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O impacto das migrações em Portugal
Sábado, 03 Novembro 2007
thumb_cartaz-cnqes-pq.jpgNo encerramento do Encontro sobre «O impacto das migrações em Portugal – emigração/imigração», Jerónimo de Sousa afirmou que «a acção política e a iniciativa legislativa do PCP estão associadas às alterações positivas introduzidas nas Lei da Nacionalidade e na Lei da Imigração» e sublinhou que o PCP, como partido dos trabalhadores que se orgulha de ser, «continuará ao lado dos imigrantes e das suas associações na luta por uma integração de pleno direito e pela valorização do seu papel na sociedade portuguesa».


Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP
Encontro sobre «O impacto das migrações em Portugal»

 

Saudações fraternais, em meu nome e em nome da Direcção do nosso Partido, a todos os presentes, particularmente aos nossos convidados, e os sinceros agradecimentos pela vossa presença e pelos preciosos contributos que aqui trouxeram e que permitiram melhorar a nossa compreensão e resposta às questões referentes aos actuais movimentos migratórios e aos seus impactos no nosso país.

A Conferência Nacional do PCP sobres Questões Económicas e Sociais, no âmbito da qual este nosso Encontro se insere, tendo como objectivo realizar uma análise global e integrada dos problemas económicos e sociais do país, não podia deixar de considerar uma realidade muito presente na nossa vida e experiência colectiva nessa dupla condição de sermos um país de emigração e de imigração. Dupla condição que se expressa no tempo longo de manutenção de uma centenária diáspora portuguesa dispersa pelos quatro cantos do mundo e, mais recentemente, nestes últimas décadas, pela presença no nosso país de uma significativa comunidade imigrante de povos de várias origens. Condição que, sendo uma marca da nossa especificidade no quadro da União Europeia, nos coloca a reforçada responsabilidade e exigência de termos uma justa orientação política que não só vá ao encontro das aspirações e necessidades das nossas comunidades emigrantes, mas que também faça a diferença, pela natureza dessa nossa específica condição, em matéria de política de acolhimento e integração dos que procuram no nosso país uma saída digna para as suas vidas, marcada pelo respeito pelos seus direitos cívicos, sociais e culturais, de apoio à sua integração harmoniosa e de valorização do seu contributo para o desenvolvimento do país.

Esta nossa iniciativa vem, assim, ao encontro de uma necessidade que todos sentíamos de actualização e melhoramento das nossas orientações e das nossas propostas que fazem parte de uma política alternativa que propomos ao povo português, em ruptura com a política de direita, algumas das quais estão já referenciadas no documento-base de apoio ao debate que aqui realizámos.

No século que agora findou e nos primeiros anos do presente, as migrações atingiram dimensões nunca antes verificadas. Portugal conheceu e conhece bem os efeitos deste movimento que levou milhões de seres humanos em direcção aos países mais desenvolvidos do sistema capitalista.

A dimensão das migrações contemporâneas, que nos últimos 25 anos fez quase duplicar o número de pessoas a viver fora do seu país, é uma consequência dos processos de globalização capitalista e da sua dinâmica predadora e criadora de crescentes desigualdades a nível mundial entre os países mais ricos e os países mais pobres.

Naturalmente que as guerras e as calamidades naturais pesam muito nas causas do processo migratório e deixam milhões de seres humanos entregues a si próprios e ao abandono, mas a causa principal é a procura de melhores condições de vida. As razões fundas do fenómeno migratório estão, por isso, associadas ao processo de concentração de riqueza que se desenvolve para a colocar nas mãos de uns poucos quer pela via da delapidação dos recursos das nações – muitas vezes com o recurso à guerra e condenando os povos respectivos à miséria, à fome e ao desemprego –, quer pela via da acentuação da exploração desenfreada do trabalho de milhões de pessoas, uma significativa parte das quais é vítima da acção não só de um patronato sem escrúpulos mas também de redes de contrabandistas e traficantes.

Movimentos migratórios que estão longe de diminuir e que o processo de desenvolvimento desigual do capitalismo tenderá a acentuar, com o aumento do fosso que separa os países em termos de desenvolvimento. Processo que as potências capitalistas e os interesses que nelas se agrupam controlam com especiais vantagens e que se evidencia na aparente contradição entre o declarado reconhecimento da importância do trabalho imigrante para o próprio crescimento e desenvolvimento dos seus países e as políticas repressivas e securitárias que ao mesmo tempo promovem, estigmatizando o imigrante e transformando o problema das migrações em casos de polícia.

