No encerramento do Encontro sobre «O impacto das migrações em Portugal – emigração/imigração», Jerónimo de Sousa afirmou que «a acção política e a iniciativa legislativa do PCP estão associadas às alterações positivas introduzidas nas Lei da Nacionalidade e na Lei da Imigração» e sublinhou que o PCP, como partido dos trabalhadores que se orgulha de ser, «continuará ao lado dos imigrantes e das suas associações na luta por uma integração de pleno direito e pela valorização do seu papel na sociedade portuguesa».
Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP
Encontro sobre «O impacto das migrações em Portugal»
Saudações
fraternais, em meu nome e em nome da Direcção do nosso Partido, a todos os
presentes, particularmente aos nossos convidados, e os sinceros agradecimentos
pela vossa presença e pelos preciosos contributos que aqui trouxeram e que
permitiram melhorar a nossa compreensão e resposta às questões referentes aos
actuais movimentos migratórios e aos seus impactos no nosso país.
A
Conferência Nacional do PCP sobres Questões Económicas e Sociais, no âmbito da
qual este nosso Encontro se insere, tendo como objectivo realizar uma análise
global e integrada dos problemas económicos e sociais do país, não podia deixar
de considerar uma realidade muito presente na nossa vida e experiência
colectiva nessa dupla condição de sermos um país de emigração e de imigração.
Dupla condição que se expressa no tempo longo de manutenção de uma centenária
diáspora portuguesa dispersa pelos quatro cantos do mundo e, mais recentemente,
nestes últimas décadas, pela presença no nosso país de uma significativa
comunidade imigrante de povos de várias origens. Condição que, sendo uma marca
da nossa especificidade no quadro da União Europeia, nos coloca a reforçada
responsabilidade e exigência de termos uma justa orientação política que não só
vá ao encontro das aspirações e necessidades das nossas comunidades emigrantes,
mas que também faça a diferença, pela natureza dessa nossa específica condição,
em matéria de política de acolhimento e integração dos que procuram no nosso
país uma saída digna para as suas vidas, marcada pelo respeito pelos seus
direitos cívicos, sociais e culturais, de apoio à sua integração harmoniosa e
de valorização do seu contributo para o desenvolvimento do país.
Esta
nossa iniciativa vem, assim, ao encontro de uma necessidade que todos sentíamos
de actualização e melhoramento das nossas orientações e das nossas propostas
que fazem parte de uma política alternativa que propomos ao povo português, em
ruptura com a política de direita, algumas das quais estão já referenciadas no
documento-base de apoio ao debate que aqui realizámos.
No
século que agora findou e nos primeiros anos do presente, as migrações
atingiram dimensões nunca antes verificadas. Portugal conheceu e conhece bem os
efeitos deste movimento que levou milhões de seres humanos em direcção aos
países mais desenvolvidos do sistema capitalista.
A
dimensão das migrações contemporâneas, que nos últimos 25 anos fez quase
duplicar o número de pessoas a viver fora do seu país, é uma consequência dos
processos de globalização capitalista e da sua dinâmica predadora e criadora de
crescentes desigualdades a nível mundial entre os países mais ricos e os países
mais pobres.
Naturalmente
que as guerras e as calamidades naturais pesam muito nas causas do processo
migratório e deixam milhões de seres humanos entregues a si próprios e ao
abandono, mas a causa principal é a procura de melhores condições de vida. As
razões fundas do fenómeno migratório estão, por isso, associadas ao processo de
concentração de riqueza que se desenvolve para a colocar nas mãos de uns poucos
quer pela via da delapidação dos recursos das nações – muitas vezes com o
recurso à guerra e condenando os povos respectivos à miséria, à fome e ao
desemprego –, quer pela via da acentuação da exploração desenfreada do trabalho
de milhões de pessoas, uma significativa parte das quais é vítima da acção não
só de um patronato sem escrúpulos mas também de redes de contrabandistas e
traficantes.
