Projecto de Lei N.º 926/XIII

Gestão Pública das Cantinas Escolares

A defesa da gestão pública das cantinas escolares, a par da garantia da qualidade das refeições escolares têm sido matérias sobre os quais o PCP tem vindo a intervir, de forma a assegurar uma boa gestão da “coisa pública” e uma alimentação equilibrada aos estudantes.

O PCP na Assembleia da República tem denunciado a falta de qualidade das refeições servidas nalguns estabelecimentos escolares, e exigido do Governo a tomada de medidas para solucionar um problema identificado por professores, funcionários, pais e estudantes.

O PCP sempre denunciou que a entrega da gestão das cantinas escolares à concessão privada era um caminho de desresponsabilização do Estado que podia acarretar perda de qualidade em termos das refeições servidas aos alunos, bem como das próprias condições de trabalho dos funcionários. Em muitos casos, foi reconhecido pela comunidade escolar que a qualidade da comida servida pelos concessionários passou a ser muito inferior à que era antes confecionada pelos trabalhadores das escolas com tal responsabilidade.

Têm sido identificados pela Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) alimentos deteriorados, inclusivamente em estado de decomposição ou putrefação, ou com qualidade ou composição alterada em cantinas e refeitórios escolares, que têm originado centenas de contraordenações e vários processos crime. Há muitas queixas relativas à falta de qualidade das refeições servidas nas cantinas escolares e à insuficiência de trabalhadores nestes refeitórios.

Também as condições de trabalho nas cantinas escolares concessionadas não podem ser aqui ignoradas. Em algumas empresas há trabalhadores que não têm contrato, outros a quem foi reduzida a carga horária e respetivo salário, outros ainda a quem não foi reconhecida a categoria profissional. Em vários casos, não houve renovação de contratações em número idêntico ao do ano anterior para fazer face ao mesmo trabalho ou ocorreram mesmo despedimentos. Os sindicatos referem ainda que não são garantidos os instrumentos de trabalho e os fardamentos, bem como o fornecimento dos produtos de forma atempada e em quantidade suficiente para que seja possível organizar o trabalho, o que se reflete na qualidade do serviço prestado.

Recentemente, em audiência na Assembleia da República, o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Centro revelou que, em cerca de 50 escolas da região, apenas 4 cumpriam integralmente o caderno de encargos. Implica isto que haveria cerca de 1670 horas e 32 trabalhadores a menos face ao número de refeições, de acordo com o estipulado no caderno de encargos. O Sindicato denunciou também a elevadíssima precariedade a que cerca de 90% dos 600 trabalhadores das 170 escolas que acompanham estão sujeitos, referindo que não tem ocorrido a aplicação de medidas sancionatórias quando os incumprimentos do caderno de encargos dizem respeito aos trabalhadores.

Além de medidas imediatas de reforço da fiscalização, como as que ficaram consagradas no Orçamento do Estado para 2018, por iniciativa do PCP, importa ir mais longe. Segundo dados do Ministério da Educação, dos 1148 refeitórios distribuídos pelas escolas públicas de 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário, 548 são de gestão direta das escolas, 776 são concessionados a empresas e 24 são de gestão autárquica. Ou seja, pouco menos de 50% são ainda de gestão escolar.

Neste sentido propomos que o Governo crie um procedimento para reversão da concessão das cantinas escolares para a gestão pública e que simultaneamente assegure os meios humanos e materiais necessários ao bom funcionamento das cantinas escolares e à qualidade das refeições fornecidas. Deste modo, o PCP defende que deve ocorrer o regresso da exploração das cantinas à gestão das escolas, quando haja lugar a rescisão de contrato por falta de cumprimento do caderno de encargos, bem como no final dos contratos de concessão.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei determina a gestão pública das cantinas escolares.

Artigo 2.º

Âmbito

A presente lei aplica-se a todas as cantinas escolares da responsabilidade da Administração Central, nomeadamente das cantinas escolares das escolas do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico, das escolas do ensino secundário e do ensino profissional.

Artigo 3.º

Fiscalização das cantinas escolares

Os contratos de concessão de cantinas escolares não podem ser renovados, na sequência de ações de fiscalização, sempre que:

a) se conclua pela falta de qualidade das refeições escolares;

b) se demonstre o incumprimento do caderno de encargos, designadamente quanto à carga horária dos trabalhadores, à razão do número de trabalhadores por número de refeições e à classificação profissional, entre outros aspetos.

Artigo 4.º

Gestão Pública das cantinas escolares

1 – O Governo estabelece um procedimento para a reversão da concessão das cantinas escolares para a gestão pública.

2 – A partir do ano letivo que se inicie após a entrada em vigor da presente lei, o Governo assume de forma progressiva a gestão direta das cantinas escolares nas escolas da responsabilidade da Administração Central.

3 – O Governo assegura os meios humanos e materiais necessários ao bom funcionamento das cantinas escolares e à qualidade das refeições fornecidas.

4 – Para dar concretização ao número anterior, no que respeita aos meios humanos, o Governo procede à abertura de procedimento concursal para a contratação dos trabalhadores necessários, integrando-os na carreira com vínculo efetivo à função pública.

Artigo 5.º

Regulamentação

O Governo regulamenta a presente lei no prazo de 180 dias após a sua entrada em vigor.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

  1. - A presente lei entra em vigor no dia imediato à sua publicação.
  2. - São excetuados do número anterior os números 3 e 4 do artigo 5.º, que entram em vigor com a publicação do próximo Orçamento do Estado.
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