É no quadro de uma hipócrita política de classe – que se escuda em argumentos de uma suposta política de imigração de «portas escancaradas» –que na Europa se refinam, com a aplicação de novos meios e novos métodos, as políticas de concretização da ideia de uma «Europa fortaleza», por cima dos mais elementares direitos dos imigrantes. Políticas que Portugal acompanha em muitas das suas vertentes. 

Com o recente acordo do tratado dito reformador, mas que é a cópia do recusado «tratado constitucional», dá-se um passo de gigante nessa direcção com a comunitarização das políticas de imigração, agora por decisão apenas da maioria, e que tem no sistema de quotas, na implementação de uma imigração selectiva, nomeadamente com a introdução da «carta azul», nas equipas de intervenção rápida, nos centros de detenção para emigrantes, no Sistema Intensivo de Vigilância Externa, nos instrumentos de recolha de dados biométricos para a criação de bases de dados pessoais com os inerentes riscos de abusos, alguns dos seus componentes.

Não deixa de ser significativo da verdadeira natureza de classe de tais orientações e dos governos ao serviço do capital que as defendem e concretizam, o facto de nenhum dos países europeus que recebem fluxos migratórios ter, até hoje, ratificado a Convenção Internacional sobre Protecção de Todos os Trabalhadores Migrantes e Membros das suas Famílias, elaborada sob aos auspícios da ONU. Instrumento internacional que pretende garantir a defesa dos direitos humanos dos trabalhadores migrantes, nomeadamente o direito inalienável a viver em família e em agrupamento familiar, bem como a promoção de medidas de combate ao tráfego de pessoas e que o nosso Partido tomou a iniciativa de propor à ratificação pela Assembleia da República.

Pelo que aqui foi dito e fundamentado neste nosso Encontro acerca das medidas securitárias e repressivas em curso na União Europeia e do seu carácter crescentemente integrado, ficou muito claro que os objectivos das actuais políticas visam já não apenas a criação de condições de exploração de uma mão-de-obra barata e desprovida de direitos, mas também garantir uma elaborada gestão das diferentes «categorias» de imigrantes em função das necessidades de mão-de-obra dos diferentes países e descartáveis a todo o tempo, numa visão ainda mais desumanizadora da imigração e dos imigrantes.

Da nossa parte não só recusaremos a ideia de uma «Europa fortaleza», como nos distanciamos de uma política comum de imigração que, para além de não responder às diferentes realidades de cada país e pôr em causa a soberania nacional, assenta numa unilateral concepção utilitarista e discriminatória que faz tábua rasa dos direitos dos imigrantes e alimenta a xenofobia e o racismo. Mais que uma política comum, o que é necessário é outra política e outras medidas que, não rejeitando a possibilidade de cooperação entre países, efectivamente protejam os direitos dos imigrantes e combatam as causas profundas da imigração.

Tomámos a decisão de avançar para a realização de uma Conferência Nacional sobre Questões Económicas e Sociais porque não nos conformamos e muito menos aceitamos a trajectória de degradação económica e de agravamento da situação social a que a política de direita de sucessivos governos conduziu o país. Trajectória que tornou inadiável o questionamento das grandes orientações políticas e a acção governativa dos últimos anos, bem como a do actual governo do PS de José Sócrates, que, no essencial, seguiu o mesmo rumo e em muitos domínios ampliou e aprofundou a ofensiva que vinha de trás contra os direitos sociais, laborais e cívicos dos trabalhadores.

O incipiente crescimento económico, o elevado desemprego e trabalho precário, a contínua destruição dos principais sectores produtivos nacionais enquanto se agrava e cresce o défice das contas externas, o carácter dependente e periférico que permanece da nossa economia, o agravamento dos défices estruturais do país e de uma enorme dívida externa, são o resultado de uma política que se mostrou incapaz de resolver os problemas nacionais e que continuou a conduzir o país pelo caminho da divergência económica, que nos vai crescentemente distanciando dos outros povos da Europa e condena o país à dependência crónica.

A gravidade da situação económica e social de Portugal está bem patente, como aqui foi realçado numa das intervenções deste nosso Encontro, na dinâmica actual dos fluxos migratórios no nosso país em resultado da grave situação económica e social que o país enfrenta, nomeadamente em consequência dos elevados níveis de desemprego que transformou Portugal no país com o mais alto índice de crescimento do desemprego na União Europeia e o único onde a taxa de desemprego subiu neste último ano.