Movimentos
migratórios que estão longe de diminuir e que o processo de desenvolvimento
desigual do capitalismo tenderá a acentuar, com o aumento do fosso que separa
os países em termos de desenvolvimento. Processo que as potências capitalistas
e os interesses que nelas se agrupam controlam com especiais vantagens e que se
evidencia na aparente contradição entre o declarado reconhecimento da
importância do trabalho imigrante para o próprio crescimento e desenvolvimento
dos seus países e as políticas repressivas e securitárias que ao mesmo tempo
promovem, estigmatizando o imigrante e transformando o problema das migrações
em casos de polícia.
É
no quadro de uma hipócrita política de classe – que se escuda em argumentos de
uma suposta política de imigração de «portas escancaradas» –que na Europa se
refinam, com a aplicação de novos meios e novos métodos, as políticas de
concretização da ideia de uma «Europa fortaleza», por cima dos mais elementares
direitos dos imigrantes. Políticas que Portugal acompanha em muitas das suas
vertentes.
Com
o recente acordo do tratado dito reformador, mas que é a cópia do recusado
«tratado constitucional», dá-se um passo de gigante nessa direcção com a
comunitarização das políticas de imigração, agora por decisão apenas da maioria,
e que tem no sistema de quotas, na implementação de uma imigração selectiva,
nomeadamente com a introdução da «carta azul», nas equipas de intervenção
rápida, nos centros de detenção para emigrantes, no Sistema Intensivo de
Vigilância Externa, nos instrumentos de recolha de dados biométricos para a
criação de bases de dados pessoais com os inerentes riscos de abusos, alguns
dos seus componentes.
Não
deixa de ser significativo da verdadeira natureza de classe de tais orientações
e dos governos ao serviço do capital que as defendem e concretizam, o facto de
nenhum dos países europeus que recebem fluxos migratórios ter, até hoje,
ratificado a Convenção Internacional sobre Protecção de Todos os Trabalhadores
Migrantes e Membros das suas Famílias, elaborada sob aos auspícios da ONU.
Instrumento internacional que pretende garantir a defesa dos direitos humanos
dos trabalhadores migrantes, nomeadamente o direito inalienável a viver em
família e em agrupamento familiar, bem como a promoção de medidas de combate ao
tráfego de pessoas e que o nosso Partido tomou a iniciativa de propor à
ratificação pela Assembleia da República.
Pelo
que aqui foi dito e fundamentado neste nosso Encontro acerca das medidas
securitárias e repressivas em curso na União Europeia e do seu carácter
crescentemente integrado, ficou muito claro que os objectivos das actuais
políticas visam já não apenas a criação de condições de exploração de uma
mão-de-obra barata e desprovida de direitos, mas também garantir uma elaborada
gestão das diferentes «categorias» de imigrantes em função das necessidades de
mão-de-obra dos diferentes países e descartáveis a todo o tempo, numa visão
ainda mais desumanizadora da imigração e dos imigrantes.
Da
nossa parte não só recusaremos a ideia de uma «Europa fortaleza», como nos
distanciamos de uma política comum de imigração que, para além de não responder
às diferentes realidades de cada país e pôr em causa a soberania nacional,
assenta numa unilateral concepção utilitarista e discriminatória que faz tábua
rasa dos direitos dos imigrantes e alimenta a xenofobia e o racismo. Mais que
uma política comum, o que é necessário é outra política e outras medidas que,
não rejeitando a possibilidade de cooperação entre países, efectivamente
protejam os direitos dos imigrantes e combatam as causas profundas da
imigração.
Tomámos
a decisão de avançar para a realização de uma Conferência Nacional sobre
Questões Económicas e Sociais porque não nos conformamos e muito menos
aceitamos a trajectória de degradação económica e de agravamento da situação
social a que a política de direita de sucessivos governos conduziu o país.
