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Desenvolvimento e Desenvolvimento Local - Carlos Pinto de Sá, Comissão Concelhia de Montemor-o-Novo
Domingo, 25 Novembro 2007

 

pinto-sa

 

Camaradas,
Numa época em que o imperialismo e as elites capitalistas nacionais - acompanhadas pela sua corte de bajuladores e pelos autodenominados de “esquerda moderna” e outros conformados e há muito rendidos -, desenvolvem uma poderosíssima campanha ideológica para impor o pensamento de direita, único e supostamente sem alternativa, saúdo a coragem e o discernimento do PCP ao convocar esta Conferência sobre Questões Económicas e Sociais e justamente clamando que é possível e necessária “Uma Nova Política – Outro Rumo ao Serviço do Povo e do País”.
Para além da barragem de discursos e cassetes repetidas à exaustão pela direita e pelos seus governantes de serviço sobre a bondade do capitalismo e das suas políticas, aí está,
    por esse mundo fora, o aumento da miséria extrema, da fome, das doenças e das desigualdades sociais e entre países;


    em Portugal, o crescente e rápido enriquecimento de um pequeno núcleo de famílias possidentes predadoras da nossa economia (apenas 10% dos portugueses abocanham 60% do rendimento nacional) que contrasta com o empobrecimento relativo e absoluto, a perda de direitos económicos e sociais dos trabalhadores, dos reformados e pensionistas, dos pequenos e médios empresários, da maioria do povo.
Neste contexto, será correcto nós, comunistas, mesmo onde somos poder local democrático, falarmos em “desenvolvimento local”? Neste contexto, terá sentido falar-se em “desenvolvimento local”? Aqui fica um modesto e sintético contributo sobre este tema.

Desenvolvimento e Crescimento
Para responder àquelas questões teremos que, brevemente e sem preocupações de excessivo rigor, abordar os conceitos de desenvolvimento e crescimento. No caso, abordar significa essencialmente recordar conclusões já estabelecidas. Com efeito, o conceito de crescimento tem sido e continua a ser um conceito económico quantitativo medido pelo chamado Produto Interno Bruto, PIB. É esta a medida económica que baseia a generalidade dos comentários sobre se existe ou não uma crise, uma estagnação ou uma expansão económica. Ora, sendo certo que o PIB nos dá uma ideia geral do comportamento de uma economia, não é menos certo que essa ideia é insuficiente, redutora e, por vezes, até distorcida. Um só exemplo: o crescimento da acidentalidade rodoviária pode fazer crescer o PIB. Ora, ninguém poderá afirmar com seriedade que isto é bom para um Povo ou para um País!


Não basta, pois, crescer economicamente. É necessário avaliar que crescimento é esse e que impacto tem no território e na população.
Será bom lembrar que um dos argumentos mais ouvidos à direita e aos seus serventuários é que “é preciso crescer e criar riqueza para se poder distribuir”. Ora o que os números mostram – como o documento da Conferência prova! – é que, ao longo dos anos, a economia cresce mas a distribuição da riqueza criada é cada vez mais injusta!
O crescimento económico medido pelo PIB não é sinónimo de melhores condições, qualidade de vida ou justiça social. Em rigor, até se pode dar a situação inversa: crescimento e deterioração das condições de vida. Dito de outra forma, crescimento não significa desenvolvimento. E isto tanto é válido para um país, uma região ou um determinado local como um concelho.


O conceito de desenvolvimento tem, pois, que ser muito mais abrangente que o de crescimento. O conceito de desenvolvimento tem que reunir um vasto conjunto de indicadores que, face à nossa actualidade, deverão ser de cariz económico (o produto claro mas também outros como o trabalho e o emprego, a distribuição do rendimento pelos vários grupos sociais, a base económica e a sua diversidade, o uso da capacidade e potencialidade endógena, etc.) mas também de cariz social (o grau de satisfação das necessidades básicas, da saúde, da educação, da justiça, o grau de acessibilidade aos bens e serviços sociais, etc.), de cariz cultural (por exemplo, o grau de democratização da educação e cultura e a sua abrangência), de cariz político (por exemplo, o grau de efectiva participação nos processos de tomada de decisão) e, cada vez mais, de cariz ambiental (por exemplo, o grau de preservação ambiental).
Os conceitos de crescimento e de desenvolvimento aqui abordados podem ser aferidos a vários níveis territoriais, nomeadamente, a um conjunto de países, a um país ou a um concelho. E é necessário que o sejam usando as ferramentas tecnológicas e estatísticas hoje disponíveis.

