Intervenção de

Garantia dos alimentos devidos a menores - Intervenção de Bernardino Soares

Projecto de Lei nº 340/VII, do PCP, sobre "Garantia
dos alimentos devidos a menores"
Intervenção de Bernardino
Soares 

Sr. Presidente Srs. Deputados

A iniciativa legislativa que hoje apresentamos incide sobre realidades inegáveis da sociedade em que vivemos e que provavelmente tenderão a aumentar.

Por um lado a existência de muitas famílias monoparentais, quer resultantes da separação ou divórcio dos pais, quer de nascimentos fora do casamento. Por outro lado as situações em que não é efectivado o direito à prestação de alimentos, tantas vezes impossibilitado por a pessoa obrigada se encontrar no desemprego, com trabalho precário ou com salários em atraso.

Do que se trata aqui hoje é de garantir a realização de uma direito mais do que atribuí-lo. De pôr fim à angústia de quem não pode transformar em sustento para a criança que tem a cargo a sentença não cumprida do Tribunal.

Só assim caminharemos para a concretização dos preceitos constitucionais relativos à família, à protecção das crianças e dos jovens, do seu pleno desenvolvimento e da garantia de condições de vida dignas. A aplicação dos preceitos aqui propostos para a prestação de alimentos a menores fará em muitos casos a diferença entre um crescimento saudável de crianças e jovens e uma situação de carência e desprotecção, que colide frontalmente com os princípios enunciados na nossa ordem jurídica.

Se a reforma do Código Civil de 1977 avançou claramente para a adequação do instituto das obrigações alimentares às novas realidades, a Organização Tutelar de Menores continua a não assegurar que esses direitos se cumpram.

Diversas são as situações que hoje em dia escapam à concretização prática da obrigação de alimentos. Desde logo a ausência em parte incerta do obrigado o que inviabiliza a prestação determinada pelo Tribunal. Noutros casos o obrigado está ausente no estrangeiro o que, mesmo quando não inviabiliza de todo a prestação determinada pelo Tribunal, a protela por um tempo frequentemente incomportável para o bem estar do menor.

Surgem depois os casos que são consequência da cada vez maior precarização laboral e desemprego na nossa sociedade. Torna-se impossível a um desempregado ou por exemplo a um trabalhador com salários em atraso, cumprir a prestação devida. E à sua situação dramática associa-se a de quem dele depende para a manutenção da vida.

Há ainda situações em que o obrigado é trabalhador por conta própria ou um falso prestador de serviços e que por vezes servem de entrave à execução da prestação.

O que o PCP propõe é tão simples como equilibrado. Trata-se de proteger em primeiro lugar o bem jurídico mais valioso nesta questão - a manutenção da vida, da dignidade e do direito a um crescimento saudável do alimentando.

Para isso propomos que seja o Estado a assegurar a prestação necessária, àqueles que dela necessitem enquanto não haja efectivo cumprimento da obrigação. Caberá ao Tribunal fixar esta prestação analisadas as necessidades do menor e até ao montante de um salário mínimo nacional. Poderá ainda fixá-la a título provisório, se necessária com urgência, a requerimento da pessoa responsável pelo menor em causa e feitas as diligências de prova que o Juiz entenda necessárias.

Em qualquer caso cabe à pessoa responsável pelo menor comunicar o fim da situação que justificava a atribuição da prestação pelo Tribunal devendo ser devolvidos os quantitativos recebidos indevidamente acrescidos de juros de mora.

Todas estas disposições especiais encontram-se no nosso projecto limitadas aos menores que de facto delas precisem, ou seja, aos que não dispõem nem beneficiam de rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional.

O Projecto do PCP propõe ainda a criação de um Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores, como instrumento importante para o correcto acompanhamento de todos estes mecanismos e também como meio que permitirá diminuir a incidência no Orçamento de Estado dos montantes necessários para suprir as prestações em situação de incumprimento.

É que o Fundo ficará sub-rogado em todos os direitos de menores não cumpridos e poderá deste modo vir a recuperar os montantes em dívida, desde logo pela disponibilidade de informação e de acção de que o Estado dispõe nesta matéria.

Pela nossa parte admitimos que o Fundo esteja integrado no Ministério da Justiça em lugar de se integrar no Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

Sr. Presidente Srs. Deputados

As propostas que hoje aqui apresentamos visam suprir uma grave lacuna do nosso ordenamento jurídico, que tarda em ser preenchida e que não pode ser ignorada.

Não é legítimo que as situações de carência de menores que existem na nossa sociedade continuem a não ter uma resposta adequada. É absolutamente exigível que tomemos medidas para tentar minorar estes problemas. Nesta matéria o Estado deve assumir um papel de garantia e de protecção que a não existir deixa em desamparo milhares de crianças e jovens a quem não basta o reconhecimento de um direito, mas que precisam da sua aplicação.

 

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