão em curso importantes processos de luta e de arrumação de forças. A instabilidade, a insegurança e a incerteza dominam as relações internacionais. Vivem-se tempos de grandes recuos e perigos de retrocesso histórico, mas também de forte resistência e potencialidades revolucionárias.

Os últimos quatro anos confirmaram as análises e previsões fundamentais do XVI Congresso. As trágicas consequências da globalização capitalista estão à vista de todos. O mundo tornou-se mais injusto, menos democrático, mais inseguro e perigoso. Aí está o agravamento da exploração, o militarismo e a guerra, o ataque generalizado a direitos, liberdades e garantias fundamentais, a tentativa de criminalizar a resistência à opressão. Entretanto, afirma-se e diversifica-se a resistência e a luta das forças progressistas, dos trabalhadores e dos povos. Intensifica-se a luta da classe operária e dos trabalhadores. Os povos enfrentam com mais determinação as agressões imperialistas. O «movimento antiglobalização», contra o neoliberalismo e a guerra, apesar do seu carácter social e politicamente heterogéneo, é expressão objectiva do estreitamento da base social de apoio do capitalismo.

Os tempos em que vivemos e lutamos são tempos muito difíceis, de resistência e acumulação de forças. Mas em que, como a experiência está a mostrar, são possíveis heróicas afirmações de resistência e soberania e inesperadas dinâmicas de progresso social. O imperialismo, nomeadamente a potência hegemónica, os EUA, não tem as mãos totalmente livres para realizar a sua política.

É possível resistir, contrariar e finalmente derrotar o seu propósito de instaurar uma ditadura planetária do grande capital, uma nova ordem mundial totalitária, contra os trabalhadores e contra os povos.

Pelo reforço dos partidos comunistas e revolucionários em cada país e o fortalecimento da sua cooperação internacionalista, pela construção de uma frente de luta anti-imperialista cada vez mais ampla, pela conjugação da acção das forças democráticas, progressistas e de libertação nacional, é possível travar com êxito a batalha contra a ideologia dominante, incutir nas massas uma maior confiança na sua luta e na possibilidade de vitória, alcançar profundas transformações progressistas e revolucionárias e, tendo em conta as lições da experiência, relançar o socialismo como a alternativa viável e necessária ao capitalismo.


1.1. O capitalismo e a sua crise

A violenta ofensiva exploradora e agressiva do imperialismo constitui o traço mais marcante e persistente da situação internacional nos últimos anos. Tal ofensiva, que conheceu após os atentados de 11 de Setembro de 2001, um novo e perigoso desenvolvimento, mergulha as suas raízes na própria natureza do capitalismo e constitui a resposta dos círculos mais reaccionários do grande capital à crise que o sistema capitalista atravessa.

A prática confirmou no essencial a validade das análises e conclusões do XVI Congresso quanto aos principais traços, tendências e contradições da fase actual do desenvolvimento económico do capitalismo. Confirmou também os EUA como o principal factor de risco para a economia mundial, num quadro de grande incerteza, arrastando consigo, em graus diferenciados os outros pólos da «Tríade» (União Europeia e Japão) e o resto da economia mundial.

O capitalismo continua a dispor de enormes recursos, de sofisticados meios de concertação e gestão das crises a nível mundial e regional e de possibilidades de aproveitamento e expansão de mercados. Mas a situação da economia mundial apresenta-se cada vez mais instável e continuam a ampliar-se as assimetrias e contradições do capitalismo.

Aumenta a terciarização das economias capitalistas mais desenvolvidas e a sua progressiva desindustrialização, com a crescente deslocalização para a periferia capitalista das actividades de mão-de-obra intensiva. Aumentam as desigualdades de rendimento e a pobreza, deixando milhões de seres humanos longe da satisfação das suas necessidades básicas, empurrando-os para a emigração em condições desumanas.

A crise económica de 2001-2003 é mais um episódio de uma crise de sobreprodução latente e de uma crise estrutural mais profunda do capitalismo. A «nova economia», ao contrário das expectativas dos seus apologistas, não foi um ponto de viragem para um novo ciclo de crescimento, sendo relevante que o esvaziar da bolha financeira se tenha verificado sobretudo nas empresas ligadas às novas tecnologias da informação e comunicação. Confirma-se o abrandamento das taxas de crescimento do produto mundial, ainda mais visíveis ao nível do produto por habitante, principalmente nos países capitalistas mais desenvolvidos, verificando-se em 2001 a redução para metade do crescimento da economia mundial e, pela primeira vez, um decréscimo do comércio mundial.

No plano económico e social a ofensiva imperialista fica marcada pela aceleração da resposta neoliberal do capitalismo à crise, assente nos objectivos traçados pelos chamados «Consenso de Washington» e «Estratégia de Lisboa»: maior liberalização da circulação de capitais e aplicação das mais-valias na esfera financeira e especulativa; crescente intensificação e exploração do trabalho; pressão para a redução da remuneração do trabalho e garantia de ganhos de produtividade para o grande capital. Uma ofensiva caracterizada: pelo ataque ao sector público e aos sistemas de segurança social em benefício dos grandes interesses privados; pelo aproveitamento da expansão a novos mercados, como é exemplo a restauração do capitalismo nos países do Leste da Europa e da ex-URSS ou o alargamento da UE; pela liberalização do comércio e do investimento a nível mundial, com o lançamento da ronda negocial da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Doha, apesar das rivalidades inter-imperialistas e das contradições entre o centro e a periferia capitalista. Uma ofensiva que acelerou o processo de mercantilização de todas as esferas da vida social, do produto do trabalho ao trabalhador, passando pelo saber e até da própria vida.

Avoluma-se a contradição entre os países capitalistas desenvolvidos - que concentram cada vez mais o consumo de bens, matérias-primas e energia (nomeadamente os EUA, responsáveis por 30% do consumo mundial de energia) - e outros países a braços com necessidades de energia para o seu desenvolvimento, nomeadamente a China, a Índia, os novos países industrializados do Sudeste Asiático e os países do Leste da Europa. Contradição em que se destacam os EUA, responsáveis por 40% da poluição mundial e 25% das emissões de CO2, expoente de um modelo de produção predador e delapidador do ambiente.

Acentua-se ainda mais o grau de financeirização do capital e a hipertrofia da esfera financeira face à esfera produtiva. Os activos financeiros dos países mais desenvolvidos representam em cada país cerca de 300% do respectivo Produto Interno Bruto (PIB), e a capitalização bolsista ultrapassa o próprio PIB em países como os EUA e a Grã-Bretanha. As dificuldades de obtenção de taxas de lucro satisfatórias na esfera produtiva, que confirmam a lei sobre a baixa tendencial da taxa de lucro, contribuem para o predomínio e desenvolvimento do capital financeiro, com implicações directas negativas sobre o crescimento económico e o emprego. Os elevados volumes de fluxos financeiros, nomeadamente de curto prazo, assumem um papel crucial na crescente volatilidade e instabilidade dos mercados financeiros internacionais. Enquanto a concorrência entre o capital se agudiza a favor das grandes potências, os elevados graus de «financeirização» da economia e de interdependência mundial da chamada «globalização» potenciam a instabilidade do sistema e o surgimento de crises financeiras que, de 1975 a 1997 implicaram uma perda acumulada de cerca de 15% do produto mundial. Reforça-se o poder da oligarquia financeira sobre a economia em geral.

Acumula-se o número de mega falências fraudulentas. Grandes escândalos financeiros de expressão mundial (Enron, Worldcom, Parmalat, entre outros) tiveram profundas repercussões sócio-económicas nos países afectados (desemprego, segurança social, etc.), mostrando os riscos do agravamento de dois traços do capitalismo actual: o predomínio da financeirização do capital e da especulação e o crescente peso das práticas criminosas na actividade económica. Aumentam os tráficos - de armas, de drogas e de pessoas - e o branqueamento de capitais deles decorrente. As práticas mafiosas e a corrupção que contaminam o poder capitalista tornam-se parte integrante «normal» do funcionamento do sistema. A economia paralela não pára de crescer.

Continua a acentuar-se o processo de concentração e centralização do capital e o seu carácter cada vez mais «regional» e «transcontinental». Na medida em que se acelera a concorrência intercapitalista reforçam-se as tendências para a formação de monopólios e oligopólios em praticamente todos os sectores da actividade económica. As operações de fusão e aquisição de empresas representam hoje mais de 12% do produto mundial e tiveram um amplo aumento durante a década de 90.

Reforça-se, por outro lado, a centralização do capital nacional («de bandeira»), nomeadamente nos EUA, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Holanda. Aprofunda-se o papel subalterno do capital nacional das economias mais débeis e a tendência para a sua eliminação progressiva. Reforça-se, neste contexto, o peso das transnacionais, que controlam 2/3 do comércio mundial, representando hoje, as maiores, um peso económico superior a alguns Estados.

Favorecer os grandes grupos económicos - abatendo fronteiras, instituindo a livre circulação de capitais, liquidando ou submetendo as produções nacionais, forçando a abertura dos mercados às suas actividades de rapina, pela guerra se necessário - tal é a missão fundamental dos Estados e das Organizações Internacionais do capitalismo.

Os processos de cooperação e de crescente integração económica e política regional, decorrentes do desenvolvimento das forças produtivas e da divisão internacional do trabalho, são também uma consequência da crescente guerra económica entre blocos. Tais processos, favorecendo embora a concentração capitalista, desempenham um papel contraditório. Podem dificultar o avanço da hegemonia planetária das grandes potências, como no caso do Mercado Comum Sul Americano (Mercosul) frente aos EUA, ou facilitá-lo, como no caso da União Europeia, que surge como o exemplo mais avançado de criação de um bloco económico, político e militar imperialista. Por outro lado, multiplicam-se os espaços de concertação e regulação capitalista a nível mundial, baseados em organizações como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (BM), Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), a OMC ou em encontros «informais» como o «Grupo dos 8» (G8), ou o Fórum de Davos, ou mesmo o «Grupo de Bilderberg» e a «Trilateral».

A incerteza continua a dominar as perspectivas da economia mundial. A prometida retoma não se confirmou em 2002. As previsões económicas indicam que pode estar em curso uma retoma, encetada no segundo semestre de 2003, liderada pelos EUA e nos países emergentes asiáticos. Mas estas previsões continuam a ser prudentes e a apresentar diversos factores de instabilidade decorrentes sobretudo dos fortes desequilíbrios estruturais da economia norte-americana, devido aos seus elevados défices público e da balança de transações correntes, que já ultrapassa os 5% do seu PIB. A desvalorização do dólar, e consequente valorização do Euro, que tem vindo a bater recordes históricos, cria fortes condicionalismos à retoma económica de vários países da Zona Euro. Importa acompanhar o crescimento e impacto da economia chinesa no plano mundial.

O endividamento dos EUA, equivalente a um quarto do seu PIB, levanta o problema da sustentabilidade dos seus défices e do consumo privado e ameaça com um ajustamento abrupto dos fluxos financeiros de dimensão mundial. Os efeitos das políticas fiscais e monetárias expansionistas, assentes nas despesas militares e nas baixas taxas de juro, vão começar a dissipar-se, também no Japão, onde permanecem os efeitos deflacionistas após mais de uma década de profunda recessão. Persistem elevados níveis de desemprego e pobreza que, restringindo o acesso a bens essenciais, limitam o consumo privado. Por outro lado, o crescimento do endividamento das famílias está a atingir os seus limites. No mercado imobiliário, cujos preços têm vindo a subir a níveis demasiado elevados, subsistem riscos de um ajustamento abrupto com consequências de expressão mundial.

Num contexto de oscilações, o forte aumento do preço de petróleo, devido às actividades especulativas, à invasão e ocupação do Iraque e ao aumento da procura mundial, contribuiu para esbater as pressões deflacionistas, mas condiciona a retoma económica e é um factor de risco adicional. Este aumento tem uma natureza estrutural, que decorre do aumento da procura mundial, mas deve-se também ao facto de estar a aproximar-se (ou ter-se já verificado) o pico da produção mundial deste recurso finito. Neste quadro, a gestão do controlo dos recursos petrolíferos e do gás natural é um problema grave que põe em causa o «modelo» energético das economias capitalistas e tende a tornar-se cada vez mais uma questão central de disputa das potências imperialistas, como foi evidente na agressão ao Iraque e ao Afeganistão ou na sua ingerência militar no Médio Oriente e no Cáucaso na mira do controlo do gás natural, do petróleo e do traçado dos principais oleodutos. Mas as dificuldades dos EUA em impor o seu controlo sobre o Iraque, associadas à instabilidade e imprevisibilidade geradas em toda essa região, tornaram-se noutro factor de peso para o agravamento do preço de petróleo e a volatilidade dos mercados financeiros.

A restauração capitalista nos países do Leste da Europa e ex-URSS, na diversidade de situações e diferença de ritmos que a caracterizam, revela um quadro de subordinação aos interesses e estratégias do grande capital e de intensificação da exploração capitalista, indissociável do movimento de expansão da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) e do alargamento da UE. Estes processos, se por um lado traduzem crescentes pretensões hegemónicas dos EUA e das grandes potências, por outro manifestam também a competição interimperialista. É particularmente significativa, neste contexto, a deslocação da máquina militar da NATO para junto das fronteiras russas (europeia e asiática), aumentando objectivamente a pressão - e ameaças sobre a Federação Russa - e convertendo os novos membros da aliança militar em «linhas da frente» de um novo mapa geopolítico do continente.

Nos planos económico e social, depois da grande recessão provocada pelas derrotas do socialismo e a concomitante destruição dos aparelhos produtivos nacionais, os resultados desiguais de crescimento dos indicadores económicos verificados nos anos mais recentes na generalidade destes países atestam os elevadíssimos custos e as consequências da chamada «transição capitalista», com destaque para a explosão da pobreza e das desigualdades, a destruição dos sistemas de segurança social, de saúde e educativo, a emergência do desemprego e da emigração em massa, a aplicação de novos e mais regressivos códigos do trabalho, a acção criminosa na esfera económica (incluindo tráfico de pessoas em larga escala) que se tornam elementos estruturais do novo modelo económico, assente nas privatizações e na submissão ao capital estrangeiro.

No plano político, num quadro de grande fluidez na arrumação das forças políticas, multiplicam-se os sinais de reforço de tendências securitárias e repressivas, a restrição de liberdades e garantias, a par da emergência de fenómenos de nacionalismo, xenofobia, apartheid social - como a discriminação extrema que afecta as comunidades eslavas, a quem são recusados os direitos cívicos na Letónia e Estónia. Em alguns países existem limitações constitucionais de carácter anticomunista e até a proibição legal da existência de partidos comunistas (como nos Estados bálticos), enquanto representantes do colaboracionismo nazifascista na II Guerra Mundial são publicamente reabilitados.

O carácter explorador, injusto e desumano do capitalismo é patente não apenas na sua incapacidade de resolver os problemas da Humanidade, mas na tendência manifesta para o seu agravamento, sobretudo onde pode manifestar-se mais livremente.

No plano da distribuição da riqueza aprofunda-se o fosso entre uma enorme massa de seres humanos e uma elite multimilionária. Ao mesmo tempo que: 1100 milhões de pessoas vivem com menos de um dólar por dia; o número daqueles que vivem abaixo do limiar da pobreza aumentou na maioria dos países em desenvolvimento; milhões de trabalhadores são empurrados para o desemprego (só na OCDE os números reais situam-se acima dos 50 milhões) - a riqueza combinada entre os 50 maiores milionários do mundo equivale à soma do PIB de todos os países da África Sub Saariana onde sobrevivem 688,4 milhões de pessoas.

Nas mais diversas áreas sociais são extremamente dramáticas as consequências da polarização da riqueza, registando-se claras situações de regressão civilizacional. No campo alimentar, é a própria Organização das Nações Unidas (ONU) que reconhece já o bloqueio da política de redução da fome no mundo com a inversão da tendência registada no início dos anos 90, apontando agora o impressionante número de 36 milhões de mortos por ano, ou seja, quase 70 seres humanos que sucumbem em média por minuto à falta de alimentos.

Na área da saúde, ao mesmo tempo que se conhecem autênticos crimes ligados ao negócio de medicamentos e patentes, reaparecem doenças praticamente erradicadas num passado recente (como o caso da tuberculose), e mais de 30 mil crianças morrem por dia devido a causas evitáveis, sobretudo nos países em desenvolvimento.

Em várias zonas do globo a esperança média de vida decresceu, destacando-se a África Sub Saariana e os territórios da ex-URSS. O alastramento do vírus do SIDA infecta em todo o mundo mais de 60 milhões de pessoas, das quais 95% nos países em desenvolvimento.

A corrupção e o crime organizado, características intrínsecas do sistema capitalista, constituem factores acrescidos de exclusão e degradação humanas. Realidades particularmente chocantes são as das crianças usadas nos negócios criminosos da exploração sexual e trabalho infantil. Mais de 10% das crianças de todo o mundo entre os 10 e os 14 anos são exploradas no trabalho infantil e cerca de 2 milhões de crianças são exploradas e violentadas na «indústria do sexo» a cada ano que passa.

A guerra, a desigualdade económica e o subdesenvolvimento do Terceiro Mundo estão inexoravelmente ligados à sistemática degradação do planeta e das condições de vida dos povos do mundo. As questões de natureza ambiental tornaram-se muito agudas. Fenómenos como a destruição da camada de ozono e as alterações climáticas, a perda da biodiversidade e a extinção das espécies, a desflorestação tropical e a destruição das zonas húmidas, a erosão e desertificação dos solos e a poluição dos mares e estuários que, representando uma séria degradação das bases ecológicas da existência humana e das condições de vida na Terra, são inseparáveis de causas sociais e históricas enraizadas nas relações de produção capitalistas da dinâmica de crescimento ditadas pelas transnacionais e pela lógica do lucro rápido que as caracteriza.

Aspecto particularmente grave consiste na mercantilização e tentativa de submissão à propriedade privada de factores básicos e essenciais para a existência da Humanidade, com implicações ainda mais ameaçadoras ao nível da dominação de povos e Estados pelo poder de grupos económicos transnacionais. Tal é o caso da água e produção de alimentos, do patenteamento de códigos genéticos e programas informáticos (software), ou da produção em larga escala ou sem a necessária avaliação dos riscos, de organismos geneticamente modificados (OGM) - sem esquecer os crimes ligados com o negócio dos medicamentos, questão que está a adquirir uma dimensão política internacional muito séria.

A utilização pelo capitalismo das conquistas da ciência e da técnica cerceia o seu potencial libertador, constitui factor acrescido de exploração, opressão e guerra, é portadora de uma lógica de desperdício e destruição que ameaça a própria vida humana.

O peso crescente do capital financeiro especulativo e da «economia criminosa» que lhe está associada em relação ao capital produtivo, assim como o papel do complexo militar-industrial no funcionamento do capitalismo e com ele a corrida aos armamentos, a guerra permanente e a chantagem nuclear, atestam bem a irracionalidade e perigosidade do sistema.

Tudo isto põe em evidência a contradição fundamental do capitalismo, ou seja, a contradição entre o carácter social da produção e a apropriação privada dos meios de produção e a exigência histórica de fazer corresponder ao impetuoso desenvolvimento das forças produtivas novas relações de produção, de carácter socialista, capazes de libertar todo o potencial emancipador das extraordinárias aquisições do trabalho e do pensamento humano, colocá-las ao serviço da Humanidade e afastar definitivamente o espectro da miséria, da guerra e da própria destruição do planeta.

A abordagem marxista-leninista da questão do poder é de decisiva importância na análise do capitalismo contemporâneo. O carácter essencialmente coercivo e a natureza de classe do Estado, os seus prolongamentos multi e transnacionais, a subordinação (e crescente fusão) do poder político ao poder económico, o papel cada vez maior do Estado e das estruturas supranacionais do capitalismo no sistema de reprodução do capital e no processo de centralização e concentração do capital e da riqueza, são questões que necessitam estudo atento já que, a conquista do poder e a sua transformação classista permanecem como questões centrais da luta emancipadora.

Ao contrário do que apregoam os ideólogos do neoliberalismo, o poder não se dispersa, concentra-se; o Estado não se dilui na chamada «sociedade civil», reforça-se nas suas vertentes de classe imperialista; os «espaços» de liberdade e participação não se alargam, restringem-se, crescentemente golpeados por medidas securitárias e crescentes ataques a direitos, liberdades e garantias fundamentais; a soberania nacional recua diante das exigências do poder das multinacionais, transformando governos dos países periféricos em simples instrumentos da «boa governação» imperialista.

São cada vez maiores os ataques à democracia mesmo na sua dimensão política formal. É evidente a crise do sistema de representação liberal-burguês, subjugado pelo poder económico e descredibilizado pelo sistema de alternância entre a direita e a social-democracia.

Direitos e conquistas históricas estão a ser sistematicamente postos em causa. O revisionismo histórico, encorajado pelas derrotas da construção do socialismo, branqueia os mais monstruosos crimes do capitalismo, deforma e denigre a Revolução de Outubro e o empreendimento de uma nova sociedade a que deu lugar, insiste na tentativa de criminalizar o comunismo e os comunistas. Os meios de comunicação social de massas e outros instrumentos ao serviço da manipulação ideológica da grande burguesia promovem os valores mais reaccionários e banalizam a violência e as facetas mais perversas do capitalismo: desde a miséria extrema à utilização de armas nucleares, desde a violação da soberania dos povos à tortura, desde as detenções arbitrárias e ilegais ao recurso permanente à guerra, desde o «choque de civilizações» à acção de subversão e ingerência da CIA e outros serviços secretos; um retrocesso no plano cultural que promove o obscurantismo, a ignorância, ideias anticientíficas e místicas, o egoísmo e a intolerância racial e cultural, a degradação de valores e do ser humano. Cresce a ameaça do populismo, do racismo e da extrema-direita.

Como bem mostra o comportamento de governos como o dos EUA ou de Israel, e a montanha de ilegalidades, crimes e práticas terroristas contra povos como o palestiniano e o iraquiano, estão em acelerado processo de desenvolvimento tendências autoritárias, repressivas e fascizantes. A tentativa de instaurar uma nova ordem totalitária, hegemonizada pelos EUA, contra os trabalhadores e contra os povos, encerra os maiores perigos para toda a humanidade.

 

1.2. A ofensiva do imperialismo

A ofensiva global do imperialismo, e em particular do imperialismo norte-americano, pela hegemonia mundial foi repetidamente prevista e fundamentada pelo PCP nos seus Congressos realizados após 1991. Esta ofensiva tem a sua causa próxima na alteração radical da correlação de forças no plano internacional, resultante da desagregação da URSS e das derrotas do socialismo no Leste da Europa e do enfraquecimento das forças do progresso social no plano mundial.

A nível mais profundo, a ofensiva global do imperialismo é resultado da própria dinâmica do sistema capitalista, cuja natureza exploradora e agressiva não se alterou nas suas características fundamentais. Uma ofensiva que é determinada pelas exigências de reprodução do capital e a corrida ao máximo lucro; pela necessidade de intensificar a exploração dos trabalhadores, tanto nos países periféricos como nos centros do poder imperialista, a fim de satisfazer as exigências da acumulação capitalista e enfrentar a baixa tendencial da taxa de lucro, reduzindo o preço da força de trabalho e enfraquecendo a capacidade reivindicativa de quem trabalha; pela necessidade de alargar o seu domínio a novos mercados, abolindo as restrições à circulação do capital financeiro e à pilhagem por parte das empresas transnacionais; pela necessidade de dominar novas fontes de matérias-primas baratas, com destaque para as energéticas, cujo controlo é decisivo para impor a sua hegemonia; pela vontade de esmagar formas autónomas de produção, comercialização e consumo, não integradas nos circuitos controlados pelas grandes empresas dos centros do imperialismo, quer sejam de natureza familiar, pública ou mesmo capitalista.

É neste contexto que se assiste a violentas ofensivas para liquidar avanços históricos e direitos dos trabalhadores, à regressão social e ao agravamento das injustiças e desigualdades, à privatização de serviços sociais e do sector público empresarial, transferindo para o domínio do capital privado sectores e funções cruciais para um desenvolvimento social mais justo (saúde, educação e cultura, segurança social, transportes e comunicações, habitação, água e electricidade).

O esvaziamento das funções sociais do Estado que foram conquistadas pela luta do movimento operário (sobretudo na correlação de forças favorável após a II Guerra Mundial), é um traço relevante da actual situação internacional. O capitalismo sente-se mais livre para funcionar sem condicionamentos nem concessões, e procura privilegiar e sofisticar as tradicionais funções repressivas do Estado enquanto instrumento de dominação de classe.

Além do desemprego e da precariedade das relações laborais que invadem o mundo do trabalho, o imperialismo fomenta uma cultura de insegurança e medo como factor de desmobilização da luta e manutenção do seu poder.

São expressões particularmente graves desta ofensiva do imperialismo: o militarismo e o recurso à guerra e o afrontamento sistemático do Direito Internacional; a inquietante generalização de ataques a direitos, liberdades e garantias com a criminalização e mesmo a tentativa de identificação com o terrorismo da resistência à opressão; com o reforço em quase todos os países de legislação e de mecanismos repressivos (Patriot Act nos EUA), as detenções arbitrárias e sem qualquer respeito pelas Convenções internacionais, e o sistemático recurso à tortura; a utilização implacável de estruturas supranacionais como o FMI, BM, BCE, OMC, OCDE, para a imposição de políticas favoráveis ao grande capital; o regresso de formas clássicas de dominação colonial, através dos «protectorados» (Bósnia, Kosovo), ou da ocupação militar directa (Afeganistão, Iraque); a tentativa de subverter e destruir a ONU e o seu sistema de agências internacionais, cuja função original de garante da paz e de promotor do desenvolvimento se pretende substituir por um papel de «legitimador» e de «almofada» das agressões imperialistas; o reforço da NATO e de outras alianças militares agressivas (como o Tratado nipo-norte-americano), com a adopção de novos conceitos estratégicos abertamente ofensivos e «preventivos», ao mesmo tempo que se desenvolvem processos de remilitarização da Alemanha e do Japão e de militarização da UE e se intensifica o intervencionismo militar para controlar e influenciar países soberanos (R. D. Congo, Costa do Marfim, Sudão, etc.).

O que está em curso é uma resposta de força imperialista às dramáticas e explosivas contradições do mundo contemporâneo. E com ela a tentativa de desmantelar a ordem jurídica e institucional, fundamentalmente pacífica e democrática, resultante da derrota do nazifascismo e a sua substituição por uma nova ordem mundial totalitária contra os trabalhadores e contra os povos, hegemonizada pelos EUA, ao serviço do grande capital e do imperialismo. Uma tal tentativa tem exacerbado e agravado todas as contradições, injustiças e desigualdades, incluindo no próprio campo do imperialismo.

Concertação e rivalidade interimperialista são duas facetas inseparáveis da dinâmica do sistema capitalista, às quais é necessário prestar grande atenção, analisando em cada momento o que predomina e o quadro concreto de arrumação de forças. Do petróleo aos sistemas de comunicação, da produção e comércio de armamento ao sistema de espionagem Echelon, são inúmeros os agudos conflitos de interesse. Prossegue a disputa pelo controlo económico, político e militar de vastas regiões como o Leste da Europa, o Médio Oriente, a Ásia Central, a África e muitas outras.

A tendência conjuntural é para o compromisso em nome dos interesses de classe mais gerais do grande capital e para o sistemático recuo das outras grandes potências da «Tríade» diante das pretensões hegemónicas dos EUA. É o que se tem verificado nomeadamente no quadro da NATO, nas vergonhosas posições da UE em relação a Cuba ou à Palestina, e o que expressa a inquietante resolução 1546 do Conselho de Segurança da ONU sobre o Iraque. Entretanto, tal como o desencadeamento pelos EUA da guerra do Iraque e o processo de militarização da UE revelam, tais arranjos de interesses coexistem com a luta por esferas de influência e domínio, que a arrogância do imperialismo norte-americano tende a agudizar.

Os quatro anos decorridos desde o XVI Congresso ficaram marcados pelo reforço das rivalidades entre os vários pólos do imperialismo. Estas rivalidades, assentam em bases objectivas, ligadas ao grau diverso de poder económico, político e militar dos vários pólos e à sua evolução a ritmos desiguais. Uma evolução que quebra anteriores equilíbrios e cria novas correlações de força, cuja resolução levou no passado, por mais de uma vez, a grandes enfrentamentos militares.

O grande capital norte-americano, confrontado com um gradual enfraquecimento económico relativo, no decurso das últimas décadas, e um crescimento dos pólos europeu e asiáticos, aproveitou a alteração da correlação de forças para passar à ofensiva no plano mundial e procurar reforçar a sua posição hegemónica no seio do capitalismo mundial através dos meios nos quais dispõe ainda de uma clara superioridade qualitativa: o controlo dos mercados financeiros, o papel da sua moeda, a informação, a produção e propaganda ideológicas, mas sobretudo o poderio militar.

Respondendo a interesses das classes dominantes e situando-se claramente numa linha de continuidade do governo Clinton e outros, esta estratégia conheceu um salto qualitativo com o reforço no poder dos sectores mais reaccionários do grande capital, ligados de forma particular às indústrias militar e petrolífera, de que o governo Bush é um fiel representante e com as quais está particularmente comprometido.

A pretexto dos atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 (cujos contornos não estão ainda completamente apurados) o imperialismo norte-americano conduz uma ofensiva onde são de destacar: duas guerras de agressão de grandes proporções (Afeganistão e Iraque), ou intervenções militares de menor envergadura (Haiti); um salto qualitativo no processo de subversão da ordem internacional, da Carta da ONU e do Direito Internacional, com a revogação formal de Tratados e Acordos existentes (Tratado ABM), a recusa em assinar Acordos como o das Armas Biológicas ou o Protocolo Ambiental de Quioto; admissão da utilização de armas nucleares e o financiamento de programas para o seu desenvolvimento; a militarização do espaço com o programa da «guerra das estrelas»; o estabelecimento de novas bases militares dos EUA, e da NATO, nomeadamente em território dos antigos países socialistas, sendo de realçar o prosseguimento de um cerco à Rússia e à China, encaradas como potenciais rivais; o aumento significativo das despesas militares, que rondam actualmente os 450 mil milhões de dólares no Orçamento dos EUA, cerca de metade dos gastos militares do planeta; a insistência na criação de novos mecanismos agressivos, tais como o Plano Colômbia ou a força militar de intervenção rápida propostos na recente Cimeira dos G8; recurso às mais violentas formas de terrorismo de Estado, como os terríveis crimes do governo israelita contra o povo palestiniano, e bombardeamentos de populações e instalações civis, frequentemente com recurso a armas não convencionais; a violação sistemática de acordos e garantias visando a protecção de cidadãos, tais como o princípio do habeas corpus ou a Convenção de Genebra sobre o Tratamento de Prisioneiros de Guerra; o recurso sistemático às mais descaradas mentiras e falsificações como forma de procurar legitimar a política de agressão e os crimes perpetrados; a agressão e a guerra como meio de gerar em curto prazo fabulosos lucros para o grande capital, quer pelo controlo de recursos e empresas dos países agredidos, quer pelas encomendas de armas e equipamento militar, quer através dos negócios de «reconstrução» das destruições provocadas pela guerra.

Três anos passados sobre o 11 de Setembro tornou-se uma evidência que a chamada guerra ao terrorismo constitui, no essencial, cobertura política e ideológica para os objectivos estratégicos de domínio mundial do imperialismo. O terrorismo, historicamente contrário aos interesses dos trabalhadores e dos povos, é um problema real que precisa de ser firmemente combatido. Mas a «guerra ao terrorismo» conduzida pelos EUA e seus aliados, com métodos de autêntico terrorismo de Estado, em lugar de o reduzir e isolar, alimenta-o e amplia-o. O combate ao terrorismo faz-se fundamentalmente lutando contra as suas raízes sócio-económicas e ideológicas - exploração, miséria, aprofundamento das injustiças e desigualdades sociais, pilhagem e opressão nacional, perseguição cultural e religiosa - e não com o afrontamento do Direito Internacional, o ataque sistemático a direitos, liberdades e garantias, o racismo e a guerra que a seu pretexto promovem.

A ofensiva do imperialismo norte-americano entrou numa fase de grandes dificuldades durante a primeira metade de 2004 devido, em primeiro lugar, à resistência do povo iraquiano à invasão do seu país pelos EUA e seus aliados. A ocupação militar directa saldou-se por um estrondoso fracasso político e uma forte resistência armada.

A consciência, no seio dos centros do imperialismo, dos perigos de uma clara derrota da aventura iraquiana dos EUA para a sua estratégia de dominação planetária está a conduzir a rearrumações de forças no campo do imperialismo e à procura de estratégias de recuo que preservem o fundamental do sistema de dominação imperialista, quer no Iraque quer no plano mais geral.

Trata-se de um processo que se encontra em desenvolvimento, passível de surpresas e sobressaltos, tendo em conta a importância das questões em jogo e a natureza objectiva das contradições: a relação de forças entre os vários centros do imperialismo e entre as respectivas moedas, o controlo dos limitados recursos energéticos fósseis (em particular do petróleo) do planeta, a distribuição das concessões necessárias para sair da crise e para a solução dos enormes problemas económicos dos EUA e do capitalismo mundial, a repartição dos recursos e mercados.

O novo mandato de Bush à frente do governo dos EUA confirma e reforça a opção de sectores importantes do grande capital norte-americano pela estratégia de confrontação e agressão a nível mundial. Essa opção encerra os maiores perigos para a Humanidade.

É tarefa das forças progressistas e revolucionárias lutar para impedir que as dificuldades da ofensiva imperialista a nível mundial se saldem quer por uma escalada aventureirista de desfechos trágicos, quer por acordos e soluções que salvem a essência da política de dominação, exploração e guerra do imperialismo. Pelo contrário, é necessário incrementar a resistência generalizada dos trabalhadores e dos povos às políticas que conduziram o mundo a uma crise de grandes proporções, a fim de criar as condições para transformações revolucionárias que possam erradicar a causa de fundo dessa crise: o capitalismo.

Neste contexto, e independentemente das contradições que prosseguem com os outros pólos da «Tríade», são de combater as ilusões de que uma União Europeia sob o comando do grande capital possa representar uma alternativa ao imperialismo norte-americano e devem ser combatidas as actuais tendências para o reforço do militarismo e do federalismo no seio da União Europeia.

A derrota do imperialismo será obra da luta dos trabalhadores e dos povos, e resultará da nova correlação de forças mundial que essa luta venha a criar.

 

1.3. A resistência e a luta dos trabalhadores e dos povos

A ofensiva do imperialismo é global e particularmente violenta. Procura arrebatar conquistas alcançadas por muitas décadas de duras lutas, destruir até aos alicerces as realizações do socialismo e perverter a sua memória, semear entre as massas o derrotismo, o conformismo e a desesperança. Tudo isto cria sérios problemas e dificuldades à acção dos comunistas e outras forças progressistas e revolucionárias.

Mas os povos não se submetem. O imperialismo encontra crescente resistência. Por toda a parte prossegue a luta libertadora dos trabalhadores e dos povos.

A resistência do povo iraquiano à guerra de ocupação do Iraque reveste-se de uma grande importância e significado político, mostrando que, mesmo na ausência de uma força nacional aglutinadora e de uma clara perspectiva revolucionária (que fizeram a força da resistência, por exemplo no Vietname), é possível enfrentar os exércitos mais poderosos, confirmando que a defesa da soberania e da independência nacional permanece um factor da mais alta importância na luta pelo progresso social.

A luta contra o imperialismo, e em primeiro lugar contra o imperialismo norte-americano e a sua política de agressão e de guerra, é de crucial importância. É necessário prestar-lhe ainda mais atenção e intensificar por todas as formas possíveis a solidariedade anti-imperialista para com os povos vítimas da ingerência e agressão dos EUA e de outras grandes potências. No Iraque, na Palestina, em Cuba e na Venezuela, assim como na Colômbia, nos Balcãs, no Afeganistão, na R. D. P. da Coreia, em Chipre e noutros países travam-se batalhas de primeira linha cujo resultado terá grandes repercussões e consequências para o futuro da humanidade. As grandes mobilizações mundiais pela paz e contra a guerra no Iraque revestem-se por isso de uma excepcional importância, sendo necessário promover a sua continuação, organização e carácter anti-imperialista.

É de sublinhar também o significado da crescente resistência às ruinosas políticas do FMI, BM ou OMC e ao domínio avassalador das transnacionais. A ampla luta popular contra a privatização de serviços e empresas públicas, nomeadamente na Europa e América Latina onde, como na Bolívia, assumiu formas insurreccionais; a luta contra o Acordo de Livre Comércio das Américas (ALCA), projecto recolonizador da América Latina pelos EUA; a emergência na Cimeira de Cancun do «Grupo dos 20» integrado por importantes países que resistem às imposições económicas do imperialismo - são acontecimentos relevantes que importa valorizar.

A contradição antagónica entre o capital e o trabalho continua no centro da luta de classes e pela superação revolucionária do capitalismo. Tanto no centro como na periferia do mundo capitalista tiveram lugar importantes lutas da classe operária e dos trabalhadores assalariados, e o movimento sindical onde continua a luta em defesa do seu carácter de classe, confirmou-se como o mais estável, massivo e influente movimento social.

O ascenso da luta de massas, embora irregular, foi o traço mais significativo da luta dos trabalhadores desde o último Congresso. O movimento grevista, incluindo greves gerais e nacionais de grande impacto político, teve forte expressão em numerosos países de todos os continentes, envolvendo a classe operária e restantes trabalhadores de grandes empresas públicas ou privadas e de sectores e ramos de actividade muito diversos. Grandes jornadas de luta, manifestações, mobilizando em diversos países da América Latina, da Europa e da Ásia centenas de milhar e mesmo milhões de manifestantes, associaram frequentemente reivindicações económicas a reclamações directamente políticas, de carácter democrático e progressista. A resistência à ofensiva exploradora do capital e destruidora de direitos e conquistas históricas dos trabalhadores, de que é exemplo a luta contra as privatizações, em defesa dos postos de trabalho e contra o desemprego, em defesa dos serviços públicos, do direito à educação, da segurança social, das reformas e pensões, contra a precariedade e a desregulação das relações laborais, pela valorização dos salários e a redução do horário de trabalho, a luta pelos direitos das mulheres, dos jovens trabalhadores e dos estudantes, contra a exploração do trabalho infantil e em defesa do meio ambiente, contribuiu para limitar o alcance dos objectivos do grande capital.

A problemática da imigração tornou-se em muitos países (Portugal incluído) uma questão incontornável, não apenas de carácter sócio-económico, mas de classe e de internacionalismo. É necessário intensificar a luta para que os trabalhadores imigrantes usufruam os mesmos direitos e regalias dos outros trabalhadores. A construção da unidade internacional dos trabalhadores e da aliança da classe operária dos países capitalistas desenvolvidos com os povos oprimidos dos países do «Terceiro Mundo» passa também por aqui.

Defender o movimento sindical da violenta ofensiva do capital, aumentar a sindicalização, libertar os sindicatos da influência reformista e de colaboração de classes que o domina em muitos países, nomeadamente na Europa, é da maior importância para o avanço da resistência e da luta contra a ofensiva do grande capital e do imperialismo.

À centralização e concentração do capital e ao domínio das relações económicas internacionais por um punhado de transnacionais corresponde a acelerada proletarização das camadas sociais intermédias e o alargamento do campo das forças antimonopolistas. Esta realidade coloca a necessidade do reforço do internacionalismo e da unidade da classe operária e dos trabalhadores em todo o mundo.

As lutas das massas camponesas, proletariado agrícola e produtores independentes, pela terra, pela soberania alimentar e o direito de produzir, contra as imposições da OMC e das multinacionais da indústria e comércio agro-alimentar, por preços compensadores à produção, envolvem centenas de milhões de pessoas por todo o mundo e que, em muitos casos, como na Índia ou no Brasil, estão fortemente organizadas em experientes movimentos de classe. Lutas que, contra a demagogia assistencialista, colocam por toda a parte a exigência da Reforma Agrária, de profundas transformações da estrutura e da propriedade da terra e do comércio agro-alimentar, assim como os direitos das comunidades indígenas e a defesa do meio ambiente contra as brutais agressões das transnacionais.

A luta das massas camponesas continuou no primeiro plano em numerosos países apesar da sua quase nula visibilidade mediática salvo quando, como no Equador, no Peru ou na Bolívia, explodiu em poderosos movimentos de massas de carácter insurreccional com grande expressão no plano político, ou como em Bombaim, onde os sindicatos e organizações camponesas contribuíram decisivamente para o carácter popular combativo do 3.º Fórum Social Mundial.

Devem também ser valorizadas: as lutas da pequena e mesmo média burguesia urbana, nomeadamente dos micro, pequenos e médios empresários; as lutas dos intelectuais e quadros técnicos, uma camada cada vez mais proletarizada e numerosa; as lutas das mulheres, cujos movimentos pela promoção dos seus direitos e pela efectiva igualdade nos planos económico, político, social e cultural têm uma importância cada vez maior na sociedade; as lutas dos jovens e estudantes, cujo peso social aumenta em muitos países, com grandes lutas pelo emprego, pela escola pública e a democratização do ensino, por um futuro melhor, sendo justo valorizar a acção da Federação Mundial da Juventude e dos Estudantes (FMJD) e o movimento dos festivais mundiais da juventude e dos estudantes, com o seu carácter de massas e conteúdo anti-imperialista.

Com o brusco agravamento da política agressiva do imperialismo norte-americano o movimento pela paz conheceu grande desenvolvimento, aglutinando em grandes acções de massas de dimensão mundial um amplo leque de organizações unitárias, movimentos sociais e forças políticas. Perante o anúncio do ataque ao Iraque, dezenas de milhões de pessoas saíram à rua para tentar impedir a agressão e protestar contra a sua concretização, apontando o governo norte-americano como o principal inimigo da paz. As poderosas mobilizações de 15 de Fevereiro e 20 de Março de 2003 contra a guerra no Iraque, realizadas simultaneamente em numerosos países, constituem um facto novo de grande relevo na luta dos trabalhadores e dos povos, contra o imperialismo e contra a guerra.

Embora com graus e aspectos diferenciados, deve ser valorizado na resistência à nova ordem imperialista, o papel dos países que definem como orientação e objectivo a construção de uma sociedade socialista - Cuba, China, Vietname, Laos, R. D. P. da Coreia. Para além de apresentarem profundas diferenças entre si, estes países constituem importantes realidades da vida internacional, cujas experiências é necessário acompanhar, conhecer e avaliar, independentemente das diferenças que existem em relação à nossa concepção programática de sociedade socialista a que aspiramos para Portugal, e de inquietações e discordâncias, por vezes profundas e de princípio, que nos suscitam.

Não é por acaso que, combinando pressões de ordem política, económica e militar, que vão do bloqueio económico à ameaça de agressão armada, o imperialismo tem estes países como alvo permanente das suas campanhas de desestabilização e agressão. Isto acontece tanto para tentar destruir a força do exemplo revolucionário e patriótico, como no caso de Cuba e da sua revolução socialista, vítima de um bloqueio criminoso e ilegal, como para conter e se possível subverter a poderosa realidade geostratégica que a China representa. É do interesse das forças do progresso social e da paz que fracassem tais objectivos do imperialismo e que os povos destes países, como todos os povos do mundo, possam decidir sem pressões e ingerências externas a sua própria via de desenvolvimento.

O alargamento da frente social de luta contra o capital e o agravamento dos problemas das massas populares conduziram nos últimos tempos a uma explosão de reivindicações, causas específicas e movimentos do mais variado tipo. Valorizando o que de positivo esta realidade contém como vontade de participação cívica e intervenção democrática, é necessário contrariar a atomização e dispersão do movimento social e pressões para a sua despolitização e recuperação reformista.

A luta pela convergência de todas as classes e camadas antimonopolistas numa vasta frente de luta anticapitalista e anti-imperialista é uma tarefa fundamental no momento actual.

A erupção do chamado «movimento antiglobalização» (nas suas diferentes expressões, desde acções de massas de contestação da política das organizações internacionais do imperialismo, aos Fóruns Sociais Mundiais ou Regionais) constitui uma nova e importante realidade da vida internacional. Representa a entrada na luta de camadas sociais duramente atingidas nos seus interesses e aspirações pelo rolo compressor do neoliberalismo. Significa uma brecha profunda aberta na teoria do «pensamento único» que prega o conformismo e a impotência. Expressa o estreitamento da base social de apoio do capitalismo na sua forma actual e tem uma forte componente anticapitalista e anti-imperialista que importa acentuar.

Em torno do conteúdo e significado do «movimento antiglobalização» trava-se uma intensa luta política e ideológica. Entre aqueles que o situam no terreno concreto da luta de classes e do combate anti-imperialista, e os que dele fazem uma abstracção em conformidade com as suas teorizações especulativas. Entre os que procuram salvaguardar e acentuar o seu carácter anticapitalista e os que, pretendendo apenas «humanizar» a globalização capitalista, se empenham na sua recuperação e institucionalização reformista. Entre os que defendem a necessidade do partido revolucionário e do sindicalismo de classe e aqueles que a negam e combatem, reduzindo a acção transformadora a um movimentismo anarquizante inconsequente. Entre os que consideram incontornável e determinante o marco nacional de luta necessariamente articulado com a solidariedade internacionalista, e os que o consideram ultrapassado e defendem um «novo internacionalismo» sem raiz de classe e conteúdo anticapitalista. Entre os que vêem nos Fórum Social Mundial e Europeu um ponto de encontro e convergência na acção de organizações, partidos e movimentos diversificados, e aqueles que procuram criar estruturas e redes supranacionais e impor a partir «de fora e de cima» agendas políticas, que não só não têm correspondência com a dinâmica real da luta de classes em cada país, como tendem a alienar as lutas populares.

O PCP tem participado e continuará a participar activamente nas principais acções do «movimento antiglobalização»: valorizando uma realidade que é expressão da crescente resistência ao imperialismo; com a afirmação das suas posições e identidade própria; coordenando a sua intervenção com a de outros partidos comunistas e revolucionários de modo a conseguir, a par da mais ampla unidade contra o neoliberalismo e a guerra, a projecção dos valores e do projecto comunista. A participação do PCP nesse «movimento» é necessária para que, como noutras ocasiões históricas, se não frustre o crescente descontentamento, contestação e radicalização, principalmente da juventude, e se reforcem as forças consequentemente anticapitalistas e revolucionárias.

A frente anti-imperialista, muito ampla e diversificada, apresenta um grau de dispersão de objectivos e formas de intervenção que é importante superar. É necessário precisar os grandes eixos de acção comum ou convergente que ajudem a unificar e a dar maior eficácia à luta. Como contribuição para este objectivo, o PCP destaca nomeadamente: a luta contra o militarismo e a guerra e o recurso à força nas relações internacionais; pela dissolução da NATO e de outras alianças militares agressivas; contra o processo de transformação da União Europeia num bloco político-militar imperialista; pelo desarmamento, pela abolição de todas as armas de destruição massiva e pela proibição das armas e da chantagem nucleares; pelo respeito da Carta das Nações Unidas e do Direito Internacional, pela democratização da ONU e o reforço do seu papel, incluindo das suas Agências especializadas, na promoção da paz e do desenvolvimento; por relações económicas internacionais mais equitativas e mais justas, contra as políticas do FMI, BM, OMC e outras organizações internacionais ao serviço do capital financeiro e das transnacionais, pela anulação da Dívida Externa dos países do chamado Terceiro Mundo; pela taxação do capital especulativo; contra as políticas neoliberais de desmantelamento de conquistas e direitos dos trabalhadores, em defesa dos serviços e sector públicos e contra a mercantilização de todas as esferas da vida social, pelo pleno emprego e estabilidade das relações laborais; contra a destruição ecológica do planeta; solidariedade com todos os povos vítimas da ingerência imperialista e que lutam pela sua soberania, a começar pelos povos da Palestina, do Iraque, do Afeganistão, de Cuba, do Saara Ocidental.

A resistência à violenta ofensiva do imperialismo manifesta-se sob formas muito diversas e nem sempre é fácil identificar, caracterizar e arrumar, de um ponto de vista de classe, as suas várias componentes sociais e políticas. Pode entretanto afirmar-se que os partidos comunistas e outros partidos revolucionários, o movimento operário e sindical de classe, os Estados de orientação socialista e anti-imperialista, os povos que lutam pela sua libertação nacional e desenvolvimento independente, o movimento contra as guerras imperialistas e pela paz, constituem as grandes forças progressistas de transformação social cuja aliança é necessária para conter e derrotar o imperialismo.

O PCP tem isso presente na sua política de relações internacionais, agindo para que se reforce a sua cooperação e amizade, combatendo as tentativas, tanto do imperialismo como de sectores oportunistas, de semear a divisão e a desconfiança no campo das forças do progresso social e da paz.

A evolução da situação internacional coloca com toda a evidência a exigência de fortalecimento dos partidos comunistas, do reforço da sua cooperação e solidariedade internacionalista, da afirmação convicta e confiante do seu projecto de edificação de uma sociedade socialista, do combate a velhas e novas linhas de ataque aos fundamentos ideológicos e organizativos do partido revolucionário. Vencer as grandes debilidades actuais e construir fortes partidos comunistas é indispensável para o êxito da luta.

Os problemas e dificuldades que se erguem no caminho do relançamento do movimento comunista e revolucionário internacional são muito grandes e de diversa natureza e a sua superação exige firmeza de princípios, resposta criativa às novas realidades, tenacidade revolucionária. Entre eles salienta-se: a ofensiva global do imperialismo com os violentos ataques a direitos, liberdades e garantias democráticas e criminalização das forças que lhe resistem; a desestruturação e instabilidade das relações sociais com profundas incidências na composição e arrumação das forças de classe e na formação da consciência de classe; e ainda as repercussões no plano objectivo e subjectivo da desagregação da URSS e das derrotas do socialismo na Europa.

