Intervenção de Carla Cruz na Assembleia de República

"O Governo demite-se das suas responsabilidades de garantir o acesso à saúde"

(projeto de lei n.º 624/XII/3.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
A consagração, há 35 anos, do Serviço Nacional de Saúde (SNS) permitiu que todos os portugueses tivessem acesso a cuidados de saúde, acesso que só foi possível com a criação de uma eficiente cobertura nos cuidados de saúde primários e hospitalares.
Essa cobertura, por ação de sucessivos Governos e do atual, tem sido fortemente reduzida, por via do encerramento de postos, extensões e centros de saúde, de Serviços de Atendimento Permanente e de maternidades, de fusões e concentrações de hospitais, que agora se tem de levar mais longe, com a aplicação da Portaria n.º 82/2014, de 10 de abril. Com esta portaria, o Governo prossegue a política de desinvestimento e no SNS.
Está previsto o encerramento de 24 maternidades; a eliminação das especialidades de endocrinologia e estomatologia; o encerramento do Instituto de Oftalmologia Dr. Gama Pinto; o encerramento dos serviços de cirurgia cardiotorácica, nos hospitais de Vila Nova de Gaia e de Santa Cruz, Lisboa; o encerramento de serviços de cirurgia pediátrica, concentrando a valência em Lisboa, Porto e Coimbra.
A ofensiva contra o Serviço Nacional de Saúde abrange também a privatização dos serviços de saúde, o avanço das parcerias público privadas na saúde; o alargamento aos profissionais de saúde da precarização das relações laborais; a aplicação do regime jurídico do contrato individual de trabalho, de contratos emprego-inserção e o recurso à contratação de profissionais de saúde a empresas de trabalho temporário; a transferência dos custos da saúde para os utentes, por via do aumento das taxas moderadoras ou das restrições na atribuição de transportes de doentes não urgentes.
Os efeitos da política de direita salientam-se também pelas obras que não são realizadas, pela não construção de unidades de saúde em concelhos altamente carenciados, pela não dispensa de medicamentos e pelas limitações na prescrição de exames complementares de diagnóstico.
O Governo demite-se das suas responsabilidades, do dever de prestar serviços públicos e de garantir o acesso à saúde, como consagrado na Constituição.
Porque a prestação de cuidados de saúde está em causa com esta política e porque é preciso travar e pôr fim a este processo de destruição do Serviço Nacional de Saúde, o PCP propõe a revogação da Portaria n.º 82/2014 e a suspensão de todos os processos que se traduzam na redução, concentração e encerramentos de serviços ou valências hospitalares.
A reorganização hospitalar deve basear-se no seguinte: deve ser estruturada em articulação com os cuidados de saúde primários; deve assentar no utente, permitindo a acessibilidade à saúde; deve otimizar os recursos existentes sem que isso implique a diminuição e a qualidade dos serviços prestados.

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