Desenvolvimento e Instrumentos de Política
Os indicadores e dados estatísticos necessários que corporizam o crescimento e o desenvolvimento de um dado território podem e devem ser apurados. Mas os dados e os indicadores não são neutros. Reflectem uma concepção, uma ideologia. Por exemplo, hoje já dispomos de um índice do poder de compra por concelho. Do ponto de vista da informação, é melhor ter aquele que nada. Mas, nós, comunistas, não nos podemos rever ou mesmo usar sem criticar aquele índice. O que nós, comunistas, queremos saber é a estrutura social daquele índice, isto é, qual é o poder de compra em cada grupo social (trabalhadores por conta de outrem se possível distinguindo entre contratados sem termo e a prazo, pequenos empresários, trabalhadores por conta própria, reformados por origem profissional, patrões e grandes accionistas de sociedades anónimas, etc.). É que se não filtrarmos os dados e indicadores estatísticos pela estrutura social corremos o risco de aceitar que numa casa com 2 pessoas e 2 frangos temos a média estatística de 1 frango para cada … sendo que 1 deles comeu os 2 e o outro nem os cheirou!


Queremos, pois, saber se o encerramento dos postos médicos em S. Brissos, Baldios e S. Geraldo (Montemor-o-Novo) trouxeram mais ou menos desenvolvimento. O que é que vocês acham? Bem os responsáveis do Centro de Saúde e da ARS olham as estatísticas e provavelmente conseguem ver um “desenvolvimento” digno de TV e de ministro. Por um passe de mágica, a procura de cuidados de saúde diminuiu naquelas localidades pelo que, salvé!, a saúde daquelas populações melhorou. É claro que a estatística não diz que aqueles cidadãos deixaram de ir às consultas pela simples razão de não terem transportes nem dinheiro para se deslocarem dezenas de quilómetros a outros postos médicos!
Podemos, pois, falar e até tentar apurar, mas à luz dos nossos ideais, um nível de desenvolvimento local num dado território como um concelho ou uma região.


Há, contudo, uma importante distinção a fazer: o nível de desenvolvimento local não depende, determinantemente, dos órgãos de poder local correspondentes porque a matriz do crescimento e do desenvolvimento é determinada a nível macro-económico pelo uso dos instrumentos de política decorrentes das opções político-económicas e pelo modelo económico-institucional em que assenta. Os órgãos do poder local podem influenciar mas não determinam, por exemplo, a rede do ensino escolar, a rede ou o tipo de serviços públicos de saúde. E a sua capacidade de intervenção é ainda menor por exemplo no nível e na estrutura social da fiscalidade ou na distribuição do rendimento entre grupos sociais.


Não se conclua, contudo, que os órgãos do poder local não desempenham qualquer papel relevante no desenvolvimento local. Aqueles órgãos não são neutros, têm opções de classe, aplicam políticas com influência num importante conjunto de áreas do desenvolvimento local. O Poder Local pode servir grandes interesses económicos ou de grupo ou pode servir o povo e o seu concelho, por exemplo, nas políticas de ordenamento do território e urbanismo, na disponibilidade e acesso a serviços públicos fundamentais como a água, o tratamento de esgotos ou o lixo, na democratização da cultura ou na participação ou exclusão políticas.
O Poder Local pode e deve definir estratégias de desenvolvimento local. Mas o desenvolvimento local não é determinantemente endógeno (excepto em casos muito localizados e pontuais), isto é, não depende determinantemente das potencialidades, recursos locais e da vontade do Poder Local e das populações locais.
O desenvolvimento de cada Região e o desenvolvimento local de um concelho não são autónomos; não são indissociáveis das políticas nacionais globais e espaciais. Pelo contrário, são determinadas por aquelas.


Em suma, uma nova política ao serviço do povo e do país exige uma ruptura com o actual modelo neoliberal de desequilíbrio regional, de abandono do interior e de litoralização que vem sendo seguido há mais de 3 décadas. Uma nova política ao serviço do povo e do país exige a definição de uma política nacional de desenvolvimento regional, de um Plano Nacional de Desenvolvimento Regional que enquadre o desenvolvimento sustentado e equilibrado das várias Regiões, que defina novas opções estratégicas consonantes com os interesses colectivos dos cidadãos, que aponte objectivos, programas, metas para travar o despovoamento do interior, para diversificar e criar uma nova base económica produtiva que gere emprego, riqueza e a sua distribuição mais justa.

