Intervenção, Debate: Alternativas à crise na União Europeia, promovido pelo PCP e GUE/NGL

Intervenção de Ilda Figueiredo, no debate sobre «Alternativas à crise na União Europeia: Direitos, Produção, Solidariedade e Soberania»

Agradeço a presença de todas e todos e saúdo, em especial, os nossos convidados do Grupo da Esquerda Unitária Europeia/ Esquerda Verde Nórdica.

Este debate realiza-se num dos momentos mais críticos da vida política portuguesa, mas também da própria União Europeia. A ligação cada vez mais estreita entre as políticas comunitárias e nacionais também contribuiu para a crise que vivemos em Portugal. Entre as causas imediatas da demissão do Governo está o IV PEC do Governo de José Sócrates, pacote de medidas de austeridade, de medidas anti-sociais, que os líderes da União Europeia aplaudiram.

Aliás, hoje mesmo, na Cimeira de Bruxelas, está a ser aprovada toda a cartilha de políticas anti-sociais que permitem transformar a crise que o sector financeiro criou, ou seja, a dívida privada de alguns bancos e outras instituições financeiras, na dívida pública que agora todos têm de pagar, sobretudo quem trabalha, quem sobrevive com baixas pensões e reformas, quem continua no desemprego, designadamente jovens e mulheres ou apenas encontra um trabalho precário e mal pago, quem tem de enfrentar sucessivos aumentos de preços de bens e serviços de primeira necessidade, de impostos sobre o trabalho ou o consumo, enquanto não param de aumentar escandalosamente os lucros e ganhos de grupos económicos e financeiros, incluindo novamente os ganhos especulativos, até sobre a dívida soberana.

 Para o conseguirem, utilizam cada vez mais a centralização e concentração do poder, utilizando os mecanismos da União Europeia, incluindo o Tratado de Lisboa, que vão alterar pontualmente para, em Junho, criarem o Mecanismo Europeu de Estabilidade e para que a utilização do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira seja sujeito a uma tal condicionalidade que, de facto, se transforma um Estado soberano num mero protectorado, numa autêntica colónia das grandes potências europeias, para melhor servir os grupos económicos e financeiros nacionais e europeus. Por isso, deixaram cair algumas promessas feitas no apogeu da crise, quando era bem claro que o seu pico se devia sobretudo à especulação financeira, à desregulada circulação de capitais, à liberalização dos mercados financeiros e da crescente financeirização da economia, à falta de transparência e de controlo que os paraísos fiscais provocam, facilitando a fuga aos impostos que, só na União Europeia, ultrapassará os 200 mil milhões de euros, ou da recusa em aprovar e pôr em prática um imposto sobre transacções financeiras que, mesmo a taxas muito baixas, poderia arrecadar cerca de 250 mil milhões de euros, como resoluções do próprio Parlamento Europeu referem, para já não falar no fim do mercado dos derivados e de todos os seus produtos especulativos, a começar pelos que envolvem as dívidas soberanas.

Mas, como cada vez mais o poder político está subordinado ao poder económico e financeiro, os instrumentos utilizados para prosseguir o agravamento da exploração e o esbulho das populações e dos Estados de economias mais débeis, são diversos, e vão desde o Pacto da Competitividade, agora baptizado de “Pacto para o Euro Mais”, com todas as medidas anti-sociais possíveis, baseadas nas quatro directrizes aprovadas no Conselho da Zona Euro, de 11 de Março, e agora ratificadas no Conselho com os seus 27 Estados - Membros, que hoje termina, até à chamada governança económica, de que temos seis diplomas legislativos em debate no Parlamento Europeu, peças indispensáveis para, em conjunto com o BCE e um Pacto de Estabilidade reforçado, porem em prática o chamado semestre europeu, com todos os controlos dos orçamentos nacionais, das políticas económicas, financeiras e sociais, das multas que agravarão a dependência dos países que caiam na sujeição a tais mecanismos de esbulho e rapina que, em nome da estabilidade da Zona Euro, tenderão a agravar a situação económica, financeira e social dos países de economias mais frágeis. A que querem adicionar a insistência nas alterações da directiva sobre organização e tempo de trabalho, desvalorizando ainda mais o trabalho e os salários.

Esta multiplicação de instrumentos de controlo político e económico visa um único objectivo: aproveitar a crise para aprofundar a integração capitalista da União Europeia, para forçar o agravamento da exploração, para ultrapassar esta crise do capitalismo com maiores ganhos e lucros para os grupos económicos e financeiros, mesmo que isso custe o definhamento ou até a destruição do chamado “modelo social europeu”, e enterre em definitivo a tão propagandeada coesão económica e social.

Só que tais medidas podem facilitar a acumulação capitalista através do esbulho e exploração dos países mais frágeis, dos seus trabalhadores e das suas populações, mas não resolvem nenhum problema de crescimento económico e, muito menos, de desenvolvimento e progresso social, como aliás, as experiências portuguesa, grega, irlandesa ou até espanhola estão a demonstrar.

Ouviremos aqui os testemunhos dos nossos camaradas convidados de alguns países em crise e de outros que, embora beneficiando da crise, na distribuição da riqueza fica claro que os ganhos não são para todos. As desigualdades sociais e as discriminações também se acentuam em países como a Alemanha ou a França.

É por isso, que as lutas prosseguem, como ontem, em Bruxelas, no sábado passado, em Lisboa, e como temos visto na Grécia, em França e em tantos outros lados. São lutas que precisam de se intensificar para travar este desastre social anunciado, para provocar a ruptura necessária nas políticas praticadas, para pôr em prática uma outra política, como defendemos no Apelo Comum que o PCP subscreveu com mais 12 partidos comunistas e de esquerda, de Estados Membros da União Europeia, nas vésperas das últimas eleições para o Parlamento Europeu. Como já aí se afirmava “ A Europa está confrontada com uma das mais graves crises do capitalismo que poderá trazer graves consequências e perigos para os trabalhadores e para os povos”.

Por isso, como também aí se afirma, “Aos trabalhadores e aos povos está colocada como grande exigência do nosso tempo, a conquista de profundas transformações sociais, pela superação da exploração e da opressão. O nosso objectivo é uma Europa de cooperação, de progresso social, de igualdade, de promoção do ambiente, respeitadora da democracia, solidária e de paz.

Por isso, queremos e lutamos por uma Europa de emprego com direitos e pela melhoria das condições de vida dos trabalhadores e dos povos, pelo progresso económico e social, o que implica o controlo público dos sectores estratégicos da economia, o fim da sujeição dos Estados ao poder económico e financeiro e à autêntica ditadura dos mercados, o que também implica o fim do Pacto de Estabilidade e do Pacto da Competitividade ou “Pacto para o Euro Mais”, dos paraísos fiscais e da liberalização do mercado financeiro, para apostar na produção, nos serviços públicos essenciais, na defesa da democracia, dos direitos e da igualdade, contra todas as discriminações.

A situação actual não só demonstra que, tal como tínhamos afirmado, o Tratado de Lisboa não é a resposta que os países e os povos precisam e, muito menos, neste contexto, a União Económica e Monetária serve de resposta à crise.

Por isso, também neste debate, e no que se seguirá em Bruxelas, é importante que se discutam as alternativas à crise na União Europeia, o que sempre terá de passar por uma ruptura com as políticas actuais, na defesa dos direitos, da produção, da solidariedade e do respeito das diversas soberanias, do princípio de Estados soberanos e iguais em direitos.

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