Existem partidos comunistas com forte influência de massas e mesmo institucional. Entretanto, o enfraquecimento do movimento comunista deixou campo livre ao relançamento de concepções e práticas de raiz pequeno-burguesa, radical-reformista, anarquizante e anticomunista. Continuam a manifestar-se em importantes partidos fortes tendências para a descaracterização e para o abandono de elementos constituintes de um partido comunista (teoria revolucionária, natureza de classe, forma de organização, objectivo do socialismo) e sua diluição em ambíguos projectos de «esquerda».

A complexa luta pelo reforço dos partidos comunistas e a sua afirmação como instrumento insubstituível da resistência e da alternativa passam pela sua capacidade para se ligarem à classe operária, aos trabalhadores e ao povo, encabeçar as suas lutas, formular uma clara perspectiva transformadora e revolucionária. Implica simultaneamente a crítica sistemática de concepções oportunistas e capitulacionistas, e em particular de teorizações utópicas pré-marxistas ou neobernsteinianas que ignoram, negam e combatem a luta de classes e as aquisições históricas do pensamento e da prática marxista-leninista. E implica também a crítica a posições sectárias e dogmáticas. Não basta a um partido afirmar-se comunista para realmente o ser.

A agressividade do grande capital e do imperialismo, a par do estreitamento da sua base social de apoio, torna particularmente necessário o alargamento da cooperação e solidariedade dos partidos comunistas e demais forças revolucionárias e de esquerda anticapitalistas. É muito urgente vencer os atrasos existentes, sem o que o descontentamento e a ampla contestação das políticas neoliberais e de guerra poderão frustrar-se ou serem recuperados por uma qualquer variante de reformismo estruturalmente comprometido com a reprodução do sistema de exploração capitalista, como é o caso da social-democracia.

Mas para avançar com eficácia e segurança é necessário pôr de lado preconceitos ideológicos, valorizar o que une reconhecendo e respeitando as profundas diferenças existentes (de situação, de perfil político-ideológico, de projecto, de organização, de influência) entre as forças que se propõem cooperar, pôr o acento na unidade na acção e para a acção em torno dos problemas e aspirações mais sentidos pelas massas. É indispensável a vinculação com os interesses dos trabalhadores e a clara demarcação da social-democracia. É necessário respeitar os princípios consagrados da igualdade de direitos, soberania, não ingerência nos assuntos internos.

Partindo destes critérios básicos, o PCP tem dado e continuará a dar o seu contributo para o fortalecimento da cooperação e da solidariedade das forças de esquerda em todo o mundo, nomeadamente na Europa, com a sua permanente abertura ao diálogo e a sua participação activa e empenhada, tanto em acções conjuntas em torno de problemas comuns, como em encontros, conferências, seminários, fóruns de variado tipo.

Dando prioridade à acção comum ou convergente por objectivos concretos e à organização de iniciativas internacionais contra o neoliberalismo e a guerra, o PCP, ao mesmo tempo que discorda de partidos supranacionais, defende há muito a necessidade de caminhar para formas mais estáveis de articulação entre partidos comunistas e outros partidos revolucionários.

Mas os atrasos neste domínio, nomeadamente na Europa, não se resolvem precipitando soluções e com lógicas de tipo federalista, com «maiorias» e «minorias», ignorando a grande diversidade de situações existentes. São necessárias soluções unitárias, respeitadoras da soberania e identidade de todos, que unam e não que possam criar dificuldades e fracturas suplementares.

O «Partido da Esquerda Europeia» que, na sua origem, na sua lógica federalista, no seu relacionamento com as instituições da UE, no enquadramento político e ideológico que lhe é atribuído por alguns dos seus principais protagonistas, está em contradição com as concepções que temos defendido de cooperação, autonomia e soberania. Ao que acresce o facto de ser concebido, por alguns, em contraposição com critérios básicos que o PCP considera serem os que melhor servem a agregação de forças progressistas e os de um partido revolucionário.

Nas circunstâncias actuais, de tempestuosas mudanças e rearrumação de forças e de reflexão sobre experiências positivas e negativas, o movimento comunista e revolucionário não é inteiramente separável de um quadro mais amplo de cooperação de forças progressistas, revolucionárias e anti-imperialistas. Mas isso não pode significar perda de identidade ou diluição. As relações de amizade, cooperação e solidariedade entre partidos comunistas, forças com afinidades de história, ideologia e projecto, são indispensáveis para afirmar e relançar os valores e o projecto do socialismo e do comunismo.

 

1.4. A alternativa. Um outro mundo é possível, um mundo socialista

Face à desumana realidade do capitalismo, o socialismo, uma sociedade nova, livre da exploração do homem pelo homem, impõe-se como uma necessidade cada vez mais premente. É necessário agir em cada país e no plano internacional para conquistar e mobilizar as massas para essa necessidade.

O capitalismo não se revela apenas incapaz de dar solução aos problemas dos trabalhadores e dos povos, está a agravá-los numa escala sem precedentes. A agudização das suas contradições e a crise sistémica em que se debate arrastam consigo uma crise global de dimensão planetária e civilizacional.

Acentua-se a contradição entre os extraordinários avanços científico-técnicos e o agravamento das chagas sociais e dos problemas ambientais. A concentração da propriedade e da riqueza atinge níveis inéditos enquanto os fossos entre o capital e o trabalho, entre ricos e pobres, entre o «Norte» e o «Sul» não param de crescer.

A anarquia e a natureza predadora do sistema de produção capitalista e a gula das transnacionais está a esgotar recursos naturais, a esterilizar áreas imensas aptas para a produção agro-pecuária e a ameaçar equilíbrios ecológicos e ambientais vitais.

A subversão do Direito Internacional, a desestabilização das relações internacionais, a violência e a guerra como instrumentos permanentes do domínio imperialista, a ameaça do recurso à arma nuclear (todas elas praticadas a pretexto da defesa dos «direitos humanos» e da «democracia»), configura uma terrível ameaça à liberdade, à democracia, à soberania dos povos, à própria existência humana.

A luta para conter e inverter tão perigoso rumo exige a convergência de todas as classes e camadas sociais atingidas, a aglutinação unitária de forças, organizações e movimentos muito diversificados - sindicais, democráticos, de direitos humanos, ecologistas, juvenis, de mulheres, pela paz - no combate contra o neoliberalismo, o imperialismo e a guerra. Exige simultaneamente uma clara perspectiva anticapitalista e anti-imperialista que só fortes partidos comunistas e um combativo movimento operário e sindical de classe podem assegurar.

Seria errado negar o valor da luta por objectivos concretos e imediatos, de vitórias parciais ainda que temporárias, de reformas democráticas mesmo quando não tocam a essência do sistema de exploração capitalista. Nunca é indiferente a forma de poder e a natureza do regime político. Mas a aliança da social-democracia com a direita para assegurar a sobrevivência do capitalismo, o apoio da generalidade das direcções dos partidos socialistas e social-democratas, particularmente europeus, ao militarismo, ao «atlantismo» e à guerra, contrariando a vontade da maioria da sua base de apoio, ilustra bem os limites e os perigos do reformismo.

Para deter a corrida para o abismo, pôr fim às guerras de agressão e à sistemática ingerência nos assuntos internos dos povos, solucionar os mais importantes conflitos e problemas internacionais e superar as mais gritantes injustiças e desigualdades sociais são indispensáveis profundas transformações progressistas e revolucionárias dirigidas contra o sistema de poder e de propriedade do grande capital, pondo em causa os seus mecanismos de exploração e reprodução.

Tais transformações, que respondem à exigência de resolver a contradição central do capitalismo entre o carácter social da produção e a apropriação privada dos meios de produção, estão há muito inscritas nas contradições e limites do sistema e na nova época histórica que a Revolução de Outubro inaugurou. O grande problema é que o amadurecimento das condições materiais objectivas não tem actualmente correspondência no plano subjectivo.

As derrotas do socialismo desequilibraram a correlação de forças em favor do imperialismo, possibilitaram um novo fôlego ao capitalismo, repercutiram-se no enfraquecimento dos partidos comunistas e de outras forças revolucionárias, influenciaram negativamente a confiança e o ânimo combativo das massas. Dispondo de um imenso poder económico, militar, ideológico, o imperialismo retomou temporariamente a iniciativa e está na ofensiva apesar da crise que o corrói.

Os tempos são ainda de resistência e acumulação de forças. Mas são também tempos de reais possibilidades revolucionárias. As políticas de exploração, opressão e guerra encontram por toda a parte a crescente resistência e luta e estão em curso batalhas cujo resultado terá uma grande importância na correlação e arrumação de forças no plano mundial. Como noutros períodos de transição histórica, grandes dificuldades e perigos coexistem com grandes potencialidades para o desenvolvimento da luta e o crescimento das forças revolucionárias.

É tão necessário rejeitar ilusões de facilidade e estar preparado para combates duríssimos e eventuais recuos e derrotas, como para desenvolvimentos positivos surpreendentes que só forças e projectos profundamente enraizados na sociedade e nas massas poderão acompanhar e dirigir.

Nas actuais circunstâncias de grande instabilidade, só uma coisa é realmente certa quanto ao futuro: as transformações progressistas e revolucionárias que a alternativa ao actual estado de coisas reclama não serão fruto de esquemas e modelos pré-concebidos a que a realidade tenha de conformar-se, antes resultarão necessariamente da dialéctica da luta revolucionária nos planos nacional, regional e mundial, irrompendo lá onde o feixe de contradições for mais denso e mais fortes as forças revolucionárias, num processo irregular e acidentado em que, à resistência da reacção e do imperialismo, será necessário opor cada vez mais a força da solidariedade internacional e internacionalista.

Nada pode substituir a luta em cada país. As teses que negligenciam ou mesmo consideram «esgotado» o marco nacional como espaço de luta transformadora e revolucionária são tão erradas e prejudiciais como as que subestimam a necessidade da solidariedade internacionalista e a luta no plano internacional. A defesa da soberania nacional e a afirmação por cada povo do seu direito a determinar o seu próprio destino continua a ser um factor fundamental de resistência à globalização imperialista e às tentativas dos EUA imporem a sua «nova ordem» mundial. O enraizamento entre a classe operária, os trabalhadores e as massas do seu próprio país é a primeira e incontornável tarefa dos comunistas e de todos os revolucionários e condição indispensável para a necessária resposta no plano internacional à ofensiva concertada do grande capital e das grandes potências.

A caracterização das dramáticas regressões e dos perigos que a situação internacional actual comporta em resultado da política do imperialismo e dos seus sectores mais reaccionários e terroristas não deve confundir-se com pessimismo. Para a eficácia da luta libertadora é indispensável enfrentar a realidade tal e qual ela é. O internacionalismo que o PCP defende e pratica é inseparável do patriotismo, mergulha as suas raízes nos interesses universais do proletariado.

Há fortes razões de confiança nos resultados da luta. Mostra-o a história do movimento operário e comunista (que é cada vez mais necessário conhecer e valorizar e não esquecer e rejeitar como se de um fardo se tratasse). Mas mostram-no sobretudo as grandes lutas da classe operária e dos trabalhadores, o movimento pela paz e contra a globalização capitalista, a persistência de vários países no caminho e objectivo do socialismo, a heróica resistência do povo palestiniano e do povo iraquiano, significativos sucessos de alguns influentes partidos comunistas, a luta revolucionária na Colômbia ou a revolução bolivariana na Venezuela, as vitórias das forças de esquerda no Brasil, África do Sul, Uruguai e outros países, poderosas explosões de descontentamento e contestação populares, como na Argentina, na Bolívia ou no Peru, mesmo quando derrotadas ou subvertidas pela demagogia populista, e muitos outros exemplos.

De capital importância é a confiança nos trabalhadores e nas massas populares, na sua organização e na sua luta, rejeitando o elitismo e o culto da espontaneidade e o movimentismo inconsequente de clássica raiz pequeno-burguesa, em que a impaciência, a busca do sucesso imediato, a teorização especulativa separada da vida constituem traços que é necessário contrariar pois tendem a frustrar grandes lutas e a facilitar a recuperação reformista e capitalista de processos que conseguem influenciar.

A firmeza de princípios e convicções e a consciente inserção da luta por objectivos imediatos no projecto por profundas transformações anticapitalistas, implicando permanente e firme combate ao pragmatismo sem princípios e à adaptação oportunista à lógica do sistema, são de capital importância para dar todo o sentido às potencialidades revolucionárias que a perigosa situação actual comporta e para relançar o socialismo como a alternativa ao capitalismo. Sim, um outro mundo é possível e necessário, um mundo socialista!

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2. Nacional

2. SITUAÇÃO NACIONAL

2.0. Introdução
2.1. Evolução da União Europeia
2.2. Situação económica, social, cultural e ambiental
2.3. A evolução política e o regime democrático
2.4. Situação na comunicação social
2.5. A política necessária

2.0. Introdução

Os últimos quatro anos ficam marcados pelo prosseguimento, com graus e aprofundamentos diversos, da política de direita, pela derrota do governo PS e pela criação de um novo quadro político determinado pela formação de governos de coligação PSD/CDS-PP dispondo de uma maioria absoluta de deputados na Assembleia da República.

É um facto evidente que o êxito eleitoral dos partidos de direita está indissociavelmente ligado à política de direita levada a cabo pelos governos do PS e que o resultado obtido por aqueles partidos, mais do que qualquer genuíno processo de adesão popular às suas propostas, traduziu essencialmente uma capitalização do descontentamento com essa política. Como já no XVI Congresso se assinalava, a persistência do PS nos mesmos eixos e opções políticas dos anteriores governos do PSD - privatizações, favorecimento dos grandes grupos económicos, ataque ao poder de compra e direitos dos trabalhadores, desresponsabilização do papel do Estado, subordinação do país às orientações da União Europeia e à estratégia agressiva do imperialismo - não só contribuíam aceleradamente para consumir o capital de expectativa como para o crescente sentimento de preocupação, desencanto e frustração de largos sectores da população.

A derrota e termo do governo do PS comprovam sem dúvida o fracasso da política de direita e de subserviência em relação à União Europeia e ao grande capital transnacional e testemunham que a persistência nessas mesmas políticas longe de responder aos principais problemas que se colocam ao país, aos trabalhadores e ao povo português os amplia e acentua. Como comprova que esse caminho não só anima e serve a direita e os seus interesses políticos e económicos, como lhes abre campo para novos e mais decididos avanços no ataque a direitos e conquistas sociais, na regressão da democracia, no ataque às liberdades.

A formação e entrada em actividade do governo PSD/CDS-PP representou uma evolução muito negativa na vida política nacional, contra a qual o PCP preveniu e se bateu nas eleições de 2002, e que se traduz no agravar e acentuar da política de direita.

A política dos governos de coligação PSD/CDS-PP traduz-se em novos e mais graves passos no sentido da privatização do que resta do Sector Empresarial do Estado, dos sistemas públicos de segurança social, da saúde, do ensino e de outros serviços públicos, pela restrição e destruição de direitos fundamentais dos trabalhadores e pela criação de condições para uma sua maior exploração e pela ofensiva contra importantes componentes do regime democrático-constitucional.

A ofensiva política, económica e social da direita e a acentuação do conteúdo de classe da sua política têm sido acompanhadas e justificadas por uma não menos intensa ofensiva ideológica - suportada na acção da comunicação social e na análise e comentário políticos, com expressão também nos programas educativos - no sentido de atenuar a resistência e ampliar o conformismo e a resignação perante o seu desenvolvimento.

É neste quadro que se devem compreender as ideias económicas dominantes para «vender» como inevitáveis as políticas de contenção da despesa pública e de favorecimento dos grupos económicos e interesses privados; a teoria do menos Estado para justificar a redução das responsabilidades sociais e da garantia de direitos essenciais à vida; a imposição do conceito de utilizador-pagador em áreas de prestação de serviços básicos, convertendo-os em direitos de propriedade comerciáveis e objecto de exploração lucrativa; a apresentação de direitos universais (direito à reforma, ao subsídio de doença e desemprego ou a outras prestações de apoio familiares) como benesses ou regalias indevidas que devem ser eliminadas para melhor retribuir os pobres e necessitados; a contraposição do conceito de trabalho ao de emprego considerando este, compreendido como estável, obsoleto e inadequado às actuais exigências económicas; a invocação dos níveis de produtividade para justificar os baixos salários e a falta de competitividade da economia; o incentivo à contraposição entre os que têm emprego e os que o não têm, entre os que têm vínculos e os que engrossam o contingente do trabalho precário.

A crise política e governativa criada com o abandono de funções pelo primeiro-ministro, indissociável da estrondosa derrota eleitoral sofrida pela coligação PSD/CDS-PP nas últimas eleições europeias e da luta travada contra a política do seu governo, abriu fundadas expectativas sobre a possibilidade real de com ela vir a interromper-se a desastrosa política deste governo e de se dar oportunidade, através da convocação de eleições antecipadas, a que os portugueses se pronunciassem por um novo governo, um novo rumo e uma nova política para o país.

A decisão do Presidente da República de permitir a indigitação de um novo primeiro-ministro e a formação de um governo oriundo da desgastada coligação de direita não só não corresponde aos sentimentos e aspirações dominantes da opinião pública, dos trabalhadores e das forças democráticas e de esquerda, como constitui um sinal de apoio a esta maioria, um incentivo à continuação de uma política comprovadamente incapaz de responder aos problemas do país e um agravado factor de instabilidade.

Num quadro em que a arrogância e a ofensiva política desta maioria e do seu novo governo contra direitos, conquistas e o próprio regime, conhecem perigosos desenvolvimentos, o PCP reafirma que (ao contrário de outros que, como o PS e o BE, por calculismo partidário ou subestimação o admitem) não se resignará a que o PSD e o CDS prossigam a sua obra de destruição e retrocesso e que continuará a lutar para lhes resistir e para pôr termo, tão cedo quanto possível, à prossecução dos seus objectivos.

 

2.1. Evolução da União Europeia

A evolução da União Europeia após o XVI Congresso fica marcada pela acentuação das políticas neoliberais, o avanço do federalismo sob o domínio das grandes potências e a sua acelerada militarização.

A comprovar esta afirmação encontram-se as principais decisões e processos que os órgãos da União Europeia concretizaram nos últimos quatro anos, designadamente:

A realização de duas revisões dos Tratados, a primeira em Nice (Tratado de Nice, 2000), abrindo caminho ao reforço do poder das grandes potências face ao processo de alargamento, e a segunda, de Junho passado, aprovando o projecto da dita «Constituição europeia»;

O desenvolvimento do processo de alargamento a mais dez países num quadro financeiro que põe em causa o princípio da coesão económica e social (os insuficientes quadros financeiros 2000-2006 e provavelmente 2007-2013) e condições inaceitáveis tanto para os novos aderentes como para os países membros menos desenvolvidos, como Portugal. Processo que prossegue com a futura adesão da Bulgária e da Roménia, e a abertura de negociações com a Turquia;

A concretização da União Económica e Monetária, com o lançamento da moeda única em 2002, a aplicação do Pacto de Estabilidade - o que levou, em 2001, à abertura de um procedimento de défice excessivo contra Portugal por violação do limite dos 3% do défice - e da política monetária do Banco Central Europeu;

A adopção da denominada «Estratégia de Lisboa», credora do elogio das organizações do grande patronato na Europa, durante a Presidência portuguesa da União Europeia em 2000, apresentada como cimeira para o pleno emprego e a competitividade, mas que constituiu de facto uma sistematização das prioridades actuais do capitalismo;

As reformas da Política Agrícola Comum, em 2000 e 2003, com o aprofundamento da liberalização da agricultura e das suas injustiças e desigualdades na distribuição das ajudas entre produtores, produções e países; a reforma da Política Comum de Pescas, com o avanço da liberalização do acesso à zona económica exclusiva portuguesa, nomeadamente por parte da frota espanhola e a eliminação das ajudas à renovação da frota;

O aprofundamento da comunitarização da justiça e assuntos internos, com uma clara deriva securitária, subtraindo competências inerentes à soberania dos Estados, e a adopção de um amplo conjunto de medidas que, a pretexto da denominada «luta contra o terrorismo», colocam em causa direitos, liberdades e garantias dos cidadãos;

A condução de uma política de imigração que em simultâneo procura criminalizar os imigrantes e explorar a força do seu trabalho segundo as necessidades do grande patronato na Europa;

A prossecução de uma política nas relações comerciais bilaterais e na Organização Mundial do Comércio ditada pelo objectivo da liberalização do comércio mundial e da criação de uma zona de comércio livre paneuropeia-mediterrânica, privilegiando, apesar de contradições, uma parceria estratégica com os EUA;

A militarização da União Europeia, como pilar europeu da NATO, acentuada com a adopção em 2003 de uma «Estratégia de Segurança da União Europeia» que faz seu o conceito de «segurança» da NATO e avança na criação de capacidades militares propostas. Releve-se o papel que as chamadas cooperações reforçadas em matéria militar podem ter na consagração da direcção comunitária das políticas de defesa e segurança por um número reduzido e seleccionado de países membros.

Decisões e processos que o PCP, ao longo dos últimos quatro anos, caracterizou e denunciou, avançando com propostas alternativas em inúmeras iniciativas e tomadas de posição.

No novo Tratado, dito «Constituição europeia» ou «Tratado constitucional», a ser ainda objecto de ratificação pelos Estados-membros, aprofundam-se as bases e eixos fundamentais lançados no Tratado de Maastricht, e posteriormente consolidados pelos Tratados de Amesterdão e Nice, no sentido de uma União Europeia federal sob o domínio e condução das grandes potências europeias. Este projecto, realizado no interesse do grande capital na Europa, tem também como objectivo a transformação da UE num bloco político-militar imperialista que, apresentado por uns para competir e rivalizar com os EUA e, por outros, como o pilar europeu da NATO, tenderá a agir, de facto, como braço auxiliar do imperialismo norte-americano. É particularmente relevante referir a relação inequívoca entre federalismo e neoliberalismo no processo de integração comunitária, onde cada avanço no rumo federal tem contribuído para o avanço das orientações neoliberais.

Um projecto que desenvolve as linhas mestras, complementares e indissociáveis entre si, que têm caracterizado a União Europeia: o reforço da sua natureza federalista, institucionalizando-se em simultâneo o directório das grandes potências no comando das políticas e do futuro da União Europeia, e o primado da «Constituição europeia» sobre as Constituições nacionais; a «constitucionalização» do neoliberalismo, através de um articulado que ocupa 3/4 do projecto de tratado e onde se consagram as estruturas, as políticas e as orientações económicas e sociais do capitalismo, que hoje prevalecem na UE; o lançamento das bases institucionais da militarização da UE e a sua transformação num bloco político-militar, com uma política de defesa comum articulada com a NATO e a criação de uma Agência Europeia de Armamento, de Investigação e de Capacidades Militares.

A chamada «Constituição europeia» reforça, de facto, claramente a natureza federal das instituições da União Europeia e o domínio do conjunto das grandes potências europeias nos processos de tomada de decisão, nomeadamente através da valorização de critérios demográficos em detrimento da representatividade dos Estados soberanos e do princípio da igualdade entre Estados, da eliminação do princípio das presidências semestrais rotativas do Conselho Europeu, da ampliação da co-decisão e da adopção das decisões por maioria qualificada no Conselho em prejuízo dos pequenos países e do seu poder de veto para salvaguardar interesses fundamentais. É um projecto que viola, pela forma e pelo conteúdo, as soberanias nacionais.

A União Europeia confirma-se assim plenamente como o instrumento de classe (intervindo nas dimensões económica, política, institucional, jurídica e militar) do capitalismo transnacional e das grandes potências da Europa, bem evidente na coincidência das decisões concretizadas pelos órgãos da União Europeia com as opiniões defendidas pelos representantes do grande capital europeu (que se afirma como o verdadeiro motor desta integração europeia) e bem visível nos poderes reforçados que os grandes países passam a ter nos processos de decisão da União Europeia.

A evolução verificada assente nos três eixos estruturantes e indissociáveis - o federalismo, o neoliberalismo e o militarismo - apresenta riscos, sociais e políticos, que não devem ser subestimados. Evolução da UE que tem contado, em questões centrais (Estratégia de Lisboa, «Constituição»), com o acordo dos sindicatos reformistas filiados na CES. Para os trabalhadores, para os povos da Europa não deixará de se traduzir na perda de direitos sociais e civilizacionais, na agudização de fracturas e desigualdades sociais, na multiplicação de assimetrias entre países e regiões da Europa, na multiplicação dos problemas ambientais, e no reforço das dependências dos países, como o nosso, de menores dimensões e desenvolvimento.

Para os povos do mundo só pode ser motivo de preocupação o facto de, perante os desafios e as questões cruciais a que o nosso tempo tem de responder - a paz, a cooperação e o desenvolvimento de todos os povos, a independência e soberania dos Estados - , se estar a erguer uma potência económica, política e militar virada para o confronto concorrencial, por mercados, matérias-primas e mão-de-obra, por capital e domínio político, que integra articulações, alianças e acordos de partilha com os EUA e o Japão.

Apesar dos importantes e graves avanços verificados, o caminho encetado pelo grande capital transnacional e as grandes potências da União Europeia não está isento de contradições, antagonismos e resistências.

Contradições e resistências que resultam do confronto do grande capital com a enorme massa dos assalariados, e em particular dos sectores operários e outras camadas sociais profundamente atingidas pelas políticas de direita, assim como contradições inerentes ao choque de interesses políticos e económicos entre as grandes potências e as que tenderão a desenvolver-se entre grandes, médios e pequenos países, e que inevitavelmente crescerão à medida que esta União Europeia federal, neoliberal e militar procure anular e violentar direitos de soberania, interesses nacionais e identidades culturais profundamente enraizados.

Os obstáculos e dificuldades que a evolução da União Europeia enfrenta têm conduzido ao reforço da ofensiva ideológica «europeísta» destinada a justificar e a ocultar a origem das dificuldades e contradições e a promover soluções, numa dinâmica de factos consumados, que só poderão significar novas e perigosas fugas para a frente.

São expressão desta ofensiva as teses dos «egoísmos nacionais», da «falta de líderes europeus com a dimensão política dos fundadores», da União Europeia «anã política», do «método comunitário versus federalismo», do federalismo como resposta alternativa e diferente ao directório, ou ainda da falta de uma «base constituinte na elaboração de uma Constituição europeia». Todas elas são destinadas a iludir que a origem dos problemas é intrínseca às lógicas do capital transnacional, com as suas consequências no desenvolvimento desigual do espaço europeu e no agravar das fracturas sociais e à imposição pelas grandes potências de uma relação de forças assimétrica nas instituições da União Europeia.

Como se os «egoísmos nacionais» não fossem um eufemismo para designar os interesses das grandes potências que desde sempre conduziram a integração comunitária europeia. Como se os fundos comunitários pudessem (e servissem para) colmatar as desigualdade regionais e os problemas sociais que o capitalismo causa. Como se o alargamento da UE não fosse um novo e decisivo passo para conquistar mercados, matéria-prima e mão-de-obra qualificada e barata, e alargar o domínio e a influência económica e política do grupo das grandes potências. Como se a Europa, no actual quadro de relações de força no continente e no mundo, pudesse ser outra coisa que não uma potência económica, política e militar destinada a promover e consolidar o capitalismo neoliberal e o militarismo.

A ofensiva do grande capital e do imperialismo encontrou pela frente, nos últimos quatro anos e nos diferentes países da UE, uma importante mobilização e significativas lutas e manifestações sociais em defesa das conquistas históricas dos trabalhadores e da paz.

Esta significativa movimentação social e política, pondo em evidência as potencialidades de luta contra as políticas dominantes, revela igualmente que é necessário reforçar, designadamente por parte das forças de esquerda vinculadas com os interesses dos trabalhadores, e claramente demarcada da social democracia, a cooperação na luta contra a ofensiva concertada do grande capital e por uma outra Europa. Mais do que nunca se impõe procurar linhas de convergência e consenso de todos quantos nos seus países se opõem à prática e ideologia do grande capital e lutam, na base de objectivos de transformação social anticapitalista e democrática, por um novo caminho para a Europa.

O caminho para uma outra Europa não residirá na decisão daqueles que desde sempre dirigem a integração neoliberal e federalista e militarista, nem no mero funcionamento de instituições, como a Comissão, o Conselho e o Parlamento Europeu, afastadas dos cidadãos e inteiramente determinadas pelas oligarquias do grande capital mas, pelo contrário, na conjugação da luta de massas e da acção institucional, explorando as contradições e obstáculos da actual integração europeia. Outra Europa é possível pelas lutas dos trabalhadores e dos povos e pela convergência das forças do progresso e da paz.

O PCP inscreve como sua prioridade o prosseguimento e reforço da cooperação dos comunistas e de outras forças de esquerda e progressistas na Europa, com respeito pelas diferenças de situação, reflexão e proposta, colocando no primeiro plano a acção comum ou convergente em torno das questões mais sentidas pelos sectores e camadas sociais afectados pela actual integração europeia, e afirmando e projectando à escala europeia acções e propostas comuns. Com a convicção de que a necessária expressão europeia e internacional da luta adquirirá uma dimensão e um significado tanto mais representativos quanto mais enraizada e organizada ela for a nível de cada país, espaço decisivo de luta dos trabalhadores e dos povos.

O PCP continuará profundamente empenhado no desenvolvimento da cooperação e convergência dos partidos comunistas, forças e partidos progressistas e de esquerda, nomeadamente: na consolidação, forte intervenção e afirmação do carácter unitário e progressista do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica do Parlamento Europeu, designadamente pela concretização dos objectivos e propostas contidos na «Plataforma Eleitoral Comum para as Eleições para o Parlamento Europeu»; no desenvolvimento de iniciativas comuns de expressão europeia; na dinamização e apoio à luta dos trabalhadores e outros sectores e forças sociais pelas conquistas e direitos sociais, contra as políticas do capitalismo transnacional, pela paz, contra o militarismo e a guerra, pela democracia e soberania, contra o federalismo e o domínio das grandes potências.

Ao longo dos últimos 18 anos, PSD, PS e PSD/CDS-PP, numa elucidativa e constante convergência de posições mescladas aqui e ali por cambiantes tácticas destinadas a tentar iludir responsabilidades, foram os responsáveis pela condução, e aprofundamento sucessivo, da integração de Portugal na CEE/UE e participaram activamente na definição de políticas e orientações da denominada «construção europeia». Aquela convergência constitui contributo e consequência do papel desempenhado pela aliança PPE/PSE (direita/social democracia) nessa construção.

Uma convergência responsável pela alienação de componentes essenciais de soberania, pela falta de consulta do povo português sobre questões fundamentais, pela submissão perante as instituições da União Europeia e as grandes potências, pela aceitação de imposições e medidas negativas para o país, pela entrega de sectores estratégicos da economia nacional ao capital estrangeiro, pela ideia da inevitabilidade das políticas da União Europeia; pela apresentação dos problemas e das dificuldades do país como a moeda de troca «necessária» aos «benefícios» dos fundos comunitários, pela permanente desresponsabilização face às políticas mais gravosas para os interesses nacionais, procurando iludir o seu apoio aos tratados e a sua participação na definição das políticas da União Europeia, e pela não utilização da margem de manobra de que, apesar de tudo, Portugal dispõe pela aplicação, entre outros, do princípio da subsidiariedade.

A pretendida diferenciação do CDS-PP em relação ao PSD em matéria europeia ficou desmentida e denunciada pela sua total solidariedade, na Assembleia da República e no governo, com as orientações europeias do PSD, pela coligação eleitoral com o PSD nas eleições para o Parlamento Europeu e pela sua recente readmissão no grupo do Partido Popular Europeu.

O Bloco de Esquerda, que acompanha, no essencial, as teses federalistas, revela-se favorável ao avanço do carácter supranacional do quadro institucional da União Europeia, desvalorizando e menosprezando a importância central da preservação da soberania nacional como garante da democracia e alicerce incontornável do desenvolvimento do país, ao mesmo tempo que procura semear a ilusão de que seria a nível europeu que se obteria aquilo que em primeiro lugar se tem de conquistar com a luta dos trabalhadores e do povo português a nível nacional.

A escolha de Durão Barroso para Presidente da Comissão e o injustificado «orgulho nacional» invocado por alguns não alteram, antes confirmam, a política neoliberal e o servilismo perante a UE que têm caracterizado a postura dos partidários do «europeísmo».

Uma política externa de diversificação das relações internacionais e de cooperação, paz e amizade com todos os povos, a salvaguarda da soberania nacional e a promoção dos interesses de Portugal e dos portugueses constituem para o PCP orientações fundamentais da intervenção do país na União Europeia.

O PCP reafirma que a defesa da soberania nacional constitui um valor fundamental e vector estratégico para a defesa dos interesses nacionais, na construção de uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, aberta ao mundo, de paz e solidariedade. É também um factor de salvaguarda da democracia e de aproximação do processo de decisão política dos cidadãos. Nesse sentido, o PCP considera que o estatuto de cada país deve ser ajustado à vontade do seu povo e à sua real situação.

O respeito pela soberania e pelos interesses, valores e especificidades de cada Estado devem constituir elementos essenciais num projecto de cooperação na Europa, pelo que no plano institucional se impõe a rejeição do federalismo e do domínio das grandes potências na União Europeia e o firme combate ao tratado que os pretende consagrar. Um tratado que afronta e viola a Constituição da República Portuguesa, que os órgãos de soberania têm o dever imperativo de respeitar e fazer respeitar, e que atinge gravemente a soberania e a independência nacionais. O PCP continuará a impulsionar um vasto movimento de opinião, esclarecimento e luta, que impeça a subordinação da nossa Constituição à dita «Constituição europeia». Constitui um imperativo democrático a realização de um referendo nacional, antes de uma indesejável vinculação de Portugal ao novo Tratado, dito constitucional, em data e com pergunta(s) que permitam aos portugueses pronunciar-se, antes da ratificação pela Assembleia da República, de forma esclarecida sobre o que efectivamente está em causa.

A tentativa de impor a denominação «Constituição europeia» (ou Tratado Constitucional) a um novo Tratado da União Europeia - com o que o termo Constituição traduz enquanto marco jurídico e político inerente à organização de um Estado - está incontornavelmente associada, qualquer que seja o seu conteúdo, ao objectivo de construção de um Estado supranacional: o superestado União Europeia dotado de uma Constituição que prevaleceria sobre as constituições dos Estados nacionais, com personalidade jurídica própria e que teria todos os poderes e símbolos de um Estado, com excepção da área fiscal.

Para alguns, face às sucessivas etapas que a «construção» da União Europeia vai consumando, o PCP deveria, contrariando os seus objectivos e convicções, render-se à inevitabilidade e irreversibilidade desses processos, ou seja, ficar condenado à política do «realismo» como a arte do possível, a uma prática política reduzida a um pragmatismo oportunista, sem valores nem princípios, a uma resignada opção pelo menor dos males.

A presente construção europeia não é um processo inócuo, neutro, de passos positivos e negativos. É a consolidação de um processo de classe que se faz, sem prejuízo de contradições, avanços e recuos, conforme os interesses do capital e das potências europeias. É a expressão política da reprodução e expansão do capital transnacional sediado na Europa e de um processo onde se sacrificam os interesses dos trabalhadores e dos povos, e em particular dos pequenos Estados como Portugal.

Não é possível tingir de «esquerda» este processo e cada um dos seus avanços. É possível condicioná-los, travá-los e até derrotá-los, em condições particulares de confluência da agudização dos seus conflitos internos com a luta dos trabalhadores e dos povos.

Cada nova etapa e avanço deste processo consolida um poder político económico e institucional favorável ao grande capital europeu e às grandes potências e fortalece o seu «Estado Comunitário» para melhor exploração dos trabalhadores e dos povos, nas suas relações de concorrência e convergência, económicas e políticas com os outros dois pólos da «Tríade» da globalização capitalista.

Para o PCP, a oposição a esses avanços não impede, antes pelo contrário, que, franqueada uma etapa, defina com autonomia política e no quadro dos seus objectivos e ideais a estratégia adequada para desenvolver a luta em defesa dos interesses nacionais, da paz e da justiça social na Europa e as iniciativas necessárias para responder às novas situações, com uma intervenção política que, sem negar a realidade, não se adapta nem se submete, antes procura criar as condições para a transformar.

Outra Europa é necessária. Uma Europa como livre união de Estados soberanos, iguais em direitos, empenhados na convergência económica e no progresso social, na promoção da paz e de uma cooperação exemplar com todos os povos do mundo.

Uma Europa que favoreça o desenvolvimento assente numa relação sustentável entre a natureza e a sociedade, defenda os interesses dos trabalhadores, respeite a identidade cultural, a soberania e a independência de Portugal e de todos os países europeus.

 

2.2. Situação económica, social, cultural e ambiental

A inserção de Portugal na economia mundial é hoje um processo profundamente articulado com o seu posicionamento no quadro da integração do país no espaço económico europeu, e em particular na zona euro, e do papel crescente e autónomo da própria União Europeia enquanto bloco económico e político no quadro da globalização capitalista.

Todas as relações económicas externas do país - fluxos de capitais, bens e serviços, posições nas estruturas de regulação económica mundial (Organização Mundial do Comércio, Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial,...) - estão condicionadas pela integração comunitária. Mas tais condicionamentos foram e são reforçados pela colaboração activa de sucessivos governos do PSD e PS numa evolução da União Europeia que conflitua com o necessário desenvolvimento do país, pela completa submissão às orientações económicas comunitárias, pela total abdicação e ausência de afirmação de uma estratégia de defesa dos interesses e soberania nacionais.

A concretização da União Económica e Monetária (UEM) com a entrada em funcionamento do euro, a institucionalização dos critérios de convergência nominal no Pacto de Estabilidade, a estrita política monetarista levada a cabo pelo Banco Central Europeu (BCE), a aprovação da Estratégia de Lisboa, a negociação da agenda liberalizadora da OMC e de vários tratados comerciais bilaterais pela União Europeia e, em geral, as orientações políticas e económicas da União Europeia, nomeadamente as respeitantes às reformas da Política Agrícola Comum (PAC) e Política Comum das Pescas (PCP), ampliaram os problemas e fragilidades da economia nacional e acentuaram a sua dependência e défices estruturais.

O crescente federalismo das instituições reforça o domínio das grandes potências (Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Espanha) no comando das políticas económicas da União Europeia e reduz a capacidade para os influir ou contrariar por parte dos pequenos países como Portugal.

Esta evolução, a par do processo de alargamento realizado em condições inaceitáveis, agrava e condiciona de uma forma extrema todas as vulnerabilidades referidas, e sobretudo tenderá a contrariar a condução da política económica nacional conforme os interesses dos portugueses.

Assume um crescente impacto na economia do país a divisão do trabalho no mundo que, sob o comando do capital transnacional, e tendo como principal instrumento a livre circulação de capitais, reorganiza a produção capitalista em função das vantagens que cada país oferece.

A deslocalização de empresas do sector produtivo, acompanhada crescentemente pela deslocalização de serviços, causam não só graves problemas sociais (desemprego, encargos para a segurança social), como tem contribuído para a perda de unidades produtivas. Um processo que se adiciona e converge, em termos de consequências, com uma divisão do trabalho no espaço europeu altamente desvantajosa para o país.

O processo de alargamento da União Europeia a países com uma mão-de-obra mais barata e mais qualificada veio reforçar a falência da estratégia de sucessivos governos de fazer de Portugal localização privilegiada de unidades de trabalho intensivo e baixos salários.

Esta análise do enquadramento internacional, e em particular na União Europeia, da economia portuguesa não pretende negar o processo objectivo da intensificação das relações e interpenetração das economias nacionais, mas sim assinalar as consequências negativas da condução desses processos para Portugal segundo os interesses do grande capital transnacional, dominantes nas instituições internacionais e na União Europeia e a ausência de negociação e defesa da especificidade de Portugal em recursos naturais e adquiridos.

E sublinha, em particular, a necessidade de o país procurar salvaguardar os instrumentos económicos para a condução soberana das suas políticas económicas, conforme os interesses nacionais, concretizando uma estratégia capaz de garantir ao país o desenvolvimento na base de uma relação sustentável entre a natureza e a sociedade.

Trinta anos depois das transformações revolucionárias de Abril um importante conjunto de grupos económicos, resultantes da política de recuperação capitalista e monopolista conduzida pelos governos do PS, PSD e CDS-PP, assumem novamente um papel dominante e determinante no quadro das relações de produção capitalista da sociedade portuguesa. A omnipresença, influência e acção desses grupos são hoje um facto incontornável, quer na dinâmica das conjunturas económicas e no desenvolvimento das relações sociais quer na condução e opções do poder político e na expansão e reprodução das ideologias dominantes.

Estruturados e representados por grupos familiares velhos conhecidos (que suportaram e apoiaram a ditadura fascista) ou que despontaram após o 25 de Abril (Mello, Espírito Santo, Belmiro de Azevedo, Amorim, Jerónimo Martins) ou pela associação do nome de um banco ou unidade empresarial ao nome do presidente do Conselho de Administração da estrutura societária (holding) que define a estratégia e assegura o domínio do grupo (BCP/Jardim Gonçalves, CIMPOR/Teixeira Duarte, etc.), entretecem entre si e com o capital estrangeiro uma densa rede de ligações económicas e financeiras, sociais e políticas, constituindo uma poderosa oligarquia económica que, com outros sectores da grande burguesia portuguesa e estrangeira, procura assegurar a continuidade e reprodução do seu poder económico, político e ideológico na sociedade portuguesa.

Os principais grupos económicos repartem-se hoje em torno de algumas actividades - sector bancário e segurador, grande distribuição, imobiliário, e em particular imobiliário comercial - e pelos ramos da actividade industrial e de serviços do Sector Empresarial do Estado que foram privatizados - cimentos, celulose e pasta de papel, alguns segmentos da alimentação e bebidas, energia, auto-estradas, telecomunicações, media, turismo, transportes. E estão particularmente activos nas operações que a política de direita enseja de privatização do que resta do Sector Empresarial do Estado, do sector da água e dos portos e no alargamento da sua actividade aos «negócios» da saúde, do ensino, da segurança social e dos serviços de registo e notariado, no quadro da liberalização e privatização desses sectores.

Estes grupos assumem, em muitos sectores e subsectores de actividade, uma clara natureza monopolista que, dentro da lógica capitalista, procuram reforçar, quer pela destruição e absorção de concorrentes nacionais, quer por associações em que cruzam participações e/ou repartição de mercados e concertação de preços, quer pela aliança privilegiada com poderosas transnacionais.

A extraordinária dimensão e poder económico actual destes grupos capitalistas e monopolistas concretiza-se e desenvolve-se em permanente articulação, cumplicidade e promiscuidade com o poder político e os partidos que o exercem desde 1976.

É a influência crescente deste tipo de poder económico (nacional e transnacional) que explica a ampla produção legislativa e regulamentadora da Assembleia da República e dos governos destinada a consagrar opções e medidas favoráveis a esses interesses de classe, designadamente através do desequilíbrio, a favor do grande patronato, das relações laborais e níveis salariais, da condução das políticas orçamental e fiscal, do favorecimento dos mecanismos de transferência de rendimento e mercados dos micro, pequenos e médios empresários para esses grupos, e da apropriação de património e mercados públicos, com as privatizações e liberalizações feitas à medida das capacidades de encaixe desses grupos.

Este ilegítimo poder ostentado e exercido pelos grandes grupos económicos e financeiros assumindo, além da dimensão económica, efectivas dimensões política, social e ideológica, constitui uma total subversão do princípio constitucional de subordinação do poder económico ao poder político, põe em causa a concretização dos objectivos económicos, sociais, culturais e ambientais consagrados na Constituição da República, e fere valores e princípios essenciais do regime democrático.

A política de direita procurou apresentar a reconstituição dos Grupos Económicos Privados como um instrumento central para «a modernização, aumento da eficiência e competitividade» da economia portuguesa.

Na lapidar expressão do então secretário-geral do PS e primeiro-ministro do governo PS (1995/99) António Guterres, os grupos económicos privados seriam «os elementos racionalizadores das transformações económicas do país, da modernização e de um novo modelo de especialização». Foi essa a justificação substantiva para a política de privatizações e o seu papel nuclear na reconstituição dos grupos.

Os resultados económicos desta política são esclarecedores: avultado défice da balança externa de bens e serviços; uma estrutura económica de perfil de especialização desvalorizado; perda de mercados interno e externo; transferência para o estrangeiro de importantes centros de decisão económica; elevados diferenciais face às médias comunitárias da produtividade e competitividade nacionais. O que foi inteiramente corroborado pelo insuspeito Parecer do Conselho Económico e Social a propósito das Grandes Opções do Plano para 2001: «Os grandes grupos económicos portugueses também não mostraram ainda apetência ou capacidade para produzir a revolução de que o sector industrial precisa (...)». Os grupos que iam «modernizar» a economia portuguesa concentraram-se nas actividades abrigadas da concorrência estrangeira e preferiram à indústria e outros sectores produtivos a banca, os seguros, o imobiliário, a grande distribuição e a especulação bolsista.

O investimento directo estrangeiro (IDE) continua a ser, para a política de direita, estratégico na criação de emprego e a resposta a alguns défices da estrutura económica do país. A avaliação do IDE em termos de interesse nacional não pode deixar de ter em consideração os seus impactos e características. O exame do IDE realizado mostra que os aspectos positivos que lhe estão associados - introdução no país de novas capacidades técnicas e novas tecnologias, novas e mais avançadas formas de gestão, reestruturação do tecido económico nacional e formação de quadros - são a excepção.

Em geral, as consequências do IDE são outras, particularmente nos casos de investimento estrangeiro dirigido ao exclusivo aproveitamento de mão-de-obra barata e dos incentivos nacionais e comunitários, sempre pronto a deslocalizar-se; nos casos de investimentos em sectores estratégicos e de alta tecnologia sem uma inserção profunda no tecido económico do país; nos casos em que, não conduzindo à instalação de uma nova actividade, se limita à aquisição de activos já existentes (privados ou públicos), potenciando não só a possibilidade de redução ou extinção de actividades nacionais e a sua substituição por produção estrangeira, como constituindo uma efectiva transferência de centros de decisão nacionais para outros países; ou nos casos em que mais não significa do que o estabelecimento de redes de subcontratação e dependência de empresas nacionais ou de simples conquista do mercado interno, fragilizando ainda mais a estrutura económica do país.

Os grandes grupos económicos nacionais privados têm sido um veículo privilegiado para a desnacionalização de sectores estratégicos e para a transferência dos centros de decisão para o exterior, através da sua intermediação entre unidades privatizadas do Sector Empresarial do Estado e o capital estrangeiro. Confirma-se a tese de que só a propriedade pública garante a manutenção dos centros de decisão no país.

O desenvolvimento do país exige o acrescentamento da cadeia de valor nacional, a defesa dos sectores produtivos e a garantia das alavancas económicas em mãos nacionais (e a experiência demonstra só se concretizar através do sector público), que o IDE, em geral, não promove e, em muitos casos, nega. Por outro lado, o peso crescente do número de sectores e a qualidade estratégica de áreas abrangidas pelo capital estrangeiro e redes do capital transnacional são um evidente risco para a condução autónoma das políticas económicas nacionais e uma evidente ameaça à soberania nacional.

O investimento directo português no estrangeiro, que tem atingido nos últimos anos valores elevadíssimos, corresponde a uma nova orientação estratégica dos grupos nacionais e tem contado com vultuosos apoios de fundos nacionais e comunitários, ditos incentivos à internacionalização da economia, autêntico estímulo à deslocalização de empresas portuguesas. Dirigido em grande parte para actividades financeiras e imobiliárias e, em menor medida, para estruturas de comercialização que diversificassem e aprofundassem a penetração nos mercados externos da produção nacional, traduzem-se numa exportação de capital de que o país é carente para investimento em território nacional, e contribuem para o desequilíbrio da Balança de Transacções Correntes, o crescimento da dívida externa e, por vezes, na apresentação de grandes prejuízos financeiros (como acontece com os investimentos da PT no Brasil).

O tecido económico português, constituído por uma presença esmagadora de micro, pequenas e médias empresas qualquer que seja o sector económico considerado (primário, industrial ou de serviços), encontra-se particularmente fragilizado.

A sujeição das políticas transversais de enquadramento da actividade económica (regulação comercial, crédito e seguros, energia, telecomunicações, fiscalidade, investimento público, transportes) à lógica e aos interesses dos grandes grupos tem-se traduzido em custos diferenciados e mais elevados para as micro, pequenas e médias empresas.

A gestão dos fundos comunitários foi privilegiadamente dirigida para o grande capital e as empresas dos grandes grupos económicos, para lá da sua utilização fraudulenta ou por compadrio político-partidário. A depredação económica realizada pelos grupos bancários, através das taxas de juro efectivas e comissões bancárias, e pela grande distribuição, através das condições leoninas impostas aos fornecedores e da concorrência desleal com o pequeno comércio (violação de regras comerciais, horários de abertura), desempenha um papel particularmente nocivo para o desenvolvimento económico das micro, pequenas e médias empresas.

A política de direita (onde se incluem as opções em matéria de integração europeia), em particular nas suas vertentes económica, ambiental, do território e da administração pública, é responsável pela manutenção e/ou agravamento das assimetrias regionais e intra-regionais, pelo crescente desordenamento do território, pelas profundas agressões ambientais e pela degradação dos recursos naturais patrimoniais do país.

A completa subordinação da actividade económica aos interesses dos grupos económicos capitalistas e à sua inexorável lógica de acumulação e expansão do capital e maximização dos lucros tende a acentuar a sua desigual localização no território, com resultados desastrosos.

As teses e práticas neoliberais do Estado mínimo e do mercado como princípio único de regulação económica, um Orçamento do Estado sujeito aos constrangimentos do Pacto de Estabilidade, um forte impulso à especulação imobiliária têm-se traduzido na liquidação de instrumentos económicos e administrativos públicos essenciais e na redução dos meios (afectando o investimento público) para intervir no ordenamento do território, para promover o desenvolvimento equilibrado das regiões e para corrigir e compensar vulnerabilidades históricas e naturais.

