Intervenção

Intervenção da Deputada<br />Projecto de Resolução nº 77/VIII,

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, O projecto de resolução do PS é surpreendente. Não pelos temas, que nos parecem do maior interesse e utilidade. Não pela recolha de dados feita, que é uma boa base trabalho já para o Livro Verde que propõem. A surpresa deste projecto vem de algumas afirmações que são feitas que nem parecem vindas do partido que apoia o Governo. Gostaria de ler alguns excertos sobre as questões da educação: 'A frustração que muitas vezes resulta do acesso ao ensino superior atinge níveis impressionantes. Porque a média não foi suficiente para o curso que se queria e os projectos de vida vão sendo adiados ou completamente alterados, tornando por vezes impossível definir um projecto de vida.' Mais à frente, refere que o acesso ao superior: 'é um factor de pressão que pode chegar mesmo a pôr em causa relações de amizade devido à competição que se estabelece entre os alunos. A solidariedade, que seria um dos valores fundamentais a desenvolver nos jovens é, nestes períodos, completamente posta de lado.' E fala ainda o PS em depressões e esgotamentos entre os estudantes. O que aqui nos surpreende não é a análise, que nos parece correctíssima. Há anos que o PCP vem dizendo isto. Os 65 mil estudantes do secundário que em Maio passado saíram à rua falavam disto mesmo. O que é francamente surpreendente é que o PS saiba estas verdades todas e não faça nada para as alterar. Há boas medidas à espera de serem aplicadas: o fim das provas globais, dos exames nacionais e a extinção do numerus clausus. Se, como dá a entender o Grupo Parlamentar do PS, o sistema de acesso ao ensino superior é um problema de saúde pública, recupere-se muito rapidamente o tempo perdido. Este projecto de resolução esquece que muitos destes factores de risco têm causas sociais e económicas cuja responsabilidade é do Governo. Como é possível que se escreva que a dificuldade no 'acesso ao estatuto de adulto' é um dos factores de risco na adolescência e na juventude e depois se prossigam políticas de precarização do emprego que impedem qualquer estabilidade, qualquer autonomia dos jovens? Como é possível que se fale da dificuldade em construir projectos de vida e se apoie um Governo que fez o que fez ao crédito jovem para compra de habitação? Não é por acaso que dados insuspeitos da União Europeia referem Portugal como o país onde os jovens mais tarde se autonomizam. O país onde apenas 4% dos jovens até aos 24 anos têm casa própria! Outro exemplo claro é o do alcoolismo: dados recentes traduzem um aumento do consumo global, e não apenas entre os jovens, como o PS deixa aqui implícito. A Resolução do Conselho de Ministros 40/99 estima existirem 1 milhão e 800 mil bebedores excessivos, dos quais 800 mil serão dependentes. As repercussões deste problema expressam-se na relação com as principais causas de mortalidade e nos muitos milhares de famílias afectadas por doenças graves, violência doméstica, acidentes de viação e de trabalho inaceitáveis e situações de grande dramatismo humano. A gravidade do problema impõe a urgência de medidas eficazes de intervenção sobre as causas sociais que estão na origem desta situação, de informação e prevenção primária, de educação e promoção da saúde, do alargamento do dispositivo e dos meios dos serviços de alcoologia, de apoio médico, medicamentoso, psicossocial e à reinserção sócio-laboral, de fiscalização da acessibilidade do álcool às crianças e em zonas próximas de estabelecimentos de ensino, de cumprimento e fiscalização da legislação, nomeadamente sobre publicidade, de alterações de natureza legislativa e fiscalizadora, de reforço das estruturas de coordenação da luta contra o alcoolismo. Isto é o que falta ao Governo fazer! Sr. Presidente, Sras e Srs. Deputados, No que diz respeito à parte deste projecto que realmente propõe questões, temos uma sugestão e uma dúvida. A sugestão é para que a organização do debate referido na alínea A) seja entregue à Comissão Parlamentar de Juventude e Desporto, que nos parece a mais adequada para tal. A dúvida é acerca do Livro Verde. Não sobre a utilidade que normalmente os governos dão aos dados que se recolhem nestes livros, mas sobre quem o fará. Não nos parece que sejam os deputados da Assembleia da República os técnicos mais avalizados para fazerem esta reflexão. Para terminar, não resisto a outra citação do projecto de resolução: 'esta discussão que aqui se promove não deve apenas configurar um desígnio paliativo'. Pois não, concorda o PCP. Esta discussão sobre a saúde dos jovens que aqui se promove exige políticas concretas, mas de esquerda.

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