Intervenção de

Financiamento do Ensino Superior Público -Intervenção de Bernardino Soares

Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhores Membros do Governo:

O Governo propõe hoje que se dê mais um passo na aplicação da sua cartilha que infelizmente nada tem de maternal. É a cartilha única da moeda europeia e do neo-liberalismo que impõe fortes restrições nas áreas sociais.

Desde a suspensão (imposta pela contestação social e estudantil) das leis das propinas do PSD, que nos sótãos conspirativos do Governo e do PS todos tentaram encontrar a melhor estratégia para reintroduzir o aumento das propinas.

Deixaram para trás promessas várias, como a resolução dos graves problemas do ensino superior ou a garantia de que não se aplicariam as propinas sem que se fizesse a reforma fiscal.

Eis que surge a grande reforma que o Governo nos propõe para o sistema de ensino superior. Não a expansão do Ensino Superior Público; não a melhoria da sua qualidade; não a extinção do "numerus clausus", mas sim a propinização do sistema.

A diferença fundamental entre o que o Governo defende e o que o país realmente precisa é que o Governo encara a educação como uma despesa quando devia tê-la como um investimento. É por isso que caminha para a desresponsabilização do Estado no financiamento do Ensino Superior negando o direito ao ensino e hipotecando o futuro do País. É disso que se trata aqui hoje.

Por isso, o Governo e o PS, como antes o PSD, partem do princípio "quem quer educação, paga-a!. Partindo daqui, tenta mascarar este objectivo com o discurso do investimento na Acção Social Escolar. Que continua a ser ridiculamente insuficiente. Talvez por isso o Governo não concretiza, por exemplo, como serão os escalões para atribuição de bolsas de estudo. Ignora também os elevadíssimos custos indirectos da frequência do Ensino Superior, suportados na totalidade pelos estudantes e suas famílias.

Na proposta do Governo, enquanto, por um lado, a propina está pronta a ser aplicada, a Acção Social Escolar é um mar de indefinições e conceitos vagos, sem nenhuma garantia para os estudantes.

O PCP defende que a Acção Social Escolar deve encarar os estudantes como trabalhadores intelectuais responsáveis e dar-lhes condições para que possam frequentar o Ensino Superior. É por isso que defendemos que a todos os estudantes sejam prestados apoios gerais nos domínios da alimentação, da assistência médica e medicamentosa, do apoio para transportes, dos elementos de estudo e material escolar e da informação e procuradoria.

Para além destes apoios gerais, devem na nossa opinião existir discriminações positivas para todos os que não disponham dos recursos económicos necessários, nomeadamente através de bolsas de estudo e apoio no alojamento.

Ponto fundamental da nossa proposta é a participação obrigatória dos estudantes em todos os níveis de análise e decisão sobre a Acção Social Escolar como forma de garantir a sua aplicação justa e alargada.

Outra proposta é a equiparação dos estudantes do Ensino Superior Particular e Cooperativo aos do Ensino Superior Público para efeitos de acesso a todos os mecanismos de Acção Social Escolar previstos.

Os anteriores governos, tal como este, mantêm o "numerus clausus", enquanto restrição qualitativa global do acesso ao ensino superior público. Empurram todos os anos para o ensino privado muitos milhares de alunos, muitos deles não tendo as condições económicas necessárias para a frequência do ensino. É por isso justo que possam ter acesso aos mecanismos de Acção Social Escolar.

Mas há uma diferença grande entre o que defendemos e o discurso normalmente dirigido por outros partidos aos estudantes do privado.

É que o PCP defende este regime, enquanto se mantiver o "numerus clausus" e na perspectiva de lhe pôr fim, enquanto os outros partidos e o Governo não querem pôr fim ao "numerus clausus" e visam com a Acção Social Escolar para o privado, mais do que apoiar os alunos, financiar indirectamente as instituições do ensino privado.

Será possível alcançar estes vários objectivos? Certamente que sim. Para isso, é preciso por fim ao subfinanciamento do ensino superior público e dos serviços de acção social, à falta de investimento em infraestruturas e à política de desresponsabilização do Estado nesta matéria.

O que não aceitamos é que continue a cada vez maior mercantilização dos saberes e a venda a retalho de um direito -- a educação -- que é de todos e de cada um.

Disse.

  • Educação e Ciência
  • Assembleia da República
  • Intervenções