Desenvolvimento, Descentralização e Regionalização
As épocas e os processos de desenvolvimento que constatamos na História contemporânea, noutros países como em Portugal, mostram que ao desenvolvimento está associada a descentralização de poder político. O Portugal de Abril com a institucionalização do Poder Local Democrático (Municípios e Regiões Autónomas) é disso um demonstrativo exemplo.


A razão fundamental dessa feliz associação decorre, em nossa opinião, de que uma verdadeira descentralização do poder político implica um aumento da participação popular nos processos de tomada de decisão. Isto é, um poder mais próximo, mais participado, mais escrutinado é mais permeável aos interesses colectivos e menos aos interesses individuais e egoístas.
Talvez, por isso, o neoliberalismo impõe a retomada de processos de concentração e recentralização. Na política, a recentralização está patente em Portugal onde o Governo neoliberal do PS/Sócrates desencadeou o mais violento ataque desde a Revolução de Abril contra a autonomia do Poder Local bem como um novo processo de recentralização de competências e poder como se comprova em sectores públicos estratégicos como o abastecimento de água, o tratamento de efluentes, os lixos, a taxação e tarifário locais. Na União Europeia, essa recentralização está plasmada na frustada Constituição Europeia agora travestida, para fugir ao veredicto dos povos, em novo Tratado de Lisboa.
Neste contexto, uma nova política ao serviço do povo e do país exige que se continue a defender este Poder Local, autónomo, descentralizado e democrático e que se continue a luta pela Regionalização, para democratizar e sujeitar ao voto popular os responsáveis regionais, para descentralizar competências e meios, processo que poderá estimular o desenvolvimento do país e, em particular, o desenvolvimento regional e local.

Desenvolvimento Local, Políticas Locais e Intervenção Popular
O desenvolvimento ou subdesenvolvimento local tem determinantes causas nacionais ou supranacionais (União Europeia, por exemplo) decorrentes das políticas centrais aplicadas. E essas medidas têm um impacto local. São exemplos claros os encerramentos e privatizações de serviços públicos como postos médicos, serviços de atendimento permanente, urgências, escolas, postos da GNR, postos e estações de correio, transportes públicos, etc.


Ora o Poder Local pode optar entre a conivência e o servilismo ao poder central e ao neoliberalismo aceitando, mais ou menos passivamente, os ataques aos serviços públicos e às condições e qualidade de vida da maioria dos cidadãos ou opor-se àquelas políticas e intenções e defender o desenvolvimento local nas suas várias facetas. Neste quadro, uma nova política ao serviço do povo e do país deve exigir que as Regiões e os Municípios elaborem e explicitem Planos Estratégicos de Desenvolvimento Local onde plasmem as suas opções e programas e o seu impacto na vida das populações locais.


Uma nova política ao serviço do povo e do país exige também que nós, comunistas, olhemos as novas realidades económicas e sociais, consideremos as forças em presença os potenciais aliados e os adversários, com grande abertura de espírito fundada nos nossos ideais analisemos área a área, sector a sector para apresentar propostas e alternativas novas e apontadas ao futuro.


E de tudo isto resulta que os processos de desenvolvimento, sejam globais, regionais ou locais, dependem muito da capacidade e do grau de intervenção popular. Mais uma vez, é a capacidade dos comunistas, dos cidadãos, dos trabalhadores, das populações, dos povos de ir à luta, é a capacidade de mostrar e construir alternativas que determinará a regressão, a estagnação ou o avanço do desenvolvimento.


Neste contexto, para um outro rumo e uma nova política ao serviço do povo e do país, assume particular importância a participação, o trabalho, o empenho dos comunistas e de outros cidadãos progressistas nos diversos tipos de instituições locais. Das colectividades de recreio e lazer, às associações de classe; dos grupos desportivos e culturais às associações de pais e estudantes; das organizações ambientais às associações humanitárias e de solidariedade social; das comissões de moradores e de utentes até aos órgãos institucionais do poder local é aí que começa o trabalho de base e a luta dos comunistas e de outros cidadãos e cidadãs progressistas pelo desenvolvimento local, pelo desenvolvimento, enfim por uma sociedade mais solidária e mais justa, pelo socialismo.

Viva o Partido Comunista Português!