Trajectória que tornou inadiável o questionamento das grandes orientações
políticas e a acção governativa dos últimos anos, bem como a do actual governo
do PS de José Sócrates, que, no essencial, seguiu o mesmo rumo e em muitos
domínios ampliou e aprofundou a ofensiva que vinha de trás contra os direitos
sociais, laborais e cívicos dos trabalhadores.
O
incipiente crescimento económico, o elevado desemprego e trabalho precário, a
contínua destruição dos principais sectores produtivos nacionais enquanto se
agrava e cresce o défice das contas externas, o carácter dependente e
periférico que permanece da nossa economia, o agravamento dos défices
estruturais do país e de uma enorme dívida externa, são o resultado de uma
política que se mostrou incapaz de resolver os problemas nacionais e que
continuou a conduzir o país pelo caminho da divergência económica, que nos vai
crescentemente distanciando dos outros povos da Europa e condena o país à
dependência crónica.
A
gravidade da situação económica e social de Portugal está bem patente, como
aqui foi realçado numa das intervenções deste nosso Encontro, na dinâmica
actual dos fluxos migratórios no nosso país em resultado da grave situação
económica e social que o país enfrenta, nomeadamente em consequência dos
elevados níveis de desemprego que transformou Portugal no país com o mais alto
índice de crescimento do desemprego na União Europeia e o único onde a taxa de
desemprego subiu neste último ano.
Esta
negativa evolução é a causa do retorno do cada vez mais preocupante fenómeno
emigratório, em crescimento contínuo e agora também em condições de grande
precariedade, evidenciando que o flagelo da emigração não é um problema
superado. Hoje muitos milhares de portugueses rumam novamente ao estrangeiro à
procura de trabalho e de melhores condições de vida e o mesmo passaram a fazer,
particularmente nestes três últimos anos, muitos daqueles, e são já muitos
milhares, que tentaram encontrar no nosso país uma saída digna para a sua vidas
e a dos seus.
E
se é verdade que esta não é uma situação nova já que ao longo de séculos
milhões de portugueses viram-se obrigados a emigrar em resultado da exploração
desenfreada e do subdesenvolvimento que as classes dominantes impuseram ao
país, particularmente evidente no período do regime fascista, que levou, nos
últimos anos da ditadura, à saída de mais de 1,2 milhões de portugueses e que,
perante a dimensão do surto migratório, acabaria por transformar Portugal
também num país importador em pequena escala de mão-de-obra super-explorada,
com o recrutamento de mão-de-obra das ex-colónias que, mais tarde, viria a
engrossar com o processo de descolonização e com a adesão à CEE e ao Acordo de
Schengen, em 1991, abrindo uma nova fase do processo imigratório.
É
verdade também que as promissoras possibilidades que a Revolução abriu de
concretização de política de desenvolvimento realmente voltada para servir os
interesses do país e dos trabalhadores, acabaram por ser frustradas por uma
política de recuperação capitalista que, ao longo destes últimos anos, assumiu
como primeiro e essencial objectivo a restauração do capital monopolista.
Política que conduziu ao agravamento da situação social, que se reflecte em
mais precárias condições de trabalho para um cada vez maior número de
trabalhadores portugueses e tem nas comunidades imigrantes, pela sua condição,
mais agravadas consequências, com uma situação laboral e social onde campeiam
as mais profundas injustiças, as maiores desigualdades e a mais grave
sobre-exploração.
Situação
que se agravaria exponencialmente para todos se o governo de José Sócrates
fosse capaz de concretizar a ameaça da implementação da flexigurança, com as
suas propostas de alteração ao Código de Trabalho para pior, nomeadamente as da
liberalização dos despedimentos e dos horários, impondo a «lei da selva» nas
relações de trabalho.
