Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República

"Este Governo não tem condições, nem legitimidade política para continuar"

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

No que às áreas sociais diz respeito, o Programa deste Governo não traz nada de novo. Limita-se a transpor a continuidade de uma política que privou milhares e milhares de portugueses de aceder à educação, à saúde ou aos apoios sociais em toda a sua plenitude, como consagra o texto constitucional.

O Sr. Primeiro-Ministro fala de defesa das áreas sociais, mas o que verdadeiramente defende não é a garantia dos direitos sociais aos portugueses e sim os interesses privados. Foi isso que PSD e CDS fizeram no anterior mandato, com a entrega dos hospitais às misericórdias, ou a abertura de turmas e de ofertas educativas no privado, encerrando-as na escola pública, ao lado.

Sr. Primeiro-Ministro, como pode afirmar defender as áreas sociais quando as consequências das suas opções políticas contrastam com esse desiderato?

Nos últimos quatro anos, na saúde, houve cada vez mais utentes a adiar a ida à consulta, a abandonar a terapêutica e os tratamentos por carência económica; mais de um milhão de utentes não tem médico e família, apesar de o Governo ter prometido, até ao final do mandato que terminou, a atribuição de médico de família para todos os utentes; os serviços públicos de saúde perderam cerca de 7500 profissionais de saúde; encerraram e reduziram serviços e valências nos cuidados de saúde primários e nos hospitais; os doentes com hepatite C não tiveram acesso ao tratamento mais adequado e só com uma luta em condições dramáticas o conseguiram alcançar; a rutura generalizada dos serviços de urgência, com horas e horas infindáveis de espera, foi o retrato do desinvestimento e da desumanização, em que PSD e CDS deixaram o Serviço Nacional de Saúde.

Na educação, foram responsáveis pelo encerramento de escolas e pela degradação do parque escolar; pela expulsão de cerca de 25 000 professores do sistema educativo, pela carência de funcionários, psicólogos e demais técnicos; pela negação dos apoios adequados a milhares de alunos com necessidades especiais; pela segregação de milhares de estudantes com o ensino vocacional e o ensino profissional, impedindo-os de aceder aos mais elevados níveis de ensino, ou pela completa desvalorização do ensino artístico.

Na área social, mais de 575 000 crianças perderam o abono de família, cerca de 36 000 idosos perderam o complemento solidário para idosos e retiraram o rendimento social de inserção a mais de 120 000 pessoas.

Sr. Primeiro-Ministro, esta é a verdadeira realidade do País, que os senhores dizem estar melhor. E esta realidade é o resultado das vossas opções e medidas.
Por isso, o que hoje trazem à Assembleia da República são propostas e medidas de redução do financiamento da escola pública e do Serviço Nacional de Saúde, ao mesmo tempo que transferem cada vez mais os custos da saúde e da educação para as famílias, propostas e medidas com que procuraram descredibilizar a escola pública e o Serviço Nacional de Saúde, para justificar a sua privatização; propostas e medidas que integram uma estratégia política de desmantelamento das funções sociais do Estado e de reconfiguração do próprio Estado e propostas e medidas que não resolveram os problemas do País e que só os agravam, com mais empobrecimento, mais injustiças e mais desigualdades.

Foram estas as propostas e as medidas que as pessoas rejeitaram nas ruas, nas inúmeras ações de luta que realizaram nos últimos quatro anos, mas também nas urnas, retirando a maioria absoluta à coligação PSD e CDS, e que evidenciam que este Governo não tem condições, nem legitimidade política para continuar.

Era isso que os senhores deviam reconhecer e não insistirem nas mesmas políticas e medidas com que infernizaram a vida dos trabalhadores, dos reformados, dos portugueses, no Programa do Governo que hoje é apresentado, recusando-se a aceitar que foi por causa destas mesmas opções que foram derrotados.

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