Esta negativa evolução é a causa do retorno do cada vez mais preocupante fenómeno emigratório, em crescimento contínuo e agora também em condições de grande precariedade, evidenciando que o flagelo da emigração não é um problema superado. Hoje muitos milhares de portugueses rumam novamente ao estrangeiro à procura de trabalho e de melhores condições de vida e o mesmo passaram a fazer, particularmente nestes três últimos anos, muitos daqueles, e são já muitos milhares, que tentaram encontrar no nosso país uma saída digna para a sua vidas e a dos seus.

E se é verdade que esta não é uma situação nova já que ao longo de séculos milhões de portugueses viram-se obrigados a emigrar em resultado da exploração desenfreada e do subdesenvolvimento que as classes dominantes impuseram ao país, particularmente evidente no período do regime fascista, que levou, nos últimos anos da ditadura, à saída de mais de 1,2 milhões de portugueses e que, perante a dimensão do surto migratório, acabaria por transformar Portugal também num país importador em pequena escala de mão-de-obra super-explorada, com o recrutamento de mão-de-obra das ex-colónias que, mais tarde, viria a engrossar com o processo de descolonização e com a adesão à CEE e ao Acordo de Schengen, em 1991, abrindo uma nova fase do processo imigratório.

É verdade também que as promissoras possibilidades que a Revolução abriu de concretização de política de desenvolvimento realmente voltada para servir os interesses do país e dos trabalhadores, acabaram por ser frustradas por uma política de recuperação capitalista que, ao longo destes últimos anos, assumiu como primeiro e essencial objectivo a restauração do capital monopolista. Política que conduziu ao agravamento da situação social, que se reflecte em mais precárias condições de trabalho para um cada vez maior número de trabalhadores portugueses e tem nas comunidades imigrantes, pela sua condição, mais agravadas consequências, com uma situação laboral e social onde campeiam as mais profundas injustiças, as maiores desigualdades e a mais grave sobre-exploração.

Situação que se agravaria exponencialmente para todos se o governo de José Sócrates fosse capaz de concretizar a ameaça da implementação da flexigurança, com as suas propostas de alteração ao Código de Trabalho para pior, nomeadamente as da liberalização dos despedimentos e dos horários, impondo a «lei da selva» nas relações de trabalho.

Esta negativa evolução, também resultado das políticas de desprotecção das actividades produtivas nacionais, das políticas orçamentais restritivas e monetaristas submetidas ao fundamentalismo do Pacto de Estabilidade e da crescente financeirização da economia e das políticas de privatização, liberalização e crescente desregulamentação dos mercados, precisa de ser contida e invertida para abrir espaço e afirmar uma política alternativa que promova um crescimento económico vigoroso e sustentado e a criação acelerada de emprego, que relance o país na senda do progresso e do desenvolvimento e permita alimentar a esperança de uma vida digna a todos os portugueses, a todos aqueles que dão com o seu trabalho e o seu esforço um contributo para o desenvolvimento do país.

Políticas que se traduzem, nomeadamente com a obsessiva política de redução do défice do governo do PS, num violento ataque às comunidades portuguesas no estrangeiro e aos seus direitos, e que se expressa bem na dita reestruturação consular que deixa emigrantes portugueses mais isolados e mais distantes, num momento em que a nova vaga de emigração aconselharia, pelas características que apresenta – mais precarizada e mais desenraizada –, a fazer exactamente o contrário em defesa de intervenção mais próxima e célere junto das comunidades. É por isso que continuamos a lutar por uma verdadeira reestruturação dos serviços consulares que ponha fim às medidas avulsas de encerramento de consulados de carreira e sua substituição por consulados honorários, naturalmente vocacionados para a defesa de interesses particulares e não de prestação do interesse público.

A mesma política que se reflecte no ensino do português no estrangeiro, cada vez mais longe de corresponder ao estipulado na Constituição da República, que obriga o Estado a desenvolver o ensino da Língua e Cultura portuguesas junto dos filhos dos emigrantes, e que se revela também na desvalorização do Conselho das Comunidades com a redução do número de conselheiros. Conselho que exige ser valorizado através da atribuição de meios técnicos e financeiros adequados ao seu funcionamento, de forma a valorizar e garantir o desempenho das suas funções e no respeito da sua plena autonomia.