Esta
negativa evolução, também resultado das políticas de desprotecção das
actividades produtivas nacionais, das políticas orçamentais restritivas e
monetaristas submetidas ao fundamentalismo do Pacto de Estabilidade e da
crescente financeirização da economia e das políticas de privatização,
liberalização e crescente desregulamentação dos mercados, precisa de ser
contida e invertida para abrir espaço e afirmar uma política alternativa que
promova um crescimento económico vigoroso e sustentado e a criação acelerada de
emprego, que relance o país na senda do progresso e do desenvolvimento e
permita alimentar a esperança de uma vida digna a todos os portugueses, a todos
aqueles que dão com o seu trabalho e o seu esforço um contributo para o
desenvolvimento do país.
Políticas
que se traduzem, nomeadamente com a obsessiva política de redução do défice do
governo do PS, num violento ataque às comunidades portuguesas no estrangeiro e
aos seus direitos, e que se expressa bem na dita reestruturação consular que
deixa emigrantes portugueses mais isolados e mais distantes, num momento em que
a nova vaga de emigração aconselharia, pelas características que apresenta –
mais precarizada e mais desenraizada –, a fazer exactamente o
contrário em defesa de intervenção mais próxima e célere junto das comunidades.
É por isso que continuamos a lutar por uma verdadeira reestruturação dos
serviços consulares que ponha fim às medidas avulsas de encerramento de
consulados de carreira e sua substituição por consulados honorários,
naturalmente vocacionados para a defesa de interesses particulares e não de
prestação do interesse público.
A
mesma política que se reflecte no ensino do português no estrangeiro, cada vez
mais longe de corresponder ao estipulado na Constituição da República, que
obriga o Estado a desenvolver o ensino da Língua e Cultura portuguesas junto
dos filhos dos emigrantes, e que se revela também na desvalorização do Conselho
das Comunidades com a redução do número de conselheiros. Conselho que exige ser
valorizado através da atribuição de meios técnicos e financeiros adequados ao
seu funcionamento, de forma a valorizar e garantir o desempenho das suas
funções e no respeito da sua plena autonomia.
Da
nossa parte, não abdicaremos de lutar por um conjunto de propostas que vá ao
encontro das reais necessidades e interesses das nossas comunidades, entre as
quais: a criação de um programa de promoção, expansão e qualificação do ensino
da Língua e Cultura portuguesas, desenvolvido em várias vertentes, com um
investimento financeiro adequado que permita cumprir o disposto no artigo 22.º
da Lei de Bases do Sistema Educativo; a criação de um Fundo de Apoio ao
Movimento Associativo português no estrangeiro que permita o financiamento de
actividades ou projectos propostos pelas Associações das Comunidades
Portuguesas.
É
fundamental que na acção governativa se desenvolva uma estratégia que inclua
uma política para as comunidades portuguesas coerente com o interesse nacional
e com o interesse das respectivas comunidades. O governo do PS, na senda do que
tem sido a política de direita dos sucessivos governos, olha para os portugueses
da diáspora como um instrumento para o desenvolvimento da sua política e nem
sequer tem em conta o seu forte contributo para a economia portuguesa. Em 2006,
o valor total dos depósitos dos emigrantes cifrou-se em 7.276 milhões de euros,
valor que, sendo inferior ao passado, constitui, apesar de tudo, uma verba
vultuosa, qualquer coisa como cerca de 4,7% do PIB. (Fonte: Banco de Portugal).
Povo
de emigrantes que tem cerca de cinco milhões dos seus membros espalhados por
todos os continentes, nós, os portugueses, estamos bem colocados para
compreender e apoiar os que junto de nós procuram um emprego, um salário, uma
vida mais digna. No entanto, não foi essa a principal característica das
políticas adoptadas em Portugal ao longo de muitos anos.
Apesar
das boas palavras dirigidas às comunidades imigrantes, as políticas de
imigração foram fortemente restritivas e marcadas por práticas policiais
gravosas para os imigrantes, constituíram um bloqueio à imigração legal e
acabaram por promover o crescimento da imigração ilegal, com consequências
sociais e humanas muito negativas para vida dos imigrantes e em prejuízo do
próprio país.