As privatizações e liberalizações de unidades empresariais de abastecimento ou fornecimento de bens e serviços essenciais organizados em rede e, portanto, com efeitos estruturantes no território - de que são exemplo a CP, EDP, CTT, PT, as empresas detentoras de gás natural - substituindo os objectivos de serviço público pelo objectivo único do lucro privado, têm-se traduzido em processos de reestruturação com profundas e negativas implicações no território e para as populações.

As políticas de investimento público, mas muito particularmente a realizada em apoio e incentivo a projectos privados, com forte participação dos fundos comunitários, foram reproduzindo em escala ampliada as dicotomias entre uma faixa litoral de Viana do Castelo a Setúbal e do Algarve, com um povoamento relativamente denso, desordenado e, em muitas situações, urbanamente congestionado e extensas áreas do interior em crescente desertificação humana e económica. Mesmo a construção de novas infra-estruturas rodoviárias acaba por ter impactos negativos dado o diferente e inferior ritmo de construção de IC face aos IP e do seu insuficiente acompanhamento pela extensão das redes regionais e locais. A que se acrescentam as repercussões estruturais que têm algumas políticas comunitárias, como a PAC e a Política Comum de Pescas, sobre a ocupação do território e o domínio marítimo com as inerentes consequências no redesenhar dos espaços económicos regionais e no agravar das assimetrias na localização económica e urbana.

A sobreposição dos critérios da eficiência financeira e do lucro aos do ordenamento, regulamentação e fiscalização das actividades económicas traduz-se em graves consequências para o ambiente e os recursos naturais, agudizadas pela «mercantilização» dos custos ambientais e da atribuição do direito a poluir a quem o puder pagar. A preservação inadiável dos ecossistemas e recursos naturais e a garantia de sustentabilidade das actividades humanas no espaço do território reclamam outros critérios económicos e sociais que não os do capitalismo monopolista.

A política de direita tem violado de forma sistemática a organização económica configurada pela Constituição da República, nomeadamente quanto ao papel e funções do Estado e de alguns dos seus princípios fundamentais e das suas incumbências prioritárias como os da subordinação do poder económico ao poder político, de coexistência do sector público, do sector privado e do sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção, do planeamento democrático do desenvolvimento económico e social, da orientação das políticas económicas para os objectivos de promoção de bem-estar social e económico, de justiça social e correcção das desigualdades, do contrariar as formas de organização monopolista, e de salvaguarda da independência nacional.

O Estado continua a ocupar um papel central no sistema socioeconómico capitalista e monopolista português em profunda articulação com as instituições da União Europeia e outros organismos internacionais, e com o capital transnacional.

O Estado tem-se assumido crescentemente como instrumento ao serviço dos interesses de classe do grande capital nacional e transnacional, e em especial na recomposição de grandes grupos económicos privados.

Adoptando e adaptando o Estado às teses neoliberais do grande capital - o menos Estado, a maior eficiência da gestão privada em relação à pública, o Estado regulador e não produtor - e apoiada nas orientações e decisões comunitárias, a política de direita promove a desregulamentação do mercado de trabalho, leva a cabo as privatizações do Sector Empresarial do Estado, a liberalização e desregulamentação dos mercados públicos, colocando como principal objectivo do Estado a criação do ambiente favorável à iniciativa privada, atribuindo-se a este uma acção supletiva das chamadas «imperfeições» ou «disfuncionamentos» do mercado.

De grande significado, pelos seus impactos negativos na qualidade de vida dos cidadãos, no desenvolvimento equilibrado do território nacional e para a soberania e independência nacionais são os processos de privatização e liberalização dos serviços públicos ou de bens essenciais, como a saúde, a educação, a segurança social, as energias, a água, as telecomunicações e os transportes.

As chamadas «entidades reguladoras», constituídas por grupos de peritos/personalidades nomeados pelo governo, pretensamente independentes e isentos, para arbitrar e harmonizar interesses contraditórios entre consumidores e produtores, entre utentes e prestadores de serviços, vão sendo multiplicadas por áreas e sectores de bens e serviços de relevante interesse público. De facto, significam o afastamento do Estado da direcção e regulação económica dessas mesmas funções e uma operação política e uma mistificação ideológica, visando desresponsabilizar o poder político, e os partidos que o exercem, pelas decisões dessas entidades, que podem atingir gravemente a maioria da população e os agentes económicos mais frágeis.

A identidade da política económica de direita, levada a cabo durante os últimos vinte e oito anos por sucessivos governos de diversas composições partidárias envolvendo, sozinhos ou acompanhados, PS, PSD, CDS-PP, e apoiada por correspondentes maiorias na Assembleia da República, assenta na semelhança dos princípios estruturantes, dos eixos essenciais, das lógicas e objectivos estratégicos das políticas económicas.

Uma identidade que resulta de opções políticas e ideológicas, ainda que com nuances, assentes nas teses do capitalismo neoliberal, na promoção dos interesses do capital monopolista e na defesa das políticas da União Europeia, traduzidas nas mesmas bases de partida para a definição e estabelecimento das políticas económicas: os grupos económicos monopolistas como células estratégicas da estrutura e funcionamento do tecido económico; o papel instrumental do Estado numa reforçada ligação entre o poder político e o poder económico, ao serviço do financiamento e favorecimento públicos da acumulação acelerada do capital privado; a atribuição ao capital estrangeiro de um lugar estratégico na economia nacional, anunciando esse capital como factor de modernização e revalorização do papel produtivo do país; o crescimento económico centrado numa dinâmica exportadora assente numa produção de baixo valor acrescentado, baixos salários e mão-de-obra precária; a consideração da posição geostratégica de Portugal como elo e plataforma dos interesses dos grupos transnacionais.

Desta identidade profunda resultam políticas sectoriais e horizontais que, apresentando variações na sua aplicação e no modo como avaliam e procuram compensar as suas consequências sociais negativas, se igualam nos resultados bem evidentes na situação conjuntural e estrutural da economia portuguesa.

Os principais resultados económicos e sociais da política de direita traduzem-se na consolidação de um perfil produtivo de baixo valor acrescentado e de um modelo assente na exploração dos baixos custos do trabalho e dos recursos naturais.

Uma estrutura económica produtiva onde domina um tecido industrial constituído em grande parte por empresas tecnologicamente atrasadas e métodos de gestão ultrapassados, e por uma significativa presença da chamada economia paralela ou informal (de vão de escada ou de garagem), em que foram liquidados ou seriamente abalados sectores e ramos inteiros: química, siderurgia e metalurgias diversas, metalomecânica pesada, reparação e construção navais, etc.. A presença significativa da indústria automóvel e de alguns outros subsectores, e os seus efeitos indutores na indústria de componentes, não tem sido, nem podia ser, suficiente para compensar os aspectos negativos assinalados.

Um sector primário - agricultura, pescas, indústria extractiva - profundamente afectado na sua capacidade produtiva, limitado nas suas potencialidades de expansão e a braços com profundas crises económicas e sociais, como por exemplo da diminuição e envelhecimento dos seus activos e liquidação de explorações agrícolas e redução da frota pesqueira.

Os primeiros e principais défices do país são o do aproveitamento dos recursos naturais e o da produção de bens materiais, particularmente pelo défice e pela dependência alimentares que geram. O enorme défice da balança comercial, dos mais elevados do mundo e dos maiores da história económica portuguesa, em termos relativos, é expressivo de tal facto, estando na origem do recurso cada vez mais intenso a créditos externos para financiar a balança de bens e serviços, resultando daí um enorme e perigoso endividamento externo, privado e público.

A economia apresenta um baixo nível da produtividade e competitividade da maioria das empresas quando comparadas com as dos países mais desenvolvidos da UE. Os diferenciais de produtividade e competitividade face às médias da União Europeia têm sido usados pela política de direita e pelo grande patronato como argumentos para alterar a legislação laboral e direitos sociais, como o subsídio de doença e de desemprego.

Para lá da enorme mistificação ideológica em torno dos conceitos de produtividade e de competitividade que, aliás, frequentemente se confundem de forma não inocente, procura-se estabelecer uma sequência lógica salário (trabalhador) - produtividade - competitividade, como se houvesse uma simples relação causa/efeito na esfera tão complexa da produção económica. Fundamentalmente, procura-se ocultar as responsabilidades pela baixa qualidade da mão-de-obra, inclusive dos gestores, principal condicionante do factor trabalho para a produtividade, pela reduzida incorporação de investigação científica e desenvolvimento tecnológico na produção, pela pouca atenção às formas de gestão e organização das cadeias de produção e unidades empresariais.

A que deve acrescentar-se que a baixa «produtividade» média da economia portuguesa resulta, no fundamental, de um perfil de especialização com um peso determinante das indústrias de mão-de-obra intensiva e baixo valor acrescentado, igualmente da responsabilidade das políticas dos governos PSD e PS, que liquidaram importantes ramos e fileiras industriais - química, farmacêutica, metalomecânica pesada - e que não impulsionaram a alteração desse perfil produtivo.

Também na avaliação do nível de competitividade da economia portuguesa, que se procura reduzir ao factor preço do produto/produtividade, se esquece a ausência de políticas de defesa do mercado interno como faz a generalidade dos outros Estados, a adopção da moeda única euro (perda de competitividade de 2% ao ano devida à taxa de câmbio efectiva), o reduzido apoio às micro, pequenas e médias empresas, as inúmeras carências e custos agravados das redes de energia, telecomunicações, transportes e logística.

Mantém-se sem alterações relevantes um elevado défice energético que a forte dependência do petróleo e outros combustíveis fósseis explica, mas não justifica. Um défice que resulta da ausência de medidas de racionalização do uso da energia, e em particular na política de transportes, que conduziu ao crescimento da intensidade energética do PIB no país, ao arrepio da evolução nos outros membros da União Europeia, e do insuficiente investimento na produção das energias endógenas, renováveis e limpas.

Um crescente défice científico e tecnológico em resultado do insuficiente investimento público em Investigação e Desenvolvimento (I&D) (estrangulamento financeiro sistemático das instituições públicas de I&D - Laboratórios e Universidades -, não renovação dos quadros). A isto somam-se o mais baixo nível de investimento da União Europeia em I&D das unidades empresariais privadas, o desaparecimento da I&D de empresas públicas destruídas, os reduzidos níveis de formação científica e técnica dos sistemas de ensino e formação profissional, a liquidação de múltiplas actividades produtivas, algumas das quais de sectores de tecnologia avançada, e o baixo nível, em geral, de integração do conhecimento científico na actividade económica.

E, por fim, um défice da estrutura de transportes e logística, resultado de políticas e medidas sujeitas ao objectivo de total privatização e liberalização do sector e total subordinação aos interesses do grande capital, nomeadamente: o desmembramento de muitas empresas; a redução de serviços e da função social dos transportes (aumento dos preços dos bilhetes e passes sociais); a ausência de planeamento e financiamento de um verdadeiro sistema nacional de transportes, integrado, com complementaridade entre os vários modos; a dependência de decisões comunitárias em matéria de financiamento e localização, que se tem traduzido em protelamentos e indefinições; os atrasos na criação das Autoridades Metropolitanas de Transportes, que surgem agora sob total controlo do governo. Problemas que têm atingido os transportes terrestres (rodoviários - nomeadamente a rede viária, o domínio do Grupo Barraqueiro e a asfixia do Sector dos Táxis) e ferroviários - nomeadamente a rede de alta velocidade e a sua articulação com a modernização da rede convencional), os transportes aéreos (nomeadamente com o projecto de segmentação e privatização da companhia de bandeira, a TAP), nos transportes marítimos e estruturas portuárias. E, igualmente, no desenvolvimento de plataformas com zonas de actividade logística, que só o Estado tem capacidade e vocação para hierarquizar e ordenar a respectiva localização.

A política fiscal sofre também de um profundo e verdadeiro défice estrutural pela sua persistência, dimensão e natureza. Uma política fiscal injusta, de agravamento da carga fiscal dos rendimentos do trabalho (taxas e escalões do IRS praticamente inalteráveis), de aumento da tributação indirecta (IVA, ISP, ...) e de benefícios fiscais para o grande capital, em particular do sector financeiro (taxas efectivas de IRC bastante abaixo das taxas nominais, vultuosas isenções e prémios fiscais, privilégios fiscais nos offshores e zonas francas). Uma política fiscal ineficiente e cúmplice da fraude e evasão fiscais. O resultado, para lá da injustiça social, é o enorme défice nas receitas fiscais do Estado, com inevitáveis repercussões no equilíbrio das contas públicas e no não cumprimento das suas funções de redistribuição do rendimento nacional (combate às desigualdades sociais e assimetrias regionais) e de dinamização do desenvolvimento do país (fortalecimento das funções sociais, construção das infra-estruturas necessárias, impulso ao crescimento económico).

Para o PCP, o desenvolvimento económico e social do país exige uma ruptura com as políticas económicas de direita, prosseguidas por PS, PSD e CDS-PP nas últimas décadas: uma organização económica onde prevaleça o interesse público e o interesse nacional; um forte e modernizado sector público e serviços públicos, a par do sector privado, com um importante contingente de dinâmicas micro, pequenas e médias empresas e da economia social e cooperativa; a defesa, valorização e desenvolvimento da produção nacional, promovendo a sua complexidade tecnológica e valor acrescentado; a valorização do trabalho e a qualificação do emprego.

O que torna necessária e decisiva a intervenção do Estado na efectiva regulação da actividade económica e como agente económico, conforme o ordenamento constitucional, sem deixar de ter em conta o papel real do mercado no quadro de uma economia mista, não dominada pelos monopólios, com sectores de propriedade diversificada e com as suas dinâmicas próprias e complementares, respeitadas e apoiadas pelo Estado; uma política fiscal justa e eficiente que dote o Estado dos meios financeiros necessários às suas funções e obrigações constitucionais; a reconsideração das políticas económicas comuns europeias e a atribuição de fundos, no quadro do objectivo comunitário da coesão económica e social, em função das debilidades e especificidades da economia portuguesa; a defesa da produção e do mercado nacionais; a elevação do nível e perfil de escolaridade da população activa.

Considerando a evolução da situação no plano social, os últimos anos testemunham no nosso país que a imposição das políticas e teses que em nome e no interesse do grande capital têm presidido à acção governativa foram acompanhadas por um processo de mutilação e destruição de importantes conquistas e direitos sociais e por um acentuado agravamento da situação social no país.

A acção do governo PSD/CDS-PP, na linha da continuada ofensiva contra o denso acervo de conquistas de Abril, deu novos e mais graves passos no ataque aos direitos dos trabalhadores, ao Sistema de Segurança Social, ao Sistema Educativo e ao Serviço Nacional de Saúde.

A ofensiva do capital e dos governos ao seu serviço para anular direitos e conquistas dos trabalhadores, que percorre toda a história do capitalismo, assume-se hoje como global e universal. E testemunha de modo inequívoco que não há conquistas e direitos irreversíveis, que o capital em nenhum momento se conforma com a redução dos níveis de exploração indispensáveis à acumulação do lucro, que cada direito dos trabalhadores se conquista ou se perde no permanente confronto entre o trabalho e o capital.

O código do trabalho e a sua regulamentação constituem uma verdadeira subversão das conquistas e direitos alcançados pelos trabalhadores com a Revolução de Abril, uma operação contra a Constituição e os direitos laborais nela consagrados, um novo e grave retrocesso social e democrático, um instrumento destinado a criar dificuldades à organização e à luta dos trabalhadores, a enfraquecer a sua capacidade de resistência e a favorecer uma mais acentuada exploração.

O código do trabalho, objecto de luta e resistência dos trabalhadores no quadro das quais se realizou a greve geral de 2002, tem como eixos e objectivos a limitação do direito à segurança no emprego e à greve, o ataque à contratação colectiva, a intolerável restrição à liberdade de associação e organização dos trabalhadores.

Com o código do trabalho e a sua regulamentação, governo e patronato, com o apoio da UGT, construíram um instrumento destinado a legitimar um modelo assente nos baixos salários, na desqualificação do trabalho e na precariedade e a facilitar e incentivar os despedimentos, o encerramento e a deslocalização de empresas. Em articulação com esta ofensiva o governo desencadeou um ataque brutal contra os trabalhadores da Administração Pública no plano dos salários, da contratação e da destruição do vínculo de emprego público.

A precariedade, que atinge cerca de 1 milhão de trabalhadores, afirma-se como elemento desestruturante da vida de centenas de milhar de famílias e ganha hoje novos contornos com a proliferação das empresas de trabalho temporário. Com o recurso a este meio, do qual os jovens são as principais vítimas, o capital livra-se dos encargos inerentes com os trabalhadores efectivos, mina a unidade dos trabalhadores e garante bolsas de recrutamento de pessoal sem os direitos consagrados na contratação colectiva.

O nível de vida, já hoje manifestamente baixo quando comparado com outros países europeus, designadamente em matéria de rendimentos, valor de salários e protecção social, conhece novas restrições e agravamentos.

O aumento do desemprego verificado nos últimos dois anos, que ascende segundo dados recentes a mais de meio milhão, e o alargamento do número de desempregados de longa duração atingem particularmente os jovens, incluindo com formação superior, e as mulheres.

O endividamento das famílias portuguesas, estimulado pelos interesses das instituições financeiras, pela especulação bolsista, pela ausência de uma política de habitação alternativa à aquisição de habitação própria e pelo fomento irresponsável a um consumo com recurso a dinheiro fácil, atinge níveis preocupantes, hipotecando em muitos casos o futuro e a estabilidade financeira de centenas de milhar de famílias.

Mantém-se e acentua-se, em nome da competitividade e do combate ao défice orçamental, uma deliberada política de contenção salarial que, estimulada a partir do governo, como o testemunha a imposição de aumentos abaixo da taxa de inflação ou o congelamento dos salários, em dois anos consecutivos, dos trabalhadores da Administração Pública, tem contribuído para a perda de poder de compra dos trabalhadores e para afastar o valor do salário nacional da média europeia.

Centenas de milhar de pensionistas e reformados continuam a receber pensões de miséria, sujeitas a actualizações insuficientes para fazer face ao crescimento dos custos com a saúde e os medicamentos, e a verem-se obrigados a recorrer à ajuda familiar para poderem sobreviver, pondo em causa a dignidade humana a que têm direito.

A defesa e promoção de uma política de emprego com direitos, estável e justamente remunerado são determinantes para garantir, não apenas um nível e qualidade de vida que são devidos a quem trabalha no presente, mas para assegurar valores mais elevados das prestações sociais de desemprego, doença ou invalidez e montantes dignos no futuro das respectivas pensões de reforma.

O crescimento das desigualdades sociais, expressão visível da natureza de classe da política de direita, traduz-se na progressiva e escandalosa concentração da riqueza num número reduzido de famílias em oposição à cada vez mais larga parcela da população vivendo no limiar da pobreza. Acentua-se a desigualdade na divisão e distribuição do rendimento nacional entre o trabalho e o capital.

A expressão da pobreza e o seu crescimento estão directamente associados ao baixo nível de rendimentos em resultado dos baixos valores dos salários, ao aumento do desemprego e aos baixos valores das pensões.

Mais de um milhão de reformados vive com pensões de valor inferior a 208 euros, num quadro em que as actualizações da grande maioria das reformas e pensões são manifestamente insuficientes para fazer face aos brutais aumentos dos preços de bens e serviços essenciais, e em que se reduzem os apoios sociais do Estado às necessidades específicas dos idosos, designadamente os apoios domiciliários, os centros de dia com refeições, os lares, etc..

Mais de dois milhões de portugueses não conseguem um rendimento mensal superior a 60% do rendimento médio nacional, ao mesmo tempo que aumenta o número dos que recorrem à ajuda alimentar. Um número crescente de trabalhadores e de famílias enfrenta condições de vida particularmente difíceis face a um orçamento familiar insuficiente para fazer face aos elevados custos da alimentação, habitação, despesas com educação dos filhos e com a saúde. Esta realidade repercute-se no dia a dia das crianças e jovens, muitos dos quais não têm acesso a creches, jardins de infância e ATL a preços acessíveis e de qualidade, o que se repercute nos níveis de insucesso, abandono escolar e no ciclo de pobreza que tende a marcar as suas vidas no futuro.

Destacam-se, ainda, o acelerado processo de fomento de políticas sociais a partir da acção do Estado centradas na gestão da pobreza e assentes numa visão assistencialista e as dificuldades em garantir uma eficaz intervenção junto de grupos sociais mais vulneráveis, designadamente junto de crianças e jovens em risco, dos cidadãos sem abrigo, das vítimas de exploração sexual e prostituição, em resultado do fraco investimento em meios financeiros e técnicos disponibilizados pelos governos.

As mulheres continuam a ser especialmente atingidas por esta política de desigualdades, constituindo a parcela dos trabalhadores pior remunerados, as mais fortemente penalizadas pela precariedade, as menos promovidas, as que têm pensões e reformas mais baixas e as que mais recorrem ao magro subsídio de inserção social.

Um quadro de desigualdades engrossado pelos muitos milhares de imigrantes, muitos deles com a sua situação por regularizar, vivendo em condições degradantes, sem direitos e sujeitos à chantagem das mafias e à exploração do patronato sem escrúpulos, que com o desenvolvimento de tendências racistas e xenófobas estimuladas pela política do governo pode vir a constituir um factor preocupante de tensões sociais.

A política de direita tem assentado no plano ideológico num farisaico discurso moralista e pretensamente humanizador e, no plano das políticas, na intensificação da exploração com restrição de direitos; na estratificação das condições de imigrante, mesmo quanto à origem, numa lógica de dividir para reinar; na acentuação do pendor policial como via de tratamento de um problema eminentemente social.

Na verdade, Portugal viu aumentar significativamente nestes últimos quatro anos o número de imigrantes, com um contributo relevante para o desenvolvimento nacional, que estudos recentes estimam em 5% da riqueza produzida anualmente.

A questão da imigração é tão mais de assinalar quanto Portugal continua a ser marcado pelo peso da sua comunidade emigrante. Um fenómeno que continua a ver-se ampliado pelo crescimento recente da mobilidade emigrante, seja pelos trabalhadores temporários e sazonais, a maioria dos quais com contratos de curta duração e em condições de grande precariedade e de enorme exploração.

As políticas de direita desenvolvidas ao longo dos anos caracterizam-se, no essencial, por um discurso demagógico que não resiste ao confronto com a prática e que se afastam cada vez mais das aspirações e necessidades das comunidades portuguesas. Aumenta assim a degradação da rede consular e das condições de exercício profissional dos seus trabalhadores, do ensino e divulgação da língua e cultura portuguesas, ao mesmo tempo que se acentuam as tentativas de instrumentalização dos órgãos próprios da diáspora.

Os problemas de habitação, sem solução no quadro da lógica de mercado e sujeitos a uma deliberada opção de favorecimento do capital financeiro, continuam a constituir um grave problema social. A progressiva desresponsabilização do Estado no investimento e na promoção de políticas públicas, a ausência de uma política de solos e a não assunção da função urbanística com natureza eminentemente pública têm contribuído para a especulação imobiliária e para o agravamento dos problemas do sector.

O regime de arrendamento urbano proposto pelo governo - que representa um novo e agravado factor de instabilidade e de precariedade do direito à habitação, com consequências sociais imprevisíveis para a larga maioria dos 750 mil arrendatários existentes - e a legislação sobre reabilitação destinada a favorecer a entrada do capital financeiro no negócio da reabilitação dos centros históricos das cidades, revelam o sentido de classe do actual governo.

A acção do governo PSD/CDS-PP nas áreas e políticas sociais está indelevelmente marcada pela desresponsabilização do Estado associada a uma orientação de mercantilização da saúde, da segurança social e da educação.

O Serviço Nacional de Saúde (SNS) constitui um alvo privilegiado da política de direita e das suas orientações neoliberais. No seguimento da situação criada pelos governos do PS - subfinanciamento, falta de investimento com a consequente progressiva degradação dos cuidados de saúde - , o governo PSD/CDS-PP desencadeou o mais forte ataque de sempre ao SNS, visando a sua destruição e privatização. A não adopção pelos sucessivos governos de orientações políticas para a defesa do SNS, designadamente promovendo programas com objectivos definidos de investimento, renovação e melhoria de qualidade, têm facilitado a transformação da saúde num sector com predominância privada, acentuando a promiscuidade existente entre o sector público e o privado, com o Estado remetido a um papel residual, o que constitui uma forte regressão social e a negação do direito constitucional à saúde.

Procurando esconder as potencialidades do SNS, considerado pela OMS o 12.º melhor a nível mundial, bem patente nos indicadores de saúde da população portuguesa - como a esperança média de vida, que passou de 68 anos em 1970 para 76,2 anos em 2003, ou a mortalidade infantil, que em 1970 era de 58,6 por cada mil nascimentos passando para 5 por cada mil nascimentos em 2002 - o governo apostou na progressiva diminuição da prestação de cuidados de saúde aos cidadãos pelos serviços públicos; limitou o financiamento e o investimento nos hospitais e centros de saúde; introduziu o primado da gestão economicista, acentuando a centralização e burocratização das decisões, pressionando as unidades de saúde para a diminuição de despesas e para a crescente obtenção de receitas próprias, à custa da qualidade dos serviços; atacou os direitos dos trabalhadores da saúde e agravou a carência de recursos humanos; interferiu na definição de competências profissionais, visando impor critérios de desqualificação técnica e científica e promover a conflitualidade no sector; desprezou as políticas de prevenção da doença e promoção da saúde; acentuou a dificuldade no acesso aos cuidados de saúde, bem patente nas crescentes listas de espera para cirurgias, tratamentos e consultas de especialidade ou na falta de médicos de família; aumentou os custos para a população, através das taxas moderadoras, do preço dos medicamentos ou da crescente necessidade de recurso a serviços privados.

O governo PSD/CDS-PP agravou o problema das listas de espera cirúrgicas, apesar de prometer o seu fim, aplicando um programa (PECLEC) que redundou na criação de uma nova lista de espera com mais utentes que a inicial e lançando agora um novo sistema que favorece ainda mais o sector privado através da criação do chamado «cheque cirurgia» o que, a par da degradação do funcionamento dos serviços de saúde, se traduzirá na transferência, nas especialidades com potencial lucrativo, dos utentes para instituições privadas.

A política dos governos PS e PSD/CDS-PP agravou a escassez dos recursos humanos da saúde, estando Portugal na «cauda» da Europa no que diz respeito a número de profissionais de saúde por mil habitantes. Aumentou o número de utentes sem médico de família, sendo recorrentemente adiada a criação do enfermeiro de família. Acentua-se a dificuldade em aceder a consultas e tratamentos de diversas especialidades, como acontece com os cuidados de saúde oral, especialmente em centros de saúde, ou com a área da saúde materna e infantil, onde a falta de especialistas, designadamente médicos e enfermeiros, tem colocado em risco de rotura maternidades centrais e levado à ameaça ou mesmo ao encerramento, valências de maternidade em todo o país, dificultando cada vez mais a acessibilidade da população a estes cuidados. Acentua-se em simultâneo o ataque aos direitos dos trabalhadores da saúde, aumentando a precariedade e a instabilidade laboral, desvalorizando e desrespeitando o seu trabalho e as suas competências científicas e profissionais e promovendo a desmotivação profissional.

O acesso a cuidados de saúde é cada vez mais caro e por isso mais difícil para a generalidade da população. O aumento das taxas moderadoras revelou-se particularmente danoso para as classes mais desfavorecidas, não só devido ao aumento do seu valor, mas também do número de actos a serem taxados. Aumentaram para muitos milhares de utentes os gastos com medicamentos, em virtude da aplicação do sistema de preço de referência (mais 6,4 milhões de euros). Cada vez mais a falta de resposta dos serviços públicos, em consequência da deliberada falta de aproveitamento dos recursos humanos e materiais instalados nos serviços públicos, empurra a população para o recurso ao sector privado.

Incluída na estratégia de desresponsabilização do Estado e da crescente transferência de custos para a população, a recente hipótese de diferenciar o pagamento de serviços de saúde, com base na informação do sistema fiscal, para além de ser inconstitucional, reproduziria na saúde a injustiça fiscal daquele sistema, que tributa fundamentalmente os trabalhadores por conta de outrém; agravaria as já deficitárias condições de acesso de muitos cidadãos à saúde; discriminaria negativamente os mais doentes, que por isso têm de recorrer mais aos serviços de saúde; não afectaria os mais ricos, quer porque têm sempre a possibilidade de recorrer aos serviços privados, quer porque o peso destes pagamentos é diminuto face aos seus rendimentos.

O governo PSD/CDS-PP acentuou a linha privatizadora. Transformou 36 hospitais em 31 hospitais sociedades anónimas e prevê empresarializar mais 30 unidades de saúde até 2006. Celebrou novo e vantajoso contrato para o Grupo Mello no Hospital Amadora-Sintra. Avançou com as chamadas parcerias público-privadas, iniciadas pelo PS, para entrega a privados dos novos hospitais a construir, num negócio sem paralelo noutros países e que constitui na prática a entrega durante décadas destas unidades hospitalares a grupos económicos privados, em condições de lucro garantido e ausência de risco, assente num financiamento público de mais de 7 400 milhões de euros - que onerará o Orçamento do Estado até 2037, em montantes superiores ao que seria a despesa pública se estes hospitais fossem construídos e geridos pelo Estado - bem como na já anunciada aplicação do princípio do utilizador-pagador nestas unidades. Prepara-se para entregar a gestão dos centros de saúde aos hospitais privatizados e a grupos privados, arredando para segundo plano a função primordial dos cuidados de saúde primários que é a promoção da saúde e a prevenção da doença e para alienar ao chamado sector social, (nomeadamente às misericórdias), em geral comprometido com interesses económicos privados, a rede de cuidados continuados.

A criação da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), exigida pelo Presidente da República como condição para a promulgação das peças legislativas do governo PSD/CDS-PP, é mais um avanço na desconfiguração do SNS. A criação da ERS, equivale a transferir as funções reguladoras do Estado para uma estrutura sem autonomia de intervenção e em boa parte dependente do financiamento de entidades privadas, para além do financiamento do Orçamento do Estado. A criação da ERS traduz a crescente desresponsabilização do Estado na condução das políticas de saúde, a sujeição do sector da saúde à estrita lógica da concorrência e do mercado, sendo um instrumento na política de privatização do SNS.

A ofensiva contra o SNS, como parte da ofensiva mais generalizada contra os serviços públicos, reflecte-se negativamente em outras áreas de intervenção no domínio da saúde pública como as da toxicodependência e na despistagem e tratamento do SIDA e de outras doenças de crescente prevalência.

Os critérios economicistas, a progressiva desresponsabilização do Estado e a governamentalização e, mesmo, partidarização da estrutura de direcção do organismo responsável pela dinamização das medidas no sector (IDT) têm conduzido à paralisia dos serviços e das acções de prevenção, e tratamento da toxicodependência, a exemplo do que se verifica ao nível dos programas e organismos responsáveis pelo combate ao alcoolismo.

A acção política e ideológica do governo em matéria de direitos sexuais e reprodutivos, em claro confronto e ruptura com o carácter democrático e progressista presente na legislação portuguesa, assume na questão do aborto e da sua expressão enquanto flagelo social particular relevância.

O crescente número de casos de aborto levados a tribunal com o cortejo de sofrimento e humilhação para as mulheres envolvidas, a par da deliberada desvalorização das acções de planeamento familiar e educação sexual em meio escolar, impõe um vigoroso combate às concepções da maioria PSD/CDS-PP que aposta na criminalização e estigmatização das mulheres que têm de recorrer à interrupção voluntária da gravidez.

Num quadro em que se impõe que sejam abandonadas, por um lado, falsas respostas institucionais como as que o BE alimentou com a petição para um referendo, e por outro, preconceitos e hesitações no campo das forças que se afirmam favoráveis à despenalização do aborto, nomeadamente no PS, o PCP continua a agir activamente para que, a par de um urgente combate aos recuos em curso em matéria de educação sexual, planeamento familiar e do conjunto dos direitos sexuais e reprodutivos, se prossiga a luta para que a Assembleia da República aprove uma lei de despenalização do aborto, a pedido da mulher, até às 12 semanas, superando assim este grave problema social e de saúde pública.

Particularmente forte tem sido o ataque contra o sistema público de segurança social, instrumento que se pretendia insubstituível de solidariedade, de justiça social, de integração e participação na vida da sociedade, ao garantir protecção, nos termos constitucionais, na velhice, invalidez, viuvez, orfandade, doença, infância, bem como no desemprego e demais situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.

O sistema público de segurança social, conquista de Abril, tem estado no centro de uma forte ofensiva com consequências visíveis no baixo nível de protecção social de Portugal relativamente à generalidade dos países da União Europeia.

A Lei aprovada pela maioria PSD/CDS-PP e a sua posterior regulamentação, constitui, numa clara opção pelos interesses dominantes, um duro golpe no direito à protecção social. Esta lei - que determina que a segurança social passe a ser constituída por três sistemas: público, complementar e Acção Social - visa a privatização das suas partes mais rentáveis, a redução e/ou isenção das obrigações do patronato para com a segurança social e a transformação do sistema público num sistema residual.

As alterações verificadas no subsídio de doença e nas prestações familiares (abono de família) e as que são anunciadas para o subsídio de desemprego e de introdução de tectos contributivos para efeitos de reforma, visam a destruição da universalidade dos direitos, a manutenção de baixos valores das prestações sociais, em que se destacam as pensões e as reformas. A criação do Rendimento Mínimo Garantido a partir de 1996 (e proposto pelo PCP em 1993) veio a consagrar um importante direito social para as famílias e indivíduos em situação de carência. A sua substituição pelo Rendimento Social de Inserção (RSI), por parte do PSD/CDS-PP, visou diminuir o acesso de muitos que se encontram numa situação de carência económica e reduzir as despesas do Estado com esta prestação social.

A evasão e as dívidas à segurança social têm tido com o governo do PSD/CDS-PP uma acentuado crescimento. Somadas à perda real de receitas que decorrem do fecho de empresas, dos despedimentos e da precariedade de trabalho são utilizadas para fundamentar a velha e falsa tese da insustentabilidade financeira do Sistema Público.

A autonomização do Sistema de Acção Social, prevista na actual lei de bases de segurança social, desligada do Sistema Público de Segurança Social insere-se numa lógica de destruição de importantes mecanismos de protecção social baseada em direitos, de redução do papel do Estado ao mero controlo institucional das situações de carência através de medidas assistencialistas e de transferência desta responsabilidade para a iniciativa dos cidadãos, das autarquias e da chamada economia social (IPSS, Misericórdias, cooperativas, fundações, associações).

Os últimos quatro anos foram marcados, também na área da educação, pelas políticas neoliberais que visam a criação do mercado da educação.

Contra qualquer lógica de valorização da educação como um sector estratégico determinante para o desenvolvimento do país, numa atitude não apenas autista e prepotente, mas também de afrontamento à Constituição, a maioria de direita, numa clara opção de classe, impôs na Assembleia da República uma nova Lei de Bases da Educação, que acabou por ser vetada, como o PCP reclamava, pelo Presidente da República.

Na proposta da maioria, agora vetada, que reflecte política e ideologicamente as suas opções para a área da educação, são inequívocas duas orientações centrais: privatizar o ensino, o que é evidente na substituição do conceito de escola pública por serviço público, e satisfazer o mercado de trabalho de acordo com um modelo de desenvolvimento assente na mão-de-obra desqualificada e nos baixos salários. Só a intensificação da luta poderá impedir a reposição pelo governo, já na próxima sessão legislativa, desta proposta.

Num país com uma taxa de abandono e insucesso que atinge 45% dos estudantes do ensino secundário onde, de acordo com os Censos de 2001, 32,5% da população empregada continua a possuir no máximo o 1.º ciclo do ensino básico completo, somente 28,8% possui o ensino secundário completo e apenas 7,8% uma licenciatura completa, ao Estado cabe assegurar a democratização da oferta educativa, a igualdade de condições no acesso e sucesso educativos, ao contrário da opção elitista que tem vindo a ser implementada e que a intenção do governo de reduzir de nove para seis anos o tronco comum da formação reforça. É fundamental desenvolver a educação para adultos, a chamada educação de 2.ª oportunidade, nomeadamente através do alargamento da rede de escolas públicas com oferta diversificada de ensino recorrente, designadamente no ensino nocturno, que facilite a sua frequência.

A educação pré-escolar conseguiu no final dos anos 90 uma visibilidade significativa resultante de uma crescente tomada de consciência colectiva sobre o importante contributo que esta dá ao nível do desenvolvimento integral do indivíduo e como primeira etapa de uma educação básica. Com o governo PSD/CDS-PP este sector educativo sofreu uma forte regressão no processo de expansão que vinha tendo desde a publicação da Lei Quadro da Educação Pré-Escolar, deixando por cumprir o papel estratégico do Estado na criação de uma rede pública que garanta a universalidade da oferta. A educação pré-escolar vê agora ameaçado o seu carácter público e gratuito ao mesmo tempo que se abandona o objectivo de generalizar esta resposta educativa a todas as crianças dos três aos cinco anos, assumindo o Estado a prioridade de apenas a promover para as crianças de cinco anos.

Num país de significativas assimetrias regionais, os problemas causados por um parque escolar caracterizado pela falta de conforto e de recursos em equipamentos educativos e material didáctico, a necessária colocação de mais professores e da dotação do número adequado de auxiliares de acção educativa e outro pessoal não docente, um financiamento público restritivo que não tem em consideração as desigualdades de acesso às novas competências curriculares de muitos alunos que vivem em regiões isoladas e desfavorecidas, a falta de apoios eficazes nas refeições e na organização dos tempos livres, o elevado número de alunos por turma, são alguns dos muitos problemas que subsistem no 1.º ciclo do ensino básico.

A Lei de Bases em vigor acentua a importância do desenvolvimento global do aluno (nas vertentes cognitivas, sócio-afectivas, da criatividade e capacidade crítica), objectivos que não serão atingidos sem que se tomem as medidas necessárias para melhorar as condições de trabalho dos professores e alunos e se promova uma «Nova Escola do 1.º Ciclo do Ensino Básico».

A articulação entre os diversos níveis de ensino é condição essencial para a qualidade da formação e para o sucesso escolar, para se alcançar uma elevada taxa de permanência e de sucesso na escolaridade obrigatória. Também nos 2.º e 3.º ciclos é indispensável o real investimento na escola pública, bem como a coordenação dos «currículos», o reforço e a diversificação dos apoios, a criação de condições para a diferenciação pedagógica e a redução do número de estudantes por turma e do número de turmas e de níveis por professor, em várias disciplinas.

No ensino secundário, e tal como aconteceu com o governo anterior, também as políticas aqui introduzidas pelo governo PSD/CDS-PP, nomeadamente com a revisão curricular, têm vindo a empobrecer os conteúdos programáticos que se encontram cada vez mais desligados das necessidades sociais e da realidade que vivemos.

Com a revisão curricular que entra em vigor no início do ano lectivo 2004/2005, não só não se resolve a crise que se vive neste nível de ensino, como se acentuará o carácter de classe da selectividade nas opções entre o ensino geral e as variantes técnica, artística e vocacional. À saída da escola secundária serão cada vez mais os filhos dos estratos sociais superiores que se encontram em vantagem para se tornarem os futuros quadros dirigentes, reproduzindo desta forma a estratificação social existente.

Portugal continua a ser, no contexto da União Europeia, o país com menor percentagem de população activa com habilitações a nível superior. É reconhecida a importância fundamental das qualificações e da elevação cultural dos povos em todas as esferas e em todas as funções do exercício das actividades sociais, económicas e políticas. O ensino superior é portanto um bem público e não um privilégio de classe nem apenas um investimento pessoal, e como tal compete ao Estado garantir o seu funcionamento em condições de equidade quanto ao acesso e à frequência deste grau de ensino. Deve pois ser de frequência gratuita e ser acompanhado de medidas de acção social escolar que facultem os apoios de que carece a maioria da população escolar, como os relativos à deslocação dos estudantes bem como à atenuação de quaisquer formas de discriminação social.

O Ensino Superior Público é hoje alvo de feroz ataque do capitalismo internacional. O «Processo de Bolonha» tem dois objectivos: a elitização económica do ensino superior, condicionando-o assim aos interesses do grande capital financeiro, e a privatização progressiva do ensino superior público. No nosso país, as orientações governamentais no âmbito do «Processo de Bolonha» visam, essencialmente, a desresponsabilização do Estado no financiamento do Ensino Superior Público e a sua uniformização e segmentação em ciclos com uma orientação classista. A fragmentação do ensino superior em ciclos com previsíveis custos acrescidos das propinas de cada ciclo possibilitará uma maior coincidência entre as elites intelectuais e as elites económicas. O acesso ao conhecimento será ainda mais um privilégio dos ricos. Àqueles cujos escassos recursos económicos não permitam a passagem ao 2º ciclo será negada a formação integral que lhes poderia conferir as capacidades necessárias para assumir uma posição consciente no controlo da economia e, ao mesmo tempo, as capacidades profissionais para as tarefas do desenvolvimento. Por outro lado, através da estratificação do ensino superior em ciclos pretende-se acelerar o processo da sua privatização e abertura à sua transnacionalização. Com efeito, quanto mais os cursos forem estratificados, mais fácil se tornará a «produção» de tais pacotes pelo sector privado da educação. A ajudar ao processo está a inviabilização financeira das universidades por subfinanciamento.

Qualquer reforma do ensino superior deverá realizar-se no devido respeito pela sua autonomia científica e pedagógica, ser partilhada com os corpos docente e discente (associações de estudantes, associações profissionais e científicas) que as integram e ter como finalidade o seu controlo democrático e o cumprimento das reais necessidades do povo português. Tendo em conta que o «Processo de Bolonha» é um instrumento de contra reforma neoliberal, o PCP alerta para os perigos e graves consequências da sua implementação e apela ao seu firme combate.

No Ensino Superior Público o Estado deve assumir os custos da formação integral dos seus estudantes em todos os ciclos de ensino. O Ensino Superior Público deve reivindicar os financiamentos a que tem direito como serviço público que é, ao mesmo tempo que encontra formas complementares de autofinanciamento através dos serviços à sociedade que as suas estruturas intelectuais e produtivas podem prestar. Deve pugnar, em qualquer ciclo de ensino, por programas curriculares estruturantes que preparem os seus formandos, não só para a vida produtiva, mas também para uma intervenção consciente na sociedade. Deve-se portanto lutar por uma profunda reconfiguração do ensino público português que habilite os estudantes a serem criadores de um país avançado, consciente, democrático. Para tal, será fundamental um ensino ligado à vida, que ensina a questionar e a duvidar.

O financiamento do sistema de ensino superior é um instrumento fundamental de política. Ao contrário da desestruturante orientação e da prática verificadas nos últimos vinte anos, em que o quadro de financiamento da rede pública vem sofrendo gravosas alterações e sucessivos incumprimentos, o financiamento público deverá ser estável e suficiente para garantir condições de trabalho favoráveis à orientação, ao acompanhamento e ao aproveitamento escolar, assim elevando a taxa de sucesso e a adequação e pertinência das aprendizagens. Sem esquecer também a importância do financiamento bastante para realizar formação avançada, a favor quer da consolidação dos estabelecimentos de ensino superior em todos os domínios do saber quer para a disponibilização de quadros altamente qualificados e de investigadores para a generalidade do tecido produtivo e administrativo do país. Rejeitamos a intenção expressa de interesses económicos nacionais e transnacionais em transformar a educação e a formação em mercadoria e objecto de sector de negócios e, com isso, negamos a legitimidade de o Estado reduzir o seu apoio expresso e substancial à rede pública para conferir facilidades legais e apoios financeiros a estabelecimentos de ensino privado. Deve sim o Estado oferecer estímulos positivos e correcções regionais e temáticas, que consolidem a rede pública e permitam aproximá-la das aspirações e necessidades dos cidadãos e dos imperativos de desenvolvimento do país.

A educação e a cultura, bases privilegiadas de sustentabilidade do regime democrático, factores essenciais a uma estratégia para o desenvolvimento do nosso país assente num modelo de repartição mais justo da riqueza produzida, onde pontifique mão de obra qualificada e bem remunerada, exigem que o Estado garanta o direito constitucional à educação e assegure um ensino público, gratuito e de qualidade para todos.

A investigação científica e o desenvolvimento experimental são parte integrante da vida cultural e económica. A produção autónoma de conhecimento, a sua assimilação e a sua transmissão são vitais à identidade e ao dinamismo intelectual e material do país. As instituições de ensino superior e os laboratórios do Estado, para além de estruturas empresariais de pesquisa científica ou tecnológica, são o contexto adequado para alimentar essa produção científica e técnica, a sua difusão no tecido nacional e o cumprimento de missões técnicas de interesse colectivo que cabe à administração pública assegurar nos âmbitos mais variados. Compete ao Estado financiar parte irredutível desse esforço de investigação, no ensino superior e nos laboratórios do Estado, garantir condições de trabalho e de carreira aos investigadores e técnicos especializados, fixar um quadro favorável ao efectivo investimento empresarial na investigação para fins produtivos.

A evolução da situação cultural caracterizou-se, no plano das políticas governamentais, pela subalternização e secundarização, pelo prosseguimento da transferência de encargos e responsabilidades para os municípios, pelas restrições e pela fraca execução orçamental. Começou a acentuar-se claramente uma orientação de privatização de bens culturais públicos. Por outro lado, e sobretudo na área das artes, a pretexto de uma política de «internacionalização» promovida pelo Instituto das Artes (IA), manifesta-se uma linha de imposição de valores de cunho cosmopolita que configura, também nesta área, um processo de integração subalterna nos circuitos internacionais de mercantilização capitalista dos objectos culturais. Em contrapartida, deve destacar-se um valioso esforço de criadores, e em particular de jovens, no sentido de encontrar formas de afirmação e difusão não subordinadas a este processo.

Os cortes e restrições orçamentais impostos (contrariamente às promessas e desmentidos governamentais) condenaram praticamente à inacção importantes instituições ou áreas de trabalho de que são exemplo a Biblioteca Nacional ou o Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia, o Instituto Camões e a extinção do Observatório das Actividades Culturais. O financiamento público das actividades culturais assenta em percentagem cada vez maior nos municípios, para os quais o Governo pretende transferir novos encargos na atribuição local e regional de apoios, na base de um modelo que conduziria a uma ainda maior fragilização das iniciativas descentralizadas, e a um cerceamento da diversidade cultural.

O património cultural e natural debate-se numa luta pela sobrevivência sem precedentes, estando em causa o futuro das instituições, das capacidades humanas forjadas ao longo de gerações, dos bens móveis e imóveis, reservas e sítios, corpóreo e incorpóreo. A drástica redução dos apoios à descentralização e criação, traduzida na liquidação das iniciativas descentralizadas e independentes, é coerente com a tentativa de impor uma orientação cerceadora da diversidade cultural. A democraticidade cultural básica não existe, procurando-se iludir a sua ausência com o recurso ao mercado cultural nas suas facetas mais destrutivas da identidade nacional. A actividade cientifica, na frente da investigação, do ensino ou no domínio da divulgação, fundamental para o desenvolvimento da sociedade portuguesa e do seu progresso económico assistiu nestes anos a uma grave recessão, em que se mascaram contratos comerciais como «ciência aplicada», se ignora a diferença entre investigação e tecnologia, se disfarça o ensino cientifico, técnico e tecnológico com o manto diáfano da informática, tantas vezes mal projectada e frequentemente usada para fins muito diferentes das suas reais capacidades. Mantém-se por cumprir acordos internacionais, culturais e científicos, a que Portugal se obrigou e que põem em causa a nossa permanência nas respectivas instâncias internacionais.

A política cultural que o país precisa exige o aumento e não a redução do papel do Estado na defesa, valorização e preservação do património cultural; no estímulo e apoio à investigação e criação contemporânea, respeitando a sua diversidade estética, formal e estilística; na valorização de um desenvolvimento regional equilibrado; no apoio à profissionalização dos criadores e à formação de públicos; na promoção do diálogo e abertura às culturas de outras comunidades e povos.

A desigualdade de oportunidades e a elitização das políticas estendem-se também ao desporto. Do ponto de vista desportivo, prosseguiu um política de promoção de grandes eventos, de que o Euro 2004 (gigantesco negócio privado traduzido num enorme endividamento público) é exemplo, para esconder a ausência de uma política de promoção activa do desporto ao serviço de toda a população.

Contrariando toda a lógica e as recomendações de organizações internacionais, os sucessivos governos do PS e do PSD abandonaram a Educação Física no 1.º Ciclo de Ensino Básico, pondo em causa aspectos essenciais do desenvolvimento motor e intelectual das crianças, com impacto no sucesso escolar; mantiveram o Desporto Escolar em níveis baixíssimos de prática; não têm apoiado os clubes e o desporto popular; a alta competição e o Movimento Olímpico e Paralímpico não têm sido dotados de recursos necessários ao seu desenvolvimento; não houve investimento na promoção de estilos de vida activa e no desenvolvimento desportivo nacional; as federações e os clubes estão sem meios nem recursos financeiros.

As autarquias locais, reconhecidamente um suporte de toda a acção desportiva nacional, quer no que respeita a infra-estruturas quer no que respeita a actividades e apoio ao movimento associativo, conheceram neste período, em contraste com o apoio dado ao desporto profissional, novas e mais profundas limitações financeiras com repercussões na sua actividade também nesta área, ao mesmo tempo que sintomaticamente a proibição de acesso ao crédito que lhes foi imposta pelos últimos governos ter como única excepção o acesso ao crédito para a construção dos estádios destinados ao Euro 2004.