Da nossa parte, não abdicaremos de lutar por um conjunto de propostas que vá ao encontro das reais necessidades e interesses das nossas comunidades, entre as quais: a criação de um programa de promoção, expansão e qualificação do ensino da Língua e Cultura portuguesas, desenvolvido em várias vertentes, com um investimento financeiro adequado que permita cumprir o disposto no artigo 22.º da Lei de Bases do Sistema Educativo; a criação de um Fundo de Apoio ao Movimento Associativo português no estrangeiro que permita o financiamento de actividades ou projectos propostos pelas Associações das Comunidades Portuguesas.

É fundamental que na acção governativa se desenvolva uma estratégia que inclua uma política para as comunidades portuguesas coerente com o interesse nacional e com o interesse das respectivas comunidades. O governo do PS, na senda do que tem sido a política de direita dos sucessivos governos, olha para os portugueses da diáspora como um instrumento para o desenvolvimento da sua política e nem sequer tem em conta o seu forte contributo para a economia portuguesa. Em 2006, o valor total dos depósitos dos emigrantes cifrou-se em 7.276 milhões de euros, valor que, sendo inferior ao passado, constitui, apesar de tudo, uma verba vultuosa, qualquer coisa como cerca de 4,7% do PIB. (Fonte: Banco de Portugal).

Povo de emigrantes que tem cerca de cinco milhões dos seus membros espalhados por todos os continentes, nós, os portugueses, estamos bem colocados para compreender e apoiar os que junto de nós procuram um emprego, um salário, uma vida mais digna. No entanto, não foi essa a principal característica das políticas adoptadas em Portugal ao longo de muitos anos.

Apesar das boas palavras dirigidas às comunidades imigrantes, as políticas de imigração foram fortemente restritivas e marcadas por práticas policiais gravosas para os imigrantes, constituíram um bloqueio à imigração legal e acabaram por promover o crescimento da imigração ilegal, com consequências sociais e humanas muito negativas para vida dos imigrantes e em prejuízo do próprio país.

Para nós, para além do respeito e solidariedade que são devidos a quem procura em Portugal as condições de subsistência, quase sempre à custa de enormes sacrifícios, a imigração é não apenas necessária, como é desejável para garantir o equilíbrio demográfico, para a sustentabilidade dos regimes de segurança social e para a promoção do nossa própria actividade económica.

O PCP sempre considerou que o combate eficaz à imigração ilegal passa por viabilizar a imigração legal, acabando com o absurdo sistema de «quotas» constante da «lei de estrangeiros», e por adoptar critérios mais flexíveis de entrada em Portugal para quem pretenda exercer uma actividade profissional. Tal como passa também por fiscalizar e sancionar devidamente o patronato, que se aproveita da imigração ilegal para explorar os trabalhadores estrangeiros, explorando a sua situação de fragilidade, e pelo combate às redes de tráfico de mão-de-obra ilegal e às associações criminosas que dela se alimentam.

Mas é indispensável permitir que os trabalhadores estrangeiros em Portugal tenham a possibilidade de legalizar a sua situação e de poder viver entre nós com os seus familiares sem terem os seus direitos diminuídos e sem estarem reféns daqueles que beneficiam com a imigração ilegal. Desde há muitos anos que o PCP tem vindo a lutar, com as associações de imigrantes, pelo reconhecimento pleno dos direitos dos imigrantes em Portugal. Tem sido uma luta difícil, de resistência contra as arbitrariedades, mas tem sido também uma luta com resultados concretos que devemos salientar e valorizar.

Há cerca de 10 anos atrás, a luta e iniciativa política do PCP ficou associada à lei então aprovada sobre os direitos das associações de imigrantes e à primeira lei aprovada em Portugal contra a discriminação racial. Assim como, nos últimos tempos, a acção política e a iniciativa legislativa do PCP estão associadas às alterações positivas introduzidas nas Lei da Nacionalidade e na Lei da Imigração.

Quando o PCP apresentou o seu projecto de alteração à Lei da Nacionalidade, em 2005, fê-lo por razões de elementar justiça. A Lei da Nacionalidade Portuguesa, que vigorava até ao ano passado, considerava portugueses de origem os filhos de portugueses nascidos em qualquer parte do mundo. Ao invés, não considerava portugueses de origem os filhos de estrangeiros nascidos em Portugal, ainda que tivessem vivido em Portugal por toda a sua vida e não tivessem conhecido sequer qualquer outro país. 