Para
nós, para além do respeito e solidariedade que são devidos a quem procura em
Portugal as condições de subsistência, quase sempre à custa de enormes
sacrifícios, a imigração é não apenas necessária, como é desejável para
garantir o equilíbrio demográfico, para a sustentabilidade dos regimes de
segurança social e para a promoção do nossa própria actividade económica.
O
PCP sempre considerou que o combate eficaz à imigração ilegal passa por
viabilizar a imigração legal, acabando com o absurdo sistema de «quotas»
constante da «lei de estrangeiros», e por adoptar critérios mais flexíveis de
entrada em Portugal para quem pretenda exercer uma actividade profissional. Tal
como passa também por fiscalizar e sancionar devidamente o patronato, que se
aproveita da imigração ilegal para explorar os trabalhadores estrangeiros,
explorando a sua situação de fragilidade, e pelo combate às redes de tráfico de
mão-de-obra ilegal e às associações criminosas que dela se alimentam.
Mas
é indispensável permitir que os trabalhadores estrangeiros em Portugal tenham a
possibilidade de legalizar a sua situação e de poder viver entre nós com os
seus familiares sem terem os seus direitos diminuídos e sem estarem reféns
daqueles que beneficiam com a imigração ilegal. Desde há muitos anos que o PCP
tem vindo a lutar, com as associações de imigrantes, pelo reconhecimento pleno
dos direitos dos imigrantes em Portugal. Tem sido uma luta difícil, de
resistência contra as arbitrariedades, mas tem sido também uma luta com
resultados concretos que devemos salientar e valorizar.
Há
cerca de 10 anos atrás, a luta e iniciativa política do PCP ficou associada à
lei então aprovada sobre os direitos das associações de imigrantes e à primeira
lei aprovada em Portugal contra a discriminação racial. Assim como, nos últimos
tempos, a acção política e a iniciativa legislativa do PCP estão associadas às
alterações positivas introduzidas nas Lei da Nacionalidade e na Lei da
Imigração.
Quando
o PCP apresentou o seu projecto de alteração à Lei da Nacionalidade, em 2005,
fê-lo por razões de elementar justiça. A Lei da Nacionalidade Portuguesa, que
vigorava até ao ano passado, considerava portugueses de origem os filhos de
portugueses nascidos em qualquer parte do mundo. Ao invés, não considerava
portugueses de origem os filhos de estrangeiros nascidos em Portugal, ainda que
tivessem vivido em Portugal por toda a sua vida e não tivessem conhecido sequer
qualquer outro país.
O
projecto de lei da Nacionalidade, apresentado pelo PCP, previa o reconhecimento
da nacionalidade portuguesa originária a todos os cidadãos nascidos em
território português, filhos de estrangeiros aqui residentes a qualquer título,
desde que fosse essa a vontade dos progenitores.
O
processo que culminou nas últimas alterações à Lei da Nacionalidade, no qual o
PCP participou muito empenhadamente, não consagrou inteiramente as nossas
propostas, mas não deixou de ser um passo muito importante e de consagrar
soluções mais justas e adequadas do que as que vigoravam antes, nomeadamente a
consagração da atribuição da nacionalidade portuguesa de origem aos nascidos em
território português, filhos de estrangeiros, desde que, no momento do
nascimento, um dos progenitores aqui resida legalmente há pelo menos 5 anos. Há
aspectos que não têm o nosso acordo, mas foi um avanço que abriu um caminho
para que muitos cidadãos possam ver reconhecida a cidadania portuguesa que
injustamente lhes tem sido negada.