A nova Lei de Bases do Desporto, cuja aprovação a maioria impôs contra todos os outros partidos e todos os pareceres das entidades que se puderam pronunciar - porque define a intervenção dos poderes públicos como «complementar e subsidiária» contrariando o texto constitucional, direcciona inaceitáveis competências para as autarquias, acentua uma intromissão do Estado no associativismo desportivo, constituindo um repertório de abordagens gerais de temas desarticulados entre si, não perspectiva uma lógica de democratização e generalização da prática desportiva a toda a população em que o Estado deverá ter um papel central - representa um grave retrocesso conceptual e legislativo e constituirá um factor mais no progressivo afastamento de Portugal dos padrões médios europeus.

Quer ao nível da intervenção política e institucional quer ao nível do movimento associativo desportivo, do movimento popular, dos agentes do sistema educativo, dos profissionais do desporto e das respectivas associações é indispensável uma acção mais estruturada, mais organizada e coordenada no combate à política de direita para o desporto.

A política ambiental, nos seus conteúdos e omissões, tem-se caracterizado por uma deliberada redução de recursos e meios postos à disposição da implementação de políticas coerentes de defesa e preservação da natureza e da sua compatibilização com os interesses da população e o desenvolvimento do país e pela opção estratégica de favorecimento da apropriação privada de recursos naturais, no quadro de uma lógica de subordinação da natureza às leis económicas do mercado incapazes, de assegurar uma comunidade humana sustentável.

Nos últimos anos tem-se mantido uma política de delapidação dos recursos actuais incapaz de os valorizar ou sequer monitorizar os recursos naturais e muito menos evitar a sua utilização abusiva; de esvaziamento dos principais serviços e entidades responsáveis pela valorização dos recursos naturais, de que é exemplo o Instituto de Conservação da Natureza, ou o estrangulamento financeiro de entidades independentes como é exemplo o Conselho Nacional do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; do protelamento da aprovação dos instrumentos de planeamento há muito decididos como sucede com a quase totalidade das áreas protegidas e parques naturais; de confrangedora inconsistência na implementação de políticas de redução e tratamento de resíduos hospitalares e industriais, e em particular dos resíduos perigosos; da ausência de medidas correspondentes aos objectivos e metas definidas para a redução de emissões de gases com efeito de estufa; da aprovação de legislação orientada para promover lógicas de mercado e a exploração pelo capital da natureza e dos seus recursos.

A assunção de uma política ambiental consequente por parte dos comunistas implica que o seu trabalho e a acção no terreno seja exemplar, não só no âmbito do saneamento básico, mas também no domínio da Conservação da Natureza. Exemplar na recusa de cedências fáceis às políticas do betão, na luta pela manutenção da biodiversidade e contra os lobbies do turismo desenfreado e outros que atentam contra os valores ecológicos, na defesa intransigente de uma Rede Nacional de Áreas Protegidas, de uma Rede Natura 2000, de uma Reserva Ecológica Nacional, de uma Rede de Corredores Ecológicos eficientes e eficazes, de uma Rede Nacional de Áreas Marinhas de Protecção Especial, de defesa intransigente das recomendações da Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e o Desenvolvimento do Rio de Janeiro, de defesa das directivas comunitárias e mundiais para a conservação da Natureza, da Convenção de Washington, da Convenção de Ramsar, da Convenção de Berna, da Convenção de Bona, do Protocolo de Quioto.

Os recentes desenvolvimentos na estratégia de privatização da água - há mais de uma década ensaiada com a criação dos chamados sistemas multimunicipais e a inerente expropriação das competências às autarquias que eles corporizam - verificados quer com a aprovação do Plano Nacional da Água em 2002 quer com a anunciada privatização de 49% do capital da empresa Águas de Portugal, assumem particular gravidade. A que há que somar outros e não menos preocupantes desenvolvimentos: o Plano Estratégico de Abastecimento Águas e Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR) de 2000, a política sequente de pressões sobre as autarquias e a cedência de muitas, concentraram o controlo dos serviços de água à larga maioria da população no grupo Águas de Portugal SA; algumas câmaras têm vindo a privatizar directamente a água, na maior parte dos casos a subsidiárias das grandes transnacionais do sector; o propósito de transformar em negócio privado, lucrativo e imediatista, todos os outros usos da água e dos terrenos envolventes, explícito no Plano, e retomado no abortado projecto de lei quadro da água que o governo ensaiou, assume-se como única linha condutora da administração da água, particularmente notória e lesiva nas estratégias relativas aos serviços de água, à produção hidroeléctrica e aos empreendimentos de fins múltiplos, especialmente o do Alqueva.

A opção por uma lógica de mercado na utilização da água, correspondendo à reivindicação dos grandes grupos económicos do sector de se apoderarem do controlo de abastecimento de água, quer em «alta» quer em «baixa», traduzir-se-á numa séria restrição do direito da população a um bem essencial à vida, na alienação da intervenção e controlo público e na irremediável entrega nas mãos de capital estrangeiro deste sector. Opção tão mais grave e irresponsável quanto é reconhecido que as políticas de água e saneamento constituem, mais que uma política sectorial, uma questão de democracia e de soberania, de segurança ambiental, de protecção da natureza e de desenvolvimento.

 

2.3. A evolução política e o regime democrático

A evolução da situação política nacional, desde o XVI Congresso, foi marcada e determinada por quatro traços fundamentais: o fracasso da política do governo do PS e do seu afastamento do governo; a formação dos governos de direita, com base no PSD/CDS-PP, resultante das eleições legislativas antecipadas e da demissão de Durão Barroso e sua substituição por Santana Lopes; a alteração qualitativa na ofensiva contra o regime democrático desencadeado pela coligação de direita e, finalmente, o envolvimento e a submissão de Portugal, primeiro pelo governo PS e depois pelo governo PSD/CDS-PP, à estratégia imperialista. Evolução que encontra na luta dos trabalhadores e do povo importante factor de combate e resistência a essa política.

A demissão do primeiro-ministro António Guterres, após a pesada derrota do PS nas eleições autárquicas em Dezembro de 2001, teve como causa primeira a erosão e o descrédito político, social e eleitoral do PS em consequência das políticas realizadas pelo seu governo contra os interesses da grande massa dos portugueses.

O balanço da governação PS, nas questões marcantes, traduziu-se numa política de baixos salários e pensões; no aumento de preços de bens e serviços essenciais; nos salários em atraso; no desemprego; na fúria privatizadora; nos benefícios para o grande capital; na destruição do aparelho produtivo; no acentuar das assimetrias regionais. Foi ainda o governo PS que lançou as bases das chamadas Reformas da Administração Pública e do Sistema Político e vinculou o país aos critérios do Pacto de Estabilidade. O nepotismo, o assalto ao aparelho do Estado para satisfazer o clientelismo partidário, os «jobs for the boys», os sucessivos escândalos envolvendo membros do governo, a utilização do aparelho do Estado para fins eleitorais, atingiram proporções escandalosas.

A interrupção do governo do PS culmina um período marcado por uma mais acentuada viragem à direita da sua política, traduzida nalguns casos em recuos e revisões de medidas mais positivas que, por pressão e iniciativa do PCP, haviam sido aprovadas, de que é exemplo a reforma fiscal.

A realização de eleições legislativas antecipadas tornou-se uma inevitabilidade política por três ordens de razões: a primeira, pelo facto de o PS, confrontado com a demissão de Guterres, ter renunciado a formar governo com outra personalidade, tendo optado pela dissolução da AR e por eleições antecipadas ainda antes de qualquer consulta do PR aos partidos; a segunda, porque o PS, apesar da possibilidade teórica de outra solução institucional, dado existir na altura uma maioria de deputados do PS e do PCP na AR, sempre governou em aliança ou com acordos ora com o PSD, ora com o CDS-PP, ora com ambos, e nunca revelou qualquer disponibilidade para proceder a uma séria alteração das suas orientações e rumo político; a terceira, porque o governo do PS, em resultado da sua política, se encontrava profundamente enfraquecido e desgastado.

A estratégia do PS de procurar com o então novo líder, Ferro Rodrigues, branquear a política realizada pelos governos de António Guterres e explorar as preocupações com o eventual perigo do regresso da direita ao poder não triunfou.

Explorando demagogicamente as consequências desastrosas da política do governo PS e uma certa aspiração difusa e errónea de «mudança», muito favorecida também pela «dinâmica de vitória» que chamou a si explorando os resultados das autárquicas de 2001, o PSD, conseguindo iludir o eleitorado quanto à sua corresponsabilização com a política realizada pelo anterior governo do PS, obteve, ainda que por fraca margem, um resultado eleitoral que lhe permitiu formar governo.

Com a sua chegada ao governo, PSD e CDS-PP colocaram como objectivo estratégico fundamental prosseguir e intensificar a ofensiva desencadeada por sucessivos governos contra o regime democrático, pela restauração do capitalismo monopolista e o respectivo controlo do poder político. Dando um carácter global a esta ofensiva, desenvolvendo-a simultaneamente no plano político, económico, social e cultural, a acção e objectivos inscritos pela coligação governamental de direita ameaça gravemente, em aspectos fundamentais com a colaboração do PS, vertentes essenciais do regime democrático-constitucional e o Estado de Direito Democrático.

No plano político acentuaram-se as políticas de governamentalização da vida pública; enfraqueceram-se os mecanismos de fiscalização e controlo da actividade governativa; tornou-se prática corrente a partidarização e submissão a interesses privados do aparelho do Estado, transformado em coutada para satisfação de clientelismos; limitaram-se gravemente direitos democráticos.

No plano económico não só prosseguiu a privatização de sectores estratégicos, como se imprimiu um novo e qualitativo impulso à privatização em áreas como a saúde, o ensino, as águas e outros serviços públicos essenciais.

No plano social afirmou-se a política de classe a favor do grande capital, com a política de baixos salários e pensões, o aumento do desemprego, a redução e mesmo liquidação de apoios sociais, os ataques à Segurança Social e ao Serviço Nacional de Saúde.

No plano cultural, as políticas de mercantilização e de elitização dos bens culturais, a privatização e elitização do sistema de ensino, a redução substancial de apoios às actividades culturais atingindo particularmente as zonas do interior, forte ressurgimento de propaganda e difusão de concepções e ideologias reaccionárias em várias áreas da vida nacional.

O regime democrático sofreu importantes e negativas alterações, com o reforço do domínio do poder político pelo poder económico, com o assalto das multinacionais e de grupos económico-financeiros nacionais e internacionais a bens e serviços públicos, com a desvalorização do papel e dos meios da Administração Pública, com as práticas e as políticas que afastam e impedem a participação na vida política e cívica e na resolução dos problemas do país.

A «fusão» destes grupos e interesses económicos com órgãos de decisão política assumiu um carácter mais aberto e descarado com traços de capitalismo monopolista de Estado quando, a par da rotação de quadros e dirigentes dos partidos do governo entre altas funções do Estado e os Conselhos de Administração dos grandes grupos económicos e financeiros já anteriormente verificada, se acrescentou agora a entrega de pastas ministeriais de acordo com os interesses concretos desses grupos, de que são exemplo a Saúde entregue ao Grupo Melo ou a Segurança Social ao lobby das seguradoras e dos fundos de pensões. Ou ainda a participação directa ou indirecta dos Grupos, em particular através das grandes confederações patronais, em órgãos institucionais como a «comissão de concertação social» e conselhos consultivos do aparelho do Estado.

Expressão do desfiguramento do regime democrático é igualmente a proliferação de estruturas «informais», sem controlo democrático, mas que gozam de enormes privilégios, poder e influência.

Importantes decisões e orientações sobre a vida política, económica e social e mesmo respeitante à soberania e defesa nacionais, são preparadas e tomadas nas chamadas estruturas de «reflexão» das elites financeiras, nas múltiplas Fundações, organizações maçónicas, Opus Dei ou em estruturas supranacionais, como os grupos Trilateral, Bilderberg e Davos, nas quais têm assento regular destacados dirigentes do PS, do PSD e do CDS-PP.

Esta «funcionalidade informal», pretensamente identificada com a chamada sociedade civil, constitui um pântano de interesses ilegítimos, de tráfico de influências, de favorecimento de clientelas, negócios escuros e corrupção.

O aparelho do Estado tornou-se numa coutada para a satisfação de clientelismos partidários e dos grandes interesses económicos, tendo os governos do PS e do PSD/CDS-PP feito milhares de nomeações.

Em contraste com a progressiva desresponsabilização do Estado nas áreas sociais e na prestação do serviço público justificada a partir da ideia de uma pretensa necessidade de «menos Estado», assiste-se à crescente acção do Estado no sentido de favorecer e se constituir como uma poderosa alavanca ao serviço da apropriação e espoliação de bens públicos, da concentração, centralização do capital e da redistribuição da riqueza a favor dos mais ricos e poderosos.

A própria natureza do regime democrático está posta em causa. O governo afronta abertamente princípios constitucionais. Os sucessivos processos de revisão da Constituição, resultantes de acordos do PS com o PSD e o CDS-PP, têm visado constitucionalizar a ofensiva contra as conquistas de Abril, a limitação de direitos e a consagração de um regime do «Bloco Central».

A última revisão da Constituição aprovada em Abril de 2004, resultante de um novo acordo entre os partidos da direita e o PS, que inicialmente garantia só admitir uma revisão «cirúrgica» e mais uma vez negociada à margem do Parlamento, traduziu-se num novo e grave retrocesso no regime democrático-constitucional.

A aprovação por estes partidos de uma norma visando uma inaceitável submissão da Constituição Portuguesa, ao direito comunitário constitui um grave atentado e limitação à soberania nacional, componente inalienável do regime democrático saído da Revolução de Abril.

Assinalam-se igualmente como profundamente negativas a aprovação de uma norma que abre caminho a uma drástica redução do número de Deputados na Assembleia Legislativa Regional da Madeira, agravando problemas de proporcionalidade já existentes, e por contraste a recusa de alterações à lei eleitoral para a Região Autónoma dos Açores tendo em conta o risco de perversidade democrática que possibilita, decorrente do facto de um partido menos votado poder vir a ter a maioria dos deputados eleitos; ou ainda a rejeição da proposta de equiparação do regime de incompatibilidades dos deputados das Assembleias Legislativas Regionais aos da Assembleia da República permitindo a manutenção na Madeira de um regime favorável a promiscuidades inaceitáveis.

A ofensiva ideológica de há muito desenvolvida contra a Revolução de Abril, o seu significado e natureza, conheceu em torno das comemorações do seu 30.º Aniversário uma nova e significativa intensificação.

A operação para apresentar Abril como uma mera «Evolução» do regime constituiu uma nova tentativa para um ajuste de contas da direita, para uma reescrita da história destinada a branquear o fascismo e para iludir o profundo significado da Revolução e do que ela traduziu: um acto e um processo revolucionário que não apenas devolveu a liberdade ao povo, como constituiu uma ruptura com o regime que dava suporte ao fascismo, um momento de profundas transformações económicas e sociais, que foram em si mesmas condições dessa ruptura.

A luta pela valorização e aprofundamento das componentes essenciais do regime democrático-constitucional - política, económica, social e cultural - continua a ser, apesar das limitações e regressões que lhe têm sido impostas pela ofensiva da direita e das suas políticas, um imperativo que se coloca aos trabalhadores, às massas populares e às forças democráticas que se identificam com os valores e ideais de Abril.

A chamada «Reforma do Sistema Político», pela natureza antidemocrática dos seus objectivos e confessadas ambições e pelas leis já aprovadas - «Lei dos Partidos» e «Lei do Financiamento dos Partidos e das Campanhas Eleitorais» - representa um enorme retrocesso no regime democrático-constitucional.

A «reforma do sistema político», marcada, quanto às concepções de fundo e quanto à iniciativa, pela convergência e acordo entre o PS, PSD, CDS/PP, animada por apelos nesse sentido feitos pelo Presidente da República, é antes de mais um exemplo do entendimento do PS com os partidos de direita contra questões fundamentais para o regime democrático.

Alimentada e teorizada a pretexto da necessidade de combater o real descrédito e o progressivo distanciamento das populações da vida política, ela constitui não apenas um exercício de desresponsabilização política dos seus promotores, mas também, e sobretudo, o argumento atrás da qual se esconde e sustenta a ofensiva para impor novas limitações às liberdades e empobrecer o regime democrático.

Como a vida política bem testemunha, é no incumprimento das promessas eleitorais, na utilização do aparelho do Estado ao serviço do clientelismo partidário, na falta de transparência e de combate à corrupção, na promoção de uma política espectáculo que crescentemente afasta os cidadãos da participação na vida cívica e política, que reside a razão primeira do progressivo descrédito da política e das instituições democráticas em largos sectores da população.

A Lei dos Partidos, aprovada na AR pelos votos do PS, PSD e CDS, tendo como objectivo criar um modelo único de organização partidária, impondo por lei aquilo que deve caber à decisão soberana dos membros de cada partido livremente associados, constitui um grave e perigoso passo no sentido da consagração da ingerência do Estado na vida interna dos partidos.

Dirigida contra o PCP, a sua soberania, características e funcionamento democrático, esta lei ao consagrar o princípio da judicialização da vida partidária constitui um sério e intolerável atentado às liberdades e garantias democráticas.

A «Lei do Financiamento dos Partidos e das Campanhas Eleitorais», aprovada a pretexto da necessidade de se imprimir transparência e moralização na vida política e partidária, não só não dá resposta àqueles problemas, como ainda os agrava ao procurar impor um modelo de financiamento assente nos recursos do Estado, em claro benefício do PS e do PSD. Ao limitar a intervenção própria de cada partido para, na base da iniciativa dos seus membros e das suas organizações, como é o caso do PCP, angariar os meios financeiros necessários à sua actividade, com esta legislação procura-se confessadamente atingir a Festa do Avante!, uma das mais significativas fontes de receita do Partido e a mais importante iniciativa político-cultural realizada em Portugal.

O XVII Congresso, reafirmando a profunda vinculação do PCP ao princípio democrático e constitucional segundo o qual é nos militantes de um partido político, e só neles, que reside o poder soberano de decisão sobre as suas formas de organização interna, e sublinhando o carácter inadmissível das limitações de natureza financeira ao livre desenvolvimento da acção partidária do PCP, declara a sua determinação em dar combate e em lutar para a revogação destas leis antidemocráticas e anticonstitucionais.

No quadro de conhecidos e indisfarçáveis compromissos e do ciclo de alternância que tem permitido, ao PS e ao PSD, a função de se revezarem na condução de políticas de direita, não pode deixar de ser registado com preocupação o papel de algumas das propostas inscritas no âmbito da chamada reforma do sistema político enquanto instrumento de bipolarização. É o caso do anunciado propósito de PS e PSD em prosseguirem no caminho da criação forçada de um sistema político bipolar, introduzindo alterações de natureza antidemocrática nas leis eleitorais para as autarquias locais e para a Assembleia da República.

Sobre o poder local recaem igualmente as consequências de uma deliberada orientação para impor, convergentemente com as políticas e opções macroeconómicas que têm presidido à acção dos últimos governos, um conjunto de decisões que condicionam e limitam a sua actividade.

O sentido geral da acção governativa nos últimos anos tem tido como fio condutor uma política orientada para a redução da despesa pública com a satisfação das funções sociais do Estado, para a procura de receitas, que são negadas às autarquias, pelo Estado no aumento dos preços de serviços por elas prestados, para a pressão no sentido da entrega ao capital privado de funções públicas exercidas pela administração local.

As restrições ao crédito pela suspensão arbitrária da Lei de Finanças Locais em vigor desde 2001, a transferência de um conjunto de competências administrativas sem os devidos meios financeiros e o recente anúncio da intenção de revisão do regime financeiro das autarquias são expressão das orientações e opções da política governativa.

A defesa do poder local e das condições para a sua afirmação, enquanto espaço de intervenção democrática e de resolução de importantes problemas locais, é inseparável do combate às políticas neoliberais, do rumo da política nacional e da luta pela construção de uma política alternativa ao serviço do povo e do país. É inseparável também do combate nas autarquias a todas as expressões de gestão não democrática, de uso do poder para benefícios pessoais, de favorecimento do interesse privado e particular sobre o interesse público e colectivo, de colaboração ou cumplicidades com as políticas de direita dos governos.

O anúncio de uma nova tentativa para alterar o sistema eleitoral para as autarquias locais, negociada pelo PSD e o PS no âmbito da recente revisão constitucional, com o objectivo de acabar com a eleição directa e proporcional das câmaras municipais e garantir o controlo absoluto por parte da força maioritária, constituiria um muito grave empobrecimento da vida democrática com inegáveis prejuízos na transparência da acção das autarquias e nas condições de fiscalização e controlo da sua actividade.

A recente legislação do governo sobre entidades intermunicipais confirma a clara orientação de, beneficiando do vazio deixado pela não criação das regiões administrativas em 1998, manter concentrados e centralizados os processos de decisão e controlo das políticas de desenvolvimento regional.

Ao contrário do que o governo procura difundir, as chamadas comunidades urbanas e áreas metropolitanas não servem o poder local nem uma efectiva política de descentralização, constituindo um factor de esvaziamento dos municípios e das suas atribuições e competências.

Num quadro de comprovadas e óbvias limitações para encontrar na fórmula de associações de municípios, destinadas a exercer no essencial competências destes e sem os poderes efectivos para assumir a condução de políticas regionais, resposta ao inadiável processo de descentralização, o PCP reafirma a sua determinação em prosseguir a luta pela criação e instituição das regiões administrativas, necessárias e indispensáveis ao desenvolvimento regional, à racionalização administrativa e à participação democrática.

No que respeita às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, considerando um avolumar de dificuldades, resultantes de um contexto político marcado pela existência de maiorias absolutas, e no novo quadro constitucional das autonomias, são muitas as razões para as preocupantes perspectivas quanto à qualidade da vivência democrática. Para o PCP importa defender e aprofundar a democracia nas Regiões Autónomas, o que significa defender a autonomia e o desenvolvimento regionais e combater, no quadro das liberdades e direitos conferidos pela Constituição e pelo Estatuto, as tendências para o exercício absoluto e autoritário do poder pelos governos regionais. Também cada vez mais se impõe o desenvolvimento de uma nova fase do exercício da autonomia, visando valorizá-la e credibilizá-la em todas as suas vertentes, tornando-a eficaz no cumprimento das suas funções de combater e vencer as desigualdades sociais e as assimetrias locais, e de resolver os problemas específicos das populações das Regiões Autónomas. Impõe-se ainda o empenhamento do Estado Português, no quadro da União Europeia, com vista a garantir, na base das desvantagens persistentes que a insularidade distante provoca, a permanência de um enquadramento de apoio e de tratamento comunitário próprios, desenvolvendo de forma adequada as regras previstas para as regiões ultraperiféricas.

A prevista revisão das leis eleitorais para as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas, a realizar em 2005, deverá, simultaneamente, melhorar a proporcionalidade e garantir a possibilidade de representação plural naquelas Assembleias Legislativas.

A «reforma da Administração Pública», apresentada pelo governo PSD/CDS-PP, como a «reforma das reformas», prosseguindo e ampliando os projectos elaborados pelo governo PS, tem como objectivo essencial adequar a estrutura e as funções da Administração do Estado aos avanços do processo contra-revolucionário e preparar a privatização de diferentes sectores e serviços.

As alterações orgânicas produzidas em certos organismos públicos e as alterações do estatuto laboral dos trabalhadores do sector, em particular o contrato individual de trabalho, inserem-se numa estratégia de progressiva privatização da Administração Pública, de abertura de novas áreas e funções do Estado à intervenção privada, e de subordinação a uma lógica da empresarialização de praticamente todas as áreas sociais (saúde, ensino, segurança social), importantes serviços públicos (transportes, correios, água) e áreas essenciais do aparelho do Estado como notariado, impostos, indústria de defesa, etc..

A pretexto da necessária racionalização, eficácia e rentabilização de serviços públicos, e da necessidade de se fazer «emagrecer» o aparelho do Estado e as áreas da sua intervenção, desenvolve-se e estimula-se uma política de pilhagem de bens públicos, apropriação privada de fundos estruturais e de redistribuição da riqueza a favor do grande capital, num processo de intervenção do Estado a favor da concentração e centralização do grande capital, da restauração dos grandes grupos económicos e financeiros.

A implementação de uma «reforma da Administração Pública» orientada para reforçar o domínio do poder económico sobre o Estado, e limitar as funções do Estado a áreas residuais do capital privado ou às que este considere necessárias à defesa e prossecução dos seus objectivos, não pode deixar de suscitar a mais fundada inquietação.

A sua concretização traduzir-se-á em graves consequências sociais para parte significativa da população e atingirá os interesses e direitos dos trabalhadores da Administração Pública. E contribuirá igualmente para o desfiguramento do regime democrático e para a completa subversão dos princípios constitucionais que estabelecem como obrigações do Estado a prossecução do interesse público como função da Administração Pública, e a promoção da política económica, social e cultural.

Na área da justiça continuaram a acentuar-se traços de uma crise que há muito afecta o sistema judicial, reflexo de uma crise social muito profunda, e cuja responsabilidade cabe por inteiro aos sucessivos governos, à sua incapacidade e falta de vontade política.

O acesso ao direito e aos tribunais e à realização da justiça em condições de igualdade para todos os cidadãos, apesar de consagrado como direito fundamental, continua por efectivar, constituindo um factor de descredibilização da justiça.

Com a chegada ao poder da coligação PSD/CDS-PP a situação na justiça não mudou e os problemas agravaram-se. A morosidade da justiça e a prescrição de processos continuam; a justiça tornou-se mais cara com a decisão deste governo de aumentar as custas e taxas da justiça e alterar o regime de acesso ao apoio judiciário; continuam as disfunções no sistema prisional, com a sobrelotação das prisões; acentuou-se a deriva securitária, a pretexto do 11 de Setembro. Com a revisão da Constituição, por acordo do PSD/CDS-PP com o PS, foram feridos princípios e valores democráticos como a inviolabilidade do domicílio, a não aplicação de prisão perpétua e a soberania do poder judicial.

A desresponsabilização do Estado, numa linha privatizadora na área da justiça, conhece desenvolvimentos preocupantes em áreas como as do notariado, acção executiva, acesso ao direito, sistema prisional.

A acentuada degradação do sistema prisional e das políticas de reinserção social é uma consequência do populismo e da demagogia que caracterizaram a política do governo PSD/CDS-PP e que inviabilizaram as medidas e as reformas imprescindíveis à dignificação, modernização e humanização desta importante área de intervenção do Estado.

Ao contrário do que declarações pomposas e gratuitas, produzidas a propósito dos recentes processos mediáticos, procuram fazer crer o que a vida confirma é a persistência de uma justiça com um marcado cunho de classe, favorável aos ricos e poderosos. Avolumam-se os riscos de alterações de sentido negativo no sistema da justiça, com o objectivo de a tornar mais vulnerável e, sobretudo, mais ineficaz no combate à grande criminalidade.

Igualmente preocupantes são as tendências recorrentes e os casos de interferência mais ou menos visível do poder político com a independência do poder judicial, das magistraturas e dos órgãos de polícia criminal, bem como os perigos que espreitam a autonomia do Ministério Público e o princípio da legalidade na acção penal.

A Política de Segurança Interna prosseguida nestes anos, quer nas formas de organização e funcionamento quer no tipo de actuação das forças policiais, é parte integrante da ofensiva contra o regime democrático e os seus fundamentos.

Desde a sua chegada ao poder, o governo PSD/CDS-PP tem vindo a implementar um plano de reestruturação e reorganização deste importante sector do Estado, pondo em causa a autonomia e o quadro legal em que funcionam e intervêm as forças de segurança, o conteúdo democrático e os imperativos constitucionais de separação entre política de defesa e política de segurança interna, visando a concentração e militarização das forças e serviços de segurança e o reforço da sua componente repressiva. São expressão destas orientações as alterações à Lei de Segurança Interna, Lei de Segurança Privada e a Lei da Criação das Polícias Municipais.

A aprovação de leis e a criação de estruturas no quadro da UE ao nível das informações e de grupos operacionais, permitindo completa liberdade e impunidade na vigilância e perseguição policial contra o chamado inimigo interno, tornam-se particularmente preocupantes para as liberdades e garantias dos cidadãos.

Esta situação é tanto mais grave quanto se desenvolvem projectos de cariz securitário consubstanciando a intervenção das Forças Armadas em missões de segurança interna, o envolvimento das polícias na recolha de informações e vigilância de movimentos e organizações sociais, a reestruturação e reorganização das Forças e Serviços de Segurança com base num «novo modelo de policiamento» e em mais exigência de «autoridade do Estado».

Os governos do PSD/CDS-PP têm sido incapazes de implementar um sistema de Protecção Civil dotado de meios e equipamentos, de eficácia e estrutura adequadas, insistindo numa concepção governamentalizadora e militarista e numa orgânica pesada e desmobilizadora do poder local, das populações e dos profissionais que intervêm na Protecção Civil, fomentando e agravando situações conflituais.

A reestruturação em curso dos Serviços de Informações - que mais uma vez conta com o acordo do PS - visa torná-los num instrumento da estratégia e intervenção imperialistas da administração Bush e acentuar a respectiva governamentalização, partidarização e opacidade, facilitando o caminho a novas derivas de espionagem, escutas e infiltrações ilegais e inconstitucionais contra o chamado «inimigo interno» e menorizando a prevenção da criminalidade organizada e de ameaças emergentes contra o regime democrático e a soberania nacional.

A política de Defesa Nacional e Forças Armadas manteve, no essencial, os bloqueios nos planos orçamental, legislativo e de pessoal.

Aprofundando as relações de submissão e dependência face aos EUA, o governo PSD/CDS-PP recuperou, no plano conceptual, a doutrina de segurança nacional, misturando os conceitos de segurança interna com os de defesa nacional ao serviço dos seus próprios objectivos político-ideológicos.

O crescente envolvimento militar externo, incluindo em estruturas não tradicionais, bem como o papel de Portugal junto dos países da CPLP, não no sentido do reforço da cooperação técnico-militar mas no do incentivo à constituição de uma força militar de intervenção, é determinado não pela condução de uma política autónoma de defesa mas sim pelos objectivos e interesses da NATO.

Ao contrário do que a densa cortina de propaganda que o governo PSD/CDS-PP promove para dar a imagem que a despesa com a Defesa cresceu em correspondência com as necessidades nacionais, a verdade é que os ramos das forças armadas se debatem com dificuldades financeiras crescentes, traduzidas em atraso nos pagamentos aos militares e em dívidas a fornecedores, e se mantêm e se agravam os problemas ligados à satisfação de antigas e justas reivindicações dos militares seja no plano das carreiras, do estatuto remuneratório, da formação e dos sistemas de saúde e apoio social.

Ignorando a experiência internacional, a legítima controvérsia que no plano nacional se manifestou e os reais interesses nacionais, o governo optou, com a conivência do PS, pelo fim do Serviço Militar Obrigatório e a consumação da profissionalização das Forças Armadas.

As opções governamentais em matéria de aquisição de material e equipamentos e os processos de privatização e desmantelamento dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas, estão a amarrar Portugal não só a avultados compromissos que comprometem o futuro por muitos anos, como a inviabilizar quaisquer outras soluções que se afigurem necessárias à defesa nacional. Num quadro em que algumas destas opções, não só não constituem uma prioridade como inviabilizam a concretização de programas de maior e mais urgente prioridade para o interesse nacional.

A política externa tem sido caracterizada por um crescente alinhamento com os círculos mais reaccionários e belicistas do imperialismo, de que o envolvimento de Portugal na invasão e ocupação do Iraque e a «cimeira da guerra» realizada na Base Militar das Lajes são exemplo, por um afunilamento das relações internacionais com os países da União Europeia e os Estados Unidos, no quadro de uma indisfarçável orientação «atlantista» e por um marcado e prejudicial preconceito neocolonial com os países africanos de expressão portuguesa.

 

2.4. Situação na comunicação social

No período em análise, o sector da comunicação social continuou, em termos globais, a ser marcado pelo desenvolvimento de anteriores tendências de fundo, com inquietantes reflexos e diversificadas consequências sobre a qualidade e o pluralismo da informação, os direitos e autonomia dos profissionais da informação e a própria vida democrática do país.

Neste âmbito, são de assinalar de forma interligada e com profundas relações entre si:

a crescente concentração da propriedade dos media num reduzido número de grandes grupos económicos organizados numa estratégia multimédia, o que constitui hoje um problema crucial da democracia portuguesa, sendo por de mais significativa a oposição manifestada pela maioria PSD/CDS-PP à aprovação de legislação que condicionasse e travasse esse processo de concentração;

a continuada degradação da situação laboral da maioria dos jornalistas e outros profissionais de informação e da comunicação, acarretando consideráveis pressões e constrangimentos à sua independência, isenção profissional e ao exercício dos seus direitos;

sem prejuízo da existência de excepções e situações diferenciadas, o abaixamento da qualidade da informação e da programação sob a influência de critérios comerciais e de luta pelas audiências, com o predomínio da superficialidade e do sensacionalismo e arrastando consigo situações limite de acentuada degradação cívica, profissional e humana com importantes reflexos a nível ideológico e das atitudes e valores sociais e políticos;

o prosseguimento da ofensiva contra o sector público da comunicação social (designadamente na televisão e na rádio), bem patente nas concepções inspiradoras da alegada «reestruturação» imposta pelo governo PSD/CDS-PP na RTP e na RDP, que, sem prejuízo de melhorias pontuais facilitadas pelo carácter absolutamente incompetente e desastroso da gestão pelos governos PS deste dossier, visou sobretudo favorecer as estações privadas (nomeadamente pela redução das receitas de publicidade na RTP e sua exclusiva afectação ao serviço da dívida), esvaziar a produção própria da empresa e preparar a retirada do 2.º canal da esfera da RTP como passo preparatório da sua futura privatização, matéria em que entretanto o governo foi obrigado a recuar;

a persistência de critérios e práticas gravemente discriminatórios e ofensivos do pluralismo (que, em regra, no plano político-partidário, atingem especialmente o PCP) num quadro em que se acentua poderosamente o peso e a influência dos órgãos de comunicação social na determinação da agenda, dos temas e do curso da vida política nacional e em que se acentuam as pressões e interferências do governo PSD/CDS-PP sobre a comunicação social.

Neste quadro geral, assume uma importância decisiva o apoio e estímulo à luta dos jornalistas e outros profissionais de informação contra a precarização laboral e pela afirmação dos seus direitos, autonomia e isenção e por uma informação vinculada ao interesse público; a defesa de soluções legislativas que enfrentem corajosamente a questão da crescente concentração da propriedade; a defesa e renovação de um sector público subordinado a critérios de isenção, pluralismo e qualidade; o apoio e valorização das rádios locais e da imprensa regional; e a luta para que a entidade reguladora que substituirá a Alta Autoridade para a Comunicação Social (extinta na última revisão constitucional) detenha meios e poderes reais e uma composição pluralista, como é acrescidamente indispensável para a sua importante missão.

 

2.5. A política necessária

A política necessária, que o PCP defende, de acordo com o seu Programa, implica a ruptura com as políticas de direita seguidas por sucessivos governos e exige a realização de uma política que tenha como grandes objectivos estratégicos resolver os principais problemas do país, responder aos anseios e aspirações da maioria dos portugueses e aprofundar o regime democrático:

Uma política económica ao serviço do progresso de Portugal, de um país desenvolvido em todo o seu território com a salvaguarda do ambiente e da melhoria das condições de vida do povo. Uma política em que prevaleça o interesse nacional, combatendo a destruição do aparelho produtivo e defendendo a produção nacional; pondo fim às privatizações e ao desmantelamento e liberalização de serviços públicos essenciais; defendendo como fundamental um sector público forte, dinâmico e eficiente; promovendo o desenvolvimento científico e tecnológico; apostando no crescimento económico sustentado; concretizando uma mais justa e eficaz política fiscal e uma política orçamental sem os condicionalismos do Pacto de Estabilidade; determinado pelos objectivos estratégicos no plano económico e social; combatendo as assimetrias regionais e agressões ambientais; diversificando as relações económicas internacionais e libertando o país de imposições externas.

Uma política social que defenda e amplie os direitos sociais, garanta o trabalho com direitos e emprego de qualidade e uma mais justa repartição da riqueza nacional, revalorizando os salários e as pensões, defendendo o sistema público e universal de Segurança Social e o Serviço Nacional de Saúde universal e geral, reforçando os serviços de apoio social, concretizando a igualdade entre homens e mulheres, a integração das comunidades imigrantes e o combate a concepções e práticas racistas e xenófobas.

Uma política cultural que, entendendo a cultura como factor de desenvolvimento, de transformação da vida e de emancipação colectiva e individual, defenda o património e a afirmação das identidades culturais do país, promova uma efectiva democratização e acesso ao conhecimento, à criação e à fruição culturais, afirme e projecte a língua e a cultura portuguesas no mundo. E uma política de educação e ensino que assegure efectiva igualdade de oportunidades de acesso a uma formação humanística, científica e artística, garantindo a todos um ensino público, gratuito, democrático e de qualidade, assegure aos professores e educadores o exercício de uma actividade profissionalmente estimulante e socialmente reconhecida, integre as escolas e estabelecimentos de ensino numa perspectiva de real progresso e desenvolvimento nacional.

Uma política que assegure a defesa e o reforço do regime democrático, credibilizando as funções políticas e das instituições públicas, realizando reformas verdadeiramente democráticas do Estado e da Administração Pública, combatendo a corrupção e o tráfico de influências; realizando uma política de segurança interna assente na legalidade democrática e na prevenção e combate ao crime e uma política de justiça que assegure a igualdade dos cidadãos perante a lei; restabelecendo o domínio do poder político sobre o poder económico; estimulando a participação dos cidadãos na vida cívica, social e política.

Uma política de Paz, cooperação e amizade com todos os povos do mundo e por um novo rumo para a integração europeia com base em Estados soberanos e iguais, assumindo a independência e soberania nacionais como valores inalienáveis, assente em relações externas amplas e diversificadas; assegurando uma política de defesa em conformidade com estes princípios e uma política externa autónoma e independente do imperialismo; combatendo os blocos político-militares; lutando pelo desarmamento e pela dissolução da NATO.

Os problemas com que o povo português e Portugal se confrontam nestes primeiros anos do século XXI têm solução. O PCP, vinculado aos valores de Abril, assume a responsabilidade de, no tempo que se aproxima, pela sua intervenção e luta, apresentar propostas e caminhos alternativos aos que a política de direita vem impondo ao país, para afirmar uma política alternativa.

Com confiança em que o país não está condenado às mesmas e erradas políticas que avolumam e agravam os problemas e as condições de vida do povo; confiança em que não só uma outra política é possível como se afirmará, mais cedo ou mais tarde, como indispensável; confiança em si próprio e nos trabalhadores e nas suas lutas para a construção de uma política alternativa, afirmar que é possível um país mais desenvolvido, mais solidário e mais justo.

 

3. Luta de Massas

3. LUTA DE MASSAS E INTERVENÇÃO DO PARTIDO, CONDIÇÕES PARA UMA ALTERNATIVA

3.0. Introdução
3.1. Arrumação das forças de classe
3.2 Os trabalhadores como motor da luta de massas
3.3. A luta de outras camadas e grupos sociais e das populações
3.4. A intervenção do PCP no combate à política de direita
3.5. A classe operária, os trabalhadores e as suas organizações de classe
3.6. Outras organizações e movimentos de massas
3.7. Acção de massas e intervenção nas instituições
3.8. Batalhas eleitorais
3.9. Quadro partidário
3.10. A luta por uma alternativa de esquerda
3.11. Reforço do PCP - uma questão fundamental


3.0. Introdução

A luta de massas, com destaque para a luta dos trabalhadores, em que novas camadas de assalariados se têm vindo a incorporar, dando maior dimensão e mais força à luta, constituiu um factor determinante no combate à política de direita e um elemento insubstituível na defesa dos direitos dos trabalhadores e na elevação da sua consciência social e política.

Foram quatro anos de intensa luta em que o Partido interligou a acção de massas, a acção institucional e a intervenção geral do Partido, e que confirmam a importância da ligação dialéctica entre a capacidade de luta dos trabalhadores e das frentes sociais e a influência política, ideológica e a capacidade organizativa das forças do Partido.

Num quadro em que a natureza exploradora e agressiva do capitalismo se manifesta com particular violência e se agudiza a luta de classes, a validade e a actualidade da luta de massas e, em particular, a luta dos trabalhadores, a sua dimensão, diversidade e grau de convergência, as forças e os sectores que a protagonizam e dinamizam, as causas e objectivos que levam à sua realização, reclamam do Partido que temos e somos a análise aprofundada do quadro político, económico e social em que se desenvolve, das dificuldades com que se confronta e das potencialidades que encerra.

 

3.1. Arrumação das forças de classe

A análise da arrumação das forças de classe na sociedade portuguesa é um elemento de grande importância para a intervenção do Partido. Esta análise tem suporte na aplicação de conceitos e métodos, na experiência e observação directa resultante da acção partidária e em indispensáveis elementos estatísticos, como os censos da população, que no entanto não estão isentos de fragilidade.

No XIV Congresso, em 1992, procedeu-se a uma análise global que adiantou pistas de metodologias e aprofundou dados e caracterizações. Uma contribuição sobre estas matérias foi também dada pelo Encontro Nacional do PCP sobre a Acção e Organização do Partido nas Empresas e Locais de Trabalho, em 2002.

A Resolução Política do XIV Congresso refere que «as análises e conclusões avançadas devem ser consideradas como grandes linhas de abordagem da realidade social portuguesa, sem pretensões a um julgamento definitivo, pontos de partida para análises mais completas e integradas, a realizar obrigatoriamente pelo colectivo partidário». Tal como então, também as análises que agora se adiantam implicam aferição, aprofundamento e desenvolvimento.

Em particular é preciso ter presente que a questão da arrumação das forças de classe e da definição objectiva da pertença de classe se associa, nas exigências da acção partidária, à necessidade de um maior aprofundamento do conhecimento dos factores objectivos e subjectivos que hoje promovem e condicionam a formação da consciência de classe.

A população total residente em território português, nacional e estrangeira, aumentou, nos dez anos que medeiam os censos de 1991 e 2001, cerca de 5%, 9 milhões e 867 mil, para 10 milhões e 356 mil habitantes. A população activa aumentou cerca de 13,5%, tendo a taxa de actividade crescido de 44,6% para 48,2% e a percentagem de mulheres de 41% para 45%.

O assalariamento progrediu mais rápido do que o crescimento da população activa, tendo o número de trabalhadores por conta de outrém recenseados aumentado cerca de 20%, de 3 milhões 169 mil, em 1991, para 3 milhões 794 mil, em 2001.

A sociedade portuguesa apresenta-se, em termos de classe, fortemente polarizada. Num pólo, a classe operária, a que se agrega o conjunto dos assalariados, todos os explorados, a esmagadora maioria da população. No outro pólo, a burguesia monopolista, a grande burguesia, uma ínfima minoria que comanda o sistema de exploração.

A classe operária é fundamentalmente constituída pelos trabalhadores assalariados em que é dominante o trabalho directamente produtivo, exercendo a sua actividade nas esferas económicas de produção material, onde não desempenham funções superiores de direcção ou de mera vigilância no enquadramento de outros trabalhadores.

No âmbito dos assalariados recenseados em 2001 identificam-se, desde logo, três destacamentos tradicionais da classe operária:

o proletariado industrial, incluindo as minas, a produção de energia, as obras públicas e os transportes, com 1 milhão e 480 mil efectivos empregados, numa aproximação por defeito. Aumentou ligeiramente a sua dimensão em cerca de 90 mil relativamente a 1991, mas diminuiu o seu peso de 44% para 39% na massa de assalariados e de 34% para 32% na população activa;

o proletariado agrícola, incluindo a criação de animais e os trabalhos florestais, com cerca de 90 mil efectivos empregados. Prosseguiu o seu declínio, reduzindo o seu peso, em relação a 1991, de 3,8% para 2,4% na massa de assalariados e de 3,1% para 2,1% na população activa;

o proletariado das pescas, incluindo a aquacultura, com cerca de 13 500 efectivos empregados, que reduziu para metade os seus efectivos em relação a 1991.

O número de operários avaliado numa acepção restrita e que considera apenas os números dos seus membros com emprego na indústria, agricultura e pescas, passou, entre os censos de 1991 e 2001, de cerca de 1 milhão e 537 mil para 1 milhão e 582 mil assalariados.

É, no entanto, importante não restringir a caracterização da classe operária a essa visão clássica e restritiva e ter consciência de que o trabalho produtivo actual atravessa os serviços e abrange uma parte crescente do trabalho intelectual.

Faz sentido considerar mais um destacamento da classe operária, o proletariado dos serviços, o conjunto dos operários do sector terciário, à excepção dos transportes, com cerca de, numa primeira aproximação por excesso, 400 mil efectivos empregados. Este grupo aumentou a sua dimensão aproximadamente em cerca de 95 mil, entre 1991 e 2001, acompanhando o crescimento da massa de assalariados, de que representa cerca de 10%, e elevando ligeiramente o peso na população activa para cerca de 8,5%.

A automação, a robotização, a informatização, as novas tecnologias, a colectivização e a especialização das funções de direcção e gestão, originam uma maior complexidade na concertação dos esforços dos trabalhadores na produção material e a integração de novos assalariados com qualificações e actividades intelectuais mais elevadas. Torna-se mais imprecisa e movediça a fronteira entre actividades produtivas e improdutivas de mais-valia e a fronteira das actividades que asseguram a colecta de mais-valia.

O conjunto dos assalariados intelectuais e quadros técnicos cuja situação os aproxima em geral da classe operária, uma parte, intervindo directamente na produção (ainda que, no caso de alguns, em funções de concepção, planeamento e investigação aplicada), subordinada aos ritmos, às metas, às exigências e ao comando da alta direcção das empresas, integra-se objectivamente na classe operária.

Essa parte dos assalariados intelectuais e quadros técnicos, transversal a toda a produção, engloba trabalhadores que exercem predominantemente funções intelectuais, altamente qualificadas, cuja execução exige, em geral, instrução de nível superior ou pelo menos secundária especializada e reúne um número crescente de efectivos, distribuídos pelos vários sectores económicos.

Parte minoritária, mas significativa e crescente, da classe operária em Portugal é constituída por trabalhadores imigrantes. Não será ousado admitir que mais de um sétimo da classe operária no nosso país é já constituído por estrangeiros. Este movimento tem-se acentuado com a vinda de trabalhadores do Leste da Europa e do Brasil. O racismo e a xenofobia funcionam como arma do patronato para dividir os trabalhadores, aumentar a exploração e enfraquecer as suas lutas, pelo que a consciência da importância da unidade dos trabalhadores, independentemente da origem étnica e nacional, se torna ainda mais premente.

Considerada numa visão mais ampla, integrando a componente dos serviços e parte dos assalariados intelectuais e quadros técnicos, a classe operária, estimando-se estatisticamente por defeito, aumentou o número dos seus membros e deve ter passado, entre os censos de 1991 e 2001, de cerca de 1 milhão e 845 mil, para 1 milhão 985 mil assalariados. A este número há que acrescentar muitas dezenas de milhar de imigrantes clandestinos, parte dos falsos trabalhadores independentes e ligeiramente menos de metade da população desempregada, o que dá um total de pelo menos 2 milhões 145 mil efectivos.

A percentagem de operários na população activa, sempre numa estimativa por defeito, reduziu-se, entre 1991 e 2001, de 45% para 43%. Actualmente cerca de um em cada dois assalariados é operário. A diminuição da percentagem de operários no total de assalariados deve-se essencialmente ao crescimento da massa assalariada em funções não produtivas, tendência geral da composição orgânica do capital no capitalismo desenvolvido, que traduz fenómenos cruzados, como o aumento da produtividade social do trabalho produtivo, o aprofundamento da exploração à escala internacional, as dificuldades de valorização do capital e a intervenção do Estado a favor dos monopólios.

A desindustrialização, com a destruição e fecho de grandes empresas nacionais, a utilização das novas tecnologias, a fragmentação, externalização e subcontratação da produção e o emagrecimento de efectivos das grandes empresas, invertem a tendência para as grandes concentrações operárias por efeito da acumulação de capital, dificultando a formação da consciência de classe e a mobilização na acção reivindicativa. Isto, contudo, não nega a realidade de grandes concentrações operárias em algumas zonas e regiões, resultantes da crescente interdependência da vida social e constituindo focos de irradiação da influência do proletariado.

A classe operária em Portugal apresenta-se, à entrada deste novo século, numerosa mas menos representada no conjunto dos assalariados, mais diversificada étnica e nacionalmente, mais precarizada laboralmente, sem alterações significativas na sua composição de género, com cerca de 33% de mulheres, mais envelhecida, mais (mas muito insuficientemente) qualificada, menos concentrada, mais heterogénea, com diminuição ligeira do peso dos seus efectivos industriais e diminuição substancial, a caminho de se tornar residual, do peso dos seus efectivos agrícolas e das pescas na população activa.

Aumenta a complexidade da composição da classe operária, persistem e agravam-se em alguns casos contradições no seu interior que dificultam a sua coesão e unidade, a formação da consciência de classe e a acção colectiva. As classes sociais não são categorias estatísticas, pelo que, longe de esgotar o seu potencial revolucionário, a classe operária deve ver avaliado o seu peso, para além da sua expressão numérica, pelo seu papel decisivo na produção de riqueza, pelo seu confronto objectivo com o mecanismo constitutivo da acumulação capitalista, a extracção de mais-valia, e pela sua intervenção na luta social e política.