O projecto de lei da Nacionalidade, apresentado pelo PCP, previa o reconhecimento da nacionalidade portuguesa originária a todos os cidadãos nascidos em território português, filhos de estrangeiros aqui residentes a qualquer título, desde que fosse essa a vontade dos progenitores.

O processo que culminou nas últimas alterações à Lei da Nacionalidade, no qual o PCP participou muito empenhadamente, não consagrou inteiramente as nossas propostas, mas não deixou de ser um passo muito importante e de consagrar soluções mais justas e adequadas do que as que vigoravam antes, nomeadamente a consagração da atribuição da nacionalidade portuguesa de origem aos nascidos em território português, filhos de estrangeiros, desde que, no momento do nascimento, um dos progenitores aqui resida legalmente há pelo menos 5 anos. Há aspectos que não têm o nosso acordo, mas foi um avanço que abriu um caminho para que muitos cidadãos possam ver reconhecida a cidadania portuguesa que injustamente lhes tem sido negada.

Quanto à Lei da Imigração, o PCP orgulha-se de ter apresentado, também através do seu Grupo Parlamentar na Assembleia da República, o primeiro projecto de lei desta legislatura destinado a alterá-la profundamente, dando cumprimento a um compromisso assumido no seu Programa Eleitoral. O projecto de lei do PCP propôs uma revisão global da «lei de imigração», tendo como aspectos fundamentais:

- A conversão da autorização de residência em regra para a admissão e para a regularização da permanência em Portugal por razões de trabalho, estudo, de formação ou de investigação científica;

- A eliminação das «autorizações de permanência», garantindo aos cidadãos abrangidos o direito à obtenção de autorização de residência;

- O abandono das fracassadas políticas de quotas para imigrantes.

O PCP não votou favoravelmente a nova lei, mas não deixa por isso de salientar que esta lei, para a qual o PCP muito contribuiu, representa um progresso em relação à situação que até então tínhamos. É certo que na legislação aprovada permanecem aspectos negativos que são estruturantes da legislação vigente, que não foram alterados e com os quais o PCP não se identifica e que não se coadunam com as suas propostas para uma política de imigração mais humana e mais justa. São disso exemplos, a manutenção de um sistema de quotas no acesso dos imigrantes ao emprego, ainda que com um carácter simbólico, o carácter não suspensivo da maior parte dos recursos de decisões desfavoráveis aos cidadãos ou os poderes discricionários que são conferidos ao SEF, entre outros aspectos. 

O PCP continua a não se identificar com princípios basilares da legislação vigente e que se vão manter na nova lei e por isso não lhe deu o seu voto favorável, porque esta lei não resolve todos os problemas que seria importante resolver e não conseguirá acabar com o flagelo da imigração clandestina e do trabalho ilegal. Contudo, Portugal terá, pela primeira vez, desde há muitos anos, uma lei que representa um progresso para os direitos dos imigrantes e das suas famílias, que vai possibilitar em definitivo a legalização de muitos milhares de cidadãos que permanecem entre nós em situação ilegal, e esperemos que a regulamentação da Lei, agora em curso, não subverta e dificulte com novos retrocessos os passos positivos que foram dados.

Esta questão é hoje, como aqui foi salientado, motivo de forte preocupação que exige uma atenta atenção e pronta denúncia contra qualquer tentativa de inviabilizar, não apenas pela prática, mas pelo próprio processo legislativo regulamentar, a perspectiva que se abriu de legalização da imigração ilegal e da possibilidade de pôr termo às consequências sociais e humanas negativas que dela decorrem.

Como partido dos trabalhadores que se orgulha de ser, o PCP continuará ao lado dos imigrantes e das suas associações na luta por uma integração de pleno direito e pela valorização do seu papel na sociedade portuguesa.

O impacto da imigração legal na Economia e nas Finanças Públicas em Portugal é hoje significativo. Segundo dados de 2004 do Conselho Económico e Social, os imigrantes são responsáveis por cerca de 5% do PIB nacional e o seu contributo para as contas públicas, através de impostos e taxas, é normalmente maior do que os custos que lhes estão associados, fazendo-os, por isso, contribuintes líquidos para a nossa sociedade.

