Intervenção, Debate: Alternativas à crise na União Europeia, promovido pelo PCP e GUE/NGL

Intervenção de Ângelo Alves, na abertura do debate sobre “Alternativas à crise na União Europeia: Direitos, Produção, Solidariedade e Soberania”

Gostaria em primeiro lugar de saudar e agradecer em nome do Partido Comunista Português a presença de todos e em especial dos nossos convidados estrangeiros. Deputados e representantes de forças políticas com quem o PCP, no Parlamento Europeu e no quadro do Grupo Unitário de Esquerda / Esquerda Verde Nórdica, mantém relações de cooperação e solidariedade.

A vossa presença hoje aqui em Lisboa decorre naturalmente dessa cooperação e será um importante contributo para este debate em torno da crise do capitalismo, dos seus efeitos e expressões na União Europeia e das alternativas pelas quais os comunistas e progressistas se batem fazendo face à violenta ofensiva do grande capital e à complexa e extremamente difícil situação em que se encontram os trabalhadores e povos em cada um dos nossos países.

Mas não queria deixar de referir também que entendemos a vossa presença aqui em Lisboa como um sinal de solidariedade, que vos agradecemos, para com a luta que estamos a travar no nosso país. Uma luta muito dura levada a cabo no contexto de uma das maiores crises económicas e sociais já vividas por este povo na sua história democrática e a que se vem agora somar a demissão do governo do Partido Socialista e portanto a realização de eleições legislativas dentro de poucos meses.

Realizamos este debate num momento em que a Europa está a ser sacudida por um violento terramoto económico e político resultante da expressão da crise estrutural do capitalismo. Uma crise que como afirmámos nas últimas eleições europeias era – e a realidade aí está a confirmá-lo – também a crise dos fundamentos e políticas da União Europeia.

Longe vão os discursos de propaganda que falavam de mudança, responsabilidade, supervisão e controlo e muito mais longe está o engodo ideológico que apresentava a União Europeia como espaço protegido contra a crise e o Euro como seu escudo. Hoje muitos fingem esquecer as sonoras proclamações das reuniões do Conselho e do G20 que referiam o fim dos off-shores, a taxação do capital financeiro, a aposta no emprego, a coesão social, etc, etc. E outros nem se querem lembrar daquela peregrina ideia de que o “modelo social” europeu iria – qual reinvenção do keynesianismo – inspirar e liderar mudanças de fundo no sistema económico e financeiro internacional.

Como a realidade o demonstra foram parangonas e pura propaganda, mas com um objectivo! Face à realidade – ou seja a explosão da crise do capitalismo de forma ainda mais violenta nos principais centros do capitalismo – o discurso e a acção das classes dominantes de reconhecimento da crise foi rapidamente direccionado para o seu objectivo central. Entraram em cena as dramatizações da situação, o esmagamento de consciências, a patranha da insegurança dos ditos “mercados”, os riscos ditos sistémicos e a necessidade de se apoiar sem limites e sem medos o grande capital financeiro. As instituições da União Europeia e os Governos nacionais foram os instrumentos fundamentais do grande capital para transformar a divida privada em dívida pública e para se operar na União Europeia uma gigantesca operação de transferência massiva de recursos públicos para os cofres do capital financeiro que ainda não terminou.

Só este facto revela muito da natureza e objectivos da União Europeia e do grau de promiscuidade entre o poder económico e político no espaço europeu.  Os resultados aí estão: níveis recorde de endividamento de Estados, situações económicas insustentáveis, e sobretudo uma profunda crise social que alastra por toda a União Europeia com maior incidência nos países mais pobres e desprotegidos.

É a machadada final nas patranhas propagandísticas da coesão económica e social e da solidariedade. O tempo foi e é o do cada um por si, foi e é o do roubo descarado dos recursos dos trabalhadores e dos povos, foi e é o do aumento brutal das desigualdades, seja entre classes, seja entre países da União Europeia, foi e é o da afirmação pura e dura do poder dos mais fortes sobre os mais fracos.

Vivemos agora o tempo das crises da dívida soberana. Uma crise que resultando desse acentuado processo de concentração e centralização poder económico e político no grande capital nacional e transnacional veio acentuar de forma abrupta as relações de dependência de tipo colonial dentro da União Europeia. Simultaneamente, e neste quadro, o aprofundamento das rivalidades inter-imperialistas atira para o centro da guerra monetária os países mais fragilizados por uma política económica e monetária da União Europeia profundamente injusta, desadequada e penalizadora dos trabalhadores, dos povos e dos próprios Estados.

Iremos ver neste debate como reage a super-estrutura europeia a esta situação. E se faltassem argumentos, que não faltam, para concluir que se verifica um brutal aprofundamento dos três pilares da União Europeia – o neoliberalismo, o federalismo e o militarismo - bastaria então enunciar três factos: a situação económica, social e política que Portugal está a viver neste momento; a realização do Conselho Europeu que mais parece um Conselho de guerra contra os trabalhadores e os povos e contra a soberania dos Estados; e por fim o desencadear de uma guerra imperialista na Líbia em que algumas das principais potências capitalistas da União Europeia têm um papel central. Estamos com dissemos há dois anos atrás aquando das eleições europeias perante uma perigosa fuga para a frente do capitalismo face à sua profundíssima crise sistémica e estrutural!

A realidade com que estamos confrontados é a da profunda e abrupta agudização da luta de classes. Uma situação tão difícil e exigente como apaixonante do ponto de vista da batalha política e ideológica. Uma situação que exige muita determinação, muita luta social e de massas, muita coragem e firmeza política e ideológica. As lutas sociais e de massas têm registado em países como Portugal, Grécia, Espanha, França, e muitos outros, evoluções muito positivas e os partidos que hoje aqui estão representados têm tido um importante papel na dinamização da luta popular e dos trabalhadores. Mas a situação exige mais. Exige mais luta, mais organização, mais combate político e ideológico, mais visibilidade da alternativa.

O tempo é de embate político e ideológico e isso exige do PCP - e pensamos de todos os partidos aqui representados – firmeza, clareza e acutilância, quer na crítica aos responsáveis e às causas de fundo da situação (e a natureza da União Europeia é uma delas), quer nas propostas alternativas e na alternativa política que apresentamos aos povos. Isso é fundamental para que desta profunda crise não resulte uma ainda mais desfavorável correlação de forças para os trabalhadores e os povos e uma ainda maior regressão histórica e civilizacional no continente europeu, o objectivo central das medidas que hoje estão a ser aprovadas no Conselho Europeu. 

Para tal pensamos que acção do GUE/NGL é fundamental, agindo em defesa dos trabalhadores e dos povos, dando voz às suas lutas, afirmando e defendendo o seu riquíssimo património de luta e de proposta e confirmando-se como um espaço de cooperação respeitador da independência, características, história e percursos de cada um dos seus membros. Um Grupo que no PCP pensamos ser necessário para afirmar uma alternativa real a uma União Europeia cada vez mais anti-social, antidemocrática, construída nas costas dos povos e contra os seus interesses e direitos.

É tempo portanto para um debate que necessariamente irá bem mais além do tema que aqui nos trouxe e que viverá para lá do tempo que temos disponível e que decerto será um contributo para o fortalecimento da luta por uma outra Europa dos Trabalhadores e dos povos.
 

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