O outro grande sector dos assalariados, designado genericamente por camadas intermédias assalariadas, é constituído basicamente por todos os assalariados não operários. Excluem-se os falsos assalariados, que pertencem às camadas superiores da burguesia, como os directores e os membros dos conselhos de administração das grandes empresas, e aqueles que, com funções superiores de direcção e enquadramento, nas grandes empresas privadas ou na administração e instituições públicas, são os seus auxiliares directos na manutenção do regime de exploração. Muito heterogéneas internamente, incluem a esmagadora maioria dos assalariados administrativos, do comércio e dos serviços e a esmagadora maioria dos assalariados das profissões intelectuais e científicas. Estes assalariados não intervenientes na produção material, improdutivos do ponto de vista da criação da mais-valia, mas despojados de meios de trabalho, são obrigados a viver da venda da sua força de trabalho a níveis de exploração crescentes.

Este sector dos assalariados, incluindo desempregados, aumentou perto de meio milhão entre 1991 e 2001, atingindo cerca de 1 milhão 820 mil, representando 44% da massa assalariada e 37% da população activa, excluindo, pela sua especificidade, as forças armadas. Um crescimento superior ao do assalariamento, que traduz a continuada extensão dos serviços pessoais e colectivos, nomeadamente estatais, e as dificuldades crescentes de realização da mais-valia, empolando o sector financeiro e exigindo um destacamento crescente de assalariados para as funções comerciais, de publicidade e administrativas das empresas. A percentagem das mulheres aumentou de 57% para 61%. Muitos trabalhadores são envolvidos em novas formas de trabalho, como o trabalho em rede, o teletrabalho, o trabalho à distância, mas isso não nega nem o assalariamento de facto de alguns falsos trabalhadores independentes nem, tal como sucede com os operários, apaga a manutenção e mesmo o desenvolvimento de grandes concentrações físicas de assalariados não operários, por exemplo nas universidades e hospitais.

Os empregados de escritório ou comércio, dos serviços pessoais e gerais, trabalham quase tantas horas como os operários em geral, em certos casos mais, têm cada vez menor autonomia, vêem frequentemente o seu trabalho desqualificado, exigindo apenas um mínimo de competências ou o domínio de técnicas normalizadas simples, as tarefas especializadas afuniladas, repetitivas e compartimentadas, as qualificações desperdiçadas, as remunerações contidas, a segurança no emprego degradada. As condições de vida e de trabalho tendem a alinhar-se pelas dos operários em geral. Mesmo subjectivamente, desapareceu em larga medida a consciência de pertencer a uma «classe» à parte. Esta realidade revela a agregação de um conjunto de assalariados dos serviços à classe operária, além dos que nela se integram, e constitui um elemento que reforça a actualidade da política de alianças da classe operária com as camadas intermédias.

Com um peso crescente nos assalariados em geral estão os intelectuais e quadros técnicos. Este é um grupo social transversal a todas as classes, muito diferenciado do ponto de vista da sua relação com os meios de produção e distribuição e do seu lugar no sistema de produção social. Os seus membros distinguem-se na sua actividade profissional, no papel que desempenham na organização social do trabalho, pelo exercício predominantemente de funções intelectuais complexas, altamente qualificadas. Enquanto grupo social, o traço mais relevante da sua evolução recente é o crescimento do seu peso na população activa e na massa assalariada.

Entre 1991 e 2001, o total dos intelectuais e quadros técnicos empregados, assalariados e não assalariados, excluindo os directores e gerentes de pequenas empresas, aumentaram cerca de 55%, para quase 960 milhares.

No mesmo período, os intelectuais e quadros técnicos assalariados aumentaram cerca de 70%, ultrapassando os 850 mil empregados. Acentua-se a exploração a que estão sujeitos. Degrada-se o seu estatuto social, profissional, laboral e remuneratório, reduzem-se as suas funções de enquadramento e de comando, diminui o seu papel hierárquico, são cada vez mais excluídos das decisões, limitam-se as suas perspectivas de carreira, desqualifica-se em muitos casos o seu trabalho, com a especialização redutora e castradora das suas potencialidades, desaproveitam-se as suas vocações e formação, instrumentaliza-se a sua intervenção social e cívica.

Verifica-se uma aproximação geral e mesmo uma integração objectiva e crescente de efectivos da intelectualidade na classe operária. Subsistem, no entanto, diferenças substanciais em relação aos restantes assalariados, que lhes dificultam a tomada de consciência social, que importa ter em conta na acção política. O seu papel na organização social, a sua participação na produção, a natureza da sua actividade, o seu modo de trabalhar, o montante e as formas da sua remuneração, as suas funções de autoridade, a sua ligação e contactos com a direcção das empresas e organismos, as suas possibilidades de ascensão na carreira, a sua formação e qualificações, as suas necessidades, a sua psicologia e os seus percursos sociais, continuam, ainda que de forma menos marcada, a distingui-los.

Fora dos assalariados, as camadas intermédias incluem a pequena burguesia e camadas inferiores da burguesia. A pequena burguesia é a classe social constituída pelos trabalhadores por conta própria, possuindo meios de produção ou distribuição, recorrendo fundamentalmente a mão-de-obra familiar e, regular ou excepcionalmente, a um número muito reduzido de assalariados. As camadas inferiores da burguesia são a fracção da burguesia constituída pelos micro empresários (de empresas com menos de 10 trabalhadores, que os censos permitem distinguir) e pelos pequenos empregadores, com profissões intelectuais e científicas ou técnicas, da indústria, do comércio e serviços ou do sector primário.

As camadas intermédias não assalariadas, incluindo desempregados, diminuíram um pouco mais de 10%, entre 1991 e 2001, para cerca de 810 milhares de efectivos, numa estimativa por excesso, reduzindo o seu peso na população activa para cerca de 16%. A percentagem de mulheres mantém-se praticamente constante, cerca de 35%. Esquematicamente, duplicou o número de pequenos patrões (incluindo os micro empresários empregadores), que, contando com os desempregados e familiares não remunerados, atingiram cerca de 480 milhares. Em contrapartida, a pequena burguesia encurtou-se substancialmente, com a sua fracção não empregadora reduzida a metade, menos de 330 milhares. Mesmo tendo presente a indefinição e mobilidade sociais, o intervalo dos censos forneceu uma demonstração concludente da instabilidade social da pequena burguesia.

O pequeno patronato vê cada vez mais destruída a miragem da independência económica. Aprofunda-se a sua integração, em posição subordinada, nomeadamente por via da subcontratação, na actividade do grande capital, por conta de quem explora o trabalho assalariado.

No campo, com a permanência de uma estrutura fundiária dual, explorações familiares dominantes no Norte e Centro e grandes explorações de dimensão latifundiária e formas empresariais capitalistas no Sul (mais de 50% do número de sociedades agrícolas do país, ocupando mais de 90% da área explorada globalmente sob essa forma e 25% da área agrícola do Alentejo e Ribatejo - incluindo o Oeste), assiste-se à diminuição acentuada do campesinato. Os recenseamentos agrícolas de 1989 e 1999 registaram uma diminuição em 37% da população agrícola familiar, para 1 milhão 235 mil e, em 44% da sua parte que trabalha a mais de meio tempo na exploração, para cerca de 360 milhares. Em 1999, 83% da população agrícola familiar trabalhava na exploração, mas apenas 29% mais de 20 horas semanais, o que revela um enorme grau de pluriactividade.

Envelhecido (os agricultores familiares tinham uma idade média de aproximadamente 57 anos em 1999), desfalcado pelas migrações para os centros urbanos e o estrangeiro, obrigado parcialmente a vender a força de trabalho para sobreviver, esmagado pela produção estrangeira e a grande distribuição comercial, acusando fortemente o choque da integração comunitária, o campesinato acelerou a queda do seu peso na população activa.

A classe social dominante do regime social é a burguesia, constituída fundamentalmente pelos proprietários dos meios de produção e de troca, que vivem da exploração do trabalho alheio. Compreende os dirigentes e grandes accionistas das empresas e sociedades financeiras; os empresários de todos os sectores e os patrões que empregam trabalho assalariado, salvo quando em número muito reduzido; os especuladores, nomeadamente da bolsa; os grandes detentores de acções, obrigações e outros activos financeiros; os grandes promotores e proprietários imobiliários; os grandes proprietários rurais; todos quantos vivem de grandes rendimentos da propriedade.

Considera-se, no âmbito da burguesia, o conjunto dos altos funcionários - directores-gerais, de serviços e actividades de empresas e instituições, dirigentes de topo da função pública, comandos superiores das forças armadas e de segurança - que, apesar de assalariados, pertencem na realidade à burguesia ou são os seus auxiliares directos no enquadramento e comando da produção, distribuição, repartição, vida e ordem sociais.

A burguesia sem o pequeno patronato, conjuntamente com os seus auxiliares directos, aumentou, de 1991 para 2001, em quase metade os seus efectivos na população activa, elevando o seu peso aproximadamente de 1,9% para 2,5%. A percentagem de mulheres na burguesia, sem o pequeno patronato e incluindo os auxiliares directos, aumentou notavelmente de 19% para 28% entre os censos, mas o aumento, ainda significativo, teria sido menor se excluíssemos os auxiliares. O pequeno patronato - os micro empresários mais os pequenos empregadores - reforça a crescente presença das mulheres na burguesia activa.

As camadas superiores da burguesia, a burguesia monopolista, reforçaram, desde o início da década de 90, o seu poderio económico e, por via deste, a sua influência na vida social e política, bem evidenciada na concentração da propriedade dos principais media nacionais em meia dúzia de grandes grupos, reduzindo drasticamente o espaço para a expressão das necessidades e reivindicações sociais.

A progressiva concentração do volume total de negócios nas grandes empresas é expressão da crescente concentração económica do grande capital. As grandes empresas, com pelo menos 250 pessoas ao serviço ou um volume de negócios igual ou superior a 40 milhões de euros, reforçaram a parte que lhes cabe no volume de negócios de todas as empresas para cerca de 48,3% em 2003.

Elucidativo, por um lado, da crescente terciarização da economia portuguesa e, por outro, do crescente poder económico da burguesia comercial, bem visível na grande distribuição, é o facto do crescimento da parte das grandes empresas comerciais no volume nacional de negócios ter crescido, entre 1993 e 2003, aproximadamente ao dobro do ritmo da parte das grandes empresas em conjunto. As grandes empresas comerciais representam cerca de 31% do volume de negócios e as empresas financeiras cerca de 17% do volume de negócios das grandes empresas, que são esmagadoramente inseridas ou controladas por grandes grupos económicos e financeiros.

Menos de 60 grupos económicos, na sua esmagadora maioria privados ou quase integralmente privatizados, têm uma facturação equivalente a cerca de 60% do PIB. Os maiores lucros resultam não só de melhorias de produtividade, de fornecimentos, capitais e créditos mais baratos, de apropriação de patentes, alvarás e outras vantagens, de reduções e isenções fiscais, de encomendas, subvenções e outros favores do Estado, da especulação económica, financeira e imobiliária, e de melhores assessorias jurídicas, em relação às outras empresas, mas também da capacidade de elevar o preço de venda acima do preço de produção, num verdadeiro sobrelucro de monopólio.

Os altos dirigentes, os membros dos conselhos de administração, os grandes accionistas dos grandes grupos económicos comandam, em crescente inter-relação e dependência dos estados-maiores das transnacionais estrangeiras, a economia nacional. O grande capital nacional inter-relaciona-se, entrelaça-se, interpenetra-se, integra-se e funde-se crescentemente com o grande capital transnacional, que ganha posições e domínio sobre a economia e a sociedade portuguesas. Não obstante as suas contradições e competições internas, a burguesia monopolista é o principal inimigo do proletariado e seus aliados, a luta contra ela é também uma luta pela independência e soberania nacionais, susceptível de chamar à acção comum sectores da própria burguesia.

De 1991 a 2001, a população sem actividade económica diminuiu de 5 milhões 469 mil para 5 milhões 366 mil, tendo diminuído a sua percentagem de mulheres de 60% para 58%, mas é preciso ter em conta que, entre as duas datas, a população activa passou a contabilizar-se, em vez dos 12 anos, a partir dos 15.

A população inactiva com 12 ou mais anos em 1991 e 15 ou mais anos em 2001 também regrediu de cerca de 3 milhões 980 mil para 3 milhões 710 mil, tendo diminuído a sua percentagem de mulheres de 65% para 62%. No seu âmbito, identificam-se quatro grupos principais, considerando-se a sua evolução, entre as duas datas em que a posição de classe dos seus efectivos é geralmente determinada pela situação profissional anterior, ou pela dos agregados domésticos onde se inserem:

Os reformados, aposentados ou na reserva aumentaram 16% os seus efectivos, para 1 milhão 935 mil, detendo como principal meio de vida pensões ou reformas.

Os estudantes, contabilizados a partir dos 15 anos, com cerca de 680 mil efectivos, mais do que duplicaram no ensino superior e vivem, em mais de 97% dos casos, principalmente a cargo da família.

Os domésticos, quase na totalidade mulheres, reduziram-se em um terço, para menos de 615 mil, devido ao aumento da taxa de actividade feminina.

Os incapacitados permanentes para o trabalho, aumentaram mais de 90%, ascendendo a mais de 175 mil efectivos, e dependem, em cerca de 70% dos casos, principalmente de pensões e reformas.

As classes, camadas e grupos sociais têm uma distribuição desigual no território nacional, sendo útil o aprofundamento do seu estudo à escala regional para um melhor conhecimento da realidade nacional.

Acentuou-se a polarização de classes na sociedade portuguesa. Em termos aproximados, o conjunto da classe operária e das camadas intermédias assalariadas aumentou, entre 1991 e 2001, o seu peso na população activa de 75% para 80%. A burguesia e seus auxiliares directos, sem o pequeno patronato, aumentou de 1,9% para 2,5%. No meio, as camadas intermédias não assalariadas, que englobam a pequena burguesia e as camadas inferiores da burguesia, diminuíram de 21% para 16% (a diferença da soma para os 100% deve-se fundamentalmente a situações real ou estatisticamente indefinidas).

O crescimento da classe operária e demais assalariados, por um lado, e das camadas superiores da burguesia e seus auxiliares directos, por outro; a diminuição relativa e absoluta das camadas intermédias não assalariadas; o esvaziamento da pequena burguesia; o nivelamento pela situação material média do proletariado de largas camadas de assalariados intermédios; a diminuição do trabalho familiar na agricultura; a concentração da propriedade agrícola; a concentração do volume de negócios nas grandes empresas; são indícios seguros de que na sociedade portuguesa se acentuou a polarização social.

A política de direita e de abdicação nacional praticada por sucessivos governos, uma política de classe ao serviço dos grandes grupos económicos e financeiros, da grande burguesia associada ao capital transnacional, beneficia um grupo extremamente reduzido, atinge os interesses da esmagadora maioria da população e compromete o futuro de Portugal.

A ruptura com a política de direita, uma alternativa de esquerda que trave o agravamento da exploração, o afundamento do país e abra caminho a um Portugal com futuro, a luta por uma democracia avançada e pelo socialismo, têm como força motriz a classe operária, exigem a unidade dos trabalhadores e a concretização de uma vasta frente social envolvendo as classes e camadas antimonopolistas.

As alianças sociais básicas, consagradas nos Estatutos, são a aliança da classe operária com o campesinato e a aliança da classe operária com os intelectuais e outras camadas intermédias. Nas condições actuais, de redução do peso do campesinato, mas em que se mantêm largos sectores da população com ligação ao trabalho no campo (embora não como actividade principal) e de grande alargamento do peso dos intelectuais e outras camadas intermédias (indissociável da maior concentração da população nos meios urbanos), esta definição mantém a sua validade, reforçando-se a importância da aliança da classe operária com os intelectuais e outras camadas intermédias.

A unidade da classe operária e dos trabalhadores, e as alianças sociais básicas são elementos fundamentais de uma vasta frente social que abrange a classe operária, os empregados, os intelectuais e quadros técnicos, os pequenos e médios agricultores, os micro, pequenos e médios empresários do comércio, indústria e serviços e também os jovens, as mulheres, os reformados e pensionistas, as pessoas com deficiência e outras forças sociais, designadamente sectores da média burguesia que são atingidos pela concentração monopolista e a política ao seu serviço, nos planos nacional, europeu e mundial.

 

3.2 Os trabalhadores como motor da luta de massas

A luta de massas, em particular a luta dos trabalhadores, constituiu um elemento marcante na evolução da vida política nacional. A par da importância da luta da classe operária - a força mais dinâmica, combativa e consequente - assumiu papel relevante uma mais ampla participação dos trabalhadores de diferentes sectores da Administração Central e Local, de sectores directamente ligados ao aparelho do Estado (magistrados, militares e forças de segurança), dos agricultores, dos pescadores, de sectores da intelectualidade, da juventude.

Nos últimos quatro anos, e apesar do nível da luta nem sempre corresponder às necessidades do combate à política de direita, foi intensa a resposta dos trabalhadores à política de recuperação capitalista e de privilégios para o grande capital. Política essa assente na tese de que a competitividade exige «moderação salarial», uma maior desregulamentação laboral e a diminuição dos direitos de quem trabalha.

Esta contestação teve o seu ponto alto na greve geral de 10 de Dezembro de 2002, com a adesão de centenas de milhar de trabalhadores, que foi seguida de um vasto movimento de acções de luta e esclarecimento convocadas pela CGTP de que se destacam: a grandiosa manifestação nacional de 8 de Fevereiro de 2003; as jornadas de luta nacional de 11 de Março e 30 de Outubro do mesmo ano; sem esquecer as manifestações do 25 de Abril e 1.º de Maio, com destaque para as comemorações de 2004.

Registem-se neste período as centenas de lutas, com o envolvimento de muitos milhares de trabalhadores na defesa do emprego, com particular destaque para a combativa luta dos trabalhadores da Mortensen e Mandata na Marinha Grande, da Bombardier na Amadora, e a luta dos trabalhadores de dezenas de empresas dos sectores têxtil e do calçado pela dignificação do trabalho com direitos e dos salários, no combate à precariedade pela segurança e contra a sinistralidade do trabalho; a luta articulada entre a defesa do sector público e dos serviços públicos, com destaque para as lutas nos sectores dos transportes, Carris, Metro, Transtejo, Soflusa e sector ferroviário, nas telecomunicações, energia e água; a luta contra a fúria privatizadora de serviços públicos essenciais como a saúde, notários, abastecimento de água, infra-estruturas e empresas estratégicas (rede eléctrica nacional, rede fixa de telecomunicações, rede de distribuição de gás natural, TAP, Portucel, as já diminutas participações do Estado na EDP, Brisa, Galp e PT); a luta dos trabalhadores da Administração Pública Central e Local contra a privatização de serviços, contra a desfiguração do serviço nacional de saúde, pela defesa da escola pública, pela dignificação das carreiras, por aumentos salariais justos; as lutas contra a deslocalização de empresas e pela defesa dos postos de trabalho como na Clarks, Ecco, Eres, Alcoa, Merloni, Alcatel, Siemens e Bombardier.

Tendo em conta o seu papel decisivo como força de trabalho, nas lutas e contra a exploração capitalista, os trabalhadores deram uma contribuição insubstituível no desenvolvimento da luta de massas e no combate à política de direita. Apesar de não terem conseguido derrotar o conteúdo essencial do pacote laboral, alcançaram êxitos nos seus objectivos imediatos e obrigaram os governos a recuar, a adiar ou mesmo a abandonar alguns dos seus projectos e medidas. Reflectindo a tomada de consciência sobre a natureza da ofensiva contra os seus direitos, a luta dos trabalhadores teve um papel decisivo no isolamento social e político do governo de António Guterres/PS e na estrondosa derrota eleitoral sofrida pelo governo do PSD/CDS-PP nas últimas eleições europeias.

 

3.3. A luta de outras camadas e grupos sociais e das populações

A classe operária em particular e os trabalhadores em geral assumiram um papel motor e muitas vezes determinante no desenvolvimento da luta de massas. Um papel que se revelou condição para atrair outros sectores e camadas sociais muito diversificados a uma intervenção comum, como aconteceu com os agricultores, os estudantes, as forças de segurança, os reformados e as populações em geral, e fazer convergir as suas lutas em torno de objectivos comuns na defesa de objectivos imediatos, pela melhoria das condições de vida, na defesa de importantes conquistas sócio-profissionais, mas também na luta por objectivos gerais como o combate à ofensiva de direita, a defesa do regime democrático e a luta por uma alternativa política.

No desenvolvimento da luta de massas confirmou-se o importante papel dos movimentos e organizações unitárias, com destaque para a CGTP-IN e o Movimento das Comissões de Trabalhadores, a par da crescente importância que assumiram as associações de estudantes, as associações socioprofissionais e sindicais da GNR e da PSP, as associações de pais, de moradores, os movimentos de utentes, as associações de Pequenos e Médios Agricultores, a CNA, as associações de Micro, Pequenos e Médios Empresários, o movimento das mulheres, da paz, de reformados e das pessoas com deficiência.

Constituíram um importante contributo para o desenvolvimento da luta de massas as acções de luta e protesto desenvolvidas pelos estudantes, contra a Lei do Financiamento do Ensino Superior e o pagamento das propinas no superior, e contra a reforma curricular e a elitização do ensino, no secundário, as diversas acções em torno da liberdade sindical e do direito ao associativismo socioprofissional da PSP e da GNR; a grande manifestação nacional convocada pela CNA contra a revisão da PAC e a defesa da floresta portuguesa; a luta dos pescadores contra a Política Comum de Pescas; e as muitas iniciativas das comissões de utentes, cujo movimento tem vindo a crescer e a prestigiar-se em muitas regiões do país em torno das questões do direito à saúde, por transportes públicos de qualidade e a preços acessíveis, pela abolição e não abertura de algumas portagens e a defesa da água como um bem e um serviço público a preservar.

Os movimentos e organizações sociais de massas, que na sua composição têm uma raiz profundamente popular, assumiram uma inquestionável importância, quer no aumento da compreensão por vastas camadas sociais da influência das acções de massas na resolução dos problemas concretos, quer no relevante contributo para alargar a participação dos trabalhadores e das populações na vida política, social e cultural do país.

A ampla aliança que se tem vindo a estabelecer no plano social entre a classe operária e as outras camadas intermédias constituiu factor determinante para a sua convergência no plano político, para a derrota da política de direita.

A importância do reforço dos movimentos de massas e outras organizações e movimentos sociais para a derrota das políticas de direita e para a construção de uma verdadeira alternativa política de esquerda exige do Partido uma ainda maior atenção aos seus problemas, tendo presente o seu papel determinante para a prossecução de uma estratégia de alianças sociais básicas - as alianças da classe operária com diferentes camadas intermédias.

No desenvolvimento da luta de massas confirmou-se o peso e a influência dos comunistas para o seu estímulo, mobilização e participação. O reforço da contribuição dos comunistas para o fortalecimento dos movimentos e lutas de massas e das organizações sociais, sem prejuízo da afirmação e acção própria do Partido e das suas organizações, é não só importante para o estímulo à participação e a mobilização desses movimentos e organizações para a luta, mas também para a unidade dos sectores progressistas na reclamação por uma nova política.

 

3.4. A intervenção do PCP no combate à política de direita

O povo português e em particular os trabalhadores foram confrontados nestes últimos quatro anos com uma ofensiva política e ideológica contra importantes direitos consagrados constitucionalmente como património da Revolução de Abril, ofensiva que se acentuou desde a entrada em funções do governo PSD/CDS-PP e que tem como objectivo central subverter a matriz fundamental do nosso regime democrático-constitucional.

Num quadro em que se avolumam as ameaças a direitos e conquistas democráticos dos trabalhadores, em que se agudizam as condições de luta e se tenta destruir e descaracterizar a natureza e a autonomia das organizações dos trabalhadores, a realidade torna imperativa a existência e reforço do partido político da classe operária e de todos os trabalhadores, um partido revolucionário, o Partido Comunista Português.

Tal como o XVI Congresso previu, o PCP assumiu-se como a principal força política de oposição à política de direita, não se confundindo na sua intervenção com aqueles que criticando as políticas do governo se não distanciam, no que propõem e defendem, das questões essenciais dessas mesmas políticas, nem daqueles que se afirmando de uma dita «nova esquerda» procuram com uma intervenção inconsequente e um discurso dito «apelativo» esconder a sua verdadeira matriz política e ideológica e fugir a assumir uma clara posição sobre as questões de fundo.

O PCP assumiu um papel central e insubstituível no combate à política de direita e foi indiscutivelmente a força política que mais dificultou o avanço da ofensiva do governo PSD/CDS-PP. Fê-lo apoiando e dinamizando a luta de massas, alertando para os perigos e as consequências da política do governo e traduzindo na sua intervenção institucional os combates da população e dos trabalhadores.

Ao longo dos últimos anos o PCP, esteve de forma inigualável na luta contra o pacote laboral e a destruição de direitos dos trabalhadores; combateu a degradação, a privatização e a elitização de sectores sociais como a saúde, a educação e a segurança social; exigiu salários e reformas dignos; defendeu a Administração Pública e a sua reforma democrática; deu luta às privatizações de empresas e sectores essenciais; defendeu os sectores produtivos e a criação de emprego; protagonizou a luta pelos direitos das mulheres e em especial pela despenalização da IVG; opôs-se ao envolvimento de Portugal na guerra conduzida pelo imperialismo norte-americano; bateu-se pela realização de um referendo sobre a vinculação do país ao novo tratado europeu; propôs a substituição do pacto de estabilidade e crescimento; apresentou propostas para o desenvolvimento do país.

No quadro da ligação dialéctica entre a acção de massas, a acção institucional e a sua intervenção geral, o Partido promoveu um conjunto de Campanhas Nacionais de Contactos com os trabalhadores de que se destacam: a dirigida aos problemas da juventude trabalhadora; as realizadas em torno da prevenção e reparação da sinistralidade do trabalho, dos contratos a prazo e dos créditos devidos aos trabalhadores de empresas falidas; e as campanhas sob os lemas «Pacote laboral, segurança social - Andar para trás Não» e «Mais força ao PCP para dar a volta a isto!».

Destaca-se igualmente o abaixo-assinado por salários mais justos e melhores condições de vida lançado pelo PCP, e que se tornou no maior abaixo-assinado realizado em Portugal, subscrito por cerca de 200 mil portugueses.

Pelo carácter interdependente e complementar da sua intervenção na dinamização da luta de massas, articulando-a com a intervenção institucional e a intervenção directa do Partido, o PCP confirmou-se como uma força reconhecidamente indispensável na resistência à política de direita, no assumir das aspirações e reivindicações das massas populares e na batalha para se alcançar uma verdadeira alternativa de esquerda.

O PCP esteve nas empresas e locais de trabalho com os trabalhadores na defesa dos seus direitos, na luta pela defesa dos postos de trabalho e de salários justos, contra a precariedade e pelo direito ao trabalho com direitos, pela dignificação dos trabalhadores, pela defesa da produção nacional. Foi o PCP que denunciou e lutou em defesa de um forte sistema público de segurança social contra as alterações aos critérios de atribuição de diversas prestações sociais, contra os atrasos nos seus pagamentos e pelo aumento do seu montante. Foi o PCP que esteve sempre nas pequenas e grandes lutas em defesa do direito à saúde e à protecção social pública, por um ensino público gratuito e de qualidade, contra o aumento brutal do custo de vida, pelo cumprimento por parte do Estado das suas responsabilidades sociais. Foi o PCP que, em estreita ligação às populações, não só assumiu a organização da luta pela resolução de problemas concretos como dinamizou a criação de muitos dos movimentos de utentes que se afirmaram nos últimos anos. E foi o PCP que de forma mais consequente e responsável se bateu contra a imposição de retrocessos nos direitos das mulheres, especialmente das trabalhadoras, e para que a Assembleia da República assumisse as suas legítimas responsabilidades, aprovando uma Lei de despenalização do aborto, ao mesmo tempo que na Maia, em Aveiro e em Setúbal manifestou a sua solidariedade com as mulheres sujeitas a julgamento. Julgamentos que o PCP considera intoleráveis, o que justificou a apresentação de uma iniciativa legislativa visando a suspensão das investigações e processos até à votação definitiva na Assembleia da República de iniciativas de alteração à actual lei.

O desenvolvimento da luta de massas, conjugado com uma reforçada intervenção do PCP e dos comunistas nas instituições e na sociedade, é um factor determinante para alcançar novos avanços e conquistas favoráveis às massas populares, para derrotar a política de direita e para criar condições para uma verdadeira alternativa de esquerda.

Na Assembleia da República, no Parlamento Europeu, nos Parlamentos Regionais e nas Autarquias Locais, os eleitos do Partido, numa acção articulada com o Partido e o movimento de massas, cumpriram de forma responsável e consequente os compromissos assumidos com o eleitorado em defesa dos interesses nacionais e do nosso povo.

A par da intervenção constante nos movimentos e acções de massas e da contribuição para a sua unidade e combatividade, assim como nas batalhas eleitorais que, em si mesmas, foram grandes batalhas de esclarecimento e combate à política de direita, o Partido, dando mostra de grande vitalidade, interveio activamente com a sua identidade e projecto próprios com propostas concretas, em toda a acção política e social.

Pela identificação com os anseios e aspirações das massas populares, pela sua acção e intervenção políticas, pelo combate persistente e coerente à política de direita, pela contribuição para a resolução dos grandes problemas nacionais, pelo seu projecto ligado à vida e a partir dos problemas concretos, o PCP afirmou-se como a mais importante e consequente força de oposição à política de direita e objectivamente a expressão política da frente social que a ela se opõe.

Num quadro de profunda instrumentalização dos principais meios de comunicação social ao serviço da ideologia dominante, é pela acção política do PCP e da organização e intervenção directa das massas que os trabalhadores e a generalidade dos portugueses melhor poderão compreender a importância da acção colectiva, e adquirir a consciência social e política necessária para as transformações estruturais da sociedade, necessária para a resolução dos seus problemas e dos do país.

 

3.5. A classe operária, os trabalhadores e as suas organizações de classe

A classe operária, os trabalhadores e as suas organizações de classe, com grande destaque para o movimento sindical, demonstraram, pela sua acção e luta organizadas que continuam a ser determinantes e predominantes na defesa dos interesses dos trabalhadores, dos seus direitos sociais e do regime democrático.

Esta realidade, globalmente considerada, não deve impedir a avaliação das debilidades e retrocessos e das razões que lhes estão na origem, dos processos e alterações que se desenvolveram neste período e dos seus impactos na composição do emprego, na estrutura empresarial, nas modificações introduzidas na organização da produção e do trabalho, nas relações entre os trabalhadores e entre estes e as suas organizações.

A luta organizada da classe operária e dos trabalhadores é travada num quadro muito alterado marcado pelo confronto com o processo de reestruturação geral das condições de exploração de mão-de-obra e pela desregulamentação das relações laborais.

O movimento sindical é a maior organização social de massas, continuando a assumir-se como força que mais une, mobiliza e organiza os trabalhadores na luta em torno dos seus interesses e direitos sociais, profissionais e de classe.

A CGTP-IN, pela sua capacidade de agregar e influenciar o movimento sindical unitário, alicerçada na sua natureza e nos seus princípios, definindo como objectivo estratégico a acção, a intervenção, a organização e a luta sindical a partir das empresas e dos locais de trabalho, sem abdicar da participação noutros espaços de intervenção, reforçou o seu papel e influência juntos dos trabalhadores e na sociedade portuguesa.

Por razões da sua própria história, por vontade expressa e pela confiança dos trabalhadores, o movimento sindical conta com a participação, a intervenção e responsabilização de milhares de militantes comunistas que, em conjugação com outros sindicalistas sem partido ou de outros partidos e sensibilidades políticas, ideológicas e religiosas, determinam as características e natureza da CGTP-IN e do movimento sindical unitário português. A UGT, pela sua natureza e acção concreta confirmou o seu papel de instrumento dos governos e do capital, designadamente no processo que conduziu à aprovação do código do trabalho.

Resultante dos processos de reestruturação das empresas e sectores, mas fundamentalmente da prolongada e profunda ofensiva protagonizada pelo capital e pela direita, os trabalhadores e o movimento sindical são hoje confrontados com problemas e situações de grande complexidade política, social, sindical e ideológica.

As graves alterações às leis laborais, tanto no plano dos direitos individuais como no dos direitos colectivos, articuladas com as alterações produzidas nos mecanismos e métodos de dominação do capital sobre o trabalho, as mutações tecnológicas e de divisão do trabalho, num quadro de uma relação de forças desfavorável aos trabalhadores, colocam o movimento sindical perante novas exigências e a necessidade de novas dinâmicas.

Mas é a partir da sua natureza e do carácter indissociável dos seus princípios unitários, democráticos, de autonomia, de massas e de classe; é na concretização da opção estratégica de intervir, agir, reivindicar e organizar a partir das empresas e locais de trabalho; é na ligação aos trabalhadores e aos seus problemas, interesses e direitos - que o movimento sindical continuará a encontrar o caminho mais sólido e mais realizador para fazer frente à ofensiva e encontrar respostas para a complexidade das novas realidades, mutações e alterações em curso.

Como foi confirmado no X Congresso da CGTP-IN, o reforço da influência e prestígio do sindicalismo de classe passou e passa pelo reforço da organização de base, sindicalizando mais trabalhadores, elegendo mais delegados sindicais, mais representantes para as Comissões de Higiene, Saúde e Segurança nos locais de trabalho, estabelecendo a ligação e complementaridade da acção reivindicativa com a contratação colectiva. A linha ofensiva do capital e da direita para, no terreno e por via da lei, condicionar a acção sindical não anula antes actualiza e valida o esforço iniciado dos processos de reestruturação sindical em curso, visando concentrar meios e estruturas e descentralizar a acção nas empresas, sectores e regiões.

Numa concepção cada vez mais integrada, o reforço da organização é inseparável do reforço da intervenção. A luta por melhores salários e melhores horários, pelo emprego qualificado e com direitos, a defesa e efectivação da contratação colectiva são elementos cruciais e prioritários da acção sindical. A defesa da Segurança Social pública e universal, do Serviço Nacional de Saúde, do ensino público e democrático, dos serviços públicos e funções sociais do Estado integram os objectivos da luta sindical.

A ofensiva contra os trabalhadores e os seus direitos, desencadeada pelo governo PSD/CDS-PP, a sua natureza e objectivos, não diferem da natureza e objectivos de governos anteriores e dos partidos que a realizaram. A diferença está na sua dimensão, no seu carácter global num quadro de relação de forças profundamente desfavorável aos trabalhadores e de um afrontamento ideológico de grande intensidade e envergadura.

Enquanto se ataca o direito ao trabalho e à segurança no emprego, aos salários, ao horário de trabalho, à evolução da carreira profissional, à contratação colectiva, à greve, à acção sindical, surgem de diversos quadrantes político-ideológicos as teses e práticas da renúncia à transformação social, do esbatimento da luta de classes, da «luta possível» que civilize o capitalismo e o mantenha nos seus limites, da diluição do movimento sindical de classe no «movimento» dos movimentos sociais liderado por Directórios autonomeados que secundarizam a luta de classes, subestimam a luta concreta por objectivos concretos e a luta nacional em nome de um chamado cosmopolitismo internacionalista.

Resultante da grande pressão ideológica, forças e sensibilidades político-ideológicas, designadamente reformistas e ex-esquerdistas, que se reviam e participam no projecto colectivo e unitário na CGTP-IN, têm vindo a evoluir para concepções e posições que, a serem concretizadas no plano do funcionamento e composição das estruturas de Direcção do movimento sindical nos seus diversos níveis, conduziriam ao desvirtuamento e desagregação do que constitui a obra mais criativa dos trabalhadores portugueses, o movimento sindical unitário, consubstanciado na CGTP-IN, um projecto de classe, de unidade e autonomia.

Numa linha de «parlamentarização» e de transposição partidária para o seio da estrutura sindical, tais forças subestimaram os sentimentos unitários e a elevada consciência de classe dos trabalhadores inequivocamente demonstrados no debate democrático e nas decisões do X Congresso da CGTP-IN.

Para os comunistas, a unidade é assumida como orientação estratégica mas não constitui um fim em si mesmo. É inseparável dos princípios da democracia, da autonomia, de massas e de classe e pressupõe a necessidade do fortalecimento da organização e da acção para dar eficácia à luta. O reforço da unidade alcança-se na base da justeza de objectivos, no desenvolvimento da acção reivindicativa sustentada na participação e mobilização dos trabalhadores a partir das empresas e locais de trabalho.

Sem abdicar de nenhum espaço de intervenção, o movimento sindical demonstrou que a luta de massas é o caminho mais sólido e mais realizador. Envolve e faz intervir os trabalhadores nos seus problemas e aspirações e torna-se numa forma mais avançada de participação democrática e de afirmação social da classe operária e dos restantes trabalhadores.

A greve geral realizada em Dezembro de 2002, as grandes e diversificadas lutas travadas em praticamente todos os sectores e em numerosas empresas num quadro de uma violenta e ampla ofensiva, provaram a validade e a actualidade da luta, e constituíram o alicerce para o alargamento da influência e prestígio da CGTP-IN e do movimento sindical que agrega.

A luta de classe entre o capital e o trabalho não só se confirma actual como continua a manifestar-se com grande intensidade. A actualidade e a necessidade de um movimento sindical de classe continua a ser uma realidade incontornável.

A luta concreta no plano nacional não é contraditória nem contrária ao desenvolvimento da cooperação e da solidariedade internacionalista. O poderoso e alargado domínio da economia por parte do capital multinacional, o prosseguimento e aprofundamento dos processos de integração, o carácter global e articulado da ofensiva que é desferida contra os trabalhadores e seus direitos, exigem um relacionamento mais forte nos domínios da coordenação, cooperação e solidariedade internacional.

No plano europeu, a filiação e participação da CGTP-IN na CES (Confederação Europeia dos Sindicatos), apesar das contradições e conflitualidades que resultam da sua orientação defensora da integração no sistema dominante, permitiu uma maior cooperação e relacionamento com diversas organizações sindicais da União Europeia. O papel, objectivos e características da CES e os níveis e formas de participação da CGTP-IN no seu seio também demonstram que eles não são substitutivos ou alternativos às organizações de classe de âmbito nacional, das suas orientações e decisões.

No plano mundial, embora com as limitações decorrentes dos meios disponíveis para esta importante frente, a CGTP-IN, estruturas intermédias e sindicatos, têm procurado desenvolver a sua solidariedade com a luta dos trabalhadores de diversos países, sendo de destacar a solidariedade com os trabalhadores e os povos da Palestina e de Cuba.

Resultante da realidade do movimento operário português, da sua experiência, da avaliação própria quanto ao que melhor serve a sua coesão e unidade, dos seus princípios e da sua composição unitária, a CGTP-IN tomou a opção de não se filiar e de manter o seu relacionamento e cooperação com as três centrais sindicais mundiais (Federação Sindical Mundial, Confederação Mundial do Trabalho e Confederação Internacional dos Sindicatos Livres) em torno de acções e objectivos concretos.

A evolução recentemente verificada, com tendência para a fusão/integração da Confederação Mundial do Trabalho (CMT) e da Confederação Internacional dos Sindicatos Livres (CISL), coloca a necessidade de se conhecer e avaliar o projecto político-sindical e as práticas sindicais concretas que vai ter, mas o facto de se posicionar como uma estrutura de natureza exclusivista e não oposta do sistema de exploração capitalista, configura a justeza da opção unitária da CGTP-IN no plano internacional.

Os reflexos da destruição do aparelho produtivo, particularmente de grandes empresas, das privatizações, geralmente precedidas de saída massiva de trabalhadores com vínculo efectivo e com mais consciência de classe, e o aumento da precariedade, conduziram a uma redução do número de Comissões de Trabalhadores (CT). Simultaneamente, num quadro de confrontação ideológica, as empresas multinacionais desenvolvem uma linha de conciliação, envolvimento e corresponsabilização das CT com sentido concorrencial ao movimento sindical em processos negociais e acordos de empresa. O governo PSD/CDS-PP perante os direitos das CT consagrados na Constituição, em particular o direito ao controlo de gestão, procurou na Lei Regulamentadora do Código de Trabalho ultrapassar e esvaziar a natureza e objectivos desse direito.

Na linha das concepções do PS sobre o papel das Comissões de Trabalhadores, o BE, apesar da sua reduzida influência no movimento das CT, procura, no essencial, desempenhar o papel do reformismo e conciliação de classes que o PS nunca conseguiu desde a aprovação da Lei das CT em 1979, ou seja, transformá-las em estruturas substitutivas do movimento sindical, em órgãos de concertação a nível de empresa. Apesar desta convergência objectiva das forças de direita, do capital multinacional, do PS e do Bloco de Esquerda, e das dificuldades que resultam da destruição e desmantelamento de grandes empresas e da evolução mais tardia e complexa da consciência de classe de jovens trabalhadores, as listas unitárias, onde os comunistas se integram, continuam a confirmar-se como determinantes e predominantes em grandes empresas e sectores estratégicos.

Os militantes comunistas devem continuar a defender as características unitárias das CT como instrumentos democráticos nas mãos dos trabalhadores para a defesa dos seus interesses e direitos, para o reforço da sua unidade e da sua consciência de classe, para dinamizar a cooperação e complementaridade com o movimento sindical unitário, para a efectivação dos direitos de participação e intervenção e controlo de gestão, para combater a desconstitucionalização dos seus direitos e a sua descaracterização em órgãos de conciliação.

O Partido, pela acção da sua organização e dos seus militantes, deve empenhar-se na eleição de novas CT, reforçar o papel das Comissões Coordenadoras de CT e aprofundar com criatividade a ligação e envolvimento dos trabalhadores com vínculos precários.

 

3.6. Outras organizações e movimentos de massas

O Movimento dos Pequenos e Médios Agricultores portugueses confrontou-se, no período 2000/2004, no contexto da política agrícola de direita, com a terceira reforma da Política Agrícola Comum (PAC), parte integrante das negociações em Cancun da Organização Mundial do Comércio (OMC) para a liberalização total do comércio internacional da produção agro-alimentar. Período que fica também marcado pelos devastadores incêndios florestais do Verão de 2003 e 2004, resultado de anos e anos de erradas políticas agro-florestais, de incúria e passividade de sucessivos governos do PSD, do PS e do PSD/CDS-PP.

A intervenção e a luta dos pequenos e médios agricultores desenvolveram-se com um ritmo irregular, persistentes diferenças regionais e formas muito diversificadas, mas com uma significativa presença e visibilidade no país. Tiveram como origem novos e velhos problemas dos agricultores e do mundo rural causados pela política de direita e as imposições e directivas da PAC.

Em Fevereiro de 2003, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) comemorou 25 anos com a realização do seu IV Congresso. Foi a consagração política, social e institucional de 25 anos de luta em defesa da agricultura familiar e da agricultura portuguesa. Foi também a viva expressão associativa do âmbito nacional de uma confederação de classe, bem ancorada no mundo rural português. Foi ainda a expressão de uma intensa actividade internacional, junto de associações congéneres do mundo inteiro, e em particular das plataformas internacionais de que faz parte: a Coordenadora Agrícola Europeia (CPE) e a Via Campesina.

Incapazes de continuar a negar a existência da CNA, dada a sua força e implantação e a inegável visibilidade da sua luta, sucessivos ministros da agricultura do PSD e do PS acabaram por se ver obrigados a aceitar o seu reconhecimento formal e institucional como principal confederação da agricultura familiar. Mas permaneceram as medidas e tentativas para a sua efectiva discriminação, como foi o caso da institucionalização por um governo PS de uma pretensa medição da representatividade das associações agrícolas.

A continuação da forte e viva presença da CNA e do conjunto da diversificada rede de associadas e de estruturas não filiadas que com ela colaboram junto dos pequenos e médios agricultores não deve ocultar as dificuldades e obstáculos objectivos ao seu desenvolvimento e necessário reforço. Muito condicionadas pelas discriminações do poder político, vivendo a crise económica dos agricultores seus associados, com estruturas demasiado dependentes e absorvidas pelos serviços que prestam, as organizações de pequenos e médios agricultores devem persistir no que foi e é a razão de ser da sua existência e do seu enraizamento: a ligação aos agricultores, aos seus problemas concretos, às carências e problemas do mundo rural português.

Com uma contribuição única no espectro partidário português, o PCP continuou a dar um forte contributo à luta dos agricultores portugueses, com uma intervenção diversificada quer na Assembleia da República e Parlamento Europeu quer através da presença junto dos agricultores, das suas lutas e associações. Sublinhe-se a sua persistente luta por uma reforma da PAC conforme aos interesses da agricultura nacional e de uma União Europeia que deve ter como princípio orientador da sua política agrícola o direito de todos os povos à soberania e segurança alimentares.

A agricultura portuguesa continua a ser uma questão incontornável de qualquer processo de desenvolvimento do país e da própria segurança nacional, que não pode ser medida pela dimensão quantitativa da sua participação no Produto Interno Bruto. Defender a agricultura e os seus principais trabalhadores (agricultores familiares e assalariados agrícolas) e lutar por reformas que garantam a actividade produtiva e a boa exploração da terra agrícola portuguesa por aqueles que a querem trabalhar, devem continuar a ser objectivos do PCP.

No entanto, as profundas alterações verificadas e em curso no tecido agrícola e no mundo rural português - liquidação de milhares de explorações agrícolas; desertificação económica e humana de extensas áreas e devastação por incêndios de milhares de hectares; diminuição significativa da mão-de-obra agrícola e da população rural; novas articulações entre os espaços agrícola e rural e o espaço urbano; crescentes problemas ambientais decorrentes das actividades agro-pecuárias; necessidade de defender a biodiversidade e consagrar o princípio da precaução no uso das sementes transgénicas - exigem do PCP uma profunda reflexão e avaliação do papel e significado da agricultura na sociedade portuguesa hoje.

Continuam entretanto a colocar-se como principais direcções de trabalho, até como importante ponto de partida para a reflexão acima referida, o reforço da acção e intervenção das organizações do Partido junto deste sector social e a intensificação do trabalho dos comunistas nas organizações de agricultores e no apoio ao desenvolvimento das suas lutas reivindicativas.

Verificaram-se, no período decorrido desde o último Congresso, diversas movimentações e lutas contra as políticas de pesca prosseguidas por sucessivos governos e contra a Política Comum de Pesca, traduzidas num brutal ataque às condições e possibilidades de exercício da actividade piscatória. Políticas que tiveram como consequência o abate de parte significativa da frota pesqueira portuguesa e a redução para metade dos activos do sector.

Promovidas e conduzidas pelos sindicatos e associações/organizações de produtores do sector, pescadores e pequenos proprietários de embarcações travaram diversas lutas na defesa da continuidade da actividade, pela garantia de acesso aos recursos, pela soberania nacional sobre o Mar Territorial e sobre a Zona Económica Exclusiva e na defesa das suas condições de vida e de trabalho. No alargamento da base de apoio a essas lutas desenvolveram-se contactos com organizações espanholas e francesas, que permitiram conjugar esforços em defesa de interesses comuns.

As pescas portuguesas, cuja importância ultrapassa em muito a sua contribuição para o PIB nacional, mantêm-se como um sector estratégico para o País. Defender o sector da pesca, os seus trabalhadores e, em particular, a pequena pesca costeira e artesanal e reforçar a sua influência junto das suas organizações, devem continuar a ser objectivos do PCP, pelo que se exige uma reflexão e avaliação sobre a situação actual do sector e o caminho a prosseguir pelo PCP em defesa das pescas portuguesas.

A evolução da situação dos intelectuais e quadros técnicos é caracterizada pelo aumento do seu peso e importância enquanto grupo social, atravessando importantes áreas - cultura e artes, educação, ciência, investigação, tecnologia - e envolvendo um vasto conjunto de profissões.

Apresentando particularidades de acordo com a área de intervenção específica, a situação dos intelectuais e quadros técnicos apresenta, no entanto, algumas características comuns a outras camadas sociais e profissionais e alguns denominadores comuns de entre os quais se destacam: crescimento do desemprego nas novas gerações de licenciados e o aumento do assalariamento nas profissões intelectuais; bloqueio de perspectivas de realização satisfatória das actividades para as quais os jovens intelectuais adquiriram competências; surgimento de fenómenos de pseudo-emprego e de pseudocarreiras, nomeadamente com a utilização abusiva da situação dos bolseiros de investigação, no quadro de formações pós-graduadas e de projectos de investigação; crescimento do número de indivíduos com formação nas diversas áreas de criação artística sem o correspondente aumento dos apoios à produção artística e à formação de públicos; crescente feminização das profissões intelectuais sem que essa realidade se reflicta numa correspondente presença em posições de direcção; aumento de imigração, com uma importante parcela de imigrantes provenientes da Europa de Leste - com uma significativa percentagem de trabalhadores com qualificações intelectuais e técnicas; tendência para a precarização generalizada da prestação de trabalho, atingindo sectores que, com o 25 de Abril, tinham alcançado estabilidade de emprego e condições de progressão profissional.

A evolução verificada confirma que os intelectuais e quadros técnicos deixaram de constituir uma elite, ainda que persista uma concepção tradicional do «intelectual» - reduzido a um grupo particularmente activo na criação e na teorização, na formação e intermediação de opiniões e valores, na batalha das ideias, aparentando um especial papel de representação ideológica e ético-política - que continua a dificultar que muitos grupos de intelectuais se assumam como tal.

Aprofunda-se a tendência para uma crescente limitação de direitos e para o aumento dos condicionalismos à actividade intelectual que, afectando igualmente a generalidade dos trabalhadores no exercício de uma actividade profissional, criam maiores possibilidades de convergência e de solidariedade entre os intelectuais e quadros técnicos e o conjunto dos trabalhadores.

No movimento sindical, associativo e representativo dos intelectuais, destaca-se a existência de um diversificado número de organizações que representam ou associam intelectuais: organizações sindicais, ordens profissionais, associações científicas, outras associações visando finalidades específicas.

No quadro das organizações de classe profissional destaca-se a existência de um forte e representativo movimento sindical docente.

