Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-geral do PCP

Cerimónia fúnebre de José Saramago

Permitam-me que vos transmita, em particular a Pilar del Rio e a toda a sua família, o sentimento de perda partilhado por muitos milhares de camaradas do meu Partido no momento da morte do camarada José Saramago.

Deixou-nos de luto, a nós e ao povo português, em particular ao povo trabalhador de onde veio, a quem amou e foi fiel.

Morreu o escritor. A sua vasta e singular obra literária deu à língua portuguesa e a todos os povos que a falam um prémio Nobel, com tudo o que ele significou de reconhecimento internacional, de admiração entre os trabalhadores da cultura um pouco por todo o mundo, transformando-se num embaixador da cultura e da nossa língua.

A sua obra e os seus principais dispositivos narrativos – um tipo de frase dita a vários, a expressão inovadora de um ritmo oral na escrita, um narrador que não se limitou a narrar mas a participar activamente, a restituir a história àqueles que são ignorados muitas vezes pela historiografia oficial, o seu questionamento, o seu espanto e indignação face as multifacetadas opressões no tempo que vivemos - são marcas impressivas do seu compromisso ético e político que, até ao fim da vida, o uniu aos explorados e oprimidos.

Usando e desenvolvendo a sua obra para fazer humanos todos os sentidos do homem, pela sua vida perpassa o ideal de um protagonista de Abril, que encontrou no seu Partido, no Partido Comunista Português, que quis que fosse o seu até ao fim da sua vida, um ideal mais avançado.

Podia ter sido só um escritor maior da literatura portuguesa. Foi mais do que isso. Foi um homem que acreditou nos homens, mesmo quando os questionava, que deu expressão concreta à afirmação de Bento de Jesus Caraça da aquisição da cultura como um factor de conquista da liberdade.

José Saramago sabia que a sua obra e a sua luta seriam sempre algo inacabado. Mas que tinha valido a pena. Valeu sim! É por isso que, para além do sentimento da perda, lhe fazemos uma homenagem sincera que não se quedará neste dia e neste ano da sua morte, fazendo-o como melhor sabemos fazer: prosseguindo o seu ideal.

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