Intervenção

Intervenção do Deputado<br />Debate de urgência sobre a febre aftosa

Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhores Membros do Governo,O surto de febre aftosa declarado, a 20 de Fevereiro, no Reino Unido e entretanto já alargado à França e à Holanda mas declarado também já em países geograficamente tão dispersos como a Argentina, a Arábia Saudita ou os Emiratos Árabes Unidos merecerá seguramente a atenção desta Assembleia.Mas mereceria tanto mais quanto o CDS/PP que propôs o debate trouxesse algum dado novo, alguma proposta inovadora e não populista para combater a doença, mesmo alguma reflexão que pudesse abrir novas pistas nesta matéria. Assim não acontecendo mais parece, como tem, aliás, sucedido recentemente noutros debates sobre política agrícola, uma oportunidade que o CDS/PP quer oferecer ao Governo para o ajudar nas dificuldades, nas teias e nas contradições em que cada vez mais se enredam as políticas agrícolas europeias e nacionais. Não há, seguramente -nem serão desejáveis - explicações simplistas para o reaparecimento em força no território da União Europeia de uma doença, altamente contagiosa no plano animal, e que tinha sido dada como erradicada no final dos anos 80.Se na BSE poderemos centrar o núcleo principal da explicação da doença na opção por uma agricultura ultra-produtivista que transformou herbívoros em carnívoros na busca permanente de maiores produtividades modificando o perfil genético do efectivo pecuário, na febre aftosa o desenvolvimento da actual epizootia é potenciada pela extrema desregulamentação do funcionamento dos mercados que favorece a circulação de carnes contaminadas sem o necessário acompanhamento e controle sanitário. Esta é a causa mais provável da epidemia que hoje se vive na União Europeia.Podem e devem ser tomadas todas as medidas que permitam rapidamente fazer recuar o vírus e, de novo, tornar indemnes os territórios onde hoje a doença existe.Podem e devem ser tomadas, pelo Governo português, todas as medidas sérias -designadamente de restrições à circulação e importação de gado biungulado e de extrema vigilância do seu estado sanitário - que impeçam a sua propagação no nosso País bem como de reforço das capacidades do Laboratório Nacional de Investigação Veterinária com os meios que lhe permita detectar, em condições de segurança, o vírus da febre aftosa. Mas se no plano da União Europeia, da Organização Mundial do Comércio e da filosofia que domina as respectivas opções económicas não forem questionados os fundamentos dos actuais modelos de globalização e de desregulamentação dos mercados a produção agro-pecuária bem como os consumidores vão estar, cada vez mais, perante a eminência de novas doenças e novas epidemias.É, por isso, preciso ter a coragem de pôr em causa a agricultura ultra-produtivista, de incremento das competitividades a qualquer preço e o processo de desregulamentação dos mercados para que se tem caminhado, modelos acarinhados, aliás, pelos Estados-membros da União Europeia, a maioria deles com governos socialistas. Tal como é necessário integrar os princípios da precaução, do equilíbrio e da qualidade na produção agrícola no quadro de uma nova PAC que respeitando e valorizando a diversidade e a especificidade das agriculturas europeias, apoie particularmente a agricultura familiar e o seu papel na ocupação do território e na criação de emprego e assegure o direito de produzir aos Países que sendo hoje claramente deficitários em matéria de abastecimento alimentar, como Portugal, poucas responsabilidades têm, aliás, nas consequências para a saúde animal e humana do actual modelo de agricultura ultra-intensiva.Sem isso todas as medidas que se tomem - designadamente preventivas (como os pedilúvios que foram abandonados na maioria das explorações agrícolas) - são obviamente bem vindas e necessárias mas claramente insuficiente e parciais.Este é o debate que importa fazer. Esta é a política que deve ser reequacionada.

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