Entretanto, em sectores profissionais importantes, alguns dos quais em acentuado crescimento (arquitectos, juristas, economistas), aumenta o número dos que exercem uma actividade em condições de assalariamento ou de trabalho a recibo verde, cujas organizações representativas são as respectivas ordens profissionais de cujo âmbito de acção estão excluídas matérias de ordem sindical. Em vários outros sectores profissionais é estimulada a constituição de ordens profissionais, mesmo em casos em que as organizações sindicais existentes já desempenham competências de regulação profissional.

Apesar da existência de fortes e activas organizações de intelectuais e quadros técnicos mantêm-se dificuldades na dinamização de estruturas de enlace entre organizações ou na dinamização da sua cooperação, mesmo entre as que organizam sectores com clara proximidade e afinidade profissional ou de campo de actividade. Refira-se ainda a importante aproximação entre muitas organizações de trabalhadores intelectuais e o movimento sindical, na qual se destaca a adesão à CGTP-IN de sindicatos que integram a FENPROF.

A Confederação Nacional de Quadros Técnicos e Científicos desempenha um importante papel no acompanhamento dos problemas e reivindicações específicas comuns dos trabalhadores a quem se dirige, nomeadamente às relativas as suas condições de trabalho.

A Associação Portuguesa de Escritores e a Sociedade Portuguesa de Autores podem desempenhar um relevante papel na defesa dos autores, na promoção das suas obras e na defesa dos direitos de autor.

O PCP prosseguiu esforços para dinamizar e melhorar o trabalho de organização e intervenção junto de muitos intelectuais comunistas, e embora subsistam muitas insuficiências, destacam-se neste período a reorganização e dinamização das estruturas nacionais para o acompanhamento da área da educação e ensino, e da área da cultura, bem como o trabalho realizado pelos sectores intelectuais das Organizações Regionais de Lisboa, Porto e Coimbra.

Como linhas de orientação para a acção dos comunistas salientam-se: o reforço da organização e da unidade dos trabalhadores intelectuais na luta pelos seus direitos, contribuindo para o desenvolvimento da organização e intervenção sindical, associativa e outras; a atenção às reivindicações de cada sector, nomeadamente através do reconhecimento da especificidade do exercício de algumas das profissões intelectuais, nomeadamente das artísticas; o alargamento da convergência de muitas das reivindicações dos trabalhadores intelectuais com as dos demais trabalhadores; o aprofundamento do conhecimento das alterações que se têm vindo a verificar na condição social dos intelectuais; a atenção às grandes concentrações que se registam no ensino superior, que cobre o conjunto do território nacional, com a constituição ou reforço de organismos de quadros técnicos e intelectuais e incremento da sua iniciativa em organizações regionais onde eles ainda não existem, com o reforço da iniciativa própria, da ligação às restantes organizações e a dinamização dos sectores intelectuais já existentes nos principais centros urbanos; a valorização do papel da cultura na solução dos problemas do país e a dinamização da intervenção dos intelectuais num desenvolvimento cultural que responda às necessidades do país num quadro de acrescida interdependência internacional, combatendo todas as formas de colonização cultural; a procura de que a intervenção dos intelectuais contribua mais activamente para a luta por uma alternativa de esquerda e para a denúncia do capitalismo como sistema explorador e opressor, para a defesa da paz e a solidariedade internacionalista.

O 25 de Abril de 1974 deu um forte impulso à luta organizada das mulheres e à acção das organizações em defesa dos seus direitos específicos; determinou uma radical alteração na situação de facto e no plano jurídico da mulher; e foi decisivo para o acesso e a participação feminina em novas áreas. Apesar das significativas mudanças registadas, a evolução da situação das mulheres é caracterizada pelo incumprimento das leis que consagram os seus direitos específicos por parte dos sucessivos governos (onde se incluem os do PS).

Com a maioria PSD/CDS-PP deram-se profundas alterações legislativas que afectam o direito de contratação colectiva e facilitam o despedimento, a exploração e o uso de mão-de-obra feminina a mais baixo custo, o que introduz novos e decisivos factores de desvalorização do valor do trabalho das mulheres, de maior desprotecção na doença, no desemprego, na maternidade e na velhice.

Foram aprofundadas as políticas de abandono do papel social do Estado em áreas essenciais a uma evolução positiva na situação das mulheres, tais como a educação, a saúde e a segurança social, acompanhadas por uma forte ofensiva ideológica que visa centrar na família a causa de todos os problemas que afectam as mulheres no trabalho e na sociedade. Foram dados novos passos na imposição, na esfera do Estado, de valores e princípios de actuação que contrariam direitos em matéria de planeamento familiar, contracepção e educação sexual e foi, mais uma vez, inviabilizada a despenalização do aborto.

A ofensiva ideológica, visando limitar a mobilização e protesto de importantes sectores femininos profundamente afectados pelas políticas de direita, tem-se caracterizado pelo fomento da «desideologização» das questões da igualdade e da participação, pela centralização das causas da discriminação em aspectos estritamente culturais e desligada dos efeitos das políticas económicas e sociais, pelas tentativas de fomentar divisões entre organizações feministas e não feministas a par da desvalorização do carácter unitário de organizações com a presença de comunistas face a outras que contam com a participação de militantes do BE e do PS. Acresce que a recente «especialização» de algumas organizações de mulheres para determinadas áreas de intervenção, visando a obtenção de financiamentos públicos e/ou comunitários, tem vindo a condicionar a diversidade de intervenção dessas organizações em áreas e âmbitos muito restritos.

Com o governo PSD/CDS-PP tem vindo a verificar-se um deliberado enfraquecimento do papel da Comissão para a Igualdade no Trabalho e Emprego (CITE) na observância do cumprimento da lei no que se refere ao cumprimento dos direitos de maternidade e paternidade, e numa activa intervenção de detecção das discriminações indirectas, que continuam a afectar as trabalhadoras, tendo deixado de funcionar o Observatório para a Igualdade na Contratação Colectiva.

A secção das ONG do Conselho Consultivo da Comissão para a Igualdade e os Direitos das Mulheres, constituída por 52 organizações, debate-se com crescentes dificuldades em resultado do incumprimento por parte do governo das suas competências legais a que acresce o enfraquecimento da iniciativa, do entendimento e acção comum das organizações que nela têm assento, o que constitui um retrocesso relativamente às experiências positivas do passado.

A evolução nos últimos quatro anos não favoreceu o importante papel das organizações de mulheres no elevar da consciência e da participação de muitos milhares de mulheres em torno de múltiplos problemas concretos com que estão confrontadas. Destacou-se, contudo, o contributo dado por algumas organizações na intervenção organizada das mulheres contra as políticas de direita, designadamente contra o aumento do custo de vida, os baixos salários e reformas, contra o pacote laboral, a privatização da segurança social, contra a guerra e pela paz. As comemorações do 8 de Março constituíram momentos especiais na denúncia das discriminações específicas das mulheres e na sua mobilização na luta em defesa dos seus direitos.

A Comissão de Mulheres da CGTP-IN desenvolveu uma importante intervenção na sensibilização dos sindicatos para a luta contra as discriminações das trabalhadoras, para a necessidade de garantir a igualdade na contratação colectiva e a protecção da maternidade-paternidade.

A intervenção organizada das mulheres no movimento sindical e na CGTP-IN constituiu a expressão mais dinâmica e combativa da luta organizada das mulheres neste período. A luta contra o encerramento de empresas, os despedimentos e o desemprego contou com uma empenhada intervenção de importantes sectores de trabalhadoras. Registou-se um importante aumento da sindicalização de mulheres e da sua eleição para delegadas sindicais.

O Movimento Democrático de Mulheres (MDM) é um movimento de âmbito nacional, com estatuto de parceiro social, filiado na Federação Democrática e Internacional de Mulheres, que desempenha um específico e relevante papel na dinamização da acção organizada das mulheres em torno de problemas e reivindicações específicas e na elevação da sua consciência social e política. A sua acção neste período caracterizou-se pela reactivação de vários núcleos, abertura de sedes e pela dinamização de uma intervenção própria, a par da sua participação com outras organizações no movimento da paz, no Fórum Social Português e na secção das ONG da CIDM.

Destaca-se ainda a importante acção realizada por outras organizações unitárias como: a Associação A Mulher e o Desporto; a Associação para o Planeamento da Família; O «Ninho» (de combate à prostituição e ao tráfico de mulheres e crianças e pela inserção social das vítimas); a Associação de Mulheres Agricultoras e Rurais Portuguesas; a Rede de Mulheres Autarcas e a Associação Moura Saluquia (participação das mulheres no desenvolvimento local).

A Organização das Mulheres Comunistas é acompanhada pela Comissão junto do Comité Central para os problemas e movimento das mulheres e integra o Conselho Consultivo das ONG da CIDM. Foi responsável pela elaboração e publicação dos estudos sobre a evolução da participação das mulheres nas autarquias e sobre os Maus Tratos às Mulheres na Madeira, que motivaram a realização de diversas acções e campanhas. O PCP assumiu neste período um papel fundamental na dinamização da iniciativa política, aos diversos níveis da acção partidária, contra os retrocessos nos direitos das mulheres e na defesa dos direitos conquistados com Abril, em defesa dos direitos sexuais e reprodutivos, de solidariedade com as mulheres em julgamento pela prática de aborto, pelo combate à prostituição e tráfico de mulheres.

São, entre outras, orientações de trabalho para a intervenção do Partido aos vários níveis e para a acção das(os) comunistas: o desenvolvimento da luta pela construção de uma alternativa à política de direita como condição necessária à efectivação dos direitos das mulheres; a promoção do recrutamento e integração das mulheres na vida partidária nos seus diversos níveis, nos organismos de direcção e no plano da intervenção institucional do Partido (autarquias, Assembleia da República); o reforço da luta organizada das trabalhadoras no movimento sindical e na CGTP-IN, valorizando a IV Conferência Sindical sobre Igualdade entre Mulheres e Homens, a ter lugar em 15 de Abril de 2005, em torno de problemas e reivindicações mais directamente ligados com a sua situação de desigualdade e os seus direitos específicos; o estímulo à acção e papel de organizações femininas, designadamente do Movimento Democrático de Mulheres, pelo seu contributo a uma maior visibilidade aos múltiplos aspectos que determinam a situação das mulheres na sociedade, destacando o seu 7.º Congresso, agendado para 21 de Maio de 2005, ao alargamento da consciência social e política de amplos sectores femininos e cuja acção pela transformação da situação e do estatuto das mulheres se insere num objectivo mais vasto de transformação social.

A Juventude, na sua diversidade, posturas e comportamentos, assume na sua essência valores de solidariedade e de partilha e traduz uma vontade de participação e de acção que se manifesta de diferentes formas e em torno de diferentes interesses, gostos e vontades com uma intensa actividade e intervenção, da qual muitas vezes não tem consciência do seu real alcance político.

O movimento juvenil constitui assim uma importante expressão desta acção, fomentando espaços de intervenção concebidos, dinamizados e dirigidos por jovens, sendo também ele um corpo diverso que se organiza de forma diversa e em torno de diferentes problemas, anseios, realidades, locais e especificidades de intervenção. As distintas formas de organização, que vão desde a organização não formal em torno de interesses pontuais, à participação em espaços recreativos, musicais, desportivos, no movimento sindical e em estruturas representativas de trabalhadores, às associações juvenis de base local e ao associativismo estudantil com toda a sua vitalidade, são exemplos da organização do movimento juvenil e da sua profunda diversidade que envolvem milhares de jovens nas suas acções e iniciativas.

Pelo seu papel na formação, intervenção na vida social, política e cultural, no esclarecimento e reivindicação o movimento associativo é alvo da ofensiva do poder, de tentativas de partidarização e de instrumentalização através dos mecanismos governamentais ao seu dispor, o IPJ e a Secretaria de Estado da Juventude. Exemplo dessas práticas foi a exclusão da direcção, elaboração e participação do movimento juvenil nas duas últimas edições do Encontro Nacional de Juventude, tentando transformá-los em veículo de ligação e propaganda do governo junto dos jovens.

O PCP valoriza e apoia o papel do movimento juvenil e considera-o indispensável para a construção e definição de uma política transversal para a juventude em que a concretização de questões fundamentais como o acesso à educação e ao ensino, a um emprego com direitos, a uma vida independente, à produção e fruição culturais, à prática do desporto, a uma vida sexual saudável e assumida, à paz e à solidariedade entre os povos, sejam imperativos e efectivos.

As políticas de ensino e as tentativas de afastamento dos estudantes da definição da vida das instituições, o desemprego e o aumento da precariedade que afecta 46% dos jovens trabalhadores, o pacote laboral, o encerramento do ensino nocturno em várias escolas e a retirada de direitos aos trabalhadores-estudantes, os cortes orçamentais e a chantagem política ao movimento associativo juvenil, o corte ao crédito bonificado, a não existência de uma política de saúde sexual e reprodutiva, o não fomento da prática desportiva e da fruição e produção culturais, a incapacidade de dar combate eficaz ao flagelo da toxicodependência e aos novos fenómenos associados, são testemunhos da política governativa dos últimos quatro anos. Uma política de direita em que convergem a incapacidade para fazer face aos reais problemas dos jovens e a ruptura deliberada com as conquistas de Abril e a criação de novas gerações sem direitos.

O movimento associativo estudantil e juvenil, o movimento sindical com destaque para a Interjovem e outros espaços de participação juvenis, têm assumido um papel determinante no esclarecimento, na mobilização e dinamização da forte luta juvenil. As acções dos estudantes do ensino básico e secundário contra a revisão curricular, pela educação sexual e por melhores condições físicas e humanas nas escolas, as grandiosas manifestações dos estudantes do ensino superior contra as propinas e a lei de financiamento, a participação dos jovens trabalhadores nas lutas pelo emprego, salários e contra o pacote laboral, as iniciativas dos estudantes do ensino profissional contra as propinas e a revisão curricular, o envolvimento da juventude na luta contra a retirada do crédito bonificado à habitação, a luta desenvolvida contra o encerramento do ensino nocturno em várias escolas e a participação nas manifestações contra a guerra, são alguns exemplos da intensa luta dinamizada pelo movimento juvenil.

A JCP, organização autónoma dos jovens comunistas, teve nos processos de luta juvenis desenvolvidos um papel estruturante e muitas vezes decisivo. Os últimos quatro anos confirmam a capacidade de ligação da JCP aos principais sectores do movimento juvenil e o aumento do prestígio do PCP junto da juventude.

Com uma acção diária nas escolas e com iniciativas regulares junto dos jovens trabalhadores, fundamentais para o esclarecimento e mobilização da juventude para a luta, a JCP, no quadro da orientação geral do PCP, reafirmou o seu papel insubstituível de ligação do Partido à juventude. O trabalho em áreas diversificadas como a habitação com as iniciativas pela reposição do crédito bonificado à habitação, as campanhas em torno dos direitos sexuais e reprodutivos e as novas frentes desenvolvidas como a intervenção organizada junto dos estudantes do ensino profissional e nas várias expressões do associativismo juvenil de base local, permitiram uma intervenção mais abrangente e um conhecimento mais profundo destas realidades e criaram melhores condições para o desenvolvimento de novas frentes de luta.

Num quadro de profunda ofensiva ideológica que procura empurrar a juventude para os valores do individualismo, do reformismo, para o sucesso a qualquer preço, para o conformismo e amorfismo políticos, a JCP tem combatido e procurado cumprir o seu papel de organização revolucionária da juventude, nomeadamente na transmissão das nossas propostas e valores democráticos, de solidariedade, igualdade, paz e combate às injustiças e de afirmação da existência de outro caminho e outro projecto de sociedade.

Esta acção tem contribuído para ganhar o apoio de largas massas juvenis para valores e propostas do PCP e da JCP, traduzidas em níveis de adesão à JCP (mais de 4000 novos recrutamentos neste período), que reflectem uma importante capacidade de atracção dos valores e ideais comunistas.

Merece particular destaque e importância para a JCP, para o Partido e para o movimento juvenil a realização do 7.º Congresso da JCP em Novembro de 2002. A preparação constituiu um momento de profunda discussão e afirmação da JCP, das suas propostas para a juventude e de afirmação ideológica da nossa visão do mundo. Ao juntar cerca de 800 delegados, o 7.º Congresso foi uma demonstração de força, convicção e confiança no futuro.

É de destacar também a assunção desde Março de 2003 pela JCP da presidência da Federação Mundial da Juventude Democrática (FMJD), organização juvenil internacional de massas, anti-imperialista, de esquerda e defensora da paz, que reúne em si organizações juvenis de todo o mundo. Também neste plano são de assinalar pelo seu significado a realização do Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes (FMJE), em Agosto de 2001 em Argel, e o agendamento para Agosto de 2005, na Venezuela, do 16.º Festival como um momento muito importante para a afirmação e reforço do movimento dos festivais e do movimento juvenil anti-imperialista.

O trabalho articulado entre a JCP e o PCP tem permitido ao Partido estar em melhores condições de intervir de forma consequente em defesa dos interesses e direitos da juventude, nomeadamente com acções legislativas nas áreas da educação, emprego e associativismo, e com a dinamização de acções em áreas que afectam os jovens como foi o caso das iniciativas desenvolvidas em torno de milhares recém-diplomados desempregados e do nível de iliteracia entre a juventude.

Desenvolvidas a partir da Comissão junto do Comité Central para o trabalho junto da Juventude, estas iniciativas mostram as potencialidades desta estrutura central. Uma maior regularidade no funcionamento, com o contributo das organizações regionais e sectores centrais, são caminhos para cumprir os seus objectivos de contribuir para a definição da orientação política para o trabalho junto desta camada e fazer a coordenação nacional da intervenção junto da juventude.

Apesar dos avanços registados, é necessário e possível progredir quer na afirmação própria da JCP, com os seus valores e propostas quer no reforço junto da juventude. A par de uma mais larga acção em torno dos problemas da juventude, o reforço do apoio do Partido ao trabalho e acção próprios da JCP e uma maior coordenação contribuirão para superar dificuldades existentes e abrir novas perspectivas à acção da JCP, que se traduza num aumento da capacidade de luta do movimento juvenil e para um decisivo contributo para o Partido.

Os reformados, pensionistas e idosos constituem cerca de 2 milhões e quinhentos mil portugueses, parte dos quais vivendo em situação extrema de pobreza. Uma situação que é inseparável do facto de a maioria dos reformados e pensionistas terem rendimentos inferiores a 60% do salário mínimo nacional.

Os últimos governos são responsáveis pela forte agudização das condições de vida dos reformados e idosos em resultado dos insignificantes aumentos dos valores das pensões e reformas (e do salário mínimo nacional) a par do brutal aumento dos preços de bens e serviços essenciais, designadamente da alimentação, transportes, água, electricidade, medicamentos, telefones.

Contrariando as promessas de convergência das reformas e pensões ao salário mínimo nacional, a Lei da Segurança Social da responsabilidade da maioria PSD/CDS-PP veio limitar a fixação dos valores das pensões correspondentes ao valor do salário mínimo às situações de carreira contributiva superiores a 30 anos e criar condições, com a tentativa de imposição de tectos contributivos, para a descapitalização do sistema e com a ameaça de exclusão das novas gerações do Sistema Público de Segurança Social.

A escalada privatizadora das funções sociais do Estado na saúde e na segurança social, a par da transferência das suas responsabilidades sociais para a família, para as autarquias e para a economia social (IPSS, Misericórdias, cooperativas, fundações, associações), cria novos e insanáveis factores de desigualdade e de pobreza que impedem o acesso a uma vida com dignidade e criam um vazio nas diversas respostas sociais adequadas às necessidades específicas das pessoas idosas.

O movimento dos reformados tem vindo a desenvolver uma importante acção quer pela sua presença activa nas acções convergentes com os trabalhadores e outras camadas quer através de acções específicas contra as políticas de direita, designadamente do governo PSD/CDS-PP, no que se refere à exigência de aumentos condignos das pensões e das reformas, ao direito à saúde e à segurança social.

A par da actividade diária das diversas Associações de Reformados realizaram-se diversas manifestações e outras acções de rua, Tribunas Públicas (de que é exemplo a efectuada em defesa do Sistema Público de Segurança Social), debates e apresentação de reivindicações ao governo e à Assembleia da República.

O 4.º Congresso da Confederação Nacional de Reformados Pensionistas e Idosos - MURPI - realizado em Julho de 2003, afirmou um conjunto de orientações de luta contra as políticas económicas e sociais que estão na origem das suas dificuldades em defesa de direitos constitucionalmente consagrados, do acesso a um serviço de saúde público e de qualidade e a um forte Sistema Público de Segurança Social.

O MURPI englobando mais de 200 organizações, comissões e associações de reformados, pensionistas e idosos no Continente e na Madeira, continua a ser a força determinante na dinamização da organização e da luta dos reformados. A intervenção do MURPI e da Inter-Reformados nas suas áreas específicas e a sua acção convergente têm contribuído para ampliar e reforçar a mobilização dos reformados.

A defesa dos interesses dos reformados e a afirmação dos seus direitos exigem como linhas de orientação: o aprofundamento do conhecimento dos problemas e reivindicações dos reformados, pensionistas e idosos, e o reforço da acção política do Partido, com a sua intervenção própria junto dos reformados aos diversos níveis; a dinamização do trabalho unitário, em cada região, designadamente a partir da acção das Associações de Reformados e das Federações Regionais do MURPI.

O Movimento Associativo Popular e outras formas de associação exprimem uma ampla diversidade de campos de acção - colectividades de cultura, recreio e desporto, comissões e associações de moradores, associações de condóminos, de defesa do património ambiental e construído, dos direitos dos utentes dos serviços públicos, cooperativas, associações de bombeiros, IPSS e outras na área social.

Expressão organizada da vontade popular e da resposta crescente às necessidades concretas da população face à crise social provocada pela política de direita, o movimento associativo - pela sua natureza, pela sua influência social, cultural, económica, política e ideológica, e pela sua legitimação (estima-se em mais de 4 milhões os seus associados) - assume formas concretas de exercício de um poder específico a nível local, muitas vezes com uma influência decisiva na vida das comunidades.

O voluntariado, elemento central e decisivo da vida associativa, afirma-se no essencial por uma atitude de serviço à comunidade que contrasta com a falta de correspondência por parte do Estado nos apoios e meios indispensáveis ao exercício da actividade voluntária de milhares de cidadãos, já de si afectada pela menor disponibilidade resultante da crise laboral e social.

As colectividades de cultura, recreio e desporto são uma fortíssima componente do movimento associativo popular. Existem mais de 17 mil colectividades legalmente constituídas, dirigidas por mais de 234 mil dirigentes, e com um número de associados que ultrapassa os 3 milhões. A sua distribuição pelo território nacional é generalizada no Continente e Regiões Autónomas e em países com forte presença de comunidades portugueses.

Desde o último Congresso do PCP os governos do PS e do PSD/CDS-PP mantiveram uma postura demagógica de elogio ao papel das colectividades ao mesmo tempo que no exercício do poder foram esquecendo promessas e compromissos, seja em termos de apoios financeiros e estruturais seja em termos legislativos, surgindo os apoios do Estado de forma pontual e avulsa, associados a objectivos políticos, partidários ou ideológicos.

A recente criação da Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto introduziu a mais importante alteração qualitativa neste movimento, nos últimos 4 anos, permitindo uma maior articulação e coordenação do movimento, acelerando a sua estruturação Distrital e Concelhia, criando novas condições de mobilização das colectividades e de intervenção junto do poder político, visando o reconhecimento e valorização do movimento associativo popular e dos seus dirigentes, através de um conjunto de acções de que se destaca a petição à AR, assinada por mais de seis mil cidadãos, que manifestaram a urgência de aprovação de um quadro legislativo ajustado à realidade associativa e às suas necessidades, de apoio e afirmação na sociedade portuguesa.

Neste período entre congressos, o PCP apresentou na Assembleia da República várias iniciativas legislativas que conduziram, com o apoio e a pressão do associativismo, à aprovação das leis sobre «Reconhecimento e Valorização do Movimento Associativo Popular», que fixa o dia 31 de Maio como o Dia Nacional das Colectividades e reconhece o Estatuto de Parceiro Social ao Movimento Associativo, e sobre o «Estatuto Social do Dirigente Associativo», que, no essencial, define créditos de horas para os trabalhadores dirigentes associativos. Constituindo passos positivos ficam muito aquém do necessário.

Através da intervenção dos comunistas no movimento associativo popular, da acção dos seus eleitos no poder local, em especial em situações de maioria, e da sua intervenção parlamentar, o PCP tem afirmado a importância que atribui ao movimento associativo como um patamar de exercício de liberdade, de participação organizada das populações, de consciencialização das suas necessidades e das formas de intervir para lhes responder, e como componente fundamental de uma democracia participada.

Para o PCP, uma gestão democrática e participada tem de ter em conta o papel social e político do movimento associativo popular e de outras instituições associativas locais, incentivando mecanismos, formas de organização e espaços de participação na definição das políticas locais, designadamente nas áreas sociais, culturais e desportivas.

São de considerar como orientações fundamentais para a acção dos comunistas no movimento associativo popular: o melhor acompanhamento dos problemas do Movimento Associativo por parte das organizações partidárias e dos organismos de direcção, responsabilizando quadros aos vários níveis de direcção, criando espaços de debate, apoio e coordenação que envolvam os membros do Partido com actividade nesta frente; o reforço da coordenação associativa nacional, regional e local, assim como a articulação nacional entre as diferentes expressões do associativismo; a concretização do Estatuto de Parceiro Social, reconhecido ao Movimento Associativo, na sua relação com os poderes central e local, assim como de um novo quadro legislativo ajustado às necessidades do movimento; o reforço da participação dos comunistas na vida associativa, enquanto forma de participação social e intervenção política e ideológica na sociedade, e de relacionamento institucional do PCP com as estruturas associativas; o contributo para a participação e intervenção do movimento na luta social por políticas que melhorem a qualidade de vida dos associados e criem melhores condições de participação associativa.

O Movimento Associativo dos Bombeiros desenvolve, para além de uma importante actividade cultural, desportiva e social, uma inestimável actividade, prestando múltiplos serviços à comunidade nas áreas do socorro, sinistralidade, catástrofes, saúde e transporte de doentes. Contando com mais de 406 associações e 45 mil voluntários, este movimento tem sido confrontado com tentativas de responsabilização pela ausência de políticas de prevenção dos fogos florestais, apesar do seu empenho e esforço na preservação do património florestal que as políticas de sucessivos governos vêm descurando. Na verdade, o Serviço Nacional de Protecção Civil e Bombeiros continua a não funcionar como um serviço estruturado e com capacidade de intervenção e a revelar-se incapaz de resolver com eficácia as situações de articulação e coordenação que levaram à sua constituição (fusão do Serviço Nacional de Protecção Civil com o Serviço Nacional de Bombeiros); mantém-se por concretizar a legislação relativa aos bombeiros e aos seus direitos; subsistem a falta de meios, medidas de prevenção e equipamentos.

Afigura-se indispensável a acção e a luta com vista ao fortalecimento do Associativismo de Bombeiros, à consolidação da sua autonomia e à melhoria da capacidade de resposta, através da dotação dos meios adequados ao exercício das suas funções em prol das populações.

É crescente e cada vez mais significativo o número de associações de solidariedade social - cerca de 4500 empregando mais de 70 mil trabalhadores - , a maioria das quais com um estatuto de Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), cujo âmbito de intervenção se insere na área social, designadamente nas valências de infância (creches, infantários, ATL), de apoio a idosos (serviços de refeições, apoios domiciliários, centros de dia, lares de idosos) e outras como as de inserção social (apoio a mulheres prostituídas, a cidadãos sem abrigo e a toxicodependentes).

A par do forte peso das IPSS de matriz religiosa existe um número crescente das que apresentam uma natureza laica e associativa, envolvendo um amplo conjunto de pessoas como utentes, dirigentes e voluntários. Em muitas localidades e áreas sociais estas instituições são a única resposta disponível face à continuada e deliberada demissão do Estado das suas funções sociais.

Importa assim na acção do PCP e das suas organizações aprofundar o conhecimento da natureza e dimensão social e política das IPSS nas diferentes regiões e promover uma maior articulação entre os comunistas que intervêm nestas instituições - dirigentes, trabalhadores, utentes.

As pessoas com deficiência, pela natureza dos seus problemas, pelos apoios específicos que requerem e pelas discriminações de que são vítimas na sociedade, continuaram a ser gravemente penalizados com a política de direita.

Promessas repetidas de resolver os problemas mais candentes, foram sendo sucessivamente adiadas e mesmo medidas sobre as quais já há legislação promulgada ficaram pura e simplesmente no papel: quota de emprego para a Função Pública, Planos Nacionais de Emprego, Inclusão Social, Acessibilidades. As Tabelas de Incapacidade continuam escandalosamente desajustadas. A Educação Especial foi alvo de forte ataque visando a destruição do ensino inclusivo. Na sinistralidade do trabalho, apesar de continuar a fazer milhares de vítimas, os governo do PSD/PP enfraqueceu ainda mais os já débeis mecanismos de fiscalização. Verificou-se um quase total afastamento das organizações de pessoas com deficiência da elaboração das políticas para esta área.

Apesar da situação desta camada social ter sido gravemente atingida pela política de direita contraditoriamente, a luta contra esta política e pela satisfação de reivindicações específicas esteve longe das exigências da situação e das possibilidades objectivas, a que não são alheias as ilusões criadas com as promessas governamentais, a demagogia em torno do Ano Europeu do Deficiente, o esforço dos governos do PS e do PSD/PP para «integrarem« as organizações de pessoas com deficiência em mecanismos ditos de «diálogo».

O Partido, com grande prestígio junto desta camada social, foi a força política que mais se destacou na defesa dos interesses e das reivindicações das pessoas com deficiência, exigindo a sua satisfação, denunciando a gravidade da sua situação, tomando iniciativas legislativas e realizando na A.R. uma audição parlamentar às organizações de pessoas com deficiência e outras intervenientes nesta área.

Entretanto, continuaram a acentuar-se atrasos e insuficiências no trabalho partidário já anteriormente detectadas, nomeadamente um menor número de quadros a intervir nesta área e uma menor atenção de algumas organizações por esta frente de trabalho.

É necessário dar maior atenção aos problemas das pessoas com deficiência, destacando mais quadros para esta frente e reforçando e melhorando o acompanhamento dos militantes que intervêm nas diferentes estruturas unitárias.

O movimento associativo dos pais, expressando a importância da participação organizada dos pais na escola, tem características particulares e peculiares que lhe criam dificuldades de consolidação, as quais se devem, em primeiro lugar, aos limites da duração dos percursos lectivos dos educandos por cada nível de ensino. Este facto cria alguma instabilidade às associações de pais, nomeadamente ao nível dos órgãos sociais, a que acrescem os problemas e entraves que resultam da situação laboral dos encarregados de educação, da ausência de apoios às famílias e das limitações quanto ao crédito de horas (4 por trimestre) para um encarregado de educação poder acompanhar a vida escolar.

Os comunistas, dado o projecto humanista da sua ideologia, em que a educação e a cultura ocupam lugar de destaque na formação integral do indivíduo como ser humano, devem assumir um activo papel na dinamização ou reactivação de associações de pais, conferindo-lhes um carácter reivindicativo; no contributo para uma maior mobilização dos pais e famílias para as questões do ensino e da educação; na participação dos representantes dos pais nos conselhos escolares do pré-escolar e 1.º ciclo do ensino básico; na aplicação e regulamentação da Lei n.º 2/2004, de 5 de Junho; na alteração do Código de Trabalho de modo a garantir um maior crédito de horas que permita aos pais um efectivo acompanhamento da actividade escolar; num efectivo apoio do Estado ao movimento associativo de pais nomeadamente quanto ao financiamento das suas actividades associativas e de formação.

A generalidade dos micro, pequenos e médios empresários enfrenta, na sua actividade, as dificuldades decorrentes da recessão económica e da crescente monopolização de sectores, actividades e mercados e das políticas macroeconómicas favoráveis ao grande capital, em particular do sector financeiro e da grande distribuição, praticadas pelos sucessivos governos, com destaque para o do PSD/CDS-PP. Entre os problemas graves com que se confrontam as micro, pequenas e médias empresas estão os critérios e as garantias exigidas para o acesso aos fundos do III Quadro Comunitário de Apoio, que os mantém praticamente inacessíveis a estas, favorecendo as empresas do grande capital nacional e estrangeiro.

Na política fiscal, continuaram as facilidades e os milhões de euros em benefícios fiscais atribuídos ao grande capital, e uma política fiscal desadequada e penalizadora das micro, pequenas e médias empresas, com destaque para o chamado Pagamento Especial por Conta. A nova lei do licenciamento comercial, aprovada pelo governo PSD/CDS-PP, liberalizou ainda mais a implantação de novos espaços comerciais, favorecendo a expansão de grandes grupos nacionais e multinacionais da distribuição. Também as projectadas alterações à Lei do Arrendamento vão traduzir-se por instabilidade e aumentos de rendas que cavarão ainda mais a ruína de pequenas empresas do comércio e serviços e pequenas oficinas, em particular dos centros históricos de vilas e cidades, descaracterizando-os, pois têm nessa actividade uma importante dinâmica da vida social e urbana. A que se acrescentam as dificuldades no acesso à justiça, créditos bancários, apoios ao associativismo e à formação, que continuam a favorecer as estruturas associativas do grande patronato.

É no contexto do agravamento dos problemas dos micro, pequenos e médios empresários, decorrente da política de centralização e concentração capitalistas prosseguida pelo governo PSD/CDS-PP, que se pode perceber o quadro extremamente complexo no seio das estruturas associativas dos empresários portugueses. Quadro que, continuando determinado pelas confederações dominadas pelo grande capital português e só representativas dos interesses deste (CIP, CCP, AIP, AEP), é palco de rivalidades e interesses conflituantes, particularmente quanto à distribuição dos fundos comunitários e das verbas do Orçamento do Estado, o que não impede entretanto a sua plena convergência com vista à apropriação dos rendimentos e mercado das micro e pequenas empresas em proveito das grandes e de uma maior exploração dos trabalhadores portugueses.

É também nesse quadro que se verificam «deserções» e afastamentos dessas confederações por parte de associações dominadas por micro, pequenos e médios empresários que não se revêem nessas confederações (e lutas eleitorais pelo seu domínio) e o crescer de movimentos e estruturas independentes de micro e pequenos empresários, procurando afirmar \e defender os seus interesses de classe. Situação particularmente visível no sector do comércio retalhista, em que o domínio triturador dos lobbies das farmácias, das grandes empresas do comércio automóvel e da grande distribuição torna mais nítida a fractura e a diferença dos interesses, que serão ainda mais evidentes com o desenvolvimento do chamado comércio electrónico.

Abre-se, assim, um vasto campo de potencialidades e possibilidades, já realçados nos congressos anteriores, para expansão e fortalecimento de amplas movimentações e lutas dos micro, pequenos e médios empresários. É na base desse ambiente que, apesar de dificuldades e limitações, a Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas (CPPME) vai afirmando um associativismo de classe intimamente ligado aos problemas concretos deste importante sector social. Um associativismo enriquecido por um conjunto de quadros com experiência sindical e política, ex-assalariados que, vítimas da política de direita, tiveram de optar pela actividade empresarial.

A importância política e social deste sector - ao nível de emprego, peso na actividade económica e na produção nacional - e as contradições dos processos económicos e sociais que o atravessam tornam possível a evolução da sua consciência e posicionamento de classe, facilitam o crescimento das suas organizações independentes, constituindo um factor de interesse relevante para a construção de uma alternativa de esquerda.

O impulso e desenvolvimento orgânico e independente desta camada, com o apoio às suas lutas e reivindicações justas, com uma maior expressão institucional dos seus interesses de classe, é do interesse da luta do PCP e deve ser inscrita como tarefa e objectivo.

O Movimento Cooperativo mantém uma importância no tecido económico, social e cultural de grande relevo, embora quase tenham desaparecido as cooperativas de produção operária e as agrícolas ligadas à reforma agrária.

Aos impactos económicos que as empresas cooperativas geram, há ainda que valorizar os sociais traduzidos na criação de emprego, na defesa dos direitos dos consumidores, na melhoria das condições de vida nos campos, na edificação de habitação a custos controlados, na promoção da defesa do meio ambiente, no envolvimento e animação das comunidades em que estão inseridas.

Esta realidade não ilude a existência de aproveitamentos por parte do capital que, fazendo uso do estatuto cooperativo, retiram vantagens, em especial fiscais, funcionando como normais empresas capitalistas.

Inseridas na economia, de acordo com estabelecido na Constituição da República, as cooperativas continuam a não ver solucionados por parte do actual governo PSD/CDS-PP, tal como dos que o antecederam, questões como o acesso ao crédito, aos fundos comunitários, bem como o cumprimento e a promoção do estatuto e valores cooperativos e a sua integração nos currículos escolares. O poder político não só não cumpre a Constituição como privilegia os grupos económicos e financeiros e sectores da economia social e algumas instituições, como as fundações e misericórdias, beneficiários da privatização da prestação de cuidados de saúde e da protecção social.

As consequências da política de direita dos sucessivos governos e a crise económica e social reflectem-se nas dificuldades que muitas cooperativas atravessam, de que são exemplo os ramos da habitação e agrícola.

O ramo das cooperativas de consumo, alvo de profunda reestruturação por via do desenvolvimento do intercooperativismo e do aproveitamento das suas sinergias, embora também afectado pela crise conseguiu crescer e recuperar influências. A este desenvolvimento não poderão estar desligados recente esforços no plano do Partido em acompanhar a intervenção dos comunistas no movimento. A realização de um Encontro Nacional e de plenários anuais, bem como a criação de uma coordenadora, são passos que necessitam de ser reforçados pela responsabilização de quadros para esta frente no âmbito da Direcções Regionais, em especial nas regiões de maior influência do movimento.

Os emigrantes estão confrontados com os efeitos das políticas de direita prosseguidas em Portugal pelos sucessivos governos que não salvaguardam os direitos constitucionais destes cidadãos portugueses cujas remessas enviadas são de grande importância para o país. A acção governamental tem sido marcada por permanentes promessas e pela tentativa de instrumentalização das comunidades para efeitos estritamente eleitorais, sem dar resposta aos seus problemas. A acção do PSD/CDS-PP na Assembleia da República, no governo e no Parlamento Europeu, deu novos passos na privatização de importantes funções sociais do Estado à custa da destruição de importantes direitos constitucionais dos emigrantes.

Contrariando o importante papel do Conselho das Comunidades Portuguesas, enquanto órgão representativo dos emigrantes e órgão consultivo para as políticas de emigração, os sucessivos governos, não conseguindo instrumentalizá-lo, têm optado por uma deliberada tentativa de dificultar o exercício das suas competências e de reduzir meios financeiros e técnicos essenciais à sua intervenção.

Destaca-se, entretanto, a importante acção que tem sido desenvolvida pelos emigrantes contra a tentativa da maioria PSD/CDS-PP de fechar consulados e de destruir o seu carácter público, com redução de meios financeiros, técnicos e humanos e a sua entrega a entidades privadas, criando insanáveis dificuldades nas respostas às suas solicitações; na luta contra a nova Lei de Bases de Educação que se repercutirá negativamente numa maior exclusão e abandono do acesso à aprendizagem da língua portuguesa; a ausência de uma política de acompanhamento do Acordo Bilateral UE-Suíça sobre a livre circulação de pessoas que penaliza os emigrantes, tal como a tentativa de retirar aos ex-emigrantes na Suíça o direito constitucional de acesso aos serviços de saúde em Portugal.

Num processo de luta com mais de 20 anos em defesa dos seus direitos, os trabalhadores externos do MNE viram finalmente aprovado o seu Estatuto Profissional, prosseguindo, agora, essa luta pela concretização destes direitos na prática.

Os comunistas desenvolvem uma importante intervenção em defesa dos direitos dos trabalhadores emigrantes e das suas famílias, exigindo o cumprimento dos seus direitos constitucionais, a defesa e salvaguarda da língua portuguesa e das especificidades culturais, a par da reivindicação da sua integração nos países de acolhimento. Esta acção desenvolve-se no quadro da intervenção institucional, na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, através da organização do PCP na emigração e da participação de comunistas, com outros democratas, no Conselho das Comunidades e em diversas associações.

No desenvolvimento da sua acção, os comunistas deverão ter como objectivo: o reforço da sua organização nos vários países onde existem comunidades portuguesas tendo em atenção o recrutamento, a participação dos militantes na vida partidária e o alargamento da influência política e eleitoral do PCP; a intervenção tendo como objectivo o reforço do papel das Associações de emigrantes numa acção persistente e continuada visando o encontro, o debate e o reforço da sua acção de modo a permitir aumentar a sua participação cultural, social e política; o contributo para um activo e regular papel do conselho das comunidades e para o seu papel na defesa dos direitos dos emigrantes.

De uma realidade marcada fortemente pela emigração, Portugal tornou-se, no espaço entre congressos, o destino de milhares de cidadãos imigrantes oriundos especialmente do Brasil e dos países da Europa do Leste.

Esta massa de trabalhadores, movidos por razões semelhantes às que levaram a outros países muitos milhares de portugueses, estão sujeitos a condições de trabalho e de vida degradantes e a uma exploração da sua mão-de-obra. A situação de ilegalidade em que muitos se encontram colocam-nos numa situação de maior exploração, de exclusão do acesso ao direito à saúde e à aprendizagem da língua portuguesa, e de plena vulnerabilidade face a todo o tipo de arbitrariedades a que são sujeitos.

Os trabalhadores imigrantes e suas famílias, especialmente de comunidades com uma mais antiga presença em Portugal, são confrontados com uma persistente precariedade de condições de vida e de trabalho, perpetuando um ciclo de desigualdades e de pobreza que se repercute nos seus descendentes, particularmente vulneráveis ao insucesso e abandono escolar e a dificuldades de integração social.

Os sucessivos governos - oscilando entre os discursos de preocupação social para dar cobertura a medidas paliativas de que foi exemplo o governo do PS, e os discursos perigosamente xenófobos e racistas de Paulo Portas e do governo PSD/CDS-PP, supostamente justificativos de políticas de «rigor» - procuram esconder o carácter restritivo da legislação em vigor quanto à admissão legal de imigrantes, utilizado por parte de engajadores e entidades patronais sem escrúpulos para a entrada em Portugal de mão-de-obra ilegal, barata e sem direitos.

A maioria PSD/CDS-PP criou novas e intransponíveis exigências à regularização dos imigrantes ao mesmo tempo que, a pretexto do combate à criminalidade, aumentou as acções de carácter repressivo e intimidatório por parte de forças policiais e do SEF, e cujo resultado concreto se salda em transformar a comunidade de imigrantes em bodes expiatórios dos problemas de segurança.

O Conselho Consultivo para os Assuntos de Imigração não vê devidamente valorizado o seu papel.

O movimento sindical, designadamente a partir da acção de sindicatos em que se verifica uma maior presença de imigrantes, tem vindo a desenvolver uma importante acção de esclarecimento e defesa dos direitos dos imigrantes.

A Frente Anti-Racista (FAR) integra o Conselho Consultivo do Alto Comissariado para a Imigração, tem participado anualmente na Festa da Diversidade e tem desenvolvido diversas iniciativas públicas de denúncia das causas e responsáveis pelo racismo e xenofobia e projectos de intervenção local. A FAR integra a Comissão Contra a Discriminação Racial, que é constituída por associações de imigrantes e de minorias étnicas.

A acção desenvolvida pelos comunistas na Assembleia da República e no Parlamento Europeu pautou-se pela apresentação de iniciativas legislativas visando a alteração da «lei dos estrangeiros» e a alteração da lei da nacionalidade, no sentido do reagrupamento familiar.

No quadro da acção que o PCP e os comunistas vêm desenvolvendo, desde a publicação de materiais à realização de iniciativas dirigidas a imigrantes e respectivas associações, são de considerar como direcções de trabalho futuro: o reforço da intervenção sindical visando a sindicalização dos trabalhadores imigrantes e a integração da sua luta no quadro da luta mais geral dos trabalhadores; o reforço do debate ideológico e da iniciativa política das organizações do Partido pela integração social dos cidadãos estrangeiros que vivem e trabalham em Portugal, de modo a pôr fim à sobrexploração destes trabalhadores (e o seu uso numa dinâmica de redução dos direitos do conjunto dos trabalhadores) e a garantir o respeito pelos seus direitos elementares; uma empenhada intervenção no combate às causas que estão na origem do racismo e da xenofobia, a par da luta por alterações de mentalidades que permitam um maior conhecimento das diversas identidades culturais, o respeito pela diferença e por uma efectiva promoção do diálogo intercultural; a ampliação do conhecimento da situação de diversas comunidades étnicas, com especial atenção às que se encontram numa situação de maior vulnerabilidade social.

O movimento da paz conheceu uma forte e diversificada intervenção face à escalada do imperialismo no plano internacional e à total subordinação do governo do PSD/CDS-PP à política agressiva e belicista da Administração norte-americana.

Destacam-se, neste âmbito, as diversas manifestações para impedir o desencadeamento da guerra no Iraque, contra a sua ocupação e pela retirada do contingente da GNR desse país, a par de outras acções contra a guerra do Afeganistão, a militarização da UE, a corrida armamentista, o reforço e alargamento da NATO.

De igual modo se evidenciam as acções de solidariedade com o povo palestiniano pela criação do seu Estado independente e soberano, contra a política de terrorismo de Estado de Israel e a construção do muro do apartheid; contra o bloqueio a Cuba; de solidariedade com os povos em luta no Iraque, na Venezuela, Colômbia, Brasil, Timor-Leste, Saara Ocidental.

O Conselho Português para a Paz e Cooperação (CPPC) confirmou-se como estrutura aglutinadora e impulsionadora do movimento pela paz, reforçando as suas posições junto da opinião pública. Simultaneamente, o alargamento e a amplitude do movimento unitário em defesa da paz contou, neste período, com o empenho e a contribuição do movimento sindical para a promoção da convergência de organizações sociais de dimensões e influência muito distintas, de individualidades, de autarquias e outras instituições, nomeadamente religiosas, em torno de objectivos precisos e concretos de que foram exemplo as importantes manifestações de massas de 15 de Fevereiro e 22 de Março de 2003, realizadas no quadro de jornadas mundiais pela paz.

A JCP tem desenvolvido importante acção, no plano nacional, na mobilização dos jovens na luta pela Paz e, no plano internacional, através da Federação Mundial da Juventude Democrática a que preside.

A iniciativa própria do Partido, aos vários níveis, conheceu um forte impulso com uma mais regular tomada de posições públicas, a edição de documentos e propaganda, a realização de debates e outras acções de esclarecimento dos trabalhadores e da população, e o contributo com a sua intervenção própria para iniciativas unitárias em defesa da paz.

Perante a ofensiva do imperialismo e as consecutivas agressões a Estados soberanos, a violação sistemática do direito internacional e a instrumentalização da ONU, a corrida aos armamentos, nomeadamente o nuclear, o alargamento da NATO e a militarização da UE, permanece como um perigo real a generalização das guerras de agressão, o que torna esta frente de luta numa das prioridades da acção dos comunistas que deverão agir no sentido de atrair ao movimento da paz os mais diversos sectores sociais e correntes de opinião.

O movimento de defesa do ambiente encontra na crescente degradação dos recursos naturais um importante campo de intervenção e de luta mais visivelmente preenchido pela actividade de organizações nacionais e internacionais existentes que, com expressões e objectivos diferenciados e com maior ou menor autonomia face aos poderes políticos e económicos, intervêm neste domínio. A pressão sobre os recursos naturais e a degradação progressiva do ambiente, inseparáveis do processo capitalista de apropriação privada da natureza, exigem uma mais decidida atenção das organizações do Partido e uma maior intervenção dos comunistas não apenas nas diversas associações e movimentos ambientalistas existentes, mas também na criação de novas estruturas que, centradas em objectivos diversos - combate à poluição, degradação de recursos, pressões urbanísticas, defesa da biodiversidade, direito à água, etc. - , possam e devam dinamizar a luta e fazê-la convergir com os objectivos mais gerais de resistência e oposição às políticas e interesses económicos do capitalismo.

No quadro da dinâmica internacional do chamado movimento antiglobalização, a realização do Fórum Social Português, em Junho de 2003, possibilitou um momento de encontro de organizações e movimentos com intervenção, influência e experiências muito diversificadas.

Na sua preparação e realização, o Fórum Social Português foi percorrido por uma intensa luta ideológica e por uma indisfarçável tentativa de o usar como instrumento de disputa de condução política e de marcação dos seus conteúdos e objectivos. Com efeito, desde o início da sua preparação, destacados quadros do Bloco de Esquerda, acompanhados por pessoas e organizações que influenciam, tentaram impor um novo modelo de iniciativa, valores e tendências que não correspondem à realidade e às dinâmicas nacionais nem respeitam a autonomia e a expressão das diversas organizações.

A intervenção e a presença dos comunistas, abertas à convergência e coincidência de pontos de vista sobre as consequências do neoliberalismo, sublinhando a identificação do capitalismo como gerador das desigualdades e injustiças valorizando a luta concreta no espaço nacional, e o elemento crucial da luta de classes, deram uma elevada contribuição para a realização do Fórum Social Português e que devem constituir referências para a participação e intervenção dos militantes comunistas em próximas iniciativa e Fóruns no nosso país.

 

3.7. Acção de massas e intervenção nas instituições

O combate à política de direita e sua substituição por uma política de esquerda constituem um inadiável objectivo de luta e uma necessidade imperiosa para o país e para os portugueses.

As organizações de massas constituem a base organizada da vasta frente social de luta que se tem oposto com a sua intervenção, quer na defesa de interesses específicos quer pela sua convergência por objectivos mais gerais, à política de direita. Estas organizações e movimentos, reflectindo uma efectiva aspiração de largos sectores a uma participação democrática, constituem um elemento essencial na luta por uma nova política.

A influência de massas do Partido, inseparável da intervenção de milhares de comunistas nestas organizações, exige uma atenção crescente à acção nestas estruturas, de acordo com as orientações do Partido, no sentido do seu reforço, da afirmação do carácter unitário das mesmas e da prossecução dos seus objectivos específicos.