O documento do nosso Encontro avança com um significativo conjunto de propostas que dão resposta a uma justa e coerente política de imigração no respeito pelos direitos dos imigrantes e dos interesses do país. Propostas que vão no sentido de superar as insuficiências da Lei da Imigração e da Lei da Nacionalidade, mas também propostas e medidas que permitam atacar, de forma decidida, o recurso ao trabalho clandestino por parte do patronato, o que passa pela maior e melhor intervenção da Inspecção-Geral do Trabalho.

Propostas de reforço das garantias dos cidadãos estrangeiros contra expulsões administrativas e de efectiva garantia de apoio judiciário aos imigrantes e às actividades das associações de imigrantes. Propostas visando a implementação de medidas que assegurem, facilitem e apoiem o acesso dos imigrantes aos cuidados de saúde, independentemente da sua situação. Propostas de apoio à divulgação e ensino das línguas dos países de origem, entre outras.

Vivemos um tempo em que todos os trabalhadores estão sob o fogo cerrado de uma ofensiva global contra os seus mais legítimos interesses, contra os seus direitos sociais e laborais. Vivemos um tempo em que cresce a exploração, que se reflecte de forma ainda mais aguda nas comunidades imigrantes, agravando a situação de extrema exploração em que uma grande parte se encontra.

Calcula-se que os trabalhadores imigrantes sejam cerca de 10% dos trabalhadores por conta de outrem e cerca de 4,5% da população portuguesa. Trabalham em número significativo em sectores como a construção civil, hotelaria, restauração e comércio e agricultura, sendo na maioria sujeitos a condições de trabalho precárias ou mesmo fisicamente perigosas, tanto para trabalhadores regulares como irregulares, com elevados níveis de exploração, com baixos salários, sem protecção social, com desrespeito pelos direitos e, em alguns casos, sujeitos/as a situações de abusos

Estima-se que mais de 35% dos brasileiros e imigrantes de Leste trabalhem até 12 horas por dia, ou mais. Os salários são baixos para a maioria dos trabalhadores imigrantes e existem salários em atraso que atingem um número significativo de emigrantes de Leste, dos PALOP e brasileiros.

Situação que é agravada por condições desumanas de habitação e pela recusa do direito no acesso a cuidados de saúde, à segurança social, à cultura e ao desporto e que atinge particularmente os jovens, as segundas e terceiras gerações de imigrantes e de forma acentuada as comunidades imigrantes africanas. Jovens nascidos em Portugal e que frequentam as nossas escolas, mas que crescem e se formam como homens e mulheres em condições extraordinariamente difíceis. Crescem e formam-se em bairros de periferia, em habitações sem condições, estigmatizados, sem condições de apoio social. Estudam em escolas, elas mesmo estigmatizadas, com programas desadequados da realidade social onde estão inseridas e nas quais, por falta de apoios, é exigida aos professores e auxiliares de acção educativa um esforço grandioso.

Realidades às quais é preciso dar resposta com o reforço de medidas e de investimento que requalifiquem essas zonas residenciais que deveriam ser parte das nossas cidades e que acabam por ser territórios marginalizados. Tal como é necessário garantir uma política de educação baseada numa concepção multicultural da sociedade portuguesa que valorize as diversas identidades, o respeito pela diferença e o efectivo diálogo e convivência entre culturas.

Para nós, para o PCP, os trabalhadores portugueses e imigrantes devem ser iguais em direitos e a luta pela igualdade para os imigrantes tem de ser um objectivo central de uma verdadeira política democrática de imigração. Igualdade com os demais cidadãos nos direitos sociais e laborais e igualdade no direito de participação política.

Mais uma vez reafirmamos a nossa profunda convicção de que o país não está amarrado e condenado a uma só solução e a um só caminho. Há alternativas e outras soluções para Portugal. Para um Portugal mais justo, mais solidário e mais desenvolvido, como o vamos demonstrar com a realização, nos próximos dias 24 e 25 de Novembro, de uma Conferência Nacional sobre Questões Económicas e Sociais.

Num tempo de forte e grande ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, a luta e o seu reforço é condição essencial para garantir a defesa dos interesses dos trabalhadores independentemente da sua nacionalidade. 

A grandiosa manifestação do passado dia 18 de Outubro revela que há força bastante para resistir à brutal ofensiva neoliberal e que o reforço da luta é o caminho mais seguro para garantir uma vida melhor para todos os trabalhadores.

Uma luta que é de todos, dos trabalhadores portugueses e dos trabalhadores imigrantes, encontrando no trabalho, na cultura e na solidariedade uma forma moderna para construir um Portugal mais justo, progressista e democrático.