Intervenção

Intervenção do Deputado<br />Alteração do Regime do Rendimento Mínimo

Senhor Presidente, Senhores Deputados, Há ocasiões e temas em que a direita se apresenta com todo o seu "esplendor". É o caso, com as tomadas de posição sobre o Rendimento Mínimo Garantido e, mais especificamente, com este projecto de lei do CDS/PP. O CDS/PP (tal como o PSD) têm navegado entre a recusa deste novo direito social, a sua caritativa aceitação e, mais recentemente, extrapolando ilegitimamente, um relatório de auditoria do Tribunal de Contas referente a pouco mais do que ao seu primeiro ano de funcionamento, apresentando propostas de alteração que a serem aprovadas diminuiriam em grande parte o alcance desta medida e, sobretudo, representam nos termos em que estão formuladas uma atitude preconceituosa e insultuosa em relação aos beneficiários do RMG. Todas as críticas recentes vindas da direita são, aliás, acompanhadas de um discurso de desconfiança em relação aos destinatários do RMG que, em muitos casos, roça as fronteiras da intolerância e da xenofobia. O Dr. Durão Barroso e o PSD começaram por atacar e votar contra o RMG. Depois, quando verificaram que se tinham enganado e que as suas críticas não colhiam, vieram afirmar que, afinal, o RMG era uma boa ideia para agora, a reboque do radicalismo verbal do CDS/PP, dizerem que o RMG estimula a "preguiça" quando existe em, Portugal "tanta gente que não quer fazer nada" enquanto o Dr. Paulo Portas, no preâmbulo do projecto de lei do CDS/PP, vai ao ponto de afirmar que o RMG sustenta, em alguns casos, a dependência do álcool, da droga ou da ociosidade. Neste contexto, o CDS/PP avança com propostas de alteração ao RMG que merecem liminarmente a recusa do PCP: · A indexação do RMG à taxa de desemprego, esquecendo que se é verdade que o desemprego de longa duração é uma das causas de ausência de rendimentos que sustentam as candidaturas ao RMG também o são os reformados, pensionistas e idosos com pensões de miséria bem como comunidades étnicas que estão completamente fora do dos sistemas de protecção social e contra quem, aliás, este projecto mais se parece dirigir; · A substituição, até 50%, da prestação pecuniária do RMG por "vales sociais" o que significaria uma espécie de regresso aos tempos da "sopa dos pobres" ou às senhas das misericórdias. É uma proposta que estigmatizaria ainda mais a condição de pobre e excluído. É uma proposta de odores estranhos. · A proibição, pelo período de 12 meses, dos beneficiários do RMG que não cumpram as obrigações "constantes do programa de inserção", apresentarem nova candidatura, é também ela uma medida repressiva mas sobretudo discriminatória para os mais pobres porque não consta que o CDS/PP tenha configurado alguma medida deste tipo para as violações de outras prestações sociais e, sobretudo, para aqueles, designadamente as empresas que não cumprem as suas obrigações para com a Segurança Social, retendo as contribuições que são devidas, ou que são responsáveis por situações de fuga e fraude fiscal. Porque é que o CDS/PP não propõe, por exemplo, que aqueles que usufruem de benefícios fiscais e que não cumprem os respectivos pressupostos deixem de poder beneficiar desse tipo de apoios do Estado? Este projecto de lei do CDS/PP é paradigmático porque de uma penada deita por terra toda a demagogia populista de solidariedade com os mais pobres e desfavorecidos e faz vir ao de cima as verdadeiras opções de classe da direita mais conservadora: intolerante, desconfiada e repressiva contra quem mais precisa, sem soluções para os dramas sociais criados pelo próprio modelo de sociedade que defende, que não seja o paternalismo intolerante e "superior" em relação aos cidadãos mais carenciados e às comunidades excluídas do sistema. A alternativa que o CDS/PP coloca agora, em desespero de argumentação, entre RMG e pensões de reforma é uma falsa alternativa. Sendo uma evidência que é necessário aumentar - e muito - as pensões de reforma, como o PCP sempre tem defendido e o Governo tem recusado escudado numa política orçamental que tem sido apoiada pelo CDS/PP a verdade é que o problema não decorre da existência do RMG. Ainda antes de haver RMG já as pensões de reforma eram inaceitavelmente baixas. O que o CDS/PP não quer são políticas que criem mecanismos que visem reforçar as políticas de inclusão social. Pelo contrário, as suas propostas acentuam os fenómenos de reprodução da pobreza, atacando aqueles mecanismos e criando novos exércitos de reserva de pessoas carenciadas e excluídas, sem capacidades de exercício dos seus direitos de cidadania e do seu direito ao trabalho e, depois, usando-os como armas de arremesso no seu discurso conservador proto-ideológico junto de outros sectores da população, permissivo a um certo tipo de discurso populista, num registo perigoso para os próprios fundamentos do regime democrático e que não pode deixar de ser severamente denunciado e criticado. Entretanto, o CDS/PP passa ao lado dos verdadeiros problemas que o RMG enfrenta e que se centram nas políticas de inserção social e na obrigação do Estado se empenhar mais nesta matéria. Porque é seguramente neste terreno que se colocam as questões mais sensíveis. O PCP - que teve a responsabilidade de introduzir no debate político e nos processos legislativos no nosso País o tema do RMG - sempre defendeu esta nova prestação social como um direito sustentado em duas vertentes. Por um lado, contribuir para que os mais excluídos entre os excluídos pudessem ter acesso a um mínimo pecuniário que lhes permitisse recomeçar uma caminhada de recuperação dos seus direitos de cidadania e, por outro lado e simultaneamente - porventura o mais importante - que esta nova prestação funcionasse como uma alavanca de apoio à sua reinserção na vida social e no exercício do direito ao trabalho, para não se consolidar como uma subsidiação da pobreza o que implica a forte intervenção do Estado. Ora, se a primeira componente do RMG tem vindo a ser relativamente garantida, a segunda está longe de corresponder às expectativas e às necessidades. Mas não tanto por razões ligadas directamente a este novo direito social mas por razões que lhe são exógenas e que decorrem da política económica do Governo e dos modelos sociais dominantes, que a direita tem, aliás, sustentado.. Esta é que é a questão que o CDS/PP passa ao largo e sobre a qual o PCP incide as suas preocupações e críticas. Quanto à estrutura do RMG a nossa principal preocupação vai para a necessidade de reforçar, ao nível dos Centros Regionais de Segurança Social e das CLA's os meios humanos, designadamente em pessoal especializado, que permita uma intervenção mais eficaz e de melhor qualidade da parte do Estado. E aqui ainda há, seguramente, muito por fazer. Mas não é aqui que se centra o Projecto de Lei do CDS/PP que, por isso, irá merecer claramente o nosso voto contra.

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