O desenvolvimento das organizações de massas é essencial para uma ampla e eficaz acção e luta das massas, e é em si mesmo um factor indispensável para a elevação da sua consciência social e política.

No quadro de uma crescente polarização da vida política no plano parlamentar, a intervenção institucional do PCP acompanhou o seu envolvimento na luta de massas, traduzindo-se numa actividade ímpar, em volume e qualidade, que procurou responder aos principais problemas dos portugueses e do país, assim como combater e denunciar as medidas e orientações do governo.

Ao assumir a importância da articulação da luta de massas com a intervenção institucional, os deputados comunistas traduziram, na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, as reivindicações populares e ao mesmo tempo utilizam as potencialidades de iniciativa e intervenção no Parlamento nas batalhas concretas.

A valiosa actividade do Grupo Parlamentar do PCP, importante instrumento para a iniciativa do Partido, para a visibilidade da sua política alternativa e para a crescente ligação a todos os que aspiram a uma sociedade mais justa, traduziu-se em intervenção oportuna e de qualidade, abordando as grandes causas políticas e sociais, mas também as questões mais imediatas, retomando lutas de sempre, mas dando igualmente resposta às novas realidades e desafios do presente, combatendo a política do governo, mas ao mesmo tempo apresentando alternativas e soluções para os problemas do país.

A actividade dos deputados do Parlamento Europeu, integrados no Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica, constituiu igualmente uma importante frente do trabalho institucional no combate às políticas de direita, no contexto social e europeu, e de proposta de uma política comunitária assente na defesa intransigente da soberania nacional e dos interesses do país, contra o neoliberalismo, o federalismo e o militarismo, por uma Europa de paz e cooperação entre países iguais e soberanos.

A intervenção dos deputados do PCP continua a pautar-se por elevados padrões de exigência ética, pelo cumprimento dos compromissos assumidos, pela permanente disponibilidade para o contacto com as populações, os trabalhadores e os seus problemas, pela sua qualidade e oportunidade de iniciativa e intervenção.

O balanço positivo da intervenção institucional não dispensa contudo um esforço constante no enriquecimento do seu conteúdo, do seu acerto técnico e político, na melhoria da sua divulgação e na exploração de potencialidades existentes para uma melhor articulação com o trabalho de massas e a intervenção local, regional e sectorial do Partido.

 

3.8. Batalhas eleitorais

As eleições presidenciais de Janeiro de 2001 saldaram-se pela eleição para um segundo mandato, logo à primeira volta, de Jorge Sampaio que alcançou 55,8% dos votos contra 34,5% de Ferreira do Amaral, candidato apoiado pelo PSD e pelo CDS.

A votação (5%) alcançada pelo candidato do PCP, António Abreu, traduz o quadro muito específico e concreto destas eleições presidenciais, muito marcadas pelo sentimento geral de que Jorge Sampaio tinha a reeleição assegurada e em que, portanto, no campo eleitoral mais à esquerda uns propendiam para a vantagem de uma afirmação eleitoral autónoma enquanto outros se inclinavam para derrotar o candidato da direita logo na primeira volta.

Entretanto, é razoável admitir que, ao menos em parte, o resultado obtido pela candidatura do PCP tenha também sido influenciado pela tardia decisão de ida às urnas, a qual, num contexto particularmente complexo, teve o valor democrático de proporcionar a 220 mil eleitores um voto inteiramente conforme com a sua consciência e vontade que, de outro modo, com grande probabilidade se teria deslocado maioritariamente para a abstenção e que, expressando-se em vez disso nas urnas, comportaram um útil sentido de exigência crítica sobre o segundo mandato de Jorge Sampaio, que os seus mais recentes posicionamentos plenamente justificam.

As eleições autárquicas de 16 de Dezembro de 2001 traduziram-se num resultado negativo para a CDU e para o PS e num progresso das posições conquistadas e influência eleitoral da direita.

Por comparação com as anteriores eleições autárquicas, a CDU sofreu uma perda de 1,4 pontos na sua percentagem nacional, de 13 Presidências de Câmara (entre as quais as de Évora, Loures e Barreiro, obviamente não compensadas pela importante conquista do município de Setúbal) e de 391 mandatos em CM, AM e AF.

Apesar destas perdas significativas, os resultados alcançados pela CDU - 28 Presidências de Câmaras, 250 Presidências de Juntas de Freguesia, cerca de 3 mil eleitos, cerca de 580 mil votos (excluindo o concelho de Lisboa) e 10,6% dos votos para as Câmaras Municipais - confirmaram-na como a terceira força no plano autárquico.

De sublinhar que, como é característico da especificidade das eleições autárquicas, as perdas de posições sofridas pela CDU voltaram a assumir uma dimensão desproporcionada em relação à sua perda de influência eleitoral nacional. De uma forma geral, parecem ter sido patentes as dificuldades causadas à manutenção de posições pela CDU pela especifica «bipolarização» existente a sul do país (entre a CDU e o PS) e pelo efeitos negativos da estagnação ou erosão eleitoral do PSD nessas regiões.

Também a parcial transformação das eleições autárquicas numa espécie de legislativas antecipadas, bem como certos elementos de dramatização eleitoral, terão pesado no sentido de uma maior aproximação da votação autárquica da CDU à sua tradicionalmente menor votação em eleições legislativas.

Embora tal não possa ser convertido numa explicação geral ou única para os resultados nacionais, sem dúvida que deficiências diversas no trabalho e na gestão autárquicos e na preparação e desenvolvimento das campanhas eleitorais, insuficiências na acção de organizações locais e na sua influência, situações de esbatimento dos traços mais distintivos do nosso projecto autárquico no exercício do poder autárquico, movimentos de opinião e aspirações difusas de «mudança» entre sectores do eleitorado (que também penalizaram em alguns importantes concelhos o PS), têm de ser integrados no conjunto de factores que terão contribuído para as derrotas sofridas pela CDU.

No quadro das eleições autárquicas de 2001, assumiu um efeito e significado particularmente negativos a conquista, embora por uma margem tangencial, pelo PSD da Câmara Municipal de Lisboa, pondo termo a um período que, globalmente, representou uma grande e positiva mudança para a capital impulsionada, desde 1989, por sucessivas coligações integrando o PS, PCP e «Os Verdes».

Embora os resultados no concelho de Lisboa tenham atestado uma grave erosão da anterior base eleitoral da coligação «Amar Lisboa», parece legítimo admitir, até pela escassa margem de votos que a ditou, que a derrota sofrida não é separável de numerosos e graves erros de orientação durante a pré-campanha e a campanha (para as quais o PCP repetidamente alertou mas que, num quadro de muito deficiente funcionamento colegial e colectivo da coligação, não conseguiu rectificar). Neste contexto, é também de assinalar que a candidatura autónoma do Bloco de Esquerda, decidida por esta formação na base da sua completa recusa de um diálogo político que considerasse a sua integração na coligação «Amar Lisboa», e a sua postura de concentração da crítica e do ataque nesta coligação, ficou responsável por uma dispersão de votos e um desgaste favoráveis à direita e aos seus objectivos.

Os resultados das eleições autárquicas de 2001 não representaram em termos de correlação de forças e influência uma significativa viragem eleitoral. Mas, servindo de motivo ou de pretexto para o pedido de demissão de António Guterres e a consequente convocação de eleições antecipadas, permitiram ao PSD proclamar e instrumentalizar uma «dinâmica de vitória» que se projectaria nas legislativas de 17 de Março de 2002.

As eleições legislativas antecipadas de 17 de Março de 2002 vieram a marcar o fim do ciclo político iniciado em 1995, com o PSD a alcançar a posição de partido mais votado (40,1% contra 37,8% do PS) e sobretudo com a conquista de uma maioria absoluta de deputados do PSD e do CDS-PP que, por posterior acordo de coligação, viriam a dar suporte à formação de um novo governo da direita dirigido por Durão Barroso.

A CDU obteve nessas eleições um resultado negativo (6,9%) que traduziu a perda de 2 pontos percentuais e de cinco deputados e em que é legitimo admitir que tenham pesado fortemente elementos conjunturais muito desfavoráveis (não verificados nas eleições de 99), com a agravante do seu encadeamento e concentração num curto espaço de tempo, designadamente:

a súbita e inesperada convocação de eleições legislativas numa conjuntura política e de opinião muito marcada, quanto à CDU, pelos variados impactos dos seus maus resultados nas autárquicas de Dezembro de 2001;

os profundos danos causados à imagem do PCP, durante toda a pré-campanha das legislativas, por processos de contestação pública e deturpação das suas orientações por parte de alguns membros do Partido em que avultaram nomeadamente acusações de intolerância e a responsabilização do PCP pela falta de uma alternativa de esquerda;

a manifesta animosidade, preconceito e parcialidade que marcaram a cobertura por grande parte dos media da pré-campanha e da campanha da CDU;

a «dinâmica de vitória» protagonizada pelo PSD a partir das autárquicas com o correspondente avolumar do perigo do regresso da direita ao governo (situação inexistente nas eleições de 1999) e os seus reflexos em segmentos do eleitorado da CDU no sentido de favorecer um voto no PS «para derrotar a direita».

As eleições para o Parlamento Europeu realizadas em 13 de Junho de 2004 caracterizaram-se por uma estrondosa derrota da coligação PSD-CDS (33,3%), pela obtenção pelo PS do seu melhor resultado de sempre (44,5%), por um êxito do BE (ao atingir 4,9% e eleger um deputado) que beneficiou de uma intensa promoção mediática, e por um resultado da CDU (9,1% e a manutenção de dois deputados) que se pode considerar positivo no concreto enquadramento e condicionalismo desta eleição. É ainda de registar que os partidos de direita ficaram a 26 pontos percentuais da soma da votação dos partidos de oposição.

Com efeito, apesar de ter perdido 1,2 pontos por comparação com as europeias de 99, a verdade é que a CDU subiu 2 pontos em relação às legislativas de 2002, apesar de realizada toda a pré-campanha e quase toda a campanha debaixo das previsões de sondagens veiculadas pelos media de resultados catastróficos e limitados à eleição de um único deputado é de admitir que tenha sido prejudicada pelo inesperado cancelamento da campanha eleitoral numa altura em que se começava a afirmar mais fortemente um movimento de mobilização, esperança e confiança num bom resultado da CDU.

As eleições para as Assembleias Regionais dos Açores e da Madeira, realizadas em 17 de Outubro de 2004, ficam marcadas no plano dos resultados eleitorais obtidos pela CDU de modo contraditório: na Madeira, pelo significativo aumento da expressão eleitoral da CDU e da eleição de dois deputados, num quadro de conhecidos constrangimentos democráticos e em que se regista um recuo da expressão eleitoral do PSD; e nos Açores, pela perda da representação parlamentar da CDU no quadro de uma campanha forte e artificialmente bipolarizada e de ostensiva discriminação, que não deixará de pesar muito negativamente na vida democrática, na defesa dos interesses dos trabalhadores e do povo açoreano e no desenvolvimento da região.

Como foi salientado na Conferência Nacional realizada em Junho de 2002, é de admitir que, pesando de forma variada mas interligada, entre as causas da perda de influência eleitoral do PCP e das suas dificuldades de recuperação se encontrem por vários factores, designadamente:

  • os múltiplos efeitos ainda não superados em termos de opinião pública das derrotas do socialismo no Leste da Europa e a sua projecção negativa sobre a capacidade de atracção dos ideais e do projecto político próprio do PCP;
  • um conjunto de profundas mudanças na vida política, nas estruturas económicas e no tecido social, na relação dos cidadãos com a política e no plano dos valores e das atitudes sociais e políticas, para as quais o Partido ainda não encontrou resposta eficaz e que têm dificultado poderosamente ou a apreensão da mensagem e propostas do PCP ou a sua tradução em opções eleitorais;
  • as múltiplas debilidades, atrasos e deficiências na organização do Partido e na sua intervenção a variados níveis, que dificultam um maior enraizamento social do Partido, uma maior agregação política e ideológica do seu eleitorado e a conversão em apoio eleitoral da larga adesão que muitas das suas propostas, iniciativas e acções suscitam, nomeadamente no plano social;
  • a crescente e diversificada influência dos media sobre a formação da opinião dos cidadãos e sobre a vida política, induzindo designadamente negativas generalizações sobre «os partidos», a desagregação de valores e referências, uma fragmentação da informação, uma grande volatilidade dos movimentos de opinião e o silenciamento, deturpação e falsificação da real identidade, posições e orientações do PCP que criam especiais dificuldades à sua intervenção e mensagem;
  • as patentes dificuldades do Partido em superar ou atenuar os efeitos sobre as opções de voto da prolongada propaganda e favorecimento da «bipolarização» entre PS e PSD, induzindo critérios de opção de voto que, secundarizando o debate de propostas e de políticas, manifestamente prejudicam a afirmação eleitoral do PCP;
  • a perda de perspectivas e o desânimo causados em sectores do eleitorado do PCP pela prolongada imposição da política de direita e a sua correspondente falta de confiança na próxima concretização de uma real alternativa de esquerda.

Sendo certo que o papel do PCP na vida nacional não pode ser aferido exclusivamente pelos seus resultados eleitorais e pela sua representação nas instituições é entretanto indiscutível que estes aspectos têm assinaláveis reflexos sobre o conjunto da sua actividade, luta, intervenção e capacidade de atracção, pelo que o reforço da sua influência eleitoral tem de continuar a constituir uma preocupação fundamental e um objectivo inseparável dos progressos e avanços que se alcançarem na organização, intervenção e acção política do Partido.

As eleições para as autarquias locais a realizar em 2005, pela primeira vez no mês de Outubro, constituem uma das mais importantes batalhas políticas a exigirem uma pronta e adequada concentração de atenções e energias para as enfrentar com êxito.

Num quadro, por um lado, ainda incerto - quanto à evolução da situação política nacional, à arrumação das forças políticas presentes em cada concelho ou ao quadro legal em vigor quanto ao sistema eleitoral - , mas, por outro, marcado pela quase certa ofensiva sem escrúpulos, que o passado recente confirma, de que seguramente as posições do PCP nas autarquias serão alvo por parte do PS e da direita, a concretização dos objectivos eleitorais do PCP e da CDU exigirá de cada organização, militante e activista uma intervenção intensa e determinada.

O reforço e ampliação das posições do PCP no quadro da CDU, no âmbito da qual se prepara para concorrer em todo o país, contribuirão para afirmar um projecto autárquico com provas dadas na defesa intransigente dos interesses populares, na promoção das condições de vida, de desenvolvimento e progresso locais, na garantia de uma gestão democrática transparente e participada.

Definindo como objectivos o reforço das suas posições na autarquias - quer pela consolidação e ampliação das suas posições em maioria quer pelo alargamento da sua presença em minoria - e concorrer ao maior número possível de autarquias a começar pelo conjunto dos órgãos municipais - pelo significado e possibilidades que daí decorre de afirmação da presença e intervenção política no conjunto do território nacional - , a preparação das eleições exige, na perspectiva da concretização desses objectivos, as seguintes medidas e direcções de trabalho: a mobilização do conjunto do Partido na sua preparação, no quadro da acção geral e em convergência com o desenvolvimento da luta social e política no plano local e nacional; a dinamização da CDU em cada local com o alargamento da participação dos seus principais activistas e com o envolvimento e comprometimento de novos apoiantes, confirmando a CDU como espaço de acção política unitária e de convergência; a constituição de listas que, assegurando capacidade de influência e atracção, garantam uma efectiva qualidade de trabalho e uma acção nas autarquias de acordo com os objectivos, princípios e projecto autárquico do PCP; a valorização do trabalho e obra realizadas, a sua projecção futura e a avaliação e correcção atempada de deficiências e problemas que limitem ou prejudiquem essa valorização, bem como a afirmação do valor das proposta e do projecto alternativo e a demonstração da importância decisiva do reforço ou conquista de novas posições.

O projecto autárquico do PCP e o valor que lhe é reconhecido, seja pela obra realizada seja pela proximidade e identificação com as aspirações populares, são indissociáveis de um estilo de gestão pelos eleitos comunistas das autarquias locais que é expressão dos objectivos, natureza e concepção democrática e participada de exercício do poder. Um projecto que é obra colectiva de milhares de comunistas, homens e mulheres, eleitos e não eleitos que, com o seu trabalho e dedicação, intervieram e intervêm na luta pela melhoria das condições de vida do povo e pela transformação social.

A Conferência Nacional do PCP «A intervenção nas autarquias e a acção local do Partido», realizada em Maio de 2003, debateu, analisou e definiu as principais orientações, tarefas e objectivos que se colocam à intervenção dos comunistas nas autarquias e à acção local do Partido. Nas suas conclusões sublinha-se que a corporização e a concretização do projecto autárquico são inseparáveis da assunção do trabalho nas autarquias como componente da acção geral do Partido enquanto frente de luta e acção dos comunistas; da intervenção e participação dos trabalhadores e da população como condição essencial para uma gestão democrática em que o conceito de democracia participada, mais que um enunciado programático, é expressão natural da conduta de um partido que tem na ligação às massas a sua fonte principal de apoio e energia; da isenção, honestidade e entrega à defesa dos interesses das populações enquanto critérios de decisão e de conduta no exercício dos mandatos; da recusa de benefícios pessoais pelo exercício de cargos políticos enquanto expressão de integridade política e pessoal; da salvaguarda do serviço público municipal nas áreas da competência do Poder Local; da coincidência entre os objectivos políticos do Partido na sua acção presente e os objectivos e atribuições do Poder Local; da permanente procura para desenvolver uma acção marcada pela proximidade aos problemas, para estimular a luta e elevar a consciência política e social das populações indispensável aos objectivos mais gerais de transformação da sociedade. Como então se salientou, é decisivo o alargamento da consciência em todo o Partido da acção nas autarquias como um espaço de afirmação do PCP, de reforço da sua ligação às massas e da sua influência, assumido como uma importante frente de intervenção do Partido no plano local, que a incorpora mas não a esgota.

A confirmação e aprofundamento dos traços mais distintivos da acção dos comunistas nas autarquias, num quadro de maior complexidade e condicionamentos, são inseparáveis do reforço do trabalho de direcção do Partido, de uma mais afirmada actividade política das organizações locais e de uma melhor articulação entre o trabalho desenvolvido na autarquia com a acção local das organizações do Partido e a luta das populações.

As eleições presidenciais de 2006, num quadro ainda não definido mas que, perante acontecimentos recentes e previsível evolução da situação política, vão ser marcadas por uma maior complexidade em relação a eleições anteriores. O PCP participará nesta batalha com o objectivo de impedir que a direita se aposse deste órgão de soberania e consequentemente, sem perder o seu grau de decisão soberana e autónoma e afirmação da sua opinião própria, contribuir para um resultado capaz de assegurar a defesa da Constituição e o prosseguimento do regime democrático que ela comporta e projecta.

As eleições para a Assembleia da República a realizar em 2006, se até lá não forem convocadas eleições antecipadas, devem constituir um momento decisivo para o afastamento do governo do país da actual coligação de direita e uma clara condenação da sua política e para afirmação, pelo reforço das posições e expressão eleitoral do PCP, de uma nova perspectiva e um novo rumo para a política nacional. A concretização do reforço da influência política e eleitoral do PCP dificultará soluções construídas na base da mera alternância no poder entre o PSD e o PS, destinadas a prosseguir no essencial as orientações mais negativas e penalizadoras para os interesses dos trabalhadores, da população e do desenvolvimento do país, e criará condições mais favoráveis para soluções políticas que se traduzam numa efectiva alternativa à política de direita. O desenvolvimento da luta, a afirmação do PCP como força necessária e indispensável a uma nova política e a valorização do trabalho realizado na Assembleia da República são elementos indissociáveis dos objectivos políticos definidos e do trabalho necessário para os concretizar.

 

3.9. Quadro partidário

A situação política resultante das eleições legislativas de 2002 ficou marcada pela constituição da coligação de direita PSD/CDS-PP, num quadro em que o PSD sozinho dispunha apenas de maioria relativa na Assembleia da República. A coligação PSD/CDS-PP surgiu como condição para assegurar o apoio a um governo que, após a derrota do PS, pudesse intensificar a política de direita e garantir a subordinação da acção governativa aos interesses do grande capital nacional e estrangeiro. Traduziu-se no reforço dos sectores mais à direita, em particular ligados ao CDS-PP, designadamente nas áreas de governo ligadas aos sectores militares, policiais e do aparelho repressivo, no quadro mais geral da tomada do aparelho do Estado pelos representantes partidários e dos grandes interesses económicos.

A acção da coligação PSD/CDS-PP alicerçou-se numa forte ofensiva ideológica, exprimindo valores reaccionários, demagógicos e populistas, acompanhados de um forte pendor anticomunista, em que pontuaram frequentemente manifestações de arrogância e prepotência.

A solidez inicial da coligação de direita foi entretanto sendo crescentemente afectada por divergências internas, quer entre os dois partidos quer entre os diversos grupos de interesses neles existentes, sobretudo após a estrondosa derrota eleitoral nas eleições para o Parlamento Europeu. Existem, apesar disso, possibilidades de manutenção da coligação para além da legislatura em curso.

O Partido Socialista manteve nestes últimos quatro anos uma orientação caracterizada por uma identificação, nas questões mais essenciais e estruturantes, com as defendidas pela direita e por uma insistente postura e disponibilidade para acordos preferenciais com esta.

Na verdade, o PS prosseguiu enquanto foi governo e sem prejuízo de aspectos positivos em determinados sectores, áreas ou problemas, os traços fundamentais de política de direita já caracterizados no XVI Congresso, confirmados na sua acção governativa com a significativa opção por privilegiar, quer o PSD ou o CDS-PP, na elaboração e aprovação das orientações e instrumentos orçamentais mais estruturantes. Na oposição, o PS, afirmando-se com frequência contrário às decisões e orientações do governo PSD/CDS-PP, o que permitiu em diversos momentos a convergência entre as diversas forças de oposição designadamente com o PCP, manteve no entanto concordâncias expressas ou implícitas com orientações estruturantes da política de direita. Nuns casos, mantendo divergências de intensidade ou de método no quadro da concordância com opções de fundo, como acontece com o processo de privatização de hospitais e centros de saúde ou com a chamada «reforma da Administração Pública». Noutros casos, manifestando visíveis hesitações na definição da sua posição em relação às opções do governo PSD/CDS-PP, como aconteceu inicialmente em relação ao Código de Trabalho, à aplicação do pacto de estabilidade ou à condenação da guerra no Iraque. Noutros casos ainda, expressando uma inequívoca concordância com as orientações da direita, como aconteceu em matéria de privatizações, de financiamento dos partidos ou de política europeia e aprovando em conjunto com a coligação PSD/CDS-PP alterações que constituem profundos retrocessos políticos e democráticos, com destaque para as duas mais recentes revisões constitucionais e para a nova lei dos partidos políticos.

Acresce que o recente Congresso do PS confirmou e acentuou orientações de clara vinculação às políticas neoliberais, de pretensões hegemónicas, de hostilidade à cooperação e convergência entre as forças democráticas e de insistência numa linha de alternância de governo face à direita que não corresponde à necessidade e aspiração de uma efectiva alternativa de esquerda.

Tendo tido a sua origem na junção de várias forças de pendor esquerdista, o Bloco de Esquerda caracteriza-se fundamentalmente pelo seu carácter social-democratizante, embora mantendo traços de radicalismo de esquerda em muitas das suas acções e na construção da sua imagem, e por um discurso frequente e convenientemente afastado do confronto ideológico e de classe.

Desde a sua criação, o BE logrou alcançar o alargamento da sua expressão eleitoral e representação institucional, ao que não será alheia uma intensa e permanente promoção mediática de que sempre beneficiou, a que se juntou nos últimos dois anos a não inocente focalização nas suas iniciativas e intervenções das reacções do governo e dos partidos da direita no debate político. A sistemática construção de uma imagem de novidade e modernidade esconde frequentemente, sem prejuízo da atribuição de relevância e da expressão de posições diferenciadas em relação a algumas matérias, a não originalidade das suas propostas, tantas vezes património de luta e de intervenção do PCP há vários anos, e conduz por vezes a uma intervenção que, centrada na busca de protagonismo mediático, valoriza aspectos acessórios em detrimento de opções de fundo.

Sem prejuízo da natural diversidade de posicionamentos à esquerda e de um normal relacionamento entre forças democráticas, a que acresce a desejável congregação de posições no combate à política de direita, note-se no entanto que, para além de procurar alargar o seu espaço de influência em diversos movimentos sociais e políticos, em que contribuem para recorrentes preconceitos anticomunistas, o BE assume hoje o objectivo prioritário de disputar a influência eleitoral do PCP, continuando para isso a recorrer a deturpações e caricaturas das posições e orientações do PCP.

O Partido Ecologista «Os Verdes» mantém diversificada e positiva intervenção que contribui para o enriquecimento da CDU nos seus diversos espaços de intervenção. Privilegiando naturalmente as crescentemente relevantes questões ecológicas e dos recursos naturais, em que tem marcado posição em relação aos novos desafios que a evolução científica e tecnológica vai colocando (como por exemplo nas questões dos Organismos Geneticamente Modificados, da manipulação genética e da segurança alimentar), o PEV multiplica igualmente a sua intervenção em áreas de significativo interesse social, como as questões da igualdade, dos direitos das minorias ou das pessoas com deficiência. Não obstante a sua actividade, o PEV continua a ser alvo de uma descarada e permanente menorização e discriminação pelos principais meios comunicacionais em flagrante contraste com o tratamento dado a outras forças com representação parlamentar.

 

3.10. A luta por uma alternativa de esquerda

Tendo como perspectiva e referência o seu projecto e a sua proposta programática de uma democracia avançada e de uma sociedade socialista, a luta por uma alternativa política pela qual o PCP se bate é indissociável da luta por uma política alternativa que, inspirada nos valores e conquistas de Abril, rompa com a política de direita que cíclica e continuadamente tem vindo a ser desenvolvida tanto pelo PS como pelo PSD sozinhos ou acompanhados pelo CDS/PP.

Nos quatro anos que medeiam desde o XVI Congresso, o governo PS e posteriormente o governo PSD/CDS-PP confirmaram pela sua prática política, em particular nas questões estruturantes, a validade do conjunto de teses então formuladas e o erro que constituiria aprisionar o Partido a posições imediatistas e voluntaristas perante um PS claramente alinhado com políticas de direita.

Reafirmando a necessidade e a perspectiva de construção de uma política alternativa e de uma alternativa política de esquerda, processo necessariamente complexo e eventualmente prolongado, são condições determinantes para a sua concretização a ampliação da influência social, política e eleitoral do PCP e correspondente alteração da actual correlação de forças entre o PCP e o PS, no plano institucional favorável ao PCP, e o desenvolvimento e articulação da luta do movimento de massas e dos movimentos sociais a partir de objectivos concretos que convirjam simultaneamente para a reclamação e exigência de uma nova política, uma política de esquerda.

O empenhamento do PCP na procura da convergência, da unidade, da cooperação das forças democráticas, do alargamento de uma vasta frente social de oposição à política de direita com projecção e reflexos no plano político e institucional é inseparável do seu firme combate e denúncia da política de direita do PS e consequentemente de um forte apelo à intervenção dos trabalhadores e dos democratas, que não só responsabilize o PS pelas opções políticas de direita como exija a alteração da sua postura de bloqueio à construção de uma alternativa de esquerda.

O PCP, reafirmando a sua disponibilidade para o diálogo político e na perspectiva da construção e concretização de uma alternativa no quadro das instituições democráticas e do regime constitucional, não está nem estará disponível para se transformar em força de apoio ou ser cúmplice de um governo ou de políticas que, mesmo retocadas ou pontualmente alteradas, mantenham em questões estruturantes ou de fundo uma orientação e práticas de direita.

Assumindo o seu papel como força portadora de uma verdadeira alternativa com capacidade e aptidão para o exercício de responsabilidades governativas, mantendo uma linha de iniciativa e proposta tanto no plano das políticas como de soluções governativas que considere necessárias e que sejam do interesse dos trabalhadores, do povo e do país, o PCP manterá a sua autonomia e soberania de decisão face aos desenvolvimentos concretos que se registarem.

 

3.11. Reforço do PCP - uma questão fundamental

A luta e a intervenção do PCP não se limitam ou esgotam no objectivo de construção de uma alternativa de esquerda. Alicerçado em valores, causas e ideais, persegue o objectivo de transformação social inscrito no seu programa.

Mas é essencial e determinante nesta fase da vida nacional que o PCP alargue a sua influência junto dos trabalhadores e das massas populares, afirme o seu projecto, os seus valores ímpares e distintos dos de outras forças políticas, desmistifique e vença preconceitos, reforce a sua intervenção e organização, estabeleça com mais vigor laços com os trabalhadores, os agricultores, os intelectuais e quadros técnicos, com todos os que são atingidos pela política de direita e que perfilham ideais democráticos, de progresso e justiça social, e que é imperioso mobilizar activamente para a luta pela construção da alternativa de esquerda.

São tarefas de grande exigência colocadas aos comunistas e ao seu Partido. Mas serão as mais realizadoras e a mais sólida garantia para construir esta alternativa.

4. Partido

4. O PARTIDO

4.0. Introdução
4.1.Breve balanço de actividade
4.2. Identidade comunista
4.3. Autonomia e independência
4.4. Direcção
4.5. Quadros
4.6. Organização
4.7. Intervenção política e ligação às massas
4.8. Informação, propaganda, imprensa do Partido e Festa do Avante!
4.9. Meios financeiros
4.10. Actividade internacional
4.11. Nota final

4.0. Introdução

Desde o XVI Congresso, o Partido desenvolveu uma permanente intervenção e actividade em defesa dos interesses dos trabalhadores e do povo, com acção determinante na promoção da luta de massas em articulação com a intervenção nas instituições, confirmando-se como o grande Partido da classe operária e de todos os trabalhadores, patriótico, internacionalista, imprescindível para a defesa dos interesses do povo e de Portugal.

Apesar das dificuldades e insuficiências conhecidas, a experiência confirma que é possível melhorar e fortalecer a organização, elevar a militância, alargar a actividade política das organizações, assegurar um Partido mais forte, fundamental para a luta por uma alternativa de esquerda, pela democracia avançada e pelo socialismo.

4.1. Breve balanço de actividade

No tempo decorrido desde o XVI Congresso, persistiu uma situação internacional desfavorável, traduzida em novos avanços na agressividade do imperialismo e das forças do capital e em desenvolvimentos negativos no processo de integração europeia, ao mesmo tempo que no plano nacional prosseguiu a política de direita com o governo PS, aprofundada pelos governos reaccionários do PSD/CDS-PP, e a ofensiva para desvirtuar o regime democrático saído da Revolução de Abril. A que se somou, neste período e convergentemente, uma campanha dirigida contra o Partido, em que se integra a acção fraccionista, para o desagregar, deturpar as suas propostas, posições e actividade.

O Partido, embora com insuficiências e dificuldades, desenvolveu uma ampla e determinante intervenção com o envolvimento das suas organizações e militantes. Milhares de militantes do Partido assumiram de forma decisiva o esclarecimento, a mobilização e a organização da luta da classe operária, dos trabalhadores e de outras camadas sociais contra a política governamental em inúmeras lutas, de que se destaca a greve geral de Dezembro de 2002 contra o pacote laboral.

Numa situação adversa, comprovou-se que o empenho e a dedicação dos comunistas são essenciais para a expressão da luta dos trabalhadores e do povo e que o seu papel é um elemento determinante para a influência, independência, características de classe e unidade do movimento sindical unitário.

O Partido levou a cabo inúmeras acções de esclarecimento, denúncia, protesto e proposta em defesa dos direitos dos trabalhadores, dos serviços públicos e das funções sociais do Estado, contra as privatizações, o encerramento de empresas e o desemprego. O Partido assegurou uma activa e empenhada intervenção nas batalhas eleitorais realizadas, assim como assumiu as reivindicações dos trabalhadores e do povo nas instituições (nacionais, europeias, regionais e locais) e aí desenvolveu uma importante acção.

O Partido realizou, para além da actividade regular e diária das organizações, diversificadas iniciativas políticas ou de convívio, milhares de reuniões e plenários, assembleias das organizações e ainda encontros, debates, colóquios, sobre diversificados temas. Sublinhem-se, entre as iniciativas mais importantes realizadas após o XVI Congresso, o Encontro Nacional sobre as Eleições Legislativas, a Conferência Nacional - O Novo Quadro Político e as Tarefas para o Reforço da Intervenção e Influência do Partido, o Encontro Nacional do PCP sobre a Acção e Organização do Partido nas Empresas e Locais de Trabalho, a Conferência Nacional - O PCP e o Poder Local, o Encontro Nacional sobre a Agricultura Portuguesa e a Reforma da PAC, o Encontro Nacional sobre os Micro, Pequenos e Médios Empresários, a acção Em Movimento Por um Portugal com Futuro e as iniciativas no âmbito das Mil localidades nela inserida, o Seminário sobre a Festa do Avante! e o Seminário Internacional sobre a Actualidade das Transformações e dos Ideais de Abril.

Promoveu o movimento geral de reforço da organização partidária sob o lema «Sim, é possível! Um PCP mais forte». Realizou Jornadas Nacionais de esclarecimento e de propaganda. Organizou anualmente de forma atractiva e criadora a Festa do Avante!. Realizou a 14.ª Festa da Alegria. O PCP esteve na primeira linha da luta pela Paz, contra a guerra de agressão dos EUA ao Afeganistão e ao Iraque e desenvolveu intensa actividade de solidariedade com os povos vítimas de agressão e opressão imperialista, em particular com o povo palestiniano e com Cuba. Promoveu as comemorações do 25 de Abril com destaque para os 30 anos da Revolução e largas centenas de iniciativas de comemoração dos aniversários do Partido com a participação de muitos milhares de camaradas e amigos.

4.2. Identidade comunista

A realidade do mundo neste início do Século XXI confirma e evidencia que o capitalismo, sistema que tem por base a exploração, opressão, agressão e guerra, com o seu projecto de domínio imperialista sobre os povos, promove uma enorme regressão civilizacional e não está em condições de dar resposta aos anseios da humanidade. O início deste novo século reforça a actualidade do projecto comunista e a necessidade da luta por uma sociedade liberta da exploração e da opressão capitalistas.

São confirmadamente difíceis as condições em que lutam hoje os partidos comunistas e as forças revolucionárias. O imperialismo procura liquidar ou neutralizar todas as forças que se possam opor ao seu projecto de hegemonia e domínio mundial, no plano dos Estados e no plano das forças políticas, em particular os partidos comunistas e as forças revolucionárias. É neste quadro de luta de classes que deve ser compreendida a intensa acção contra o PCP, procurando anular o seu papel e força na sociedade portuguesa e comprometer a sua existência.

O PCP é alvo de uma permanente acção de desgaste, designadamente a partir da comunicação social, com o objectivo de silenciar propostas e iniciativas e de promover uma campanha sistemática de deturpação das posições e projecto do Partido, visando isolar, abalar e dificultar o alargamento da sua influência e limitar a sua capacidade de atracção.

O grande capital, com o vasto arsenal de forças políticas, estruturas e meios que tem à sua disposição, sabe que a força do Partido assenta na sua ideologia e orientação políticas, nos seus quadros e militantes, na sua unidade e coesão no quadro dos princípios de funcionamento do Partido, na sua organização, no seu entusiasmo, dedicação e militância, e por isso desenvolve campanhas para provocar a dúvida, quebrar o entusiasmo, desanimar e desmobilizar o colectivo partidário.

Esta ofensiva visa promover o anticomunismo, uma falsa e má imagem do Partido e o aumento dos preconceitos contra ele. Visa também promover a sua desagregação e atingir o compromisso que une cada militante ao colectivo partidário, elo de união que faz a diferença entre um conjunto de indivíduos dispersos, isolados ou em conflito entre si, e uma organização que passa à acção a partir da discussão onde conta a opinião de todos e do apuramento de uma decisão comum.

Nesta acção têm participação activa ex-membros do Partido e alguns outros que invocam a qualidade de membros e que convergem na acção anticomunista para atacar o Partido na sua essência e criar dificuldades ao reforço da sua influência social, política e eleitoral. E que, usando abusiva e enganosamente a ideia de renovação, de facto dão provas de capitulação ideológica, rendem-se e submetem-se à ideologia e à política do grande capital, fomentam a desagregação orgânica do Partido, prosseguindo no desgaste da sua imagem e influência, assumindo-se cada vez mais como apêndice do PS e do BE.

Face a esta ofensiva dos inimigos do Partido, a percepção e compreensão pelo colectivo partidário dos seus objectivos é não só essencial como indispensável para resistir ao ataque e às tentativas de desmobilização e compreender que a integração de cada quadro e militante no colectivo partidário é a força indispensável de um partido revolucionário. É essa compreensão que, na salvaguarda do direito de opinião reconhecido nos princípios e na prática do funcionamento do Partido e na permanente preocupação com a resposta às novas realidades, tem permitido não só resistir à ofensiva dirigida contra o PCP como tem garantido uma intervenção ímpar na sociedade portuguesa em defesa dos trabalhadores, do povo e do país.

A ofensiva contra o PCP, indissociável do ataque contra os trabalhadores e o regime democrático, assumiu com a Lei sobre os Partidos e a Lei de financiamento dos Partidos e das campanhas eleitorais uma outra e mais grave expressão.

Rompendo com o regime democrático nascido com o 25 de Abril, o objectivo destas novas leis é retirar aos membros do Partido a liberdade de decidir sobre a forma de organização, impor ao PCP o modo de funcionamento de outros partidos e desencadear contra ele um processo de devassa da vida interna e de abusiva limitação à angariação dos meios que lhe permitam garantir a sua intervenção política.

Estas leis que visam o PCP, para além do que directamente estabelecem, abrem portas a todo o tipo de ingerência em função das conveniências e da correlação de forças do momento e constituem uma ameaça pendente sobre os que não se conformam com o modelo dominante e têm um projecto político alternativo de sociedade.

A ilegítima e abusiva pretensão de introduzir limitações às receitas com origem na recolha militante de fundos a pretexto do significativo aumento da subvenção estatal visa essencialmente, favorecendo os partidos como o PSD e o PS que em boa parte dela vivem, impor restrições à angariação de meios financeiros e às possibilidades de intervenção do PCP. Desiludam-se os que ambicionam através destas leis, por mais monstruosas que sejam do ponto de vista democrático e constitucional, poder levar o PCP a comprometer o seu funcionamento e a transformar-se naquilo que nunca foi, não é, nem será: uma imitação do PSD, do CDS-PP ou do PS.

Reafirmando que o funcionamento do PCP é incomparavelmente mais democrático que o de qualquer outro partido em Portugal, o XVII Congresso sublinha o carácter inaceitável destas leis e considera que o Partido deve desenvolver contra elas um combate no sentido da exigência da sua revogação como objectivo de luta e imperativo para a afirmação de um efectivo curso democrático na sociedade portuguesa.

São claros os objectivos destas leis: enfraquecer e destruir o Partido. Desde logo pela tentativa de imposição de preceitos e interpretações que conduziriam ao seu enfraquecimento, divisão e desagregação. E, também, pelo uso dos mecanismos legais por si criados e em função da correlação de forças em cada momento ingerir-se coercivamente na vida do Partido a pretexto do não cumprimento da legislação.

É justamente tendo em conta estes objectivos que o PCP tem de procurar encontrar respostas que, não comprometendo o seu funcionamento nem aceitando procedimentos contrários aos seus princípios e natureza de classe, não o exponham a riscos desnecessários.

A resistência e a luta contra as leis sobre os Partidos e pela sua revogação devem ser asseguradas em permanência pelas organizações e organismos do Partido, tendo como momentos salientes a realização dos Congressos e Assembleias e as respectivas fases de preparação. Com a certeza, também, de que o reforço do funcionamento democrático do Partido constitui um elemento importante de resistência e luta.

O determinante papel do PCP na luta pelo derrube do fascismo e pela conquista do regime democrático no nosso país, dão-lhe uma autoridade inigualável. Em matéria de luta pela liberdade e a democracia, o PCP não tem de receber lições de ninguém, muito menos dos seus adversários políticos e inimigos de classe.

Na grave situação de Portugal e do mundo, o PCP, orgulhoso da sua história, assegura o firme compromisso de prosseguir com confiança e convicção inabaláveis a sua luta e intervenção pela concretização do seu projecto.

O Partido Comunista Português, partido necessário, indispensável e insubstituível para os trabalhadores, o povo e o país, afirma a sua identidade comunista consagrada no Programa e nos Estatutos como base da sua organização, intervenção e objectivos, cujos elementos centrais o diferenciam e definem:

o objectivo da construção de uma sociedade nova liberta da exploração do homem pelo homem, da opressão, das discriminações, desigualdades, injustiças e flagelos sociais do capitalismo - o socialismo e o comunismo;

a natureza de classe como partido e vanguarda da classe operária e de todos os trabalhadores, independente da influência, dos interesses, da ideologia e da política das forças do capital, e que tem como características e preocupação uma estreita ligação à classe operária, aos trabalhadores e ao povo em geral;

a base teórica, o marxismo-leninismo, concepção materialista e dialéctica do mundo, instrumento científico de análise da realidade, guia para a acção, ideologia crítica e transformadora, sistema aberto, contrário à dogmatização bem como à revisão oportunista dos seus princípios e conceitos fundamentais, que, em ligação com a vida, constantemente se enriquece e se renova;

a estrutura orgânica e princípios de funcionamento que assentam no desenvolvimento criativo do centralismo democrático, de que são características básicas uma profunda democracia interna, uma única orientação geral e uma única direcção central;

a concepção articulada das tarefas nacionais e dos deveres internacionalistas, que considera indissociáveis e complementares, e que o definem como partido patriótico e internacionalista.

O Programa do PCP aprovado no XIV Congresso, no qual se inscreve a luta por uma Democracia Avançada como parte integrante e constitutiva da luta dos comunistas portugueses pela construção do socialismo, corresponde à actual etapa histórica. As alterações verificadas na situação nacional e internacional não põem em causa a actualidade dos seus objectivos e propostas fundamentais que é necessário afirmar e projectar junto dos trabalhadores, da juventude, do povo português.

Os Estatutos do Partido, base essencial da sua natureza, correspondem às necessidades e exigências que se colocam ao seu funcionamento e intervenção na fase actual. As alterações cuja introdução é proposta são as consideradas estritamente necessárias em função da experiência e avaliação própria do Partido. Referem-se no essencial: à consideração da Comissão Central de Controlo como órgão de jurisdição; a uma maior precisão do que significa a não admissão de fracções; à explicitação das funções do Secretariado do Comité Central em matéria de administração do património e dos recursos financeiros; ao estabelecimento de um prazo para recurso e à indicação dos sítios Internet e edições electrónicas nacionais como imprensa do Partido.

4.3. Autonomia e independência

Organização, enraizamento, influência, intervenção, unidade e coesão do Partido são questões essenciais que, nas condições de hoje, se colocam com redobrada força para que possa cumprir o seu papel. As forças e meios próprios são elementos decisivos para a sua concretização.

Há quem queira fazer crer que o caminho é a adopção de soluções desagregadoras, dissolução de compromissos e princípios, liquidação do colectivo, dispersão dos indivíduos e ligações difusas entre eles, apresentadas como aprofundamento da democracia, mas escondendo de facto formas de controlo individual mais fortes, enfraquecimento e empobrecimento real da democracia.

No entanto, agindo no quadro de uma sociedade capitalista e numa situação de forte ofensiva do imperialismo e do grande capital, face à sua forte organização e meios com que exercem o poder, não é possível sustentar que um partido que tenha de facto como objectivo a transformação social, possa travar a sua luta no quadro da dissolução dos compromissos e princípios, da dispersão e da desorganização. Nos dias de hoje, é ainda mais evidente, para um partido comunista, a necessidade de uma sólida organização, assente em fortes compromissos entre os seus membros, ligada às massas, com meios próprios de intervenção, que promova neste quadro uma profunda democracia interna, a participação dos seus membros, a iniciativa e a acção militantes.

A organização partidária é o elemento decisivo. A organização não pode viver fechada sobre si própria, tem de estar ligada às massas e intervir na realidade concreta. Mas a organização, para ser isso mesmo, implica vida colectiva, agregação entre os militantes e compromissos sólidos de acordo com os princípios do Partido que assegurem a ligação entre eles.

Um partido comunista para cumprir o seu papel tem de basear-se nas suas próprias forças, na sua organização, nos seus meios, na sua imprensa, nas suas iniciativas de propaganda, nos seus quadros e militantes e na capacidade que estes têm de informar, esclarecer, mobilizar e influenciar. É a única forma de garantir a sua independência de análise, elaboração, decisão, posicionamento político e intervenção. É a base de apoio e de projecção da intervenção de um partido que existe para transformar a sociedade, acabando com a exploração e opressão e não para ser mudado pela sociedade capitalista, formatado de acordo com os valores desta e diluído como mais uma força política da órbita dos interesses dominantes.

Há forças políticas que, pelos interesses de classe que efectivamente servem ou pelo papel que desempenham de colaboração e convergência com os interesses dominantes recebem apoios decorrentes da influência que o grande capital readquiriu na sociedade portuguesa e podem até não ter organização, a não ser para certos momentos, nomeadamente os processos eleitorais. Há forças que na prática foram criadas pelos meios de comunicação social e insufladas por eles de tal maneira que se acabasse esse apoio a sua projecção pública deixaria de existir. Essas forças políticas cumprem o seu papel e têm apoio e projecção para esse efeito. Mas o PCP, com a sua natureza e objectivos, reclamando o direito de ser tratado sem discriminações, não pode basear a sua acção nesses meios. A garantia da sua independência e capacidade de intervenção exige que conte essencialmente com as suas próprias forças.

O PCP, determinado a cumprir o seu papel, afirma o propósito de enfrentar as acções e campanhas que contra ele são desencadeadas e manifesta a sua determinação de prosseguir no reforço da sua influência social, política e eleitoral, no reforço da sua organização e intervenção. Considerando as exigências que se colocam no presente e no futuro estabelece como objectivo prosseguir o trabalho para assegurar um partido mais coeso, mais forte e mais influente, um partido mais apto para resistir, mais capaz para intervir, mais preparado para avançar.

4.4. Direcção

O trabalho de direcção do Partido ao longo dos últimos anos foi sujeito a provas exigentes. O quadro internacional, a situação nacional e a ofensiva geral contra o Partido em que se inserem as leis sobre os partidos e a acção fraccionista com grande apoio, promoção e amplificação na comunicação social, exigiram novas e mais complexas respostas ao trabalho de direcção, entre as quais se destacaram a necessidade de uma intervenção estratégica de acordo com o projecto do Partido a par de uma forte intervenção e resposta quotidiana; as realizações e prioridades partidárias articuladas com acontecimentos e iniciativas fruto da dinâmica política e social e de uma constante dispersão mediática, a acção política e o contributo para o desenvolvimento da acção de massas associados com as medidas de reforço da organização partidária e de formação política e ideológica.

Neste quadro de grande complexidade, a direcção do Partido no seu conjunto deu uma resposta apreciável, assegurando que o PCP cumprisse o seu papel para com os trabalhadores, o povo e o país, reforçasse as suas raízes nas empresas e locais de trabalho, afirmasse as suas tarefas internacionalistas, enfrentasse e contivesse a agressiva ofensiva contra ele dirigida, intervindo e afirmando o Partido e o seu projecto.

Evidenciaram-se entretanto insuficiências, dificuldades e problemas que é necessário ultrapassar, nomeadamente no aprofundamento de algumas questões de fundo, no trabalho colectivo em articulação com a resposta imediata exigida, na coordenação global do trabalho partidário, na capacidade de definir prioridades e de concentrar atenções nas prioridades definidas, no arrastamento ou adiamento da solução de problemas, num insuficiente controlo de execução.

É necessário cuidar mais do estilo de trabalho do Partido a todos os níveis. Um estilo que combine: uma grande operatividade e forte dinâmica de intervenção com o estudo das realidades; a valorização do trabalho colectivo com o incentivo à participação e iniciativa individuais; uma direcção e orientação central únicas com descentralização na acção. Um estilo que concentre atenções nas prioridades definidas e imprima celeridade à solução de problemas; que tenha como preocupação permanente a integração na dinâmica partidária de um número sempre crescente de membros do Partido e promova a assunção de responsabilidades, a crítica e a autocrítica e a frontalidade e combata a rotina, o burocratismo, o deixa andar, o praticismo, que introduza confiança na possibilidade de superar dificuldades e limites, que aprofunde a análise e a discussão políticas e aperfeiçoe a coordenação do trabalho.

O Comité Central cumpriu no essencial o seu papel, exercendo as suas responsabilidades em momentos fundamentais na complexa situação em que o Partido desenvolveu a sua actividade nos últimos anos. Realizou 22 reuniões. Manifestaram-se no entanto insuficiências no aprofundamento de análises e orientações sobre questões relevantes da situação nacional e internacional e da situação e intervenção do Partido. O Comité Central deve assumir mais o trabalho superior de direcção do Partido, com o reforço da participação dos seus membros e uma abordagem de questões essenciais sem prejuízo da sua contribuição para a orientação política mais imediata.

O Comité Central a eleger pelo XVII Congresso, reflectindo a natureza e os objectivos do Partido, deve ter uma larga maioria de operários e empregados, com uma forte componente operária, uma composição diferenciada que assegure uma estreita interligação com os principais sectores da actividade partidária, a participação de quadros inseridos nas organizações e movimentos de massas com destacada intervenção em diferentes áreas da vida nacional, quadros funcionários e não funcionários, uma mais elevada participação juvenil, designadamente da JCP, e feminina. A renovação e rejuvenescimento são aspectos que devem ser assegurados. O novo Comité Central a eleger pelo XVII Congresso deve manter uma dimensão próxima da actual, não devendo no entanto ultrapassá-la.