Quanto
à Lei da Imigração, o PCP orgulha-se de ter apresentado, também através do seu
Grupo Parlamentar na Assembleia da República, o primeiro projecto de lei desta
legislatura destinado a alterá-la profundamente, dando cumprimento a um
compromisso assumido no seu Programa Eleitoral. O projecto de lei do PCP propôs
uma revisão global da «lei de imigração», tendo como aspectos fundamentais:
-
A conversão da autorização de residência em regra para a admissão e para a
regularização da permanência em Portugal por razões de trabalho, estudo, de
formação ou de investigação científica;
-
A eliminação das «autorizações de permanência», garantindo aos cidadãos
abrangidos o direito à obtenção de autorização de residência;
-
O abandono das fracassadas políticas de quotas para imigrantes.
O
PCP não votou favoravelmente a nova lei, mas não deixa por isso de salientar
que esta lei, para a qual o PCP muito contribuiu, representa um progresso em
relação à situação que até então tínhamos. É certo que na legislação aprovada
permanecem aspectos negativos que são estruturantes da legislação vigente, que
não foram alterados e com os quais o PCP não se identifica e que não se
coadunam com as suas propostas para uma política de imigração mais humana e mais
justa. São disso exemplos, a manutenção de um sistema de quotas no acesso dos
imigrantes ao emprego, ainda que com um carácter simbólico, o carácter não
suspensivo da maior parte dos recursos de decisões desfavoráveis aos cidadãos
ou os poderes discricionários que são conferidos ao SEF, entre outros aspectos.
O
PCP continua a não se identificar com princípios basilares da legislação
vigente e que se vão manter na nova lei e por isso não lhe deu o seu voto
favorável, porque esta lei não resolve todos os problemas que seria importante
resolver e não conseguirá acabar com o flagelo da imigração clandestina e do
trabalho ilegal. Contudo, Portugal terá, pela primeira vez, desde há muitos
anos, uma lei que representa um progresso para os direitos dos imigrantes e das
suas famílias, que vai possibilitar em definitivo a legalização de muitos
milhares de cidadãos que permanecem entre nós em situação ilegal, e esperemos
que a regulamentação da Lei, agora em curso, não subverta e dificulte com novos
retrocessos os passos positivos que foram dados.
Esta
questão é hoje, como aqui foi salientado, motivo de forte preocupação que exige
uma atenta atenção e pronta denúncia contra qualquer tentativa de inviabilizar,
não apenas pela prática, mas pelo próprio processo legislativo regulamentar, a
perspectiva que se abriu de legalização da imigração ilegal e da possibilidade
de pôr termo às consequências sociais e humanas negativas que dela decorrem.
Como
partido dos trabalhadores que se orgulha de ser, o PCP continuará ao lado dos
imigrantes e das suas associações na luta por uma integração de pleno direito e
pela valorização do seu papel na sociedade portuguesa.
O
impacto da imigração legal na Economia e nas Finanças Públicas em Portugal é
hoje significativo. Segundo dados de 2004 do Conselho Económico e Social, os
imigrantes são responsáveis por cerca de 5% do PIB nacional e o seu contributo
para as contas públicas, através de impostos e taxas, é normalmente maior do
que os custos que lhes estão associados, fazendo-os, por isso, contribuintes
líquidos para a nossa sociedade.
O
documento do nosso Encontro avança com um significativo conjunto de propostas
que dão resposta a uma justa e coerente política de imigração no respeito pelos
direitos dos imigrantes e dos interesses do país. Propostas que vão no sentido
de superar as insuficiências da Lei da Imigração e da Lei da Nacionalidade, mas
também propostas e medidas que permitam atacar, de forma decidida, o recurso ao
trabalho clandestino por parte do patronato, o que passa pela maior e melhor
intervenção da Inspecção-Geral do Trabalho.
Propostas
de reforço das garantias dos cidadãos estrangeiros contra expulsões
administrativas e de efectiva garantia de apoio judiciário aos imigrantes e às
actividades das associações de imigrantes. Propostas visando a implementação de
medidas que assegurem, facilitem e apoiem o acesso dos imigrantes aos cuidados
de saúde, independentemente da sua situação. Propostas de apoio à divulgação e
ensino das línguas dos países de origem, entre outras.
