Intervenção de Miguel Tiago na Assembleia de República

«Isto não era um submarino, era um porta aviões a zarpar do país carregado de dinheiro»

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Sr. Presidente,
Srs. Deputados,

Uma primeira questão que se coloca é a de, se o PSD e o CDS não tivessem sido desmascarados, até quando é que iam continuar a esconder os milhares de milhões de euros que saíram do País sem identificação e sem escrutínio por parte da Autoridade Tributária.

Uma segunda questão que se coloca é que Paulo Núncio assumiu que não tinha divulgado as estatísticas porque tinha dúvidas.

Longas dúvidas, quatro anos de dúvidas, sem nunca ter feito nada para as esclarecer, porque não tomou uma única medida para esclarecer as dúvidas que tinha. Tanto quanto nos disse, nem sequer mesmo junto dos seus ministros das finanças!

Portanto, essa dúvida favoreceu e visou, objetivamente, permitir que um volume muito largo de capitais saísse de Portugal através de transferências para offshore sem qualquer escrutínio por parte da inspeção tributária.

Mas isto, Srs. Deputados do CDS, isto não era um submarino.

Isto era um porta-aviões que estava a zarpar para fora do País carregadinho de dinheiro.

Srs. Deputados, as outras questões que se colocam são políticas e estão relacionadas com as opções políticas que definem o Governo PSD/CDS e a sua natureza e compromissos de classe.

A forma como estavam comprometidos com os grandes grupos económicos para esbulhar os direitos dos trabalhadores, para lhes esbulhar a riqueza, para carregar com impostos, para roubar salários e subsídios, para retirar dias de férias e feriados, era a mesma forma como mostravam total benevolência para com os grandes grupos económicos, ao mesmo tempo que enviavam para fora do País a riqueza que aqui produziam, e muita dela nem sequer sabemos como foi obtida.

Essa é uma marca dos quatro anos de Governo PSD/CDS e dos compromissos que assumiu, um Governo que para os fortes era muito fraco e só se gabava de ser forte perante os fracos.

Mas, Srs. Deputados, enquanto continuarmos a discutir offshore sempre baseados nos elementos da moda — ou são as atualizações que vieram a ser possíveis por via da estatística, ou são os Panama Papers, ou são os Swiss Leaks —, enquanto continuarmos a cingir este debate a esta onda mediática, vamos continuar a fingir que estamos a resolver quando tudo fica na mesma.

Srs. Deputados, a questão fundamental é aceitar e compreender que os offshore são uma parte do funcionamento do sistema capitalista que os senhores defendem e que é necessário tomar medidas concretas. Essas medidas concretas já foram trazidas aqui, pelo PCP, vezes sem conta, e não só com as perguntas ao anterior Governo.

Aliás, agora, o Sr. Deputado Duarte Pacheco diz que lamenta não se ter realizado a estatística, mas, Sr. Deputado, não foi por falta de lembrança, porque o PCP confrontou o seu Governo, vezes sem conta, por escrito, oralmente, na Comissão de Orçamento e Finanças, digamos que com uma insistência grande, e não consta que o Sr. Deputado, nessa altura, tenha tomado qualquer iniciativa para que a estatística tenha sido revelada ou para que tenha sido conhecido publicamente o valor dos fluxos financeiros com origem em Portugal e com destino a offshore, principalmente numa altura em que o BES estava a colapsar e era preciso saber se não estava a fugir dinheiro do País, dos grandes grupos económicos que dominavam, orbitavam ou contraiam crédito no Banco Espírito Santo.

Portanto, o PCP relembra, uma vez mais, que é necessário tomar medidas que ataquem também o problema de fundo, que é combater as transferência para offshore, combater as transferências para paraísos fiscais, taxá-las quando são paraísos fiscais cooperantes e proibi-las quando sabemos que estão a ir para trás de um biombo atrás do qual ninguém pode saber de nada, e fingimos que temos uma regulação ao mesmo tempo que estimulamos, e às vezes até escondemos, como fez o anterior Governo, a colocação desse dinheiro por detrás desse biombo, que, como vemos, é bastante opaco e agora saber para onde foi será muito mais difícil do que teria sido taxá-lo em Portugal.

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