Considera-se que a estrutura da direcção central deverá continuar a assentar no Comité Central, na Comissão Política e no Secretariado do Comité Central (assumindo estes dois organismos a direcção executiva do trabalho partidário), e bem assim na Comissão Central de Controlo com os ajustamentos de funções e critérios de composição que se considerem adequados face à experiência e à componente das suas funções como órgão de jurisdição. A articulação entre a estrutura central e as DOR poderá justificar, além de outras soluções intermédias no plano regional, a existência de reuniões, mais ou menos regulares, com a participação dos membros da Comissão Política, Secretariado, dos responsáveis das DOR e de sectores centrais da actividade partidária, com definição que o Comité Central avaliará.

As Direcções Regionais assumem um papel fundamental na ligação entre a direcção central e as organizações partidárias e são decisivas, no âmbito das suas competências, para a direcção do trabalho partidário e da iniciativa política regional. Persistiram nos últimos anos situações de DOR com dimensão e peso muito diferenciado e com meios limitados face às suas necessidades. Mantendo-se a regra de DOR de âmbito distrital prosseguiu a experiência de DOR com outros âmbitos. Estas experiências devem ser prosseguidas, avaliando-as no quadro da necessidade de resposta do Partido, adoptando as soluções mais adequadas a cada caso. Os organismos intermédios, assumindo o papel de ligação com a estrutura de direcção central e o de contributo para a coordenação e direcção do trabalho em algumas regiões, são uma solução que precisa ser alargada e aprofundada, reforçando o seu papel e competências. Deve ser estimulado e aprofundado o relacionamento e ligação com os organismos de base. Ao mesmo tempo é necessário, no quadro das possibilidades existentes, assegurar que as DOR disponham dos meios indispensáveis para a sua intervenção. Deve prosseguir no quadro da adequação das estruturas e quadros às possibilidades e meios existentes, uma ajustada distribuição de forças e meios entre a estrutura central e o conjunto das DOR, prosseguindo a concentração de actividades e tarefas na estrutura central que se entenda adequada para a eficácia e melhor utilização de meios, designadamente no apoio às organizações partidárias, e uma melhor coordenação com a acção institucional.

Os organismos intermédios de direcção (Comissões Concelhias, Organismos de Direcção de Sectores Profissionais ou de Empresas, Comissões de Freguesia) têm uma grande importância no trabalho partidário. A sua dimensão e papel são muito diferenciados. É necessário alargar o seu número, elevar o seu papel de direcção, acentuar a sua iniciativa e intervenção política, assim como a sua contribuição para o estímulo ao desenvolvimento da luta de massas e ao fortalecimento das organizações dos trabalhadores e das populações. É preciso assegurar a sua maior intervenção para a criação e dinamização das organizações de base, no plano local e principalmente nas empresas e locais de trabalho.

As estruturas de apoio à direcção central (áreas, comissões, grupos de trabalho e de estudo) desempenham um papel de grande importância na análise dos problemas, no contributo para a definição de orientações e no acompanhamento da acção partidária. Manifestaram-se no seu trabalho desequilíbrios, irregularidades e desajustamentos face às possibilidades, disponibilidades de quadros e prioridades. É necessário reequacionar a sua dimensão e articulação em função das prioridades e disponibilidades de quadros nas diversas áreas, das possibilidades de participação das DOR, evitando duplicações e assegurando um funcionamento mais regular e eficaz das estruturas que venham a ser constituídas. Deve ser valorizado e estimulado o trabalho colectivo no funcionamento destas estruturas ao mesmo tempo que, inserido nesse estilo de trabalho, se deve procurar alargar o numero de camaradas chamados a contribuir, por meios diversos, incluindo pela colaboração individual.

A coordenação de empresas e sectores de âmbito nacional, confirmadamente importante, continua excessivamente marcada por questões sindicais. É indispensável acentuar o seu contributo para a intervenção do Partido e o reforço da organização partidária. A responsabilidade de membros dos organismos executivos por este trabalho revelou-se útil, embora a acumulação de tarefas que em alguns casos se verifica justifique que outros camaradas possam assumir responsabilidades neste trabalho.

A forma específica de exercício democrático do poder pelos comunistas que decorre da identidade e dos objectivos do PCP - em diferentes situações, no Partido, nas organizações sociais, nas autarquias, instituições e órgãos de soberania - é marcada por traços, desenvolvidos nas Resoluções Políticas do XV e XVI Congressos, que lhe dão uma especificidade própria. A experiência do exercício do poder pelos comunistas é uma realidade que é preciso valorizar, ao mesmo tempo que é indispensável prosseguir um esforço permanente para o seu aprofundamento, corrigindo erros, aperfeiçoando criativamente métodos e formas de trabalho, sendo exigente e rigoroso de modo a salientar a diferença da postura e da acção dos comunistas.

4.5. Quadros

São milhares os quadros, estreitamente ligados aos problemas e interesses das massas, actuando em diversas frentes de luta, que asseguram diariamente a actividade revolucionária do Partido e são garante da sua capacidade de intervenção.

A situação coloca hoje ao Partido e aos seus membros questões novas e complexas que tornam mais exigente a formulação e concretização de uma correcta política de quadros, audaciosa e simultaneamente ponderada, adequada às novas realidades. A ajuda aos quadros (partidária, pessoal e humana), a sua preparação e formação política e ideológica, o seu conhecimento e avaliação, a sua promoção e responsabilização são elementos fundamentais da política de quadros do Partido essenciais para o seu fortalecimento devendo constituir uma preocupação permanente dos organismos de direcção aos vários níveis.

Os quadros devem ser avaliados pelo seu trabalho, pelas suas qualidades e capacidades, pelo seu empenhamento na actividade revolucionária do Partido. Desde o XVI Congresso deram-se passos positivos na avaliação e conhecimento dos quadros, quer a nível de cada DOR, quer a nível central. O levantamento realizado pela CCQ relativo aos quadros funcionários é uma importante base de trabalho para a sua melhor avaliação.

A promoção de quadros a tarefas de maior responsabilidade, particularmente a promoção de quadros jovens, é uma condição essencial para o desenvolvimento e reforço do Partido. Embora com excepções que importa examinar, os passos dados nesse sentido, ainda que insuficientes, revelaram-se positivos. É necessário responsabilizar mais quadros do Partido que têm condições e capacidade para assumir tarefas de maior responsabilidade, quer no acompanhamento de organizações de base, concelhias, de sector, ou outras, quer com a sua intervenção em estruturas de âmbito nacional.

No conjunto dos quadros, assumem particular importância, para a indispensável afirmação das características e funcionamento do PCP, os funcionários do Partido que dedicam a sua vida à acção política e revolucionária. Tem-se revelado correcta a promoção e responsabilização em tarefas do Partido de quadros jovens, particularmente quadros vindos da JCP, que têm dado um bom contributo ao desenvolvimento do trabalho partidário, bem como o apoio central a novas funcionalizações, que tem permitido a várias Organizações Regionais funcionalizarem ou subsidiarem quadros prioritariamente jovens.

A formação dos quadros e a elevação do nível político e ideológico dos militantes exigem, ao mesmo tempo, o estudo individual, a leitura da imprensa e dos documentos fundamentais do Partido, o estudo do marxismo-leninismo, o estudo de questões nacionais, regionais, de sectores de actividade, a participação regular na actividade partidária, em reuniões, assembleias, encontros, conferências, seminários, debates e outras iniciativas, a frequência de cursos políticos que se têm revelado um precioso auxiliar em estreita ligação com a realidade, a experiência e as tarefas práticas do Partido.

Desde o XVI Congresso regista-se como um dado positivo, embora insuficiente, os avanços sensíveis registados com a realização, na Escola do Partido, de 40 cursos dirigidos a colectivos do Partido e da JCP frequentados por 600 camaradas, para além de outros cursos e debates realizados por organizações do PCP e da JCP com o apoio da Escola.

De destacar a experiência positiva de organização de cursos, com programas específicos, para funcionários do Partido e da JCP, para quadros jovens operários e para delegados ao Encontro Nacional do PCP sobre a acção e organização do Partido nas empresas e locais de trabalho e às Assembleias das Organizações Regionais, que referiram o interesse em participar em cursos, assim como, embora noutro plano da formação, a realização de cursos de informática para funcionários do Partido.

São direcções fundamentais da política de quadros:

ampliar e reforçar o núcleo de quadros do Partido através da promoção e responsabilização audaciosa de novos quadros, particularmente operários, jovens e mulheres; promover uma acção e concentração de esforços com um objectivo associado à formação e ajuda aos camaradas que assumam novas responsabilidades;

Prestar cuidadosa atenção à origem social dos quadros, particularmente dos funcionários, não perdendo de vista que o reforço do Partido está estreitamente ligado à composição social dos seus quadros;

elevar o nível político do trabalho partidário em todos os organismos e organizações do Partido, visando fazer corresponder o desenvolvimento político dos quadros às necessidades do Partido e à complexidade das suas tarefas actuais e futuras;

melhorar o acompanhamento, conhecimento e ajuda aos quadros; integrar os quadros em organismos colectivos e proceder a uma justa divisão de tarefas tendo em conta as possibilidades e capacidades de cada um;

valorizar o papel dos funcionários, dando mais atenção à sua selecção, acompanhando a sua evolução política, ideológica e cultural;continuar a avaliação do quadro de funcionários tendo em vista a sua renovação e rejuvenescimento; fazer corresponder o quadro de funcionários às necessidades e aos meios financeiros do Partido;

reforçar o trabalho de formação política e ideológica dos quadros, seja pelo incentivo ao estudo individual seja pela frequência de cursos políticos, procedendo à utilização intensiva da Escola do Partido, à ampliação e renovação do colectivo de formadores, à revisão de programas e textos de apoio, à actualização de métodos pedagógicos, à implementação de novos cursos e iniciativas de formação ideológica que vão ao encontro das necessidades e do reforço do Partido.

4.6. Organização

A organização partidária é o elemento decisivo para que o Partido intervenha e concretize os seus objectivos. O Partido conta com milhares de militantes activos, conscientes, determinados, um grande colectivo partidário, único na sociedade portuguesa pela sua generosidade, combatividade, militância e capacidade de mobilização e intervenção. A organização respondeu a grandes exigências de intervenção desde o XVI Congresso, assegurando uma intensa e qualificada acção partidária.

A acção nacional de contacto com os membros do Partido para esclarecimento de situações, actualização de dados e contactos e elevação da participação na vida partidária, em curso há um ano e meio, constitui uma das mais relevantes no âmbito do reforço do Partido desde o XVI Congresso.

Tarefa complexa, de grande envergadura e nunca antes concretizada, está a constituir um assinalável êxito na recepção dos membros do Partido contactados e assume uma grande importância partidária. Esta acção apontada pelo XVI Congresso e definida pela Conferência Nacional do Partido sobre o novo quadro político e o reforço do Partido (Junho de 2002) assumiu um papel muito importante no contributo para esse mesmo reforço. A sua plena concretização significará um avanço de grande importância no reforço da organização partidária que abre caminho a novos e importantes passos no reforço do Partido.

Entre outros aspectos, esta acção contribuiu para o alargamento do núcleo activo, o aumento do valor das quotizações, o estabelecimento de formas diversificadas para o seu pagamento regular e a ampliação do número de camaradas que efectivamente as pagam, a elevação do número de camaradas com tarefas e responsabilidades, a actualização das empresas e locais de trabalho de milhares de militantes, o apuramento de moradas e endereços actualizados, incluindo endereços electrónicos, permitindo utilizar as novas tecnologias da informação no contacto com um número considerável de militantes, o alargamento da difusão da imprensa partidária, em particular do Avante! e o aumento da capacidade de mobilização partidária.

Um dos maiores impactos desta acção foi o contributo para o esclarecimento da situação dos inscritos no Partido, alguns dos quais sem contacto há muitos anos, permitindo assim avançar muito no conhecimento da realidade partidária. Com base no trabalho realizado pode desde já referir-se que o esclarecimento da situação dos membros do Partido deverá apontar para um número global de efectivos quando terminar a acção de contacto, da ordem dos 75 mil a 80 mil.

Este número, a confirmar-se, reflectirá uma redução do número de inscritos, em grande parte aparente uma vez que em muitos casos se trata de pessoas que há mais de 20 anos não tinham contacto com o Partido e cuja situação só agora foi possível esclarecer com a acção nacional de contactos com os membros do Partido. Entretanto, o número referido traduz não apenas um número de inscritos mas de facto o número de membros do Partido com ligação ou contacto, o qual, comparado com o apurado no último balanço de organização em que eram referenciados cerca de 69 mil membros do Partido nessas condições, significará um real reforço do Partido.

A acção de contacto e esclarecimento da situação dos efectivos partidários envolveu já mais de metade dos inscritos no Partido. É necessário prosseguir e intensificar esta acção e simultaneamente é indispensável que os membros do Partido que ainda não fizeram a actualização dos seus dados tomem a iniciativa de contactarem as organizações partidárias para o fazerem. No sentido de fazer o apuramento da realidade da organização partidária, de contribuir para uma mais rápida finalização deste trabalho e de permitir uma concentração de atenções em linhas de reforço do Partido que passem pela elevação dos níveis de estruturação, de funcionamento colectivo e participação, de militância e de intervenção, aponta-se o dia 30 de Junho de 2005 como a data a partir da qual os efectivos partidários aos vários níveis passam a ser contabilizados pelo número de membros do Partido que por sua iniciativa ou iniciativa das organizações partidárias têm os seus dados actualizados comprovando assim também a sua vontade de continuarem como membros do Partido. Os membros do Partido que nesta data não tenham os seus dados actualizados, quando por sua iniciativa e/ou contacto da organização a sua situação for esclarecida e os respectivos dados actualizados passam a ser contabilizados nos efectivos partidários.

O Balanço da organização elaborado no terceiro trimestre de 2004, resultante da contabilização das fichas de membros do Partido existentes, mas em que é já visível parte do resultado da acção nacional de contacto com os membros do Partido, reflecte assim um número de inscritos (113 mil) intermédio entre os dados apurados no Balanço de Organização de 1999 e o que se estima venha a ser o número de membros do Partido a apurar no Balanço da Organização a elaborar após Maio de 2005 na base de critérios de contabilização dos efectivos partidários decididos pelo XVII Congresso (75 mil a 80 mil membros). O Balanço de Organização que acabou de ser elaborado, apesar das limitações resultantes de não reflectir ainda o fundamental dos resultados da acção nacional de contactos com os membros do Partido, apresenta um conjunto de dados úteis na consideração da realidade partidária. Aumenta a percentagem dos membros do Partido com ligação ou contacto e daqueles que estão integrados em organismos. Estabiliza a percentagem dos membros do Partido a pagar quotas, representando um número insuficiente. A composição social, etária e por sexos dos efectivos não apresenta alterações significativas. A composição social traduz uma forte composição operária (perto de 50%) com uma ligeira redução. Os empregados representam 23,8%, verificando-se uma larga maioria de operários e empregados (74%). A percentagem de intelectuais e quadros técnicos, pequenos e médios empresários e estudantes sobe ligeiramente. A proporção de mulheres aumenta para 25,6%. Relativamente à composição etária, sem contar com os membros da JCP que não são membros do Partido, 13,4% têm menos de 40 anos, 22% têm entre 41 e 50 anos, 34,2% entre 51 e 64 anos e 29,5% mais de 64 anos. Continua a verificar-se o aumento do número de membros do Partido com mais de 50 anos que, tal como já foi assinalado no XVI Congresso corresponde à manutenção no Partido de dezenas de milhares de membros que a ele aderiram em diferentes fases da vida nacional e ao alargamento da esperança de vida média da população na sociedade portuguesa. O número de jovens continua a ser insuficiente, embora seja de notar como positivo o facto de cerca de 40% dos novos militantes que aderiram ao Partido nos últimos anos terem menos de 30 anos, além dos milhares de jovens que aderiram à JCP. O número de organismos, incluindo as organizações que reúnem em plenário, 2490, estabilizou, com ligeiro crescimento. No plano territorial contam-se mais de 700 organismos traduzindo uma tendência de estabilização. Mantêm-se as insuficiências no plano das empresas e locais de trabalho.

O XVI Congresso definiu importantes orientações para o reforço do Partido que a Conferência Nacional de Junho de 2002 especificou e calendarizou lançando o movimento geral de reforço da organização partidária «Sim, é possível! Um PCP mais forte», cuja concretização envolveu significativo empenhamento das organizações partidárias.

Deram-se passos no reforço da organização e intervenção junto da classe operária e dos trabalhadores nas empresas e locais de trabalho, embora desiguais, aquém das necessidades e insuficientes para vencer as fragilidades existentes. Intensificou-se a atenção e intervenção sobre os problemas dos trabalhadores e das populações. A acção junto da juventude desenvolveu-se com destaque para o papel e intervenção da JCP. Embora de forma insuficiente, avançou-se na responsabilização de quadros e no rejuvenescimento de organismos.

O recrutamento de novos militantes teve uma significativa expressão, atingindo cerca de 6000. Deu-se um grande avanço na avaliação da organização e dos efectivos partidários, na ligação e contacto com os membros do Partido e ainda que de menor escala, na sua integração, em formas diferenciadas, na vida partidária. A dinâmica de realização de assembleias das organizações foi significativa, tendo-se realizado mais de 400, apesar das insuficiências que continuaram na realização de assembleias das organizações de base.

Os passos dados na aplicação de orientações, cuja concretização à partida era considerada muito difícil, de que são exemplo o alargamento da difusão da imprensa partidária, os níveis de recrutamento alcançados ou os resultados da acção nacional de contacto com os membros do Partido numa parte significativa das organizações, mostram que, além de necessário, é possível um PCP mais forte.

No entanto, tal realidade não ilude debilidades, insuficiências e estrangulamentos que se mantêm, nomeadamente em aspectos como: a estruturação partidária; o funcionamento e a intervenção de muitas organizações de base, nomeadamente no plano dos locais de residência; a responsabilização de quadros; a militância e a dimensão do núcleo activo; a organização e intervenção do Partido nas empresas e locais de trabalho e a acção junto de diversas camadas e sectores sociais.

O PCP é indispensável e insubstituível na defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país, na luta por uma alternativa que garanta um Portugal com futuro, na afirmação do projecto comunista. A luta pelos seus objectivos, travada em cada momento com as forças de que dispõe, exige, para a concretização do seu projecto, um PCP mais forte.

Estando em desenvolvimento a acção nacional de contacto com os membros do Partido, que é preciso completar, o XVII Congresso aponta como questão central a dinamização e concentração de atenções do colectivo partidário no lançamento e concretização de uma nova fase do movimento geral de reforço da organização partidária «Sim, é possível! Um PCP mais forte». Com esta acção visa-se concretizar um profundo avanço na agregação, funcionamento colectivo, estruturação e capacidade de intervenção, de modo a que o Partido esteja mais coeso e preparado para responder às grandes exigências que se lhe colocam.

Neste quadro, o XVII Congresso considera como orientações fundamentais para o reforço do Partido a concretizar de forma integrada:

reforçar a acção junto da classe operária e dos trabalhadores, levando à prática as conclusões do Encontro Nacional sobre a acção e organização do Partido nas empresas e locais de trabalho realizado em Outubro de 2002, designadamente a responsabilização de mais quadros pelo trabalho junto dos trabalhadores, nomeadamente funcionários do Partido; o desenvolvimento de trabalho organizado do Partido nas empresas prioritárias, em particular as com mais de 1000 trabalhadores e/ou de importância estratégica; o alargamento e criação de sectores profissionais ou de empresas como forma de estruturação das organizações regionais e concelhias, privilegiando a organização a partir do local de trabalho e elevando significativamente o número de membros do Partido organizados nesta base; a intervenção política e o estímulo à luta como orientações fundamentais associadas ao reforço da organização; o aprofundamento do estudo da realidade e da sua evolução;

promover uma acção geral de estruturação da organização partidária, reforçando a estrutura intermédia (DOR, comissões concelhias, de freguesia, organismos sectoriais e de empresas) e o apoio à sua intervenção; assegurando a definição nominal das organizações de base - as células - (no plano dos locais de trabalho e de residência, a partir não apenas do número de membros mas da disponibilidade de participação e procedendo aos agrupamentos necessários de modo a garantir que tenham um funcionamento efectivo), bem como mantendo o seu funcionamento regular quer na base de um maior número de organismos, quer da generalização de plenários regulares, de preferência mensais, e dinamizando a sua intervenção; fortalecendo e alargando a estrutura e as formas de coordenação da acção junto de diversas camadas sociais (juventude e apoio à JCP, intelectuais e quadros técnicos, PME, pequenos e médios agricultores, pescadores, mulheres, reformados, deficientes);

intensificar a responsabilização de quadros, a sua formação e ajuda de modo a que assumam e desempenhem com mais facilidade as novas responsabilidades, contribuindo para o rejuvenescimento de organismos, a elevação da capacidade de direcção e o aumento da intervenção do Partido. Sendo a responsabilização de quadros um trabalho de sempre, exige a concentração de atenções em determinados momentos para vencer rotinas e assegurar um maior aproveitamento das potencialidades existentes. Neste quadro, o XVII Congresso define a necessidade de promover uma acção geral de levantamento e responsabilização de quadros com linhas de apoio à sua formação para as novas responsabilidades que assumem, de modo a contribuir para o fortalecimento, renovação e rejuvenescimento dos organismos existentes aos vários níveis e constituição de mais organismos;

intensificar a realização das assembleias das organizações, assegurando a sua regularidade, não ultrapassando um período de três anos sem a sua realização, com particular atenção para as organizações de base (cuja periodicidade tem vantagem em ser anual);

alargar a compreensão de que a militância, a participação de cada militante, é o elemento decisivo da força do Partido e assegurar que um maior número de membros do Partido assuma tarefas regulares ou permanentes por pequenas que sejam, aproveitando as disponibilidades e capacidades de cada militante e encorajando a sua iniciativa;

intensificar o recrutamento de novos militantes (em particular operários e outros trabalhadores, nomeadamente nos grandes sectores nacionais, jovens e mulheres), garantindo a sua integração e responsabilização, dando-lhes a conhecer o Programa e os Estatutos, promovendo a sua formação na acção partidária e em iniciativas específicas;

promover uma melhor integração dos membros do Partido em organismos, assegurar formas que facilitem a participação, com prioridade para o enquadramento daqueles que têm acção militante, estimular a distribuição de tarefas, o seu cumprimento e a prestação de contas, reforçar as estruturas (de contacto, distribuição da imprensa partidária, recebimento de quotização, etc.) e alargar o recurso a outras formas que permitam uma maior ligação ou contacto com o conjunto dos membros do Partido (correio, telemóvel - SMS, correio electrónico);

assegurar uma mais rápida e regular actualização da situação, dados e contactos dos membros do Partido, realizando anualmente o contacto com uma parte dos militantes com este objectivo, proceder a uma mais regular avaliação dos efectivos partidários;

alargar a compreensão dos organismos do Partido de que a organização não é um fim em si mesmo, mas sim um instrumento para a acção e que, por isso, os problemas dos trabalhadores, da população, das áreas em que actuam e as linhas de orientação, propostas e iniciativas para lhes dar resposta devem estar no centro das suas atenções. Melhorar neste sentido o conteúdo das reuniões e a sua preparação, bem como o acompanhamento da concretização das decisões tomadas;

dinamizar os centros de trabalho, importante elo e suporte físico da nossa organização, ponto de encontro e base de apoio do trabalho partidário.

4.7. Intervenção política e ligação às massas

O PCP tem na sua ligação e enraizamento no seio dos trabalhadores e do povo a condição essencial da sua força indestrutível. Alargar a intervenção política e aprofundar a ligação do Partido às massas são, por isso mesmo, das tarefas mais prementes e essenciais que se colocam ao Partido e devem estar na primeira linha de prioridades de todos os organismos e militantes.

A sociedade nova, livre, solidária, liberta da exploração do homem pelo homem e por isso verdadeiramente democrática por que lutamos terá de resultar da força e da determinação da luta de massas. E em primeiro lugar da luta travada no local onde é mais latente o confronto dos instrumentos de classe: a empresa e o local de trabalho.

A luta de massas, elemento determinante da transformação social e política é, em regra, facilmente entendido no plano teórico pelo colectivo partidário como um princípio central da actividade e intervenção políticas do Partido. Até porque, directa ou indirectamente, são conhecidos exemplos ou experiências de luta em que ficou claro que o capital não cede em nada sem a força e a determinação da luta. A participação dos trabalhadores e das populações na luta e na actividade política e social é por isso, pela solidez política que representa e pela transformação que provoca, um alicerce estratégico que permite alargar a resistência e passar à ofensiva pelos nobres objectivos por que lutamos.

Não obstante os avanços nesta importante área de trabalho, continuam a evidenciar-se dificuldades para introduzir na discussão e concretizar na actividade diária o que tão facilmente é entendido no plano teórico.

Entre as principais dificuldades detectadas anota-se a ausência de discussão dos problemas dos trabalhadores e das populações com origem, entre outros aspectos, na não realização de reuniões, ou na falta de espaço para a sua discussão nos organismos ou ainda porque das reuniões e conclusões se acaba por dar prioridade, não à luta como melhor caminho para a sua resolução mas à mera diligência pela acção dos eleitos locais junto dos órgãos do poder. As formas de ultrapassar as dificuldades detectadas devem ser encontradas de acordo com cada situação concreta.

A alteração da situação política a favor dos trabalhadores e do povo português exige o contributo decisivo da actividade política de todos os organismos e de todos os militantes do Partido, e que exerçam as suas tarefas no trabalho ligado à organização, nas estruturas dos trabalhadores, nos órgãos de Poder Local ou em associações do mais diverso tipo. Passa pela mais ampla iniciativa das organizações e militantes na esfera da sua intervenção e no quadro geral da orientação partidária.

Na preparação e desenvolvimento das acções de massas, sem prejudicar os objectivos imediatos e concretos que as animam, conhecendo os problemas, o sentimento e a disponibilidade para a luta, é de ter em conta que a alteração da situação política exige uma mais ampla e profunda consciência social e política das massas só possível de adquirir através do carácter transformador e revolucionário da luta.

Às organizações, aos organismos, a todos os militantes cabe a responsabilidade de transformar em natural e permanente a promoção de iniciativas e acções do próprio Partido sobre o meio em que actuam e, a partir dos problemas concretos, elaborar propostas e tomadas de posição, promover o diálogo com sectores de opinião democráticos, cidadãos independentes, estruturas e instituições de carácter económico, social, cultural e científico, e dinamizar a luta dos trabalhadores e das populações.

Nesta acção, cabe um papel importante aos militantes do Partido com tarefas nas organizações de massas - eleitos nas estruturas dos trabalhadores, nos órgãos de poder local, nas comissões de utentes e de moradores, colectividades, associações do mais diverso tipo - , pela possibilidade que têm de contactar e influenciar muitos homens e mulheres no sentido de os levar a uma maior intervenção política na sociedade, a acreditar na força transformadora da luta e a reforçar a sua aproximação ao Partido. Seja qual for a tarefa que cada militante desempenhe, seja qual for a área onde desenvolva e dirija a actividade partidária nunca pode perder de vista que, com a sua acção, está a ajudar a luta mais geral que o Partido trava a nível nacional e que, por isso, necessita de enquadramento e discussão política no Partido.

O carácter democrático, humanista e libertador do projecto do nosso Partido potencia um extraordinário poder de atracção, quando conhecido e compreendido pelas massas. Divulgá-lo e afirmá-lo como a única alternativa ao sistema capitalista é, em articulação com as acções de massas e a iniciativa sobre problemas concretos, tarefa de carácter estratégico na situação actual, para marcar a diferença em relação aos partidos que defendem o capitalismo, abrir perspectivas aos trabalhadores, rasgar novas janelas de futuro às camadas jovens e colocar na ordem do dia a necessidade de lutar pelas grandes causas da humanidade: pôr fim à exploração do homem pelo homem, lutar pela paz, construir a sociedade socialista e comunista.

4.8. Informação, propaganda, imprensa do Partido e Festa do Avante!

A intervenção do Partido, assente no papel decisivo da organização partidária e tendo como elemento principal a luta de massas à qual se associa a luta institucional, exige coordenação e unificação de forças e integra outras linhas, meios ou instrumentos de acção em que se destacam a imprensa partidária, a informação e propaganda, a Festa do Avante! e outras iniciativas partidárias.

A desproporção no acesso aos grandes órgãos de comunicação social que se tem vindo a agravar obriga os comunistas a reforçar o combate persistente pela igualdade de tratamento por parte dos media.

A intervenção partidária na luta quotidiana visando alcançar os objectivos de curto, médio e longo prazos - desenvolvendo-se a partir de linhas, meios e instrumentos de intervenção que têm as suas dinâmicas próprias e estando ligada à iniciativa de cada organização - , terá reais possibilidades de influenciar a vida política e de ter êxito se o Partido tiver a capacidade de coordenar e unificar num dado momento o conjunto das suas forças para uma determinada acção ou objectivo. Apesar de experiências positivas, mantêm-se dificuldades de o fazer de modo sistemático, excepto nas campanhas eleitorais e, mesmo aí, com insuficiências.

Impõe-se prosseguir a experiência de realização de grandes campanhas políticas de massas de protesto, proposta e reivindicação promovidas pelo Partido, cuidando da sua programação de forma a deixar espaço para as dinâmicas sectoriais, regionais e locais, e não prescindindo da agilidade necessária para a decisão e resposta em função do momento.

No conjunto do trabalho de comunicação do PCP, que envolve muitos elementos e vertentes, tem particular importância e relevo o papel da informação e da propaganda, que são crescentemente essenciais e indispensáveis a quase todas as formas de intervenção política do PCP.

Apesar de enormes restrições de meios e recursos, os últimos quatro anos ficam marcados por uma intensa e diversificada actividade de informação e propaganda, apoiada no trabalho do Departamento de Propaganda, do Gabinete de Imprensa central e das organizações regionais, entre as quais se destacam: o apoio a diversas campanhas eleitorais nacionais e regionais; a promoção de acções nacionais de informação e esclarecimento temáticas, como sejam o pacote laboral, a IVG e a guerra no Iraque; a produção de numerosos materiais temáticos ou dirigidos e de tempos de antena de rádio e de televisão; a manutenção actualizada do sítio do Partido na Internet e a sua crescente utilização como meio de intervenção e comunicação e também como instrumento de dinamização de acções de agitação; a organização e circulação de diversas exposições temáticas, bem como a produção de CD, DVD, sobre o 25 de Abril, Ary dos Santos, a imprensa partidária, a conquista das oito horas de trabalho no campo; a crescente colaboração para a concretização de grandes iniciativas do Partido e uma persistente actividade de contacto com a comunicação social para difusão das posições e iniciativas partidárias e para corresponder eficazmente às suas solicitações.

Um balanço do trabalho desenvolvido nestas áreas comporta evidentemente o reconhecimento de numerosas deficiências, lacunas e atrasos em relação a muitas questões, preocupações e linhas de trabalho enunciadas em anteriores Congressos - e que mantêm no essencial validade e actualidade - mas que, entretanto, não são de molde a invalidar, tendo em conta os recursos limitados do Partido e a desequilibrada correlação de forças no plano da luta das ideias, a valiosa contribuição da acção desenvolvida.

As tendências, evoluções e mudanças que percorrem a vida política e o sistema mediático, e a crescente conexão destas duas áreas, longe de atenuarem a importância ou reduzirem o papel da informação e da propaganda do Partido, apelam imperativamente ao seu fortalecimento, crescente qualificação, melhoria e expansão: na razão directa da necessidade de enfrentar a pressão exercida pelos critérios mediáticos no sentido da fragmentação e distorção da realidade e da informação sobre ela, com sacrifício da compreensão dos processos e da ligação entre os fenómenos; na razão directa da necessidade de dotar os militantes, os eleitores do Partido e largos sectores sociais de elementos de informação consistentes e verdadeiros sobre a realidade nacional e as propostas do Partido, contrariando por esta via o efeito de gritantes discriminações contra o PCP e de valores e critérios dominantes nos media e na vida política que veiculam a superficialidade, o conformismo, as viciadas generalizações sobre todos os partidos e fomentam a amnésia política e impunidade dos responsáveis da política de direita; na razão directa do valor acrescido que a informação e propaganda do Partido representam para a própria dinamização da actividade partidária e para um maior contacto directo das organizações e militantes com os sectores sociais e com as comunidades em que estão inseridos.

Neste quadro, mantêm-se actuais as questões, linhas de trabalho e orientações constantes da Resolução Política do último Congresso, a que é necessário continuar a prestar particular atenção e tomar decisões para a sua implementação:

reforçar uma qualificada e continuada linha de trabalho central no domínio da informação e propaganda e da relação com a comunicação social, apoiada em estruturas e quadros especializados e capaz de assegurar a resposta às necessidades da actividade de comunicação nacional do Partido e de garantir o necessário apoio complementar à actividade e iniciativa própria das organizações, nomeadamente no sentido de melhorar a preparação das iniciativas que, apesar de serem de âmbito local ou regional, têm projecção e expressão nacional;

desenvolver, animar e apoiar uma efectiva descentralização da iniciativa e do trabalho de comunicação, nomeadamente ao nível das organizações de base, como elemento indispensável de uma intervenção mais pronta, mais esclarecedora e mais próxima dos acontecimentos e das pessoas - e, portanto, mais eficaz - e também como contributo importante para um mais intenso relacionamento das organizações com os trabalhadores e as populações;

mantendo conceitos e princípios que têm orientado a actividade de comunicação do Partido (como é o caso da defesa da coerência entre a forma e o conteúdo, da distinta valorização da propaganda política relativamente à publicidade e aos seus critérios, da harmonização da iniciativa descentralizada com elementos unificadores e nacionais da mensagem política e da imagem, da valorização da organização do Partido e dos seus militantes como factor decisivo de comunicação), estimular a pesquisa e a inovação nos meios, nas linguagens e nas formas e progredir na avaliação da eficácia e dos resultados do trabalho de comunicação, com base num mais estreito relacionamento e diálogo com as organizações e no recurso a elementos especializados das técnicas de comunicação e da área das Ciências Sociais;

continuando a valorizar formas clássicas e provadas de informação e propaganda como os boletins de célula, os documentos sobre os vários problemas sentidos pelos trabalhadores e pelas populações, e a colocação e exposição pública de materiais, promover a reflexão e o estudo sobre as mudanças qualitativas em curso e no horizonte no sistema mediático (massificação da Internet e comunicação social electrónica, televisão e rádio digitais, multiplicação de canais, interactividade, alterações de conteúdos e padrões de informação, etc.) e sobre os modos de o Partido assegurar neste quadro uma activa e eficaz intervenção e projecção das suas ideias e valores que tenha em conta a diversidade e diferenciação das pessoas a quem se dirige, dos seus níveis de literacia e de graus de acesso às novas tecnologias de informação;

combater concepções e políticas que, a pretexto de justificadas e legítimas preocupações ambientais e de defesa do património, que partilhamos, visam restringir e condicionar o exercício do direito e da liberdade de propaganda política.

A Festa do Avante! é expressão da Revolução de Abril que assegurou a liberdade e a democracia ao povo português. Concretização da vontade, da iniciativa e da capacidade colectiva dos membros do Partido, a Festa do Avante! é um importante factor de mobilização e dinamização da organização do Partido.

Festa do PCP, do povo e da juventude, a Festa é em cada ano de luta um momento alto de resistência, tenacidade e determinação face à dura e prolongada ofensiva política de direita. A Festa foi e continua a ser uma demonstração de camaradagem, de fraternidade, de imaginação, de criatividade, de militância e capacidade de organização, de valores democráticos, de solidariedade de classe e internacionalista, de luta e de confiança na possibilidade de uma política diferente e de uma sociedade melhor.

A imprensa partidária - O Avante! e O Militante - constitui um instrumento insubstituível quer na informação com verdade, quer na batalha das ideias e na formação ideológica dos militantes comunistas, quer na divulgação das posições, análises e orientações do Partido nos planos nacional e internacional, quer ainda no reforço da organização partidária e no aumento da influência do Partido junto dos trabalhadores e das populações.

No quadro actual, face à fortíssima ofensiva anticomunista - potenciada pela crescente concentração da propriedade dos media nas mãos de grandes grupos económicos e financeiros - a importância da imprensa partidária assume uma expressão ainda mais relevante, pelo que é necessário reconhecer que o Avante! e O Militante não têm ainda o lugar necessário na actividade partidária e que a sua promoção e difusão se apresentam como tarefa essencial a exigir a atenção permanente de todo o Partido.

A experiência recente na campanha de difusão do Avante! - muito positiva apesar das insuficiências evidentes e da irregularidade de empenhamento das diversas organizações - confirma as enormes potencialidades existentes e aponta, de forma clara, o caminho da insistência e da persistência nos esforços visando fazer chegar mais longe o órgão central do Partido. A linha de edições especiais de que são exemplo os números sobre o pacote laboral (com uma edição de 50 mil exemplares), sobre a saúde e sobre a lei das rendas de casa, ou a produção do CD com o poema As Portas Que Abril Abriu de Ary dos Santos constituiu um importante êxito a que importa dar continuidade.

O Avante!, órgão central do Partido, desempenha um papel fundamental na informação e no esclarecimento político e ideológico. Num tempo em que o grande capital domina a esmagadora maioria dos órgãos de comunicação social, que servem os seus interesses, o Avante! - informando sobre as lutas dos trabalhadores em Portugal e no mundo, sobre a resistência dos trabalhadores e dos povos ao imperialismo - assume-se como uma voz ímpar no panorama da imprensa nacional e cuja leitura é cada vez mais necessária para uma compreensão real dos principais problemas e desafios do mundo contemporâneo. O seu prestígio junto dos trabalhadores e do povo é factor que potencia o alargamento da influência do Partido. O papel que o Avante! representa para o conjunto do Partido exige um contínuo aperfeiçoamento, uma melhor articulação com as organizações, questão que implica, designadamente, a participação de todas as organizações e militantes, com o fornecimento de informações, notícias e sugestões. Assim como exige a adopção de medidas orgânicas de responsabilização pela difusão e venda por parte das organizações, para alargar a difusão que a experiência mostra ser possível.

O Militante, como instrumento virado para a informação e formação políticas e ideológicas e para a abordagem de questões de organização, cujo conteúdo também se tem enriquecido, exige igualmente uma maior divulgação.

As edições electrónicas, com destaque para o sítio do PCP e o sítio do Avante! na Internet, representam uma importante forma de divulgação das propostas e projecto do

Partido e de interacção com um vasto número de pessoas. É necessário prosseguir na sua dinamização numa perspectiva que inclua simultaneamente uma visão global e uma preocupação descentralizadora. A riqueza e diversidade temática já existente pode ser ampliada e aprofundada com novos conteúdos, nomeadamente os relacionados com o conhecimento, divulgação e valorização da história do Partido.

A actividade editorial representa um importante património e um meio de intervenção de grande valor. É necessário promover a sua dinamização, nomeadamente no plano das edições e das iniciativas de promoção, integrada numa mais forte linha de acção política, cultural e ideológica.

4.9. Meios financeiros

A capacidade do Partido para realizar as tarefas políticas está estreitamente relacionada com a sua capacidade financeira. A questão dos fundos, desde a sua angariação até à sua criteriosa gestão, constitui um problema da maior importância na actividade quotidiana dos militantes, dos organismos e das organizações.» Esta conclusão da Resolução Política do XVI Congresso do Partido mantém toda a actualidade, tal como se mantêm actuais as deficiências ali apontadas, assim como a enumeração das medidas para as ultrapassar.

O aumento dos recursos materiais, na perspectiva de assegurar a independência financeira do Partido, a par da luta pela revogação da iníqua Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, aprovada pela direita com o apoio do PS e do Presidente da República, é uma questão fulcral para a garantia da manutenção do carácter de classe do nosso Partido, da sua independência política e ideológica.

No último Congresso foram definidas linhas orientadoras para o trabalho partidário nos quatro anos seguintes que apontavam para um aumento das receitas no seu global, particularizando o aumento das quotas e a sua cobrança regular, das contribuições dos filiados e dos eleitos nos diversos órgãos autárquicos e legislativos. A sua concretização quatro anos passados está longe de ser satisfatória, continuando a verificar-se incompreensões e subestimações políticas nesta área decisiva da vida partidária.

O objectivo proposto não foi alcançado, quer por razões relacionadas com as deficiências na actividade do Partido, quer por acontecimentos políticos a ela exteriores. Os resultados eleitorais do Partido e da CDU nas eleições autárquicas e legislativas que se realizaram neste período, desfavoráveis em termos políticos, tiveram reflexos negativos também ao nível das receitas, quer nas institucionais (menos 9,68%) quer nas contribuições dos eleitos (menos 23,71%).

As contas, consideradas globalmente, têm apresentado resultados líquidos negativos nos últimos três anos, traduzindo uma arrecadação de receitas muito aquém das despesas, o que exigiu o recurso a receitas extraordinárias, através da gestão do património do Partido.

No que respeita às contas das organizações regionais, a taxa de cobertura das despesas pelas receitas, em 2000, foi de 79,9%, enquanto que, em 2003, subiu para 85,1%. Esta variação significa que os esforços que as organizações têm vindo a fazer para diminuir as despesas, ainda que positivos, são insuficientes.

As quotizações, que para além da sua importância financeira têm no PCP um significado político muito importante, ficaram aquém dos objectivos. O aumento verificado de 8,39% nesta rubrica em 2003 relativamente ao ano de 2000 não é separável da campanha de contactos e actualizações, levada a cabo à escala nacional, o que em si revela as potencialidades e a necessidade de consolidar o trabalho no sentido de que cada militante do Partido cumpra o dever estatutário de pagar a sua quotização e de a manter actualizada.

Globalmente, as receitas operacionais aumentaram passando de 7 167 336,56 euros em 2000 para 8 208 233,41 euros em 2003, o que representa, um aumento de 14,52%.

As receitas das organizações regionais globalmente consideradas apresentam um aumento de 57,6%, passando de 4 089 768,90 euros em 2000, para 6 445 362,66 euros em 2003, insuficiente para cobrir o aumento das despesas entretanto verificado.

As despesas operacionais, consideradas globalmente, aumentaram 29,12%, passando de 7 852 086,89 euros em 2000 para 10 138 237,13 euros em 2003. Neste ano mais de 46% do total destas dizem respeito aos «custos com o pessoal», situação que se justifica plenamente atendendo à natureza e características do Partido que somos.

As despesas do conjunto das organizações regionais aumentaram 47,98%, passando de 5 120 464,92 euros em 2000 para 7 577 455,56 euros em 2003.

A procura de um equilíbrio financeiro nas contas do Partido exige as seguintes medidas e objectivos de trabalho:

o aumento de receitas, dando particular atenção: à recolha da quotização, quer pela via orgânica responsabilizando mais camaradas pelo acompanhamento respectivo, quer dinamizando novas formas de recebimento - transferência bancária e pagamento pelo Multibanco - , tendo como objectivo ganhar o conjunto dos militantes para um valor ínimo de quota definido a partir da referência de 1% do respectivo vencimento (ou remuneração) mensal; à recolha e controlo das contribuições dos eleitos em cargos públicos e de membros de cargos de nomeação política, levando à prática o princípio ético e estatutário de não ser beneficiado nem prejudicado; à recolha de contribuições dos militantes e simpatizantes; à realização de iniciativas públicas, importante forma de obtenção de receitas e meio de contacto com os militantes e para aproximação às massas; à dinamização dos locais de convívio nos centros de trabalho, tornando-os atractivos, funcionais e fonte de receita para a organização;

a contenção e redução das despesas, visando particularmente: aprofundar o controlo financeiro com o objectivo de estancar e banir gastos supérfluos não fundamentais paraa actividade política; combater liberalismos e dar mais atenção à utilização de meios materiais e financeiros do Partido e diminuir o peso relativo de funcionários sem tarefas na organização; defender e salvaguardar o património do Partido, adequando a sua utilização ao necessário equilíbrio financeiro;

a definição por cada organismo do Partido do seu plano de trabalho anual com vista à concretização dos objectivos da política de fundos.

A política financeira do Partido e as medidas que lhe têm que estar associadas nos próximos anos não podem deixar de ter presente a necessidade de garantir um equilíbrio financeiro sem recurso às verbas de gestão do património e uma redução da dependência de subsídios centrais por parte das organizações regionais.

Ao Partido no seu conjunto, e a cada organização em particular, coloca-se o objectivo de, no âmbito da sua actividade, procurar um aumento das receitas e uma redução das despesas que assegurem a indispensável actividade política no quadro das reais possibilidades financeiras do Partido.

O Partido, como Partido da classe operária e de todos os trabalhadores, dispõe de possibilidades objectivas para vencer e ultrapassar as actuais dificuldades nesta importante área da sua actividade.

4.10. Actividade internacional

O PCP interveio na intensa batalha política e ideológica imposta pela ofensiva do imperialismo, dando resposta, no essencial, a um conjunto muito diverso de novos problemas, desenvolvendo a sua solidariedade com os povos em luta, intervindo na frente da paz e no «movimento antiglobalização».

A actividade internacional do PCP caracterizou-se pelo reforço e alargamento das suas relações com partidos comunistas e outras forças progressistas, pelo restabelecimento de relações com alguns partidos e o estabelecimento de novas relações, nomeadamente no Leste da Europa. Há a salientar dois traços essenciais: um negativo, que é a tendência para a diminuição da visita de delegações a Portugal, apesar da participação regular de cerca de 40 delegações na Festa do Avante! e outro positivo, o grande número de delegações ao estrangeiro para visitas oficiais ou de estudo, congressos, festas da imprensa comunista, encontros de solidariedade, conferências e seminários.

Na Europa, a actividade foi intensa e exigente. O PCP deu activa contribuição para a actividade do Grupo de Esquerda Unitária Europeia/EVN no Parlamento Europeu. Promoveu encontros sobre questões sociais e para a elaboração da Plataforma comum para as eleições para o PE. Participou em várias iniciativas sobre a problemática europeia. Participou no Fórum da Nova Esquerda Europeia, como observador, e em reuniões de partidos de esquerda que conduziram ao «partido da esquerda europeia», que não integrou por não o considerar adequado ao necessário reforço da cooperação.

O PCP continuou a dar atenção e a valorizar as suas relações em África, Ásia e América Latina. É de salientar a participação nos Seminários de partidos comunistas da América Latina e Europa, nos Encontros do Fórum de S. Paulo, nos Encontros Internacionais de Atenas, nas Conferências Euro-Mediterrânicas de partidos de esquerda e em Seminários como o promovido pelo Partido Comunista da China «Socialismo, realidade e desenvolvimento». Em Portugal, regista-se como muito positivo a realização do Seminário Internacional por ocasião do 30.º aniversário do 25 de Abril.

Atento ao desenvolvimento dos processos de contestação da política exploradora e agressiva do imperialismo, o PCP interveio no movimento pela paz e «antiglobalização» com a preocupação de defender o seu conteúdo anti-imperialista. Participou nos Fóruns Sociais Mundiais e Europeus, em várias contra-Cimeiras, nas Marchas da Rota (Espanha).

O PCP, partido patriótico e internacionalista, orienta a sua actividade internacional na defesa dos interesses dos trabalhadores, da soberania e independência nacionais, na luta pela paz e no reforço da amizade e cooperação com todos os povos. Deverão ser linhas fundamentais para a intervenção do Partido: o reforço das relações bilaterais e multilaterais entre partidos comunistas e outra forças revolucionárias e para a sua crescente unidade na acção; a afirmação dos valores e ideais do socialismo e contribuir para a recuperação e relançamento do movimento comunista e revolucionário; o reforço das relações de intercâmbio com outras forças políticas e sociais anticapitalistas; a resposta pronta aos acontecimentos internacionais desenvolvendo iniciativas de agitação, esclarecimento e solidariedade; a criação de condições para o estudo mais sistemático e aprofundado da evolução da situação internacional; a abordagem das questões internacionais no seu discurso político; o reforço da informação ao Partido sobre a actividade internacional e o prosseguimento da divulgação para o exterior das principais análises do Partido; a melhoria da articulação da actividade internacional dos comunistas nas instituições e nos movimentos de massas; a contribuição para o desenvolvimento das iniciativas nacionais e internacionais dos movimentos unitários pela paz e de solidariedade internacionalista.

4.11. Nota final

O XVII Congresso, avaliando a situação internacional e nacional, o papel indispensável e insubstituível do PCP na sociedade portuguesa e a sua contribuição para o movimento comunista e revolucionário, as exigências a que está sujeito, afirma a disposição de assegurar que o PCP, partido comunista que foi, é e vai continuar a ser, cumprirá o seu papel, sejam quais forem as condições em que tenha que actuar.

A intervenção e a força do PCP baseiam-se no seus quadros e militantes, organizados e unidos em torno de um projecto, com sólidos princípios de funcionamento, fortes laços de fraternidade e solidariedade, ligados aos trabalhadores e à população. Da reflexão, iniciativa, militância e acção de cada um e de todos os militantes, depende a força do Partido e sua capacidade de intervir, influenciar e transformar.

O XVII Congresso salienta que os militantes e organizações do Partido, as gerações de comunistas que fazem o PCP neste início do século XXI, ligados aos trabalhadores, à juventude, ao povo português, intérpretes no tempo presente da gesta heróica, da abnegação, espírito de sacrifício e humanismo de gerações de comunistas que ao longo de muitas décadas têm formado o Partido, são o colectivo capaz de impulsionar os avanços progressistas de que a sociedade portuguesa carece, são o colectivo capaz de contribuir para o relançamento e reforço do movimento comunista e revolucionário que a luta dos trabalhadores e dos povos precisa para a liquidação do capitalismo e a sua substituição por uma nova sociedade liberta da exploração e da opressão - o socialismo e o comunismo.


Almada, 28 de Novembro de 2004