Vivemos
um tempo em que todos os trabalhadores estão sob o fogo cerrado de uma ofensiva
global contra os seus mais legítimos interesses, contra os seus direitos
sociais e laborais. Vivemos um tempo em que cresce a exploração, que se
reflecte de forma ainda mais aguda nas comunidades imigrantes, agravando a
situação de extrema exploração em que uma grande parte se encontra.
Calcula-se
que os trabalhadores imigrantes sejam cerca de 10% dos trabalhadores por conta
de outrem e cerca de 4,5% da população portuguesa. Trabalham em número
significativo em sectores como a construção civil, hotelaria, restauração e
comércio e agricultura, sendo na maioria sujeitos a condições de trabalho
precárias ou mesmo fisicamente perigosas, tanto para trabalhadores regulares como
irregulares, com elevados níveis de exploração, com baixos salários, sem
protecção social, com desrespeito pelos direitos e, em alguns casos,
sujeitos/as a situações de abusos
Estima-se
que mais de 35% dos brasileiros e imigrantes de Leste trabalhem até 12 horas
por dia, ou mais. Os salários são baixos para a maioria dos trabalhadores
imigrantes e existem salários em atraso que atingem um número significativo de
emigrantes de Leste, dos PALOP e brasileiros.
Situação
que é agravada por condições desumanas de habitação e pela recusa do direito no
acesso a cuidados de saúde, à segurança social, à cultura e ao desporto e que
atinge particularmente os jovens, as segundas e terceiras gerações de
imigrantes e de forma acentuada as comunidades imigrantes africanas. Jovens
nascidos em Portugal e que frequentam as nossas escolas, mas que crescem e se
formam como homens e mulheres em condições extraordinariamente difíceis.
Crescem e formam-se em bairros de periferia, em habitações sem condições,
estigmatizados, sem condições de apoio social. Estudam em escolas, elas mesmo
estigmatizadas, com programas desadequados da realidade social onde estão
inseridas e nas quais, por falta de apoios, é exigida aos professores e
auxiliares de acção educativa um esforço grandioso.
Realidades
às quais é preciso dar resposta com o reforço de medidas e de investimento que
requalifiquem essas zonas residenciais que deveriam ser parte das nossas
cidades e que acabam por ser territórios marginalizados. Tal como é necessário
garantir uma política de educação baseada numa concepção multicultural da
sociedade portuguesa que valorize as diversas identidades, o respeito pela
diferença e o efectivo diálogo e convivência entre culturas.
Para
nós, para o PCP, os trabalhadores portugueses e imigrantes devem ser iguais em
direitos e a luta pela igualdade para os imigrantes tem de ser um objectivo
central de uma verdadeira política democrática de imigração. Igualdade com os
demais cidadãos nos direitos sociais e laborais e igualdade no direito de participação
política.
Mais
uma vez reafirmamos a nossa profunda convicção de que o país não está amarrado
e condenado a uma só solução e a um só caminho. Há alternativas e outras
soluções para Portugal. Para um Portugal mais justo, mais solidário e mais desenvolvido,
como o vamos demonstrar com a realização, nos próximos dias 24 e 25 de
Novembro, de uma Conferência Nacional sobre Questões Económicas e Sociais.
Num
tempo de forte e grande ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, a luta e
o seu reforço é condição essencial para garantir a defesa dos interesses dos
trabalhadores independentemente da sua nacionalidade.
A
grandiosa manifestação do passado dia 18 de Outubro revela que há força
bastante para resistir à brutal ofensiva neoliberal e que o reforço da luta é o
caminho mais seguro para garantir uma vida melhor para todos os trabalhadores.
Uma
luta que é de todos, dos trabalhadores portugueses e dos trabalhadores
imigrantes, encontrando no trabalho, na cultura e na solidariedade uma forma
moderna para construir um Portugal mais justo